segunda-feira, 14 de abril de 2025

João Filho: Quebra de decoro é o novo normal dos deputados bolsonaristas

Dois dias depois de irem à Avenida Paulista denunciar ao mundo que estão sendo perseguidos por uma ditadura implacável, deputados bolsonaristas aprovaram na Comissão de Segurança Pública da Câmara, na terça-feira, 8, um projeto de lei para desarmar a equipe de segurança do presidente da República e dos seus ministros.

Ou seja, os inimigos da “ditadura” conseguiram democraticamente aprovar uma lei que retira as armas de um dos “ditadores”. A contradição é óbvia, mas para o bolsonarismo isso nunca foi um problema.

O autor da proposta é Paulo Bilynskyj, do PL de São Paulo, um bolsonarista fanático que se orgulha dos serviços prestados por seu avô ao nazismo — eis as credenciais democráticas do deputado. Além de escancaradamente inconstitucional, a lei é estapafúrdia por si só, mas o argumento que a sustenta torna tudo ainda mais absurdo.

Segundo Bilynskyj, já que Lula é a favor do desarmamento da população, então, por coerência, a segurança presidencial e ministerial deve ser desarmada. “O presidente Lula, cercado de seguranças armados, luta sempre para desarmar o cidadão. O ministro [da Justiça, Ricardo] Lewandowski, que tem porte de arma renovado pela PF, dificulta o acesso do cidadão às armas de fogo”, disse o deputado, sem temer o ridículo. Sabemos como o bolsonarismo é infantilóide e vive desse gugu-dadá ideológico.

O relator do projeto é Gilvan da Federal, do PL do Espírito Santo, outro patriota fanático que deixou claro o motivo pelo qual quer desarmar a segurança do presidente: “Eu quero mais é que o Lula morra. Eu quero que ele vá para o quinto dos infernos. É um direito meu. Não vou dizer que eu vou matar o cara, mas eu quero que ele morra, que vá para o quinto dos infernos. Nem o diabo quer o Lula, por isso que ele está vivendo aí. Superou o câncer. Tomara que ele tenha um ataque cardíaco, porque nem o diabo quer a desgraça desse presidente que está afundando o país. Quero mais que ele morra mesmo. E que [seus seguranças] andem desarmados. Não quer desarmar o cidadão de bem? Que ele ande com os seus seguranças desarmados”, declarou Gilvan.

Percebam que o objetivo do projeto de lei é declarado sem pudor e sem disfarces. Articulam politicamente para que o presidente fique desprotegido porque desejam a sua morte. O contexto em que isso se dá torna tudo mais escabroso. Não só desejam a morte de Lula como a planejaram. Estamos falando do mesmo grupo político que arquitetou o Punhal Verde e Amarelo, um plano para matar o presidente, o vice e um ministro do STF.

Vivemos uma era de normalização dos absurdos. Eles se tornaram tão frequentes que já estamos todos anestesiados. Desde que o bolsonarismo tomou de assalto a vida política brasileira, já presenciamos de tudo.

Lembremos que o então deputado federal Jair Bolsonaro defendeu o fuzilamento do então presidente Fernando Henrique Cardoso e, anos depois, exaltou o torturador da então presidenta Dilma Rousseff durante o seu processo de impeachment.

De lá pra cá, criou-se uma legião de deputados federais delinquentes e agressivos que se orgulham em desafiar as leis e atacar as instituições. Mais recentemente tivemos Carla Zambelli, do PL de São Paulo, mandando um colega parlamentar “tomar no cu” e ameaçando um cidadão com revólver.

Gustavo Gayer, do PL de Goiás, insinuou que uma ministra estava fazendo um trisal com um deputado e um senador. Delegado da Cunha, do PP de São Paulo, foi flagrado em vídeo ameaçando encher a cara da ex-companheira de tiro após espancá-la. Marcel Van Hattem, do Novo do Rio Grande do Sul, chamou o STF de “organização mafiosa”.

Há uma infinidade de exemplos. A quebra do decoro parlamentar virou algo corriqueiro desde o início da ascensão bolsonarista. Estamos tão acostumados com esse nível de barbárie que ver um deputado pregando abertamente a morte do presidente da República já não nos choca como deveria. É o novo normal.

Nenhuma das atrocidades citadas foram punidas com cassação do mandato. Claro, quem comanda o parlamento é o bolsonarismo. E é nesse contexto que temos a aprovação da cassação, pelo Conselho de Ética da Câmara, de Glauber Braga, do PSOL do Rio de Janeiro, acusado de expulsar aos pontapés um influenciador do MBL do Congresso.

