sexta-feira, 6 de setembro de 2024

"Acabaram as dúvidas sobre falta de democracia na Venezuela’, diz deputado argentino

O recente pedido de prisão do candidato da oposição à presidência da Venezuela, Edmundo González Urrutia, sepultou as dúvidas remanescentes sobre a legitimidade democrática das eleições realizadas em 28 de julho, afirmou à DW um dos coordenadores da Aliança Progressista, plataforma que reúne 145 partidos e organizações de esquerda e centro-esquerda de todo mundo.

O pedido de prisão de González, feito pelo Ministério Público a um tribunal especializado em crimes de terrorismo, mostra que Maduro "insistiu no caminho de desconsiderar o voto popular, (...) fraudando resultados eleitorais e envolvendo distintos poderes da República nessa farsa", afirma Esteban Paulón, deputado federal da Argentina pelo Partido Socialista e coordenador da Aliança Progressista nas Américas.

A Aliança Progressista foi criada em 2013 por iniciativa de diversos partidos, com impulso especial do Partido Social Democrata alemão (SPD), que consideravam que a Internacional Socialista – tradicional aliança de partidos de esquerda e trabalhista – dava guarida a legendas não comprometidas com a democracia e tinha uma estrutura resistente a mudanças. O secretariado da Aliança Progressista é sediado em Berlim.

Entre os partidos que integram a aliança, estão três legendas venezuelanas que se opõe a Maduro, o PT e PSB do Brasil, a maioria dos partidos social-democratas europeus e o Partido Democrata dos Estados Unidos.

LEIA A ENTREVISTA:

·        Como avalia a ordem de prisão contra Edmundo González?

Esteban Paulón: Pouco mais de um mês após as eleições na Venezuela, as dúvidas sobre confiabilidade do sistema eleitoral, transparência dos resultados, correto escrutínio e respeito ao voto popular se transformaram na certeza de que nada disso esteve presente.

O governo de Nicolás Maduro insistiu no caminho de desconsiderar o voto popular, fraudando resultados eleitorais e envolvendo distintos poderes da República nessa farsa – o que é da maior gravidade, porque implicou inclusive o Tribunal Superior de Justiça nessa manobra.

Isso é gravíssimo. A comunidade internacional já expressou claramente que não crê nos resultados das eleições e não vai convalidar o governo de Maduro, que reforçou a perseguição contra a oposição. A recente ordem de prisão contra o presidente eleito Edmundo González é um fato novo muito grave na escalada antidemocrática na Venezuela, e a comunidade internacional não pode ficar indiferente a isso.

É uma violação do respeito à vontade popular que gerou um precedente muito grave para a região e colocou o país em uma armadilha. Será muito difícil sair dela e recuperar a paz sem que, primeiro, se restaure a confiança e a a garantias constitucionais e os resultado eleitoral seja respeitado pelo próprio governo.

·        A Aliança Progressista divulgou nota pública em 1º de agosto expressando preocupação com a eleição venezuelana e pedindo a publicação dos resultados, mas até agora os boletins de urna não foram divulgados. Como vocês avaliam isso?

Muitos de nós acreditamos que, ainda que os boletins fossem divulgados hoje, isso não seria crível. O que estamos ouvindo de nossos parceiros na Venezuela é que há uma situação muito complicada e uma tensão crescente. Haverá mais mobilizações populares, e muitas pessoas já foram detidas. Vários países já reconheceram o triunfo de Edmundo González, e seguiremos em escalada de violência. Não vejo Maduro reconhecendo sua derrota e o governo insistirá em reivindicar vitória, mas ele não tem credibilidade nacional nem internacional.

·        Como foi a articulação na Aliança Progressista para se posicionar sobre a Venezuela?

A nossa prioridade foi chegar a uma nota que contemplasse nossos membros venezuelanos, que são três partidos opositores a Maduro: o Movimento Socialismo, a Avanzada Progressista e o Cambiemos. Para nós, o marco geral é o respeito à vontade popular e o questionamento da falta de transparência e da violência com a qual o processo eleitoral foi conduzido. O governo tem a obrigação de garantir uma transição democrática pacífica. A nota representa toda a Aliança Progressista, mas o PT não participou da reunião na qual definimos o seu conteúdo.

