segunda-feira, 3 de abril de 2023

A conturbada vida de João Cândido, líder da Revolta da Chibata preso, expulso da Marinha e internado como louco

Até hoje, quase 110 anos depois, não se sabe ao certo o que levou o comandante do Minas Gerais, João Batista das Neves, a ordenar que o marinheiro Marcelino Rodrigues Menezes levasse 250 chibatadas: a suspeita de ter embarcado, às escondidas, com duas garrafas de cachaça; a acusação de ter agredido um cabo com uma navalha; ou um pouco dos dois.

Em 1910, faltas leves eram punidas pelos oficiais da Marinha com a prisão em solitária, a pão e água, por um período de três a seis dias. Já as ofensas mais graves, como desrespeito à hierarquia, recebiam como castigo 25 chibatadas, na frente de toda a tripulação e ao som do rufar de tambores.

O fato é que, no dia 21 de novembro daquele ano, a sentença imposta a Marcelino, amarrado a um mastro do convés e nu da cintura para cima, revoltou um grupo de marinheiros negros que, cansado de sofrer castigos físicos de seus oficiais brancos, resolveu organizar um motim.

No dia seguinte, às 22h, o clarim não pediu silêncio. Chamou para o combate. Sob a liderança de João Cândido, 2.379 marinheiros — em sua maioria, negros e pardos — assumiram o comando de quatro navios de guerra — Minas Gerais, São Paulo, Bahia e Deodoro —, que estavam ancorados na Baía de Guanabara.

Aos gritos de "Viva a liberdade!" e "Abaixo a chibata!", a marujada içou bandeiras vermelhas de insurreição, apontou 80 canhões na direção do Rio de Janeiro e ameaçou bombardear a então capital da República, caso suas exigências não fossem cumpridas: melhores salários, anistia aos revoltosos e, principalmente, o fim dos castigos.

Por essa razão, o motim, que durou apenas cinco dias, de 22 a 27 de novembro, entrou para a História como a Revolta da Chibata. "Não podíamos admitir que, na Marinha do Brasil, um homem ainda tirasse a camisa para ser chibatado por outro homem", declarou João Cândido, em depoimento ao Museu da Imagem e do Som (MIS) do Rio, em março de 1968.

·         Chibata, nunca mais!

Um tiro de canhão, de advertência, chegou a ser disparado. Atingiu um cortiço e matou duas crianças. Enquanto parte da população fugia apavorada, a outra parte, curiosa, corria para o cais, para assistir ao vaivém dos navios.

Pressionado por políticos da oposição, o recém-empossado presidente da República, o marechal Hermes da Fonseca, aceitou as condições e pôs fim à rebelião.

"João Cândido e os outros marujos, até então anônimos e subalternos, viraram notícia e obrigaram os poderosos a ceder. Durante cinco dias, a capital do Brasil esteve sob sua posse e, na medida em que conquistaram seu principal objetivo, que era o fim dos castigos corporais, saíram vitoriosos", afirma o historiador Marco Morel, professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), organizador do livro A Revolta da Chibata (2016), escrito pelo seu avô, Edmar Morel, e autor do livro João Cândido - A Luta pelos Direitos Humanos (2008).

Apontado como o líder do movimento, João Cândido passou a conceder entrevistas para os principais jornais da época. "As carnes de um servidor da pátria só serão cortadas pelas armas dos inimigos, mas nunca pela chibata de seus irmãos. A chibata avilta", declarou, em 1910, ao jornal Correio da Manhã.

A trégua, porém, durou pouco. Já no dia seguinte, logo que os rebelados começaram a desembarcar, Hermes da Fonseca voltou atrás. E, por decreto, começou a perseguir todos os que participaram do levante.

"Fisicamente, João Cândido era um gigante, mas nunca abusou de sua superioridade física. Hábil no uso das palavras, sempre cumpria o que prometera, ao contrário do presidente que, logo que recuperou os navios, traiu os compromissos assumidos", afirma o escritor Alcy Cheuiche, autor do livro João Cândido, o Almirante Negro (2010).

