“Marçal é um efeito surpresa para nos
lembrar de jamais subestimar a extrema-direita”, afirma Erika Hilton
Se há uma figura
pública que entende do enfrentamento à extrema-direita, essa pessoa é a
deputada federal Erika Hilton, do PSOL de São Paulo. E ela é firme em cravar:
“classifico Pablo Marçal como pior do que Bolsonaro”. A disposição de Erika
para o debate e o bate-boca com parlamentares bolsonaristas tem sido
reconhecida. Na semana passada, ela foi anunciada vencedora do Prêmio Congresso
em Foco 2024, na votação popular da categoria “Melhores da Câmara”.
Na madrugada da
terça-feira (3), mesmo com o pé machucado, a deputada manteve a vinda ao
Recife. O principal compromisso da agenda foi um ato, à noite, na praça da
Várzea, de demonstração de apoio à candidatura da colega de partido, Jô
Cavalcanti. A atividade contou também com a presença da candidata a prefeita
Dani Portela. Durante o dia, porém, Erika aproveitou para gravar mensagens de
apoio a outras candidaturas e conceder entrevista à imprensa. Num estúdio
localizado no centro, conversou com a Marco Zero, depois de falar ao portal
Afoitas.
Marco Zero – Esta é a
primeira eleição depois da disputa presidencial disputada por Lula e Bolsonaro.
Como a extrema-direita tem buscado atuar?
Erika Hilton – Acho
que há um esforço muito forte de tentar retomar a força que foi perdida com a
derrota do bolsonarismo. Agora, nas eleições municipais, a extrema-direita está
ensaiando para se organizar para o que será 2026. A gente, então, tem que tomar
muito cuidado. Não podemos subestimar essa força. O inimigo foi derrotado nas
urnas em 2022, mas pode fazer um estrago absurdo nas principais capitais do
País.
Como a senhora avalia
o efeito Pablo Marçal em São Paulo e no Brasil?
Marçal é um efeito
surpresa para nos lembrar de jamais subestimar a extrema-direita. Ele é um
homem perigoso, um condenado pela justiça, mas que tem uma capacidade de se
vender como popular, de vender sonhos fáceis, de se comunicar com as massas de
maneira assustadora. Precisamos desmascará-lo. Precisamos nos comunicar com as
massas. Não merecemos um coach que vende ilusões como soluções para os desafios
que demandam estratégia, planejamento, experiência e organização.
“… a visão do Nordeste
é diferenciada e torço muito por isso (…) de que o Nordeste seja de novo esse
fiel da balança”
Mas como fazer isso?
A gente precisa tirar
das pessoas essa sensação de que, de maneira simples e por um caminho curto,
elas vão ter as suas necessidades e dores solucionadas. Porque é isso que ele
vende e é dessa maneira que ele se conecta com grande parte das pessoas, em especial
com as periferias de São Paulo. A gente precisa de um antídoto para lembrar
quem é esse senhor, como ele construiu a sua riqueza. Precisamos desmontar essa
estratégia de comunicação da venda de soluções milagrosas. Eu o classifico como
pior do que Bolsonaro, porque acho que, do ponto de vista econômico, de fingir
ter um verniz democrático, ele se coloca como um cara moderado, apesar de ser
mentira. A gente viu ele no programa Roda Viva acenando ao Supremo Tribunal
Federal, dizendo que o país merece ser repactuado. Isso é característica de um
estrategista.
A impressão que dá é
que o sistema político não está preparado para alguém que age como ele. A
Justiça Eleitoral bloqueou as contas no Instagram. Pouco tempo depois, outras
recém-criadas já tinham mais de 3 milhões de seguidores.
O Poder Judiciário, em
especial nas eleições, avançou, tomou medidas importantes, mas precisa se
revisitar para entender quais são e como funcionam esses mecanismos digitais
utilizados pela extrema direita para atacar, mentir e cooptar parte da
sociedade. As eleições não podem ser sequestradas por essas narrativas e
métodos. As eleições precisam ser baseadas em propostas e debates.
Na eleição
presidencial de 2022, o Nordeste se mostrou um contraponto ao bolsonarismo.
Para a senhora, como essa polarização se dará na região nas eleições
municipais?
Torço muito para que o
Nordeste siga nessa frente. Tivemos governos de direita em algumas partes, mas
acho que a visão do Nordeste é diferenciada e torço muito por isso. As eleições
são uma incógnita. Não tenho acompanhado a fundo o cotidiano nas principais
capitais, mas tenho esperança de que o Nordeste seja de novo esse fiel da
balança, para dizer que não há espaço para o fascismo.
Recentemente, o
resultado do PIB foi divulgado e se mostrou melhor do que a análise de parte da
grande mídia e do mercado financeiro. A que a senhora atribui esse tipo de
postura?