·        O PT explicou por que não participou dessa reunião?

Eles têm duas linhas de trabalho no âmbito internacional, uma delas é mais próxima da Mônica Valente e do Foro de São Paulo, e outra é mais próxima da Aliança Progressista. O PT participa de algumas atividades da Aliança Progressista, mas não do cotidiano dela.

O principal momento da participação do PT na Aliança Progressista foi quando o Lula foi preso, pois a aliança liderou uma campanha internacional de apoio à libertação de Lula. Eles participaram mais ativamente nesse momento, e após a sua libertação não seguiram tão ativos.

·        O PT reconheceu a vitória de Maduro, mesmo sendo membro da Aliança Progressista.

Isso foi no partido. O Lula, como presidente do Brasil, foi muito mais cauteloso. O partido tem um vínculo mais próximo com o chavismo, eles são membros do Foro de São Paulo. O mesmo aconteceu em relação à Nicarágua quando o Ortega foi reeleito. Tivemos uma reunião [com o PT] para perguntar o que eles iriam fazer sobre o Ortega, pois era uma preocupação da nossa rede e de muitos países democráticos. Eles disseram que compartilhavam da preocupação, mas que estavam agindo nos bastidores para não expor Ortega porque seria pior – porém o regime foi ficando cada vez mais duro e o PT segue o reconhecendo. São posições muito tradicionais na esquerda, [na linha] "como é um dos nossos, não podemos questionar". Talvez com a Venezuela aconteça o mesmo.

·        Como surgiu a Aliança Progressista?

O impulso veio do SPD e de outros partidos, que em 2013 concluíram que a Internacional Socialista tinha uma estrutura muito complicada para representar a esquerda democrática e progressista no nível internacional.

Nos final dos anos 80, a Internacional Socialista passou a ser coordenada por Luis Ayala [secretário-geral da Internacional Socialista de 1989 a 2022], um militante chileno que foi refugiado político na época de [do ditador Augusto] Pinochet. Ele montou uma estrutura muito burocrática e fechada, que se sustentava principalmente com os votos de partidos da África. Nesse período, ele incorporou muitos partidos que comandavam ditaduras, não eram democráticos.

Houve um questionamento muito forte, que não conseguimos resolver pela via democrática, então muitos de nós decidimos fundar a Aliança Progressista, que hoje tem 145 integrantes. Temos o apoio inclusive do Partido Socialista Europeu [que reúne partidos sociais-democratas e trabalhistas de países europeus].

Meu partido também participou do Foro de São Paulo, que no princípio foi muito interessante para os partidos do Sul Global, mas depois assumiram posições radicais para sustentar determinados processos que não podemos acompanhar, como por exemplo na Nicarágua. Um dos partidos da Aliança Progressista é o Unamos, que reúne ex-sandinistas que estão na resistência, no exílio. A Nicarágua não é uma democracia.

·        Como a Aliança Progressista vê a defesa da democracia eleitoral na esquerda?

Defendemos a democracia eleitoral e vigência dos direitos humanos sempre, não só quando nossos amigos não estão no governo – costuma haver muito padrão duplo no tema de direitos humanos. Estamos convencidos de que a democracia é a via da paz e de que o diálogo político é o caminho para a construção de uma sociedade melhor, progressista e moderna. Também temos um compromisso com o meio ambiente e com direitos LGBT e à igualdade de gênero.

 

¨      Venezuela acusa os EUA de serem 'cúmplices' dos que promoveram protestos violentos no país

A Venezuela criticou nesta terça-feira (3) a posição dos EUA em relação ao mandado de prisão emitido contra o ex-candidato presidencial Edmundo González, e acusou o governo de Joe Biden de ser "cúmplice" dos setores da oposição que convocaram protestos violentos em rejeição aos resultados das eleições de 28 de julho.

