Bálcãs mostram que islã também é parte da
história da Europa
Há mais de mil anos
o islã está presente na Europa. Na Idade
Média, a região de Andaluzia, no sul da Espanha, esteve por muito tempo sob sua
influência. Mas foi nos países do sudeste europeu que a religião e a cultura
islâmicas deixaram marcas profundas.
A identidade islâmica
faz parte da Europa como o cristianismo e o judaísmo está presente nas
sociedades do Oriente Médio e do Norte da África.
Isso é especialmente
visível nos Bálcãs, aonde o islã chegou com a expansão do Império Otomano para
o sudeste da Europa após 1453 e onde até hoje marca, em diferentes graus,
países como Bósnia e Herzegovina, Albânia,
Macedônia do Norte, Montenegro, Kosovo, Romênia e Bulgária.
Na Bósnia e
Herzegovina, no Kosovo e na Albânia, muçulmanos são a maioria. Na
Macedônia do Norte, perfazem um terço da população nativa. Muitos da etnia roma
(grupo étnico minoritário ao qual as pessoas se referem, no Brasil, como
ciganos) também seguem a religião.
A disseminação do islã
nos Bálcãs foi um processo histórico complexo – não rápido ou violento, mas sim
gradual, levando entre 100 e 150 anos, afirma o professor Mehmet Hacisalihoglu,
da Universidade Ludwig-Maximilians em Munique. Os incentivos para a conversão
ao islã eram mais de natureza econômica. Essa visão é hoje consenso entre
pesquisadores.
Os otomanos não
estavam primariamente interessados na expansão religiosa, e sim na extração de
recursos dos países conquistados, como impostos e serviços, explica a
professora emérita Gudrun Krämer no livro Geschichte des Islam (História
do islã, em tradução literal).
Acima de tudo, os
novos senhores estavam de olho nas terras e em ricas jazidas de ouro e prata
para a produção de moedas. Conflitos tinham menos a ver com questões religiosas
e mais com a luta dos povos subjugados por autonomia e preservação de suas identidades
culturais.
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Nacionalistas veem islã como parte de estratégia de dominação
No entanto, até hoje
há controvérsias sobre a expansão do islã nos Bálcãs. A forma como esse período
histórico é visto e interpretado não é mera questão acadêmica: é crucial para a
convivência entre os diferentes grupos religiosos e étnicos nos Bálcãs atualmente,
principalmente diante de nacionalistas que veem a expansão do islã como parte
de uma estratégia política de dominação.
Hacisalihoglu,
contudo, vê mudanças positivas, com uma visão mais realista sobre o Império
Otomano e a disseminação do islã. "Hoje, livros escolares na Macedônia do
Norte e também na Sérvia apresentam de forma mais fiel esse processo de
islamização", exemplifica.
No caso da Macedônia
do Norte, que se tornou um país independente em 1991, um acordo firmado em 2001
prevê a representação adequada da história do país e de sua minoria islâmica,
sem exageros nacionalistas.
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Pluralidade religiosa
O período otomano nos
Bálcãs foi marcado por diversidade religiosa: cristãos católicos e ortodoxos,
muçulmanos sunitas e judeus viviam lado a lado nas cidades. Os bairros eram em
geral separados, mas as pessoas se encontravam na feira. Igrejas, sinagogas e
mesquitas estavam muitas vezes a poucos metros de distância uma da outra – algo
que é possível ver até hoje em Sófia, capital da Bulgária.
O chamado
"sistema Millet" permitia uma "vida autônoma e
independente" para todas as religiões, explica Hacisalihoglu.
"Os monoteístas
não muçulmanos continuavam a desfrutar de um alto grau de autonomia dentro de
uma ordem hierárquica dominada pelos muçulmanos sunitas", escreve Krämer.
Depois de 1870, a
Rússia tentou tomar áreas nos Bálcãs, por razões que ainda são debatidas entre
historiadores. O historiador britânico William Holt descreve esse processo como
uma tentativa de "Reconquista nos Bálcãs", a exemplo do que fizeram
os reinos cristãos da Península Ibérica ao expulsar os muçulmanos de terras que
hoje pertencem a Portugal e Espanha. Outros especialistas atribuem a investida
russa a razões políticas e econômicas.