A grande mídia mantém
um certo ranço. O problema não é do governo, é de um mercado que não aceita
políticas pensadas para determinados grupos sociais. Há um atachamento de uma
série de questões. Mas é um governo que prioriza ainda o povo. Estamos dentro de
um Estado e uma sociedade capitalistas, que não aceitam, mesmo com números
favoráveis, políticas voltadas às minorias, à classe trabalhadora, ao povo
pobre e preto. Ainda que o governo Lula não caminhe na perspectiva de ser o
governo mais socialista do mundo, até porque a correlação do Congresso Nacional
jamais permitiria, ele ainda é um governo que está puxando o debate fiscal e
econômico para o lado de cá. Prioridades como educação, saúde e meio ambiente
são pautas secundárias para o mercado. Então, mesmo com o PIB acima da
expectativa, a diminuição do desemprego e a valorização real do salário mínimo
e aumento do consumo, a gente ainda vê essas críticas.
• Pablo Marçal – o político do futuro? Por
Mário Coutinho
Já faz dois meses que
estou obcecado pelo Pablo Marçal, assisti todas as suas entrevistas, vi todos
os vídeos publicados em seu Instagram até a plataforma ser derrubada, escutei
todos os podcasts de análise; só não ousei ler seus 62 livros – meu hiperfoco
tem limites.
Meus amigos insistem
em dizer que ele é só um Bolsonaro 2.0, e eu teimo em dizer que não. Digo que
Pablo Marçal é algo novo, um fenômeno em ascensão, e nós, que ainda não sabemos
muito bem lidar com Jair Bolsonaro, temos que enfrentar esse enigma caleidoscópico.
Se de um lado o
playbook é o mesmo de Silvio Berlusconi e Donald Trump, toda aquela baboseira
de teologia da prosperidade, o populismo barato e a simplificação do slogan, de
outro sua atuação é muito mais complexa do que aparenta ser. Diferente de
Donald Trump, que começou com um mísero milhão de dólares emprestados do pai,
Pablo Marçal realmente veio de uma família de classe média baixa, com pai
funcionário público e mãe faxineira, apresenta a carteira de trabalho como
prova irrefutável de seu trabalho e dignidade (especialmente quando acusado de
integrar uma quadrilha que roubava aposentados).
Sim, ele cresceu na
vida, mas não se esquece das origens humildes. No programa Roda Viva da TV
Cultura cantou duas músicas do Racionais MCs. Mudando seu mindset, se tornou
empresário de sucesso, orador, atleta de Ultraman (ele mesmo publicou um
desenho em seu Instagram no qual ele era o Superman), na vida pessoal é de
Jesus e pai de família. A mudança de mindset não só faz com que ele tivesse
sucesso econômico, faz com que ele tenha sucesso em tudo na vida.
Se fosse cantor, seria
maior que Frank Sinatra; fosse ator, seria maior que Marcelo Mastroianni; como
escritor já superou Machado de Assis. É o perfect outsider porque é o perfect
insider. Ele é você. E você também pode ser como ele, basta mudar a sua mentalidade.
Ele está disposto a fazer tudo isso de graça; na verdade vai até perder
dinheiro, mas sentiu em seu coração que precisava nos abençoar.
João Dória precisava
se fantasiar de gari, marronzinho, pedreiro; Pablo Marçal não: ele foi e é tudo
isso. Primeiro, leitor, tive certeza de que era uma estratégia de marketing;
depois me convenci de que ele de fato acreditava em tudo isso, fui tomado pela
dúvida e resolvi fazer um pequeno experimento: reassisti a entrevista no Roda
Viva de mente aberta, visualizando São Paulo nas mãos de Pablo Marçal.
Insuflei-me de
esperança e paz com a visão do maior arranha-céu do mundo na zona sul, com os
teleféricos trazendo os milhões de trabalhadores que não moram em São Paulo,
enquanto seus carros estacionados nos bolsões deixam o ar da cidade mais limpo,
o céu já não é mais cinza, esta é a Dubai dos trópicos. Ele seria um prefeito
técnico, esse Pablo hidrofóbico é apenas uma estratégia, afinal de contas ele
está sozinho, contra o sistema e tudo que está aí.
A imagem dos parques
limpos e bem cuidados me comoveu especialmente, vi famílias passeando com seus
cachorros enquanto as crianças corriam e abraçavam tigres, como nos panfletos
das Testemunhas de Jeová.
Quando soltei o ar
senti uma onda de vergonha – senti simpatia pela Vera Magalhães, que parecia
prestes a ter um colapso mental –, eu que me orgulho de ser cético e racional
fui tomado por uma visão mística, que finalmente me fez entender o verdadeiro
apelo do Pablo Marçal. Não é por ter sido periferia, da classe média e hoje
bilionário. Não é gostar de rap e ser crente. Não é sua multiplicidade e
talento político para se conectar com todos os eleitorados: é sua loucura.
O discurso é que o
racional não tem funcionado muito bem, então apostemos no irracional,
embarquemos juntos nesta grande aventura. E pode até funcionar, rezo de joelhos
para que funcione, porque um chimpanzé com uma AK-47 me deixa apavorado.
Fonte: Marco Zero/ A
Terra é Redonda
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