A
guerra contra o Brasil que levou à independência do Uruguai
Há 200
anos, os homens destinados a formar o destacamento precursor da independência
do Uruguai não faziam a menor ideia de que inventariam um país.
Atravessando
os rios Paraná e Uruguai a bordo de dois barcos, tinham apenas duas
preocupações: manter o mais absoluto silêncio e remar com a máxima rapidez
possível.
Tinham
zarpado de portos situados no que é hoje a Argentina, armados pobremente de
carabinas, sabres e adagas.
Se
algum deles tivesse dúvida sobre o que os aguardava ao final da jornada,
bastaria perguntar ao comandante da expedição.
Aos 40
anos, Juan Antonio Lavalleja passara três em uma masmorra na Ilha das Cobras,
no Rio de Janeiro.
Era lá
que o Império do Brasil (e, antes dele, a Coroa portuguesa) trancafiava
suspeitos de alta traição.
Sob a
lei brasileira, não havia outra definição para qualquer tentativa de desmembrar
o território nacional — exatamente o que Lavalleja e seus homens pretendiam
fazer se chegassem à margem direita do Rio Uruguai.
A
aventura por pouco não terminou em derramamento de sangue antes mesmo de
começar.
Nas
palavras de José Spikermann, um dos cronistas do grupo: "(...) ficamos
entre dois barcos inimigos, um a bombordo e outro a estibordo, víamos seus
faróis a muito pouca distância".
Por
volta de 23h de 19 de abril de 1825, o bando desembarcou na Praia da Agraciada,
distante 370 quilômetros de Montevidéu.
Tinham
"o aspecto de verdadeiros bandidos", diria Atanasio Sierra, outro
participante.
"Nesse
momento, não pudemos menos que beijar o solo da Pátria", relatou
Spikermann.
Pátria,
para Spikermann e seus companheiros, não era o Brasil. Nem Portugal, muito
menos a Espanha.
Era a
região situada entre os rios da Prata e Uruguai e os antigos limites
meridionais do império português, anexada em 1821 por Lisboa e zelosamente
conservada pelo Brasil após a independência.
Os
expedicionários de Lavalleja pretendiam libertá-la do domínio brasileiro e
devolvê-la ao seio da república independente proclamada em Buenos Aires.
Tinham
o apoio mais ou menos explícito do governo e da elite portenha, que lhes
brindaram com dinheiro, armas e propaganda ufanista nos jornais.
À
primeira vista, a façanha de 19 de abril assemelhava-se a mais um episódio
obscuro em séculos de guerras e escaramuças de fronteira.
Acabou
provocando um conflito que, de 1825 a 1828, fixaria praticamente em definitivo
os limites territoriais na região.
Para os
uruguaios, é a Guerra do Brasil. Para os brasileiros, Guerra da Cisplatina.
Para os argentinos, Guerra da Banda Oriental ou Guerra contra o Império do
Brasil.
A
campanha envolveu os dois Estados mais poderosos da América do Sul: o Império
do Brasil, hoje Brasil, e as Províncias Unidas do Rio da Prata, que apoiaram os
insurretos.
Acompanhando
de perto os acontecimentos, estava o poder marítimo dominante desde o final das
guerras napoleônicas, com fortes interesses na América do Sul: o Reino Unido.
Nenhum
deles, porém, poderia prever de antemão o desfecho do conflito: a criação de um
terceiro país, o Uruguai.
• Bicentenário de expedição motiva
celebrações em todo o Uruguai
Transcorridos
dois séculos, a expedição de 1825 passou à posteridade como Desembarque dos 33
Orientais e é um dos mitos fundadores da nacionalidade uruguaia.
As
celebrações da data ocorrem desde o início deste mês em todo o Uruguai.
Na
Praia da Agraciada, hoje situada no departamento uruguaio de Soriano, um Comitê
de Homenagem aos Libertadores de 1825 foi recebido no dia 19 com honras depois
de recriar a travessia, partindo de Buenos Aires.
A
solenidade foi encabeçada pelo presidente Yamandú Orsi.
"Se
tivéssemos de pensar no significado desse acontecimento para a Guerra da
Cisplatina, em primeiro lugar teríamos de nos localizar em um contexto em que
havia múltiplas opções", explica Ana Frega, professora titular de História
do Uruguai da Universidade da República, de Montevidéu, por videoconferência, à
BBC News Brasil.
"Os
caminhos possíveis a respeito do desenvolvimento político da organização dos
territórios na região não estavam claramente definidos", complementa.
A área
tinha sido palco de disputa sangrenta entre Portugal e Espanha por quase dois
séculos.
Nesse
intervalo, múltiplos tratados entre as duas potências haviam desenhado e
redesenhado o mapa do território.
O
primeiro desses textos, o Tratado de Tordesilhas, negociado em 1494 por Espanha
e Portugal com o papa espanhol Alexandre 6º no papel de mediador, designara
Laguna (hoje no Estado de Santa Catarina) como ponto máximo de expansão
meridional de Portugal na América do Sul.
A ideia
de um Brasil insular estimulou os portugueses a expandir seu domínio além do
designado nos tratados.
"Desde
os tempos coloniais, os portugueses pensavam que os rios das bacias do Prata e
do Amazonas tinham divisores de águas muito próximos. Isso constituiria um
espaço físico que configuraria uma Ilha Brasil", afirma Cesar Augusto
Barcellos Guazzelli, professor titular de História da Universidade Federal do
Rio Grande do Sul (UFRGS).