A tentativa russa de
tomada dos Bálcãs acabou falhando principalmente por causa do Império
Austro-Húngaro. Em 1878, a Áustria ocupou a Bósnia e reconheceu oficialmente a
comunidade muçulmana. Ali, a dinastia dos Habsburgo criou uma organização muçulmana
a exemplo da igreja cristã austríaca e o cargo de reisu-l-ulema, liderança
religiosa que até hoje segue sendo o maior representante dos muçulmanos
bósnios.
Desde então, um Islã
com um longo histórico de convivência com outras religiões e etnias
em um Estado secular pôde se estabelecer na Bósnia.
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Bósnia: islã em um país secular
Entre as
particularidades da vida islâmica bósnia estão visões liberais sobre a
proibição do álcool e a prática do jejum, bem como uma grande abertura para
outras religiões e modos de vida.
A prática da
poligamia, comum em alguns países árabes, praticamente não ganhou espaço na
Bósnia. Diferentemente da Península Arábica ou do Egito, correntes islamistas e wahabitas eram praticamente desconhecidas nos Balcãs.
Isso mudou com a Guerra da Bósnia (1992-1995),
quando os muçulmanos, que se autodenominam bosníacos, foram perseguidos e
mortos por nacionalistas sérvios e croatas, culminando no genocídio de Srebrenica.
A desintegração da Iugoslávia e
a Guerra da Bósnia acentuaram as fronteiras entre etnias e religiões.
Juridicamente, Estado e religião são separados em todos os países do Balcãs.
Mas durante e após a guerra, a religião tornou-se um fator político e de
identidade mais forte.
Mesmo assim, em
comparação com o Oriente Médio ou as metrópoles da Europa Ocidental, as
posturas liberais do islã nos Bálcãs e sua forte rede de relações sociais
tornam essa vertente da religião mais resiliente contra tendências radicais e
As raízes da Europa
também são islâmicas
Muçulmanos, cristãos e
judeus convivem no sudeste europeu há séculos. Apesar disso, até hoje a Europa
reluta em ver os muçulmanos dos Bálcãs como parte do continente. Eles seriam os
"outros", de acordo com o autor britânico-paquistanês Tharik Hussain,
que atribui essa visão ao fato de muitos muçulmanos na região terem vivido sob
domínio otomano.
"Os otomanos eram
vistos como inimigos da Europa cristã-ocidental, que deu origem à identidade
europeia moderna", explica Hussain no livro Minarets in the
Mountains: A Journey into Muslim Europe (Minaretes nas montanhas: uma
jornada à Europa muçulmana, em tradução livre). "Essa identidade inclui
também uma postura anti-muçulmana, que é parte do DNA da Europa."
Essa visão faz de
"muçulmano" e "europeu" duas categorias identitárias
mutuamente excludentes. Mas a história do islã nos Bálcãs mostra que as raízes
da Europa são cristãs, judaicas e islâmicas.
¨ 30 anos depois, marcas dos Aliados ainda estão em Berlim
As tropas da coalizão
que derrotou Adolf Hitler na Segunda Guerra Mundial (1939-1945) passaram quase meio século estacionadas na Alemanha.
Tudo começou em 8 de
maio de 1945, o dia da capitulação incondicional
do Terceiro Reich ante
as forças aliadas. Era o fim de um dos piores conflitos da história, que custou
pelo menos 60 milhões de vidas e fora provocado pelos nazistas.
Pouco tempo depois, em
2 de agosto daquele mesmo ano, a Alemanha foi dividida em quatro zonas pelas
potências vencedoras. Os Estados Unidos, o Reino
Unido e a França ficaram com o lado ocidental do país, e a União
Soviética, com o oriental; o primeiro deu origem em
1949 à República Federal da Alemanha (RFA), enquanto o segundo virou a República Democrática Alemã (RDA) – uma ditadura comunista que de democrática só tinha o
nome.
<><> Uma
Berlim dividida em quatro setores
A antiga capital do
Reich nazista também foi dividida em quatro setores entre os Aliados, e já
naquele momento começaram a crescer as tensões entre as potências vencedoras da
guerra.
Da aliança militar
forjada por conveniência surgiram dois campos inimigos: o democrático, dos
aliados do Ocidente, e o comunista, da União Soviética. E é em Berlim que essas
tensões afloraram com mais intensidade, com o bloqueio soviético dos setores
ocidentais em junho de 1948. O objetivo: assumir o controle de toda a cidade.
<><> A
ponte áerea que salvou Berlim Ocidental
Estados Unidos, Reino
Unido e França reagiram ao bloqueio com a lendária ponte aérea de Berlim.