De fato, a agressão existiu, mas os atenuantes são fortes demais. Com ameaças e palavreado agressivo, o integrante do MBL ofendeu a mãe do deputado, que estava doente e morreria menos de um mês depois do episódio. Não foi a primeira vez. Há registros documentados de que o provocador vinha há dias perseguindo o parlamentar de maneira sistemática.

O MBL é conhecido por se infiltrar em manifestações de esquerda para provocar, constranger e depois lacrar com os vídeos na internet. Mesmo assim, é inegável que a reação de Glauber foi desproporcional e deve ser punida. Um parlamentar não pode rebater ofensas verbais com agressão física. Mas decidir pela pena máxima – cassar o mandato – é uma vergonha se levarmos em conta os padrões adotados pelo Conselho de Ética.

O que Glauber fez é café pequeno perto do que deputados bolsonaristas fazem quase que semanalmente tanto no Congresso quanto fora dele. Para o bolsonarismo, espancar a esposa, pregar o assassinato do presidente da República e defender golpe de Estado é menos grave que dar um pontapé em um provocador que acusa de forma leviana sua mãe que está à beira da morte. Está claro que a cassação do deputado do PSOL é fruto de perseguição política.

<><> “O bolsonarismo nada de braçada no Legislativo”

A decisão do Conselho de Ética agora segue para o plenário da Câmara, onde a tendência é ser confirmada. Glauber pode perder o mandato por revidar as agressões de um agente provocador. Já Gilvan da Federal seguirá livre, leve e solto após confessar o desejo pela morte do presidente da República em meio à defesa de um projeto de lei que visa desarmar sua equipe de segurança.

Bolsonaro foi chutado do Executivo, mas o bolsonarismo ainda nada de braçada no Legislativo. E nada indica que isso mudará nas próximas eleições. Esse é o drama brasileiro.

A cassação de Glauber faz parte do pacote golpista e autoritário do bolsonarismo. Eles planejam golpe de estado e a morte do presidente da República, cassam mandatos de parlamentares de esquerda e, ainda assim, se dizem vítimas de uma ditadura opressora.

Que o Judiciário cumpra o seu papel e coloque os líderes que tramaram o 8 de Janeiro na cadeia. Quem sabe assim o ímpeto delinquente e autoritário do bolsonarismo seja arrefecido nos próximos anos.

¨      Caso Glauber Braga escancara regime político decadente. Por João Scarpanti

Na última quarta-feira, dia 9, foi aprovada pelo Conselho de Ética da Câmara dos Deputados, por 13 votos a 5, a cassação do mandato de Glauber Braga (PSOL-RJ), deputado federal pelo Estado do Rio de Janeiro. Braga ainda pode recorrer da decisão na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), antes que a cassação seja enviada e votada pelo plenário da Câmara, onde poderá ser aprovada em definitivo.

Caso o recurso de Glauber Braga seja rejeitado e o pedido de cassação vá a plenário, será necessária a formação de maioria absoluta — ou seja, mais de 236 votos favoráveis à cassação — para que ele perca seu mandato, o que resultaria em sua inelegibilidade, que poderia se estender até 2035.

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O processo foi instaurado sob a alegação de que Glauber teria “agredido” um provocador fascista integrante do Movimento Brasil Livre (MBL), o que configuraria quebra de decoro parlamentar e abriria caminho para a cassação. O teor fraudulento das acusações fica evidente pela seletividade de sua justificativa: a quebra do decoro parlamentar. Não é preciso ser especialista para perceber que, se essa justificativa fosse de fato válida para um golpe contra a soberania do voto popular, a Câmara dos Deputados estaria esvaziada por falta de parlamentares.

O verdadeiro motivo por trás da cassação é, como o próprio deputado alega, sua oposição à liderança da Câmara e à sua maioria direitista, em especial a Arthur Lira (PP-AL), que foi quem iniciou o processo de cassação contra Braga, à época em que presidia o parlamento.

A posição levantada por Paula Coradi, presidenta nacional do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), ao ser questionada sobre um possível recurso ao Supremo Tribunal Federal (STF) contra a cassação de Glauber, vai no sentido de apontar uma “punição desproporcional ao fato”. Analistas indicam que dificilmente a cassação será arquivada ou revertida pelo STF.

O Supremo Tribunal Federal já indeferiu, em outras ocasiões, solicitações de parlamentares que buscavam anular procedimentos de perda de mandato. Para os ministros, essas deliberações são de natureza interna corporis, ou seja, pertencem exclusivamente à esfera de atribuições do Congresso Nacional. Em outras palavras, trata-se, segundo o Supremo, de uma questão política.

