Quem é André
Ventura, líder da extrema direita em Portugal que convocou manifestação contra
Lula
"Lula
da Silva deve ser condenado por sua proximidade com a Rússia e pela
incapacidade de ver o sofrimento do povo ucraniano, contrário à diplomacia que
Portugal tem feito e bem, no âmbito europeu, pela sua proximidade à China, pela
sua hesitação em condenar as ditaduras sul-americanas que tanta dor, pobreza e
sofrimento têm causado, mas sobretudo e acima de tudo, pelo nível de corrupção
que representa."
É
assim que o deputado André Ventura, líder do partido de extrema-direita
português Chega, descreveu o presidente brasileiro, às vésperas de sua visita a
Portugal, em vídeo enviado nesta semana à imprensa do país.
Ele
acrescenta: "Lula é, na nossa perspectiva e na perspectiva de qualquer
cidadão de centro-direita ou de direita, o pior que a política
representa".
Fundado
em abril de 2019 por Ventura, o Chega, que se define como um partido
"conservador, liberal e nacionalista", tem no discurso anti-imigrante
um de seus principais alicerces e é hoje a terceira maior força na Assembleia
da República (Parlamento português), com 12 deputados.
A
sigla organizou um protesto contra Lula no próximo dia 25 em frente ao local.
"Lugar
de ladrão é na prisão", diz a chamada para a manifestação, que faz
referência à prisão de Lula em 7 de abril de 2018 - as condenaões contra o
presidente foram posteriormente anuladas.
A
convocação do ato foi compartilhada pelo deputado federal Eduardo Bolsonaro
(PL-SP), que descreveu a manifestação como "justa". O perfil do
Chega! no Twitter respondeu ao post do parlamentar dizendo que "Lula, não
é bem-vindo em Portugal!".
Em
13 de janeiro deste ano, em sessão no Parlamento português, Ventura chamou Lula
de "bandido".
Na
ocasião, o presidente da Assembleia da República, Augusto Santos Silva (Partido
Socialista), rebateu Ventura e afirmou se tratar de "uma expressão
ofensiva em relação ao presidente de um país muito amigo de Portugal".
O
líder do Chega replicou e disse ser "difícil se referir ao presidente do
Brasil de outra forma".
Ventura
apoiou publicamente a reeleição do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) no ano
passado. Em sua manifestação de apoio, ele disse que o capitão reformado era a
"escolha certa" para o Brasil.
No
mês que vem, em maio, Ventura deve receber Bolsonaro e o vice-primeiro-ministro
da Itália, Matteo Salvini, entre outros nomes da direita em Lisboa para uma
cúpula mundial organizada pelo Chega.
O
objetivo, segundo Ventura, é transformar Portugal num dos centros mundiais da
ultradireita contra o socialismo.
"A
presença de Jair Bolsonaro, de Matteo Salvini e de muitos outros dirigentes da
direita europeia marca Lisboa como um dos novos centros da direita mais forte
da Europa e uma das referências mundiais da luta contra o socialismo",
disse Ventura em outro vídeo compartilhado em suas redes sociais.
"Vamos
criar um evento com o objetivo ambicioso de ser um polo, uma alternativa à
Conferência Conservadora que ocorre todos os anos nos EUA", acrescentou.
·
Discurso anti-imigrante
Quando
pequeno, Ventura estudou em um seminário e queria tornar-se padre. Mas mudou de
ideia. Formou-se em Direito, trabalhou na Autoridade Tributária (órgão
equivalente à Receita Federal) e lecionou em duas das principais universidades
de Lisboa. Também foi comentarista esportivo.
Atualmente,
aos 40 anos, exerce mandato como deputado pelo Chega. Foi eleito pela primeira
vez em 2019. Tentou se candidatar à Presidência de Portugal em 2021, sem
sucesso, ficando em terceiro lugar.
Por
outro lado, numa demonstração clara de seu prestígio e do crescimento da
extrema-direita no país, o Chega passou de partido de deputado único para a
terceira maior força política nacional, elegendo 12 deputados nas eleições
legislativas de janeiro de 2022.
Definindo-se
como "liberal a nível econômico, nacionalista e conservador", Ventura
ganhou fama por declarações consideradas machistas, anticiganistas,
islamofóbicas e xenofóbicas.
Ventura
critica o que chama de "migração sem controle" na Europa e defende um
continente "de matriz cultural e cristã e de identidade, contra a
imigração descontrolada".
Quando
se elegeu, em 2019, Ventura postou no Twitter: "Por que razão cresce o
Chega nas sondagens e na rua? Porque já não é só a voz individual, os nossos
desejos e as nossas ambições. O Chega é a voz de um povo inteiro farto de
corrupção e de impunidade."
Entre
suas propostas, estão a castração química ou física a condenados por crimes de
violação ou abuso sexual de menores; a prisão perpétua; e a duplicação das
penas por corrupção e proibição de exercício de cargo público durante dez anos,
além de agravamento de penas para crimes como violação, homicídio, terrorismo e
tráfico de pessoas.
"Não
me parece justo que alguém que mata várias pessoas de forma aleatória, fria e
por motivos fúteis possa estar cá fora ao fim de 12 anos. (...) Defendo a
obrigatoriedade de trabalho para os reclusos. Quem está na prisão é porque
cometeu um crime de forma voluntária então não é justo que também ele contribua
para aquilo que estamos nós todos a contribuir? Alguns chamam a isto trabalhos
forçados, querem chamar-lhe isso, força. Não me importo", disse ele em
entrevista ao site Notícias ao Minuto em 2018.
"Apesar
de serem ambos crimes gravíssimos, não posso equiparar quem mata duas pessoas e
quem abusa sexualmente de duas pessoas. Mas o perigo para a sociedade é muito
grande e aquele tratamento químico garante que não haverá reincidência dos
ímpetos sexuais para voltar a atacar", acrescentou.
Seu
discurso anti-imigrante foca nos ciganos e nos muçulmanos, mas poupa os
brasileiros, maior comunidade de estrangeiros em Portugal atualmente, com 252
mil em situação regular, segundo os dados mais recentes do SEF (Serviço de
Estrangeiros e Fronteiras).
Em
2017, Ventura disse que Portugal tinha "excessiva tolerância com alguns
grupos e minorias étnicas".
"Não
compreendo que haja pessoas à espera de reabilitação nas suas habitações,
quando algumas famílias, por serem de etnia cigana, têm sempre a casa
arranjada. Já para não falar que ocupam espaços ilegalmente e ninguém faz nada.
Quem tem de trabalhar todos os dias para pagar as contas no final do mês olha
para isto com enorme perplexidade. Isto não é racismo nem xenofobia, é resolver
um problema que existe porque há minorias no nosso país que acham que estão acima
da lei", afirmou ele, em entrevista ao site Notícias ao Minuto.
Sobre
os muçulmanos, Ventura postou em 2019 em sua conta no Twitter: "Quantos
paquistaneses vão ter de cortar a cabeça a mais mulheres para percebermos o
real perigo que esta vaga (onda) islâmica significa para a Europa?"
Em
fevereiro deste ano, ele admitiu que, para o Chega, nem todos os imigrantes são
bem-vindos a Portugal.
"A
esquerda quer um país de completas portas abertas, a esquerda tem de querer um
país em que haja imigração, ate porque muitos dos nossos setores necessitam de
imigração, para trabalhar e para construir economia, mas não pode ser uma
imigração em que a nacionalide é completamente vendida e a porta é
completamente aberta."
·
'Bolsoluso'
Apelidado
de "Bolsoluso" ou "Bolsonaro português", por seu
alinhamento ideológico com o ex-presidente brasileiro, Ventura criticou, no
entanto, os atos antidemocráticos no Brasil em janeiro deste ano.
Na
sessão no Parlamento português em chamou Lula de "ladrão" o líder do
Chega condenou "os ataques às instituições e a violência" de 8 de
janeiro, quando milhares de apoiadores de Bolsonaro invadiram as sedes dos três
poderes em Brasília.
Ventura
tampouco exalta a ditadura militar portuguesa, diferentemente do ex-presidente
brasileiro.
Sobre
António Salazar, ditador português durante o regime de Estado Novo, ele disse
que "a República liderada pelo Dr. António de Oliveira Salazar, a maior
parte do tempo, também não resolveu [os problemas do país] e atrasou-nos
muitíssimo em vários aspetos. Não nos permitiu ter o desenvolvimento que
poderíamos ter tido, sobretudo no quadro do pós-II Guerra Mundial. Portugal
poder-se-ia ter desenvolvido extraordinariamente e ficamos para trás, assim
como os espanhóis".
Apesar
disso, em discurso de encerramento em um congresso do Chega em novembro de
2021, Ventura apropriou-se do lema de Salazar, "Deus, pátria e
família", acrescentando-lhe a palavra "trabalho", para resumir
os valores em que o partido acredita.
A
popularidade de Ventura reflete o crescimento da extrema-direita em Portugal.
Segundo
um levantamento recente realizado pelo Instituto Intercampus para um grupo de
jornais portugueses, as intenções de votos no partido de ultradireita saltaram
de 7,2%, há um ano, para 13,5%.
Fonte:
BBC News Brasil
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