segunda-feira, 2 de setembro de 2024

'A máscara caiu': Ocidente escancara protecionismo econômico para combater China, diz analista

Canadá segue EUA e impõe tarifas de até 100% contra veículos elétricos produzidos na China. Ao adotar o protecionismo econômico para conter o crescimento chinês, Ocidente revela falácia de seu discurso em favor do livre comércio, acredita analista ouvido pela Sputnik Brasil.

Nesta semana, o Canadá anunciou a imposição de tarifas de até 100% contra veículos elétricos produzidos na China, além de tarifas de 25% nas importações de alumínio. A medida foi classificada por Pequim de "protecionismo clássico" e abre mais um front na guerra comercial declarada pelo Ocidente contra o país asiático.

A medida canadense espelha a de seus vizinhos e aliados EUA, que quadruplicaram as tarifas impostas contra veículos elétricos chineses em maio deste ano, também atingindo a marca dos 100%. Os EUA ainda restringiram as importações de semicondutores, componentes para painéis de energia solar, baterias de lítio-íon e demais bens considerados estratégicos.

O Ministério do Comércio da China reagiu ao anúncio canadense, declarando que a medida vai contra as regras internacionais de comércio e afeta a "estabilidade das cadeias de suprimentos globais", conforme reportou a Reuters.

"O lado canadense afirma apoiar o livre comércio e o sistema de comércio multilateral com base nas regras da Organização Mundial do Comércio (OMC), mas viola flagrantemente as regras desta organização, segue cegamente determinados países e anuncia que adotará medidas tarifárias unilaterais, o que é protecionismo comercial típico", disse o porta-voz do ministério chinês.

O porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Lin Jian, se uniu ao coro, declarando que a competitividade dos veículos elétricos chineses é fruto de "de inovação tecnológica persistente, cadeias industriais e de suprimentos bem estabelecidas e adesão total à concorrência de mercado".

"Os subsídios não geram competitividade industrial, enquanto o protecionismo protege apenas o atraso. O desenvolvimento futuro será sacrificado", disse o porta-voz da chancelaria chinesa.

Uma das empresas que será mais afetada no curto prazo pelas tarifas canadenses é a norte-americana Tesla, que exportou mais de 35 mil unidades de veículos elétricos produzidos em Xangai para o Canadá em 2023, de acordo com o portal Automative News.

Nesta quinta-feira (29), a Tesla solicitou ao governo canadense que reconsidere as tarifas impostas, reportou a Reuters. As tarifas impostas contra a China pela União Europeia, por exemplo, garantem tratamento especial a ocidental Tesla. Enquanto empresas chinesas são alvo de tarifas que variam entre 17 e 36%, a Tesla arca com somente 9%, cenário que poderá se repetir no caso canadense.

Outras líderes chinesas de mercado, como a BYD, ainda não exportam quantidades significativas para o Canadá. Atualmente, os veículos elétricos chineses têm como principais mercados países do Sul Global, particularmente na região do Sudeste Asiático.

<><> Adeus ao liberalismo comercial?

A decisão canadense reflete a tendência de recrudescimento das relações geopolíticas globais, que refletem nos fluxos comerciais, acredita o professor de economia do Mackenzie, Milton Pignatari. Para o especialista, a atual proliferação de conflitos internacionais leva a uma cisão entre lados beligerantes opostos, que exercem sua rivalidade também na esfera comercial.

"No exemplo do Canadá, por questões políticas, geográficas e ideológicas, certamente é muito melhor manter um bom relacionamento com os EUA [do que com a China]", disse Pignatari à Sputnik Brasil. "Isso nos leva a acreditar que no atual momento econômico, existe sim uma alteração nos processos de liberalização comercial em curso, não em grande escala, mas sinalizando algumas tendências que podem vir a se confirmar futuramente, principalmente com o eventual desfecho dos conflitos."

A reemergência do protecionismo global e a consolidação das guerras comerciais poderão levar a uma estagnação da produção de riqueza e gerar uma crise econômica internacional, alerta o economista.

"Seguindo de maneira didática as regras de mercado, se tivermos menos oferta do que procura, certamente haverá um aumento dos preços. Com aumento dos preços, os países terão menos reservas, o que compromete a acumulação de riquezas. Isso fará que os investimentos tenham de ser repensados. Ao diminuir investimentos, sempre existe uma forte tendência a ocorrer uma diminuição da produtividade", explicou Pignatari.

O esforço de países ocidentais desenvolvidos em frear o crescimento chinês através da imposição de tarifas também poderá ter efeitos nocivos em suas próprias economias, diminuindo o acesso não só a bens industriais essenciais, mas também produtos alimentícios como arroz e milho. "Ou seja, frear o crescimento chinês poderia refletir em frear também outras diversas economias", acredita Pignatari.

Por outro lado, a China se prepara para o impacto das medidas ocidentais e já desvia suas exportações para mercados do Sul Global, menos propensos a adotar tarifas comerciais de cunho geopolítico, disse o mestre em história pela USP, residente em Pequim e especialista em assuntos relacionados a China, Marco Fernandes.

"Desde o final de 2022, a China passou a exportar mais para os países do Sul Global do que para países desenvolvidos, o que é, na minha opinião, mais um movimento tectônico da economia global", disse Fernandes à Sputnik Brasil. "Essa tendência se consolidou em 2023 e se encontra em plena aceleração, o que muda completamente o jogo."

A capacidade ocidental de frear o crescimento econômico da China através da imposição de tarifas comerciais também esbarra na pujança do mercado doméstico chinês, capaz de manter a demanda por produtos industriais produzidos internamente.

"A China tem outra carta na manga, que é o seu mercado interno. Podemos considerar que o país atualmente conta com uma classe média de cerca de 400 milhões de pessoas. O objetivo do governo é expandir esse número para 700 milhões em 2035, isto é, praticamente dobrar a capacidade", revelou Fernandes.

Segundo ele, essa estratégia econômica chinesa é denominada "circulação dual" e implica a diminuição da dependência de exportações para apostar no crescimento do consumo doméstico. "A China já previa problemas de ordem geopolítica e formulou esse conceito, que atende a demandas internas pelo aumento da prosperidade", diz o analista.

Trabalhador chinês de uma das maiores empresas de petróleo da China, a Sinopec, manuseia mangueiras após entregar gasolina em um posto em Pequim, China - Sputnik Brasil, 1920, 30.08.2024

Trabalhador chinês de uma das maiores empresas de petróleo da China, a Sinopec, manuseia mangueiras após entregar gasolina em um posto em Pequim, China

© AP Photo / Ng Han Guan

Por outro lado, o analista nota que o protecionismo dos países desenvolvidos não é uma novidade e sempre foi acionado para proteger setores econômicos menos competitivos de EUA e Europa, como o setor agrícola.

"O Brasil é alvo de protecionismo europeu a décadas, basta atentarmos para as negociações do acordo Mercosul-União Europeia, que nunca foi concluído", lembrou Fernandes. "O discurso liberal do livre comércio capitaneado pelos países desenvolvidos, enquanto mantinham a hegemonia absoluta do mercado mundial, era hipócrita e voltado para convencer as classes dominantes do Sul Global a abrirem seus mercados internos. Agora vemos que a máscara caiu."

A liberalização dos mercados do Sul Global levou a processos deletérios, como a desindustrialização de países-chave como África do Sul e Brasil, "que era uma potência industrial décadas atrás, e hoje se resume a ser uma grande fazenda ou uma grande mina". Neste novo momento geopolítico, o Brasil também poderá se reposicionar e fazer novas escolhas para reforçar o seu parque industrial doméstico, concluiu o analista.

¨      Governo dos EUA 'ajudou' a China a obter mil patentes entre 2010 e 2024, diz mídia

O Escritório de Patentes e Marcas Registradas do país norte-americano comunicou dados que mostram uma cooperação significativa com a China desde 2010, escreve a Reuters.

O Pentágono, a NASA e outras agências governamentais dos EUA financiaram pesquisas que resultaram em mais de 1.000 patentes americanas para inventores baseados na China desde 2010, inclusive em áreas sensíveis como biotecnologia e semicondutores, revela uma pesquisa da agência britânica Reuters publicada na quinta-feira (29).

Ela citou dados do Escritório de Patentes e Marcas Registradas dos EUA, que forneceu os dados este mês ao Comitê Seleto Sobre a China da Câmara dos Representantes do país norte-americano.

De acordo com o escritório, a agência concedeu 1.020 patentes de 2010 até o primeiro trimestre de 2024 que foram financiadas, pelo menos em parte, pelo governo dos EUA e envolveram pelo menos um inventor residente na China. No entanto, os dados não detalham se entidades ou indivíduos dos EUA compartilham as patentes.

Um total de 197 patentes diz respeito a produtos farmacêuticos e 154 a biotecnologia, ambos setores estratégicos para a China e os Estados Unidos.

"É alarmante que os contribuintes americanos tenham financiado involuntariamente mais de 1.000 patentes reivindicadas por entidades chinesas, sendo o Departamento de Defesa responsável por quase 100 dessas patentes", disse John Moolenaar, presidente do Comitê Seleto Sobre a China, em um e-mail à Reuters.

Segundo a mídia, os dados de patentes dos EUA serão mais um argumento para os pedidos de cancelar ou renegociar o histórico Acordo de Ciência e Tecnologia EUA-China, um acordo de cooperação de décadas.

 

¨      Do caos à reconstrução: como o Timor-Leste garantiu a sua independência após intervenção?

Nesta sexta-feira (30), são comemorados os 25 anos da primeira consulta popular pela independência do Timor-Leste, que deu força ao longo processo emancipatório do país — tendo a sua independência da Indonésia vingada em 2002.

Colonizado pelo Império Português, o então Timor Português conseguiu se emancipar de sua antiga metrópole em 1975. Mas, no mesmo ano, foi ocupado pela vizinha Indonésia.

Para entender melhor esse movimento, o podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, conversou com figuras que participaram de parte desse processo.

O coronel Maurício de Araújo, veterano das missões de paz da Organização das Nações Unidas (ONU), que atuou no país em duas ocasiões distintas – em 2002-2003 e novamente em 2011-2012 –, compartilhou a visão sobre a transformação do Timor-Leste desde o início da intervenção internacional até sua reconstrução e independência.

<><> País em ruínas

"Um país em situação de conflito, como é o caso da grande maioria dos países em que a gente atua em missões de paz das Nações Unidas, eles são países cuja infraestrutura é praticamente inexistente ou muito deficiente" relatou o coronel Araújo. Ele descreveu a situação inicial do país logo após a transferência de administração das Nações Unidas para o governo local.

"Basicamente as estradas estavam sendo refeitas, principalmente na capital, que havia um investimento maior em termos de reconstrução, mas é um país completamente quebrado em vários aspectos. Falando um pouco do tecido social, você tinha a falta de uma faixa da população que foi para a guerra, foi para o conflito e ofereceu a resistência," detalhou, referindo-se à devastação pós-conflito e ao colapso das instituições.

A situação que o coronel encontrou era marcada pela escassez de recursos e pela ausência de estruturas básicas.

"Um país cuja infraestrutura estava sendo completamente renovada e com uma camada social, uma população que estava querendo começar a se renovar e a se reconstruir após esse período todo." recordou ele. A reconstrução da infraestrutura era apenas o início de um longo processo de recuperação.

Segundo ele, naquela época, a língua predominante era o bahasa indonésia, com apenas uma camada mais velha da população falando português.

"Havia uma falta de uma faixa populacional, principalmente de homens, entre os 15 e os 50 anos. [....] A língua portuguesa ajudava muito porque a população passava a se sentir bem acolhida", explicou o coronel sobre a importância do idioma na interação com a população local.

<><>  da ONU e desafios

Sobre o impacto da ONU no Timor-Leste, o militar afirmou: "Foi extremamente importante, é considerado um caso de sucesso na ONU". Ele evidenciou a transformação do país desde a chegada das tropas das Nações Unidas até o fim da missão, em 2012.

"Nós conseguimos participar do encerramento da missão em 2012, que foi quando o país passou a andar realmente com as próprias pernas e sem a presença maciça de tropas e de todo o aparato das Nações Unidas naquele lugar", disse.

O coronel destacou o papel crucial da ONU na reforma das instituições e na melhoria das condições de vida, mencionando que o Timor-Leste se tornou um país com um "estrutura muito melhor" e uma economia em crescimento.

Ao retornar ao Timor-Leste em 2011, o Coronel notou significativas melhorias. Ele mencionou a infraestrutura aprimorada, o surgimento de um shopping center e o desenvolvimento da polícia local.

"A evolução foi visual, de chegar no país e perceber já as mudanças. [...] A polícia muito melhor preparada... A gente passou as funções da Polícia da ONU para a Polícia Local", contou, destacando a capacidade da polícia local em realizar suas funções de forma profissional.

Sobre as relações do Timor-Leste com seus antigos colonizadores e invasores, o coronel observou que, apesar do passado difícil, "não há rancor". Ele ressaltou que a Indonésia e o Timor-Leste mantêm um "relacionamento bom, inclusive comercial," e que o país tem avançado com o apoio de potências asiáticas como China e Singapura.

<><> Histórico

Em uma análise detalhada, o período de ocupação indonésia do Timor Leste (1975-1999) destaca-se pela sua brutalidade, segundo uma especialista ouvida pela Sputnik Brasil.

"Foram processos muito diferentes porque particularmente o período indonésio foi o mais violento, gerou mais de 100 mil mortos", afirma Silvia Garcia, jornalista, antropóloga e professora de relações internacionais da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB).

A violência sistemática durante esse período deixou marcas profundas, e o impacto persistiu mesmo após a desocupação, influenciando a formação de milícias e o trabalho da ONU na região até 2012, pontuou.

Xanana Gusmão, uma figura central na história recente do Timor Leste, é amplamente reconhecido por seu papel crucial tanto na resistência à ocupação indonésia quanto na construção do novo Estado timorense.

"Ele é considerado um dos heróis da resistência e depois pelos cargos que ocupou, inclusive, hoje, o [de] primeiro-ministro do Timor Leste", destaca Garcia.

Gusmão também participou ativamente de negociações geopolíticas, como a delimitação do mar de Timor, uma área estratégica devido às suas reservas de petróleo e gás.

Desde a restauração de sua independência em 2002, o Timor Leste tem avançado na construção de um Estado estável. No entanto, a estabilidade política interna ainda enfrenta desafios. "Há uma estabilidade política do ponto de vista da sua relação com outros países, mas, internamente, o país ainda lida com disputas por poder e por projetos de nação que são muito distintos atualmente", analisa a professora Garcia.

O interesse pelo Timor Leste não é meramente acadêmico, assuntou. A conexão pessoal de Garcia com a nação, nascida de uma experiência acadêmica e de relações pessoais, ressalta a complexidade das relações internacionais e a profundidade do envolvimento brasileiro com o país.

A cooperação bilateral entre a Universidade Estadual da Paraíba e o Fundo Nacional de Desenvolvimento do Capital Humano do Timor Leste exemplifica o engajamento contínuo do Brasil com a nação timorense.

¨      Taiwan provoca China em relatório militar e diz que Pequim 'não tem capacidade' para entrar na ilha

Em uma avaliação anual de ameaças enviada aos legisladores taiwaneses nesta sexta-feira (30) o Ministério da Defesa de Taiwan disse que Pequim continua aprimorando habilidades como operações de comando conjunto.

Mas sublinhou que a China não tem capacidade para invadir a ilha "totalmente", uma vez que não possui o equipamento necessário, disse o documento visto pela Reuters.

A China "ainda não possui totalmente as capacidades formais de combate para uma invasão abrangente de Taiwan [...]. No entanto, o uso de táticas e estratégias contra Taiwan ainda é limitado pelo ambiente geográfico natural do estreito de Taiwan e pela insuficiência de equipamentos de desembarque e capacidades logísticas", afirmou o relatório.

O documento também ressalta que Pequim tem outras opções para ameaçar Taipé, como inspecionar navios de carga estrangeiros, ao mesmo tempo que sinalizou a aceleração e o desenvolvimento de uma série de novas armas chinesas, como o bombardeiro H-20 e mísseis hipersônicos, e aumentando o número de ogivas nucleares, enquanto testa novas táticas.

O Ministério da Defesa da China não respondeu imediatamente a um pedido de comentário, mas em uma coletiva de imprensa na quinta-feira (29), o porta-voz da Defesa, Wu Qian, disse que "quanto mais eles [Taiwan] provocam, mais rápido eles perecem".

Pequim vê Taiwan como uma província renegada que pertence por direito à China no âmbito da política de Uma Só China. A ilha autogovernada não declarou formalmente sua independência, mas afirma já ser, mantendo laços próximos a países ocidentais, principalmente os Estados Unidos.

 

Fonte: Sputnik Brasil

 

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