Para garantir a
sobrevivência dos 2,2 milhões de cidadãos nos setores ocidentais, aviões
abasteciam a cidade com todo tipo de suprimentos: alimentos, remédios,
combustível, carvão para manter as casas aquecidas. Os aviões foram
carinhosamente apelidados pelos berlinenses de Rosinenbomber, ou
"bombardeiros das passas" – uma alusão aos pacotes cheios de
guloseimas lançados por soldados americanos sobre a cidade antes do pouso, e
que faziam a alegria das crianças.
Acidentes aéreos e
outros infortúnios associados à ação mataram cerca de 100 pessoas – as vítimas
são lembradas no Memorial da Ponte Aérea (Luftbrücken-Denkmal) no antigo
aeroporto de Tempelhof, onde aterrissavam parte dos aviões dos aliados.
A ponte aérea durou
até o fim do bloqueio, em maio de 1949. A história dessa façanha logística é
contada na exposição permanente do Museu dos Aliados (Alliierten-Museum),
no antigo setor americano.
<><> Um
cinema para soldados que virou museu
O próprio imóvel que
abriga o Museu dos Aliados é histórico: ali ficava o cinema Outpost, que
atendia soldados americanos. E a alameda onde está situado o museu, a
Clayallee, é uma homenagem ao organizador da ponte aérea, o general americano
Lucius D. Clay.
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Checkpoint Charlie: um ímã de turistas
Há ainda o
mundialmente famoso Checkpoint Charlie, antigo posto militar na fronteira entre
Berlim Ocidental e Oriental.
Hoje ele é parada
obrigatória para quem visita Berlim. Muitos se deixam fotografar diante da
réplica – o original está no Museu dos Aliados.
Erguido após a
construção do Muro de Berlim em 13 de agosto de 1961, era por
ali que militares das forças aliadas e diplomatas transitavam livremente entre
os dois lados da cidade. Naquela época, o local chegou a ser cenário de um
impressionante confronto entre tanques de guerra americanos e soviéticos.
<><>Tanques
e túmulos ao lado do Portão de Brandemburgo
E por falar em
tanques, há alguns deles espalhados por Berlim.
Um está posicionado em
frente ao Museu Berlim-Karlshorst, no antigo setor soviético. O ponto alto da
exposição permanente é o Salão da Capitulação (Kapitulationssaal), onde
foi selado o fim da Segunda Guerra em 8 de maio de 1945.
O Memorial de Guerra
Soviético ao lado do Portão de Brandemburgo também está cercado por tanques.
Ali também estão enterrados ao menos 2 mil soldados do Exército Vermelho que
caíram na Batalha de Berlim, travada entre 16 de abril e 2 de maio de 1945.
O aeroporto militar de
Gatow, no antigo setor britânico, é outra lembrança da presença aliada. A Força
Área Real esteve estacionada ali até a saída definitiva das tropas, em 8 de
setembro de 1994. Hoje, o local está sob proteção do patrimônio histórico e
abriga o Museu das Forças Armadas alemãs (Museum der Bundeswehr).
<><> Em
Tempelhof e Tegel os aviões já não pousam
Gatow não tem tráfego
aéreo há muito tempo, assim como os outros dois aeroportos nos setores
americano e francês que, naquela época, eram de uso militar e civil: Tempelhof e Tegel. Ali, hoje é possível se informar sobre a
história cheia de reviravoltas dos aliados.
Uma atração especial
deve voltar a ser exibida em novembro deste ano, após passar por restauração: a
réplica em madeira da Torre Eiffel, com 13 metros de altura, que decora a
entrada do Centro Francês, no bairro de Wedding. A instituição cultural foi inaugurada
em 1961 e hoje se dedica à promoção da amizade franco-alemã.
<><> Nomes
de rua lembram o passado
Faz 30 anos que os
últimos soldados das forças aliadas da Segunda Guerra deixaram Berlim. Parte
das casernas que deixaram para trás são hoje usadas pelas Forças Armadas
alemãs.
A herança dos Aliados
é visível principalmente em pontos históricos. Ainda assim, há outros
rastros curiosos, que surpreendem principalmente os desavisados. Um desses
lugares é a Cité Foch, um antigo conjunto habitacional no distrito
de Reinickendorf que era usado por militares franceses. Ali, o passado continua
vivo nos nomes das ruas: Avenue Charles de Gaulle, Place Molière, Rue
Montesquieu.