No entanto, em contraste com essa análise formalista e com a retórica da imprensa burguesa, o ativismo judicial tem se tornado cada vez mais comum por parte do Supremo Tribunal Federal e de todo o Judiciário brasileiro, que atua quase como um poder moderador e não poupa esforços para intervir contra os interesses da classe trabalhadora. Isso se evidencia em episódios como o mensalão, a Operação Lava Jato, o golpe contra a ex-presidenta Dilma Rousseff (PT) e a prisão ilegal do atual presidente Lula (PT), ocorrida em abril de 2018. A verdadeira razão pela qual o Supremo se absteria de intervir, neste caso, é para lesar o chamado “campo progressista”.

Essencialmente, a cassação do mandato de qualquer deputado eleito pelo voto popular é uma das manifestações mais antidemocráticas de um regime político decadente, no qual a judicialização da política se apresenta de forma desenvolvida. Isso ocorre em um momento em que a esquerda encontra dificuldades para disputar politicamente os rumos da sociedade e busca refúgio justamente naquele que é um de seus algozes: o Estado burguês — mais especificamente, seu Judiciário.

O recrudescimento do regime político e o festival de perseguições levadas adiante pela evidente “ditadura da toga” não surgem agora como um raio em céu azul. O que estamos presenciando é o resultado direto de uma política na qual a própria esquerda embarcou — a continuidade do “festival de cassações”, que teve uma manifestação especialmente aguda em 2023. Essa política, já denunciada por setores da esquerda revolucionária, viu deputados do PSOL e do Partido dos Trabalhadores (PT) protocolarem pedidos de cassação em massa após um discurso proferido por Eduardo Bolsonaro (PL-RJ), no qual ele afirmou que “professores doutrinadores são piores que traficantes”.

Embora a moda tenha pegado de 2023 para cá, o PSOL já fazia carreira na judicialização da política. Em 5 de maio de 2022, o partido solicitou à Câmara Municipal de São Paulo a perda de mandato do vereador Camilo Cristófaro, após ele ter utilizado uma fala de cunho racista. No dia 23 de maio de 2022, a deputada estadual Mônica Seixas (PSOL-SP) requereu a cassação dos deputados Wellington Moura e Gilmaci Santos, ambos do Republicanos, por tê-la insultado com a expressão “louca”. Em 23 de junho de 2022, o PSOL entrou com pedido de cassação do deputado José Medeiros, alinhado ao bolsonarismo, pelo simples fato de ele ter interrompido uma fala da deputada Talíria Petrone. Já em 14 de setembro de 2022, Mônica Seixas levou ao Conselho de Ética da Assembleia Legislativa de São Paulo a solicitação de cassação do mandato do deputado estadual Douglas Garcia, também bolsonarista, sob a acusação de que ele teria atacado verbalmente a jornalista conservadora Vera Magalhães.

No início da legislatura de 2023, o PSOL seguiu a mesma linha e apresentou quatro novos pedidos de cassação. Os alvos foram os deputados Abílio Brunini (PL-MT), André Fernandes (PL-CE), Clarissa Tércio (PP-PE) e Sílvia Waiãpi (PL-AP). Segundo a legenda, esses parlamentares teriam apoiado ou incentivado os atos bolsonaristas ocorridos em 8 de janeiro. Mais uma vez, a sigla buscou a perda de mandato com base em opiniões ou posicionamentos públicos expressos por seus adversários políticos. Em abril do mesmo ano, foi a vez da deputada Carla Zambelli — conhecida por suas posições aberrantes e reacionárias — se tornar alvo de uma nova solicitação de cassação. O motivo alegado foi uma ofensa verbal dirigida ao deputado Duarte Júnior.

De lá para cá, a política de censura e judicialização não apenas foi mantida, mas se intensificou. E isso apenas serviu para fortalecer a direita, que é quem efetivamente controla o regime político, por meio da burocracia policial, das cortes, da imprensa burguesa e afins. Por mais reacionárias que possam ser as falas de todos os alvos dos pedidos de cassação, a garantia dos direitos democráticos na sociedade burguesa — especialmente no atual estágio de decadência do regime político — é uma tarefa que cabe, em primeiro lugar, àqueles que defendem as lutas operárias. É preciso ter em mente que todo dispositivo de repressão utilizado contra representantes da burguesia, ainda que eventuais, sob o Estado burguês, será utilizado de forma ainda mais dura contra as classes pobres, trabalhadoras e seus representantes.