Bandeirantes
e tropeiros empenharam-se em atingir o que lhes parecia o máximo limite
natural, ou seja, o rio da Prata.
"Tordesilhas
foi feito pelo papa, mas a natureza foi feita por Deus", ironiza
Guazzelli.
Os
portugueses fundaram a Colônia do Sacramento em 1680, como uma cabeça de ponte
na margem direita do Prata.
A
cidade foi portuguesa por 97 anos, até 1777, quando acabou trocada com a coroa
espanhola, nos termos do Tratado de Santo Ildefonso, pelos Sete Povos das
Missões, hoje em território brasileiro.
• Independência do Brasil e da Argentina
reembaralhou cartas no Prata
Pouco
mais de 30 anos depois de Santo Ildefonso, ao final da primeira década do
século 19, as condições haviam mudado outra vez.
Na
margem esquerda do Prata, Buenos Aires, antiga capital do Vice-reinado espanhol
do Rio da Prata, expulsara as autoridades coloniais em 1810 e proclamara
independência seis anos depois sob o nome de Províncias Unidas do Rio da Prata.
Os
portugueses, por sua vez, viram as dificuldades espanholas no Prata como uma
oportunidade.
Os
exércitos de Dom João 6º avançaram sobre a margem direita do curso d'água em
1811 e 1817 — dessa última vez, para uma longa permanência.
Incapazes
de expulsar o exército lusitano, os governantes de Buenos Aires continuaram
reclamando soberania sobre a região, que chamavam pelo antigo nome colonial:
Província Oriental.
Sem
dar-lhes ouvidos, Dom João anexou o território ao Reino Unido de Portugal,
Brasil e Algarves. Foi batizada de Província Cisplatina.
"Os
nomes, aqui, são importantes. A Província Oriental estava a oriente de quê? Do
antigo Vice-Reinado do Rio da Prata, parte da Espanha imperial. Ficava além do
rio Uruguai", ressalta Guazzelli.
E
completa: "Por outro lado, quando se fala, como os portugueses, em
Província Cisplatina, trata-se da região que fica do meu próprio lado do
Prata".
Independentemente
do nome da província, a população autóctone falava sobretudo espanhol.
A
maioria aprendera a desconfiar não apenas de coroas, mas de qualquer forasteiro
que lhe exigisse obediência.
Expulsos
de Buenos Aires, os espanhóis entrincheiraram-se em Montevidéu. O entorno
rural, chamado de Campanha, cerrou fileiras com os revolucionários.
Em meio
à guerra e à convulsão social, emergiu como líder José Gervasio Artigas
(1764-1850), autoproclamado Chefe dos Orientais (Jefe de los Orientales).
Durante
10 anos, esse leitor de Thomas Paine e Jean-Jacques Rousseau fez guerra contra
espanhóis e portugueses. A certa altura, passou a resistir ao centralismo de
Buenos Aires.
• Nas mãos dos revolucionários, a bandeira
de Artigas
Artigas
sustentava que os orientais deviam constituir uma república independente como
parte de uma federação platina.
Era, em
linhas gerais, a mesma proposta de caudilhos das antigas províncias espanholas
de Santa Fe, Entre Ríos e Corrientes, desconfiados das intenções unitárias de
Buenos Aires.
Em
defesa da própria autonomia, Artigas e os chefes desses territórios
constituíram exércitos guerrilheiros.
Em suas
fileiras, havia forte presença de indígenas, afrodescendentes e camponeses.
Horrorizado, o governo portenho chamava-os depreciativamente de montoneros (de
montón, ralé).
Quase
150 anos depois, o xingamento seria adotado com orgulho na Argentina pela
fração guerrilheira do movimento peronista.
Artigas
tinha uma peculiaridade em relação aos caudilhos da margem ocidental: defendia
a divisão de terras e a libertação dos escravizados alistados nas forças
revolucionárias.
A
primeira medida tinha propósitos sociais e militares: a Pátria seria melhor
protegida se cada um de seus filhos pudesse tirar dela seu sustento.
Chegara
a essa conclusão no início do século 19, como lugar-tenente do militar e
naturalista espanhol Félix de Azara (1742-1821) em uma missão de demarcação de
terras e fundação de assentamentos a mando da Coroa espanhola na região das
Missões, hoje território brasileiro.
A
segunda proposta almejava reforçar as fileiras do exército oriental.
Refletia,
no fim das contas, um fato consumado: de armas nas mãos, ninguém se deixa
escravizar.
Esse
programa radical atraiu para o Chefe dos Orientais a ira de todos os governos
com interesses na região.
Enfraquecido
pela divisão das próprias forças, Artigas emigrou em 1820 para o Paraguai, onde
morreria afastado da política três décadas mais tarde.
Em
1825, o nome de Artigas havia se tornado anátema.
Lavalleja
e alguns de seus lugares-tenentes, porém, haviam servido sob suas ordens.
A
bandeira dos insurretos da Praia da Agraciada tinha as mesmas cores da de
Artigas: azul, branco e vermelho.
A esse
desenho, os expedicionários acrescentaram uma inscrição sobre a faixa branca:
"Liberdade ou morte" (Libertad o muerte).
• Após quatro meses, a declaração de
independência
Na fase
inicial da luta, sublinha Ana Frega, os revolucionários tinham duas tarefas
centrais.
"Precisavam
provar-se militarmente confiáveis e formar um governo que enviasse deputados da
região ao