¨ Intensificação de incursões israelenses na Cisjordânia prejudica
o acesso da população a cuidados médicos, alerta MSF
Incursões militares em
larga escala lançadas pelas forças israelenses na Cisjordânia, na Palestina, e
os repetidos ataques dos militares israelenses a profissionais de saúde,
ambulâncias e instalações médicas estão prejudicando gravemente a capacidade das
pessoas de ter acesso a cuidados médicos.
As incursões
israelenses, que começaram nas primeiras horas de 28 de agosto, também causaram
danos em larga escala à infraestrutura rodoviária, a redes de eletricidade e
abastecimento de água, prejudicando seriamente a capacidade de Médicos Sem
Fronteiras (MSF) de realizar atividades médicas nas cidades de Jenin e Tulkarm.
“Há um acesso médico
muito limitado na cidade de Tulkarm e em seus acampamentos de refugiados, e os
danos à infraestrutura são enormes”, alerta um integrante da equipe de MSF. “É
quase impossível alcançar as pessoas que precisam de cuidados. Essas incursões
não são anunciadas. As pessoas ficam totalmente despreparadas. Entre outras
questões, mães nos relataram que não têm comida suficiente para seus bebês. Os
moradores se sentem presos e isolados.”
As equipes médicas de
MSF foram forçadas a suspender suas atividades nas cidades de Tulkarm e Jenin
desde o início das recentes incursões.
“Nossa equipe está
atualmente com movimentação e capacidade de fornecer apoio direto à população
restritos”, relata Caroline Willemen, coordenadora do projeto de MSF. “Só
conseguimos fornecer primeiros socorros psicológicos de emergência em
Tulkarm e fazer uma doação [de suprimentos médicos, leite para bebês e
fraldas] em Jenin. As incursões precisam parar, e o acesso irrestrito à saúde
deve restaurado o mais rápido possível.”
Em Hebron, as forças
israelenses bloquearam o acesso dentro e fora da região, impedindo que as
equipes de MSF administrassem clínicas móveis e apoiassem nossa maternidade
localizada fora da cidade. Em Hebron, a clínica de MSF está em
funcionamento, mas, segundo relatos, os bloqueios e a sensação de insegurança
impedem que os pacientes acessem o local.
Em Jenin e Tulkarm,
ambulâncias e profissionais de saúde têm sido repetidamente atacados,
comprometendo seriamente as atividades médicas. Após oito dias de incursão, as
necessidades estão crescendo, principalmente nos acampamentos. É necessário um
aumento na resposta humanitária.
“Veículos israelenses
blindados estão estacionados nas entradas do hospital Khalil Suleiman, apoiado
por MSF, em Jenin, e a equipe da unidade de saúde está lutando para manter as
atividades em meio à escassez de eletricidade e água”, diz Willemen.
Uma paramédica
voluntária treinada por MSF relata que foi ferida enquanto prestava primeiros
socorros a um paciente em um acampamento em Tulkarm. “Mesmo enquanto usava meu
uniforme médico, fui atingida e fiquei ferida acima do olho e com ferimentos de
estilhaços”, disse ela.
Segundo outro
paramédico treinado por MSF, soldados israelenses entraram em sua casa e o
ameaçaram. “As forças israelenses arrombaram minha porta. Eu os informei várias
vezes que era voluntário de organizações médicas, mas eles me arrastaram para
fora e chutaram minhas costas antes de apontar uma arma para minha cabeça”,
relatou ele.
As recentes incursões
na Cisjordânia são as mais intensas desde 2002. De 28 de agosto a 5 de
setembro, 39 palestinos foram mortos e 140 ficaram feridos, de acordo com o
Ministério da Saúde local. Esses ataques fazem parte de um amplo padrão de
violência, que se deteriorou acentuadamente desde o início da guerra em Gaza.
Mais de 652 palestinos foram mortos na Cisjordânia desde outubro de 2023.
MSF pede que civis,
profissionais de saúde, ambulâncias, instalações médicas e hospitais sejam
protegidos a todo custo. Como potência ocupante, as autoridades israelenses
devem cumprir suas obrigações, de acordo com o direito internacional
humanitário, de garantir o acesso desimpedido a cuidados de saúde e outros
serviços essenciais na Cisjordânia.
Fonte: Deutsche Welle/MSF
Imprensa
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