O voto popular soberano só deveria poder ser cassado pelo próprio voto popular soberano. Qualquer direito de cassação de um parlamentar — ou de qualquer político eleito — que esteja fora das mãos da população é uma ferramenta da burguesia nacional e do imperialismo contra as conquistas populares. Cassar um parlamentar não é cassar o direito de um cidadão, mas o de milhares ou milhões que nele votaram. E pensar que o fortalecimento do Estado está ligado ao fortalecimento da democracia — em especial da democracia operária — é um erro que rapidamente se revela fatal para sua organização política, como já está se demonstrando com a repetida abertura de processos de cassação

•        Reagir a provocador fascista não é quebra de decoro; Glauber fica!. Por Bepe Damasco

Um provocador típico da organização neofascista chamada MBL proferiu uma série de agressões verbais contra o deputado Glauber Braga (Psol-RJ), no interior da Câmara dos Deputados, culminado com ofensas à mãe do parlamentar, que se encontrava no leito de morte e veio a falecer dez dias depois.

Como não se trata fascista com flores, Glauber reagiu com um bem dado pé na bunda do sujeito. Onde está a quebra de decoro nesta justa indignação?

Como um Conselho de Ética que ainda mantém o mandato de uma parlamentar, como Carla Zambelli, que perseguiu um cidadão na rua de arma em punho; ou do deputado Gustavo Gayer, que dirigindo bêbado provocou a morte de três pessoas; ou ainda de Chiquinho Brazão, acusado de mandar matar Marielle Franco, pode cassar Glauber Braga, um deputado combativo, que pauta seu mandato pela defesa de seus ideais e por compromissos populares.

Crítico contundente do orçamento secreto e da falta de transparência na destinação de emendas, objeto inclusive de decisões moralizadoras por parte do ministro Flávio Dino, do STF, e de processos criminais que tramitam na Corte, Glauber despertou a ira de boa parte das bancadas conservadoras do Centrão, além, é claro, da extrema direita, a quem enfrenta corajosamente na Câmara.

Tudo leva a crer que a cassação do deputado fluminense seja algo já tramado e decidido por forças poderosas da Casa, conforme revela a pressa com que o Conselho de Ética deliberou pela cassação, por 13 votos a 5.

Contudo, o estilo aguerrido do deputado segue como um obstáculo para os que pretendem calar sua voz. Levando a resistência às últimas consequências, ele passou as duas últimas noites dentro da Câmara dos Deputados, de onde só pretende sair ao fim do processo, e está em greve de fome.

Além da votação em plenário, ainda cabe recurso da decisão do Conselho de Ética à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Depois, resta o caminho do Supremo.

Glauber fica!

•        Por que Glauber Braga tem que ficar. Por Reimont Otoni

O processo espúrio e manipulado contra o deputado federal Glauber Braga não pode prosperar. É uma grave ameaça à Democracia e ao Estado Democrático de Direito, com viés de lawfare – supostamente, usam a regra, mas para montar uma farsa de caráter político-ideológico, pela qual a extrema direita tenta se vingar do bravo parlamentar e de toda a bancada de esquerda e progressista.

Na teoria, Glauber está sob ameaça de cassação por ter reagido a seguidas ofensas e provocações dirigidas não só a ele, mas também a sua mãe, a ativista e ex-prefeita de Nova Friburgo Saudade Braga, já enferma e que faleceu poucas semanas depois do episódio.

Sabemos que o motivo não é esse.

É uma nuvem de fumaça para contrapor às investigações contra os golpistas que tentaram derrubar e atentar contra a vida do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva.

É uma agressão à soberania popular, ao voto de 78 mil eleitores cuja vontade está ameaçada de cassação.

É injusta e absurdamente desproporcional, considerando todos os processos não avaliados ou pendentes na mesma Comissão de Ética da Câmara, como o que deveria analisar as agressões físicas sofridas pelo companheiro deputado Rogério Correia (PT-MG), chutado pelo também deputado Éder Mauro (PL-PA) durante uma sessão do próprio Conselho de Ética, em junho de 2024. Rogério apresentou farta documentação probatória, incluindo exame de corpo de delito, fotos dos hematomas, laudo médico e vídeos, mas o processo segue parado.

Glauber e eu não somos do mesmo partido, mas sempre estivemos lado a lado em episódios cruciais da nossa República, como na luta pela aprovação Política Municipal para a População em Situação de Rua, de minha autoria. Jamais esquecerei o discurso firme e histórico de Glauber ao votar contra o vergonhoso impeachment da presidenta Dilma Rousseff.

O Congresso Nacional não pode prescindir da imensa contribuição desse parlamentar ético, valoroso, combativo e dedicado, com paixão, às lutas do povo brasileiro.

Cassar Glauber Braga é um golpe na Democracia, comparável às tentativas, tratativas e atos realizados pela extrema direita desde que percebeu que perderia as eleições de 2022.

Glauber Braga tem que ficar.

 

Fonte: The Intercept/Brasil 247

 

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