"A violência ou bravata do [subsecretário de Estado dos EUA para Assuntos do Hemisfério Ocidental, Brian] Nichols é produto das transações realizadas em Miami. Ele é cúmplice da gangue criminosa que tentou incendiar o país após perder as eleições, agora faz birra quando a Justiça atinge os organizadores da violência e ao desconhecimento dos poderes públicos", disse o ministro das Relações Exteriores da Venezuela, Yván Gil, em seu canal oficial do Telegram.

O comentário tecido pelo ministro fez referência a uma mensagem do subsecretário norte-americano sobre a ordem judicial contra González.

"Em vez de reconhecer a sua derrota eleitoral e se preparar para uma transição pacífica na Venezuela, [Nicolás] Maduro ordenou agora a prisão do líder democrático que o derrotou esmagadoramente nas urnas", disse Nichols na oportunidade.

Segundo o subsecretário norte-americano, "Edmundo González promoveu a reconciliação nacional e nos juntamos à crescente lista de parceiros internacionais que condenam esta ordem de prisão".

Gil, por sua vez, apelou aos EUA para que "se dediquem aos seus problemas, que já têm o suficiente" e respeitem a Venezuela e sua soberania. "Continuaremos a avançar, apesar do seu ódio e das pretensões neocoloniais", concluiu.

Um tribunal venezuelano com jurisdição sobre crimes associados ao terrorismo concordou na segunda-feira (2) em prender González pela suposta prática de vários crimes.

A ordem foi emitida depois que González não cumpriu as três intimações emitidas pelo Ministério Público para testemunhar perante o órgão no âmbito da investigação que está sendo realizada contra ele.

No dia 1º de agosto, o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) admitiu o recurso eleitoral interposto pelo presidente Nicolás Maduro e iniciou uma investigação sobre as eleições, para a qual convocou os dez candidatos que participaram do pleito.

Já no dia 22 de agosto, a Suprema Corte garantiu que, por meio do processo de perícia, foi concluído que os boletins emitidos pelo Conselho Nacional Eleitoral (CNE) "mantêm plena coincidência com os registros das bases de dados dos centros nacionais de totalização".

Segundo o CNE, Maduro obteve 51,95% dos votos, enquanto Edmundo González, seu adversário mais próximo, alcançou 43,18% dos votos.

Entretanto, a oposição não reconhece os resultados e afirma que o seu candidato foi o vencedor.

¨      Venezuela agradece à Rússia por condenar a apreensão do avião de Maduro

A Venezuela agradeceu à Rússia pela firme condenação da apreensão do avião presidencial pelos Estados Unidos, depois de considerar que se trata de uma ação "neocolonial" das autoridades norte-americanas.

"Em nome do presidente Nicolás Maduro, agradecemos a Maria Zakharova, representante oficial do Ministério das Relações Exteriores da Rússia, por sua firme condenação da recente ação neocolonial dos Estados Unidos, que sequestrou o avião presidencial venezuelano", expressou o ministro das Relações Exteriores venezuelano, Yván Gil, na terça-feira (3), em sua conta na rede social X.

Zakharova destacou que os EUA demonstraram "um total desrespeito pelas normas jurídicas internacionais", e que ação demonstra que Washington entende que pode "dispor da propriedade soberana de outro Estado".

Na segunda-feira (2), o Departamento de Justiça dos EUA confirmou a apreensão da aeronave e informou que o procedimento foi realizado com base em violações de sanções e leis de controle de exportação.

A Venezuela descreveu o confisco do avião como um ato de "pirataria" e acusou Washington de usar o seu poder econômico e militar para "assustar e pressionar" países como a República Dominicana "para servirem como cúmplices nos seus atos criminosos".

Além disso, alertou que se reserva o direito de tomar qualquer ação judicial para reparar esse dano contra a nação sul-americana.

A Venezuela considerou que a medida faz parte de uma escalada de ações contra o Governo reeleito em 28 de julho.

 

¨      Presidenta de Honduras volta a denunciar tentativa de intervenção dos EUA: 'novo golpe de Estado'

A presidenta de Honduras, Xiomara Castro, voltou a denunciar na terça-feira (3) o que chamou de um "golpe de Estado" em andamento contra seu governo após a decisão de cancelar o tratado de extradição com os Estados Unidos.
"Ratifico que a paz e a segurança interna da República estão em risco [...] por um novo golpe de Estado que o povo deve deter", disse Xiomara em rede nacional de rádio e televisão. Xiomara encerrou o tratado com os Estados Unidos há seis dias, argumentando que buscava evitar que Washington o utilizasse contra militares hondurenhos e facilitasse uma tentativa de golpe de Estado.

No dia 30 de agosto, o chanceler hondurenho, Enrique Reina, afirmou que fontes da inteligência do país detectaram um plano articulado pela embaixadora dos Estados Unidos em Honduras, Laura Dogu, para supostamente dividir as Forças Armadas e destituir o chefe militar Roosevelt Hernández.

Ainda segundo o governo de Honduras, o plano estaria ligado a declarações dadas pela diplomata dos EUA após autoridades hondurenhas terem se reunido com o ministro da Defesa da Venezuela, Vladimir Padrino López.

A oposição hondurenha, por sua vez, acusa Castro de cancelar o tratado para proteger membros de seu governo e de sua família.

No sábado, renunciaram um cunhado e um sobrinho da presidenta: o secretário do Congresso, deputado Carlos Zelaya, após admitir perante o Ministério Público que se reuniu com narcotraficantes em 2013, e seu filho, o ministro da Defesa, José Manuel Zelaya. Nesta terça-feira, o portal especializado InSight Crime publicou um vídeo dessa reunião.

"Em relação ao vídeo [...] condeno qualquer tipo de negociação entre narcotraficantes e políticos", afirmou a presidenta em sua mensagem ao país na terça-feira. "O plano para destruir meu governo socialista, democrático, e o próximo processo eleitoral estão em andamento", acrescentou.

Entenda o caso

O acordo era considerado pelos EUA e antigos governantes hondurenhos uma ferramenta para desmantelar o "narco-Estado" que, segundo a Justiça estadunidense, foi criado em Honduras sob o governo anterior de Juan Orlando Hernández (2014-2022). O próprio ex-presidente de direita foi extraditado em 2022, após deixar o poder, e condenado em junho, em Nova York, a 45 anos de prisão.

No entanto, autoridades do governo de Castro denunciaram que Washington estaria utilizando o acordo para desestabilizar o país, principalmente por conta de sua relação com a Venezuela. 

Após passar por um governo aliado aos Estados Unidos, Honduras retomou relações com Caracas a partir do governo atual de Castro. A reunião com o ministro da Defesa venezuelano, portanto, foi considerada normal por Honduras, mas como a autoridade venezuelana é sancionada e classificada sem provas como "narcotraficante" pelos EUA, o acordo serviria para acusar também as autoridades hondurenhas de cumplicidade.

O chefe da diplomacia hondurenha explicou a decisão de rompimento do tratado "para que a extradição não seja utilizada como arma político-eleitoral, contra a instituição e os funcionários do governo".

"Aqui pode estar neste momento sendo gestada uma tentativa de golpe de Estado" e o tratado de extradição "pode ser como [...] uma arma política nesse embate" contra o governo de Castro, disse Reina em um programa da emissora local Canal 5.

"Essas acusações que a embaixadora faz de praticamente ligar o ministro da Defesa [José Manuel Zelaya] e o chefe do Estado-Maior Conjunto [das Forças Armadas, general Roosevelt Hernández] com o narcotráfico, pode ser o passo de acusá-los para poder extraditá-los", acrescentou o chanceler.

O diplomata apelou ainda ao respeito pela autodeterminação dos povos, à soberania do Estado, ao princípio da não interferência em assuntos internos, e às decisões do governo hondurenho de manter relações com qualquer país do mundo, tal como estipulado na Carta das Nações Unidas.

 

Fonte: Deutsche Welle/Sputnik Brasil/AFP

 

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