·         Memórias do cárcere

Dos 2.379 marujos revoltosos, 1.216 foram expulsos da Marinha. Outros 600 foram presos e 105 obrigados a embarcar nos porões do navio Satélite, rumo à Amazônia, para trabalhos forçados na produção da borracha. Catorze deles nunca chegaram ao destino. Foram fuzilados durante a viagem e tiveram seus corpos jogados ao mar.

"A revolta de 1910 teve o mais infame dos desfechos", escreveu o jornalista Oswald de Andrade, em Um Homem Sem Profissão - Sob as Ordens de Mamãe (1958).

João Cândido foi preso, interrogado e, às vésperas do Natal de 1910, levado para a Fortaleza de São José, na Ilha das Cobras (RJ), onde ficava o Batalhão Naval.

Em um calabouço onde só cabiam seis prisioneiros, dividiu a solitária com 17 companheiros. Ali, os marujos ficaram por três dias, sem ter o que comer ou beber e debaixo de um sol escaldante. Sob o pretexto de desinfetar a cela, imunda de fezes e urina, os carcereiros jogaram cal lá dentro. Apenas dois dos 18 encarcerados sobreviveram: João Cândido e João Avelino Lira, de 26 anos. Os demais morreram de fome ou de asfixia.

A odisséia de João Cândido não terminou ali. Em abril de 1911, foi mandado para o Hospital Nacional dos Alienados, onde permaneceu por dois meses. Logo, o diretor da instituição, Juliano Moreira, atestou que, de louco, João não tinha nada. Liberado, voltou à prisão, onde sobreviveu a uma tentativa de assassinato.

Um ano e meio depois, no dia 29 de novembro de 1912, foi levado a julgamento. Apesar de absolvido das acusações, foi expulso da Marinha. O apelido de "Almirante Negro" quem lhe deu foi o escritor João do Rio, que trabalhava no jornal Gazeta de Notícias.

·         Um líder nato

Filho de escravos, João Cândido Felisberto nasceu no dia 24 de junho de 1880, em uma fazenda em Encruzilhada do Sul (RS), a 170 km de Porto Alegre. Aos 14 anos, ingressou na Marinha, como grumete (recruta). Como marinheiro, João Cândido navegou por três continentes — Europa, América e África — e aprendeu a operar quase todos os instrumentos a bordo, do leme ao canhão.

"De origem muito pobre, João Cândido não estudou. Mas tinha uma sabedoria e um espírito de liderança que permitiram que se destacasse na Marinha. Aprendia tudo de olhar", afirma o jornalista Fernando Granato, autor dos livros O Negro da Chibata (2000) e João Cândido (2010), da coleção Retratos do Brasil Negro.

Entre outras expedições, João Cândido participou da missão que, em 1903, disputou com a Bolívia o território do Acre. À época, contraiu tuberculose e chegou a ficar internado por três meses no Rio. Recuperado, foi mandado para a Inglaterra, em julho de 1909, para aprender a operar o encouraçado Minas Gerais, de fabricação britânica.

Ao voltar da Europa, depois de conversar com marujos ingleses, os mais politizados do mundo, tentou negociar o fim da chibata com o então presidente Nilo Peçanha. Não teve sucesso.

·         'Velhos amigos'

Ao sair da prisão, em 30 de dezembro de 1912, João Cândido passou a fazer biscates e a vender peixes para sobreviver. Durante muitos anos, saía de casa à noitinha e só voltava na manhã seguinte.

Foi carregando cestos de peixe na Praça 15 que, em 1937, anônimo e pobre aos 57 anos, conheceu o jornalista Edmar Morel, então repórter do jornal O Globo, que decidiu escrever sua biografia, A Revolta da Chibata (1959).

"O livro ressuscitou João Cândido, que voltou a ser notícia meio século depois de seu feito nas águas da baía da Guanabara. Quando João Cândido faleceu, meu avô foi um dos que carregou seu caixão, sob forte temporal e cercado de policiais. Mais que amigos, tornaram-se parceiros, cúmplices e solidários", afirma Morel.

Em março de 1953, quando soube que o Minas Gerais seria vendido como sucata para a Itália, João Cândido subiu em seu modesto caiaque, o Três Marias, e remou até o ancoradouro. Lá, deu um longo beijo de despedida no seu casco enferrujado.

João Cândido se casou três vezes, com Marieta, Maria Dolores e Ana, e teve 11 filhos. Viveu seus últimos anos de vida em São João de Meriti, na Baixada Fluminense, numa rua sem asfalto, luz elétrica ou água encanada.

"Embora nunca tenha sido castigado na Marinha, meu pai não aceitava que os companheiros fossem torturados. Não foi um ato de heroísmo o que ele fez. Foi um ato de humanidade", relata o filho Adalberto Cândido, o Candinho, de 81 anos.

"A maior lição que meu pai deixou foi não abaixar a cabeça para ninguém. E assumir as consequências do que faz", acrescentou.

No dia 6 de dezembro de 1969, João Cândido, então com 89 anos, deu entrada no Hospital Getúlio Vargas, no Rio, onde morreu dois dias depois, de câncer no intestino. No dia do enterro, um grupo de policiais, à paisana, compareceu ao cemitério do Caju para fotografar quem estava lá.

"Quando morreu, em 1969, João Cândido ainda inspirava medo nas autoridades. Passados 50 anos, não teve o reconhecimento merecido. Embora signifique um marco histórico de ruptura contra um sistema racista e opressor, a Revolta da Chibata é praticamente desconhecida para a maioria dos brasileiros", afirma Granato.

·         'O dragão do mar'

João Cândido não foi o único a ser perseguido. Todos aqueles que, de alguma maneira, prestaram homenagens ao Almirante Negro tiveram que arcar com as consequências.

O humorista Apparício Torelly, o Barão de Itararé, foi um deles. Em outubro de 1934, decidiu transformar a vida de João Cândido em folhetim, A Insurreição dos Marinheiros de 1910, e publicá-la em série no jornal Folha do Povo.

Por volta do 10º capítulo, foi sequestrado e espancado por homens encapuzados. Debochado, passou a pendurar na porta de sua sala na redação do jornal uma placa onde se lia: "Entre sem bater".

O compositor Aldir Blanc passou por perrengue parecido. Em 1970, ele e o parceiro, João Bosco, compuseram a música O Mestre-Sala dos Mares, sucesso na voz de Elis Regina. Os censores implicaram com a letra e levaram Aldir para depor no antigo Palácio do Catete, hoje Museu da República.

"Lá, um policial negro sempre arranjava um jeito de parar bem perto de mim: eu, sentado, e ele, de pé, com o coldre da arma quase encostado em meu nariz", recorda o compositor.

Aldir Blanc fez o impossível para a censura liberar a música: "marinheiro" virou "feiticeiro", "negros" cedeu lugar para "santos" e "almirante" foi substituído por "navegante".

"O samba só passou por um truque: um funcionário da então gravadora RCA ensinou que, se mudássemos radicalmente o título, eles não leriam a letra e ela passaria com algumas pequenas alterações, bem doidas. Bolamos, então, 'Mestre-Sala dos Mares' e, como não tinha a palavra negro no título, metemos a bola entre as canetas da censura", gaba-se o compositor.

·         Turmalina 18-50

De lá para cá, o Almirante Negro já inspirou samba-enredo da União da Ilha, ganhou estátua na Praça 15, recebeu anistia póstuma do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e, desde o mês passado, é reconhecido como herói do Estado do Rio de Janeiro.

"Por mais que tentassem derrubar sua história, João Cândido foi sempre lembrado e festejado como o líder de centenas de marinheiros negros que deram um basta aos desumanos castigos corporais", afirma o historiador Álvaro Pereira Nascimento, professor da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) e autor do livro Cidadania, Cor e Disciplina na Revolta dos Marinheiros de 1910 (2008).

"Ainda faltam mais biografias e, também, a reparação financeira à família de João Cândido e às dos demais marinheiros. Não receberam um centavo após serem ilegalmente perseguidos e expulsos da Marinha de Guerra entre 1910 e 1912".

A mais recente homenagem a João Cândido partiu do dramaturgo Vinícius Baião. Ele é autor e diretor do espetáculo Turmalina 18-50 - Os Últimos Dias do Almirante Negro em terra.

O título da peça, encenada pela Cia. Cerne, faz alusão ao último endereço do marinheiro em São João de Meriti: Rua Turmalina, Lote 18, Quadra 50.

"O reconhecimento de João Cândido está aquém do que deveria ser. Até hoje, os livros didáticos comentam muito superficialmente a Revolta da Chibata e, por esse motivo, muitos brasileiros não sabem quem é e o que fez João Cândido. Ele precisa ser colocado no mesmo panteão dos grandes heróis como Zumbi, Tiradentes ou Dandara", afirma o dramaturgo.

 

Ø  A história esquecida do 1º barão negro do Brasil Império, senhor de mil escravos

 

Um próspero fazendeiro e banqueiro do Brasil nos tempos do Império, dono de imensas fazendas de café, centenas de escravos, empresas, palácios, estradas de ferro, usina hidrelétrica e, para completar a cereja do bolo, de um título de barão concedido pela própria Princesa Isabel. A biografia do empresário mineiro Francisco Paulo de Almeida, o Barão de Guaraciaba, não seria muito diferente de outros nobres da época não fosse um detalhe importante: ele era negro em um país de escravos.

No ano em que a Lei Áurea completa 130 anos, vale a pena conhecer a trajetória do primeiro e mais bem-sucedido barão negro do Império, um personagem praticamente desconhecido na História do Brasil. Empreendedor de mão cheia e com grande visão de negócios em um país ainda essencialmente agrário, ele tem uma trajetória que lembra a de outro barão empreendedor do Império, este bem mais famoso: o Barão de Mauá.

Com um patrimônio acumulado de 700 mil contos de réis, que garantia ao dono status de bilionário na época em que viveu, Almeida nasceu em Lagoa Dourada, na época um arraial próximo a São João del Rei, no interior de Minas Gerais, em 1826.

A origem da sua família é pouco conhecida. Filho de um modesto comerciante local chamado Antônio José de Almeida, na certidão de batismo consta como nome da mãe apenas "Palolina", que teria sido uma escrava. "Infelizmente não sabemos o destino de Palolina e a quem ela pertencia, mas, sim, ela era escrava", afirma o historiador Carlos Alberto Dias Ferreira, autor do livro Barão de Guaraciaba - Um Negro no Brasil Império.

O nome, porém, provoca discussões entre os descendentes do barão, já que, por um erro de grafia no registro, "Palolina", na verdade, seria Galdina Alberta do Espirito Santo, esposa de Antônio e considerada pelo próprio barão sua legítima mãe. "Certamente seu pai ou mãe tinham ascendência negra, mas não existe nenhum registro provando que ele era filho de escravo ou escrava", afirma a trineta do barão e guardiã da história da família, a secretária administrativa Mônica de Souza Destro, que mora em Juiz de Fora (MG).

Ainda na adolescência, Almeida começou a vida como ourives fabricando botões e abotoaduras em sua terra natal, na região aurífera de Minas. Nos intervalos, tocava violino em enterros, onde recebia algumas moedas como pagamento e os tocos das velas que sobravam do funeral, que utilizava para estudar à noite. Por volta dos 15 anos, tornou-se tropeiro entre Minas e a Corte, no Rio de Janeiro.

Nessas idas e vindas, ganhou dinheiro comprando e vendendo gado, conheceu muitos fazendeiros e negociantes nos caminhos das tropas e começou a comprar terras na região de Valença, no interior fluminense, para plantar café.

Após casar-se com dona Brasília Eugênia de Almeida, com quem teve 16 filhos, tornou-se sócio do seu sogro, que também era fazendeiro e negociante no Rio de Janeiro.

Após a morte do sogro, assumiu todos os negócios e sua fortuna disparou: comprou sete fazendas de café espalhadas pelo Vale do Paraíba fluminense e interior de Minas. Apenas na fazenda Veneza, em Valença, possuía mais de 400 mil pés de café e cerca de 200 escravos. Levando-se em consideração que ele tinha outras áreas produtoras de café, o barão pode ter tido até mil escravos, segundo Ferreira.

"Não se trata de uma contradição ele ter sido negro e dono de escravos, pois tinha consciência do período em que vivia e precisava de mão de obra para tocar suas fazendas. E a mão de obra disponível era a escrava", diz Ferreira.

"Ainda que nos cause repúdio hoje em dia, o contexto de escravidão era uma coisa normal e era mão de obra que existia naquele tempo", completa Mônica, que prepara uma biografia do seu ancestral, ainda sem data para ser publicada.

Em sociedade com outros empreendedores com quem mantinha contato, Guaraciaba tornou-se banqueiro e fundou dois bancos: o Mercantil de Minas Gerais e o Banco de Crédito Real de Minas Gerais. A diversificação empresarial não parou por aí.

Em um período em que as ferrovias começavam a rasgar o território nacional, participou da construção da Estrada de Ferro Santa Isabel do Rio Preto (depois incorporada pela Rede Mineira de Viação), cujos trilhos passavam por suas propriedades, em Valença.

A ferrovia, que ligava Valença a Barra do Piraí e se tornou importante para escoar o café do Vale do Paraíba, foi inaugurada por D. Pedro 2º em 1883. Teriam começado aí as boas relações entre Guaraciaba e a família real, que culminariam na concessão do título de barão pela princesa Isabel, regente na ausência do pai, em 1887.

O título foi concedido por "merecimento e dignidade", em especial pela dedicação de Guaraciaba à Santa Casa de Valença, onde foi provedor. Mas entrar para a nobreza tinha um custo fixo e tabelado pela Corte: 750 mil réis.

Sempre atento às oportunidades de negócios que chegavam com o progresso, Almeida foi sócio fundador da primeira usina hidrelétrica do país, inaugurada em 1889, em Juiz de Fora (MG). A Companhia Mineira de Eletricidade, que construiu a usina, também foi responsável pela iluminação pública elétrica em Juiz de Fora. O barão, claro, foi um dos participantes e financiadores da modernidade que aumentou o conforto da população.

Dono de um estilo de vida condizente com a nobreza imperial, o Barão de Guaraciaba possuía uma confortável residência na Tijuca, no Rio de Janeiro, e outra em Petrópolis, destino de veraneio preferido dos ricos e da nobreza.

Na cidade serrana construiu uma mansão que posteriormente foi chamada de Palácio Amarelo e que hoje abriga a Câmara Municipal. Também fazia diversas viagens para a Europa, principalmente para Paris, para onde mandou seus filhos para estudar.

"Guaraciaba distinguiu-se por ter sido financeiramente o mais bem-sucedido negro do Brasil pré-republicano. Ele se tornou o primeiro barão negro do Império, notabilizando-se pela beneficência em favor das Santas Casas", afirma a historiadora e escritora Mary Del Priore.

Segundo ela, Almeida fazia parte de um pequeno grupo de mestiços de origem africana que conseguiram ascender financeira e socialmente.

O racismo, porém, permanecia arraigado na sociedade brasileira, independentemente da posição financeira, diz Priore. Alguns desses empreendedores, a exemplo do Barão de Guaraciaba, conquistaram ou compraram seus títulos de nobreza junto ao Império, sendo por isso chamados na época de "barões de chocolate", em alusão ao tom da pele.

"O sangue negro corria nas melhores famílias. Não faltavam casamentos de 'barões de chocolate' com brancas", completa a historiadora.

Após a proclamação da República, Guaraciaba começou a se desfazer dos seus bens, mas viveu uma vida bastante confortável até morrer, na casa de uma das filhas, no Rio de Janeiro, em 1901, aos 75 anos.

Seus herdeiros, inclusive alguns ex-escravos agraciados pelo dono e que permaneceram com o patrão após a alforria, receberam dinheiro e propriedades, e se espalharam pelos Estados do Rio de Janeiro e Minas Gerais.

"Ele foi um grande empreendedor que acabou banqueiro, homem de negócios, fazendeiro e senhor de escravidão. É preciso empenho e coragem dos historiadores para estudar esses símbolos bem-sucedidos de mestiçagem", diz Mary Del Priore, que resgata um pouco da história do Barão de Guaraciaba em seu livro Histórias da Gente Brasileira.

 

Fonte: BBC News Brasil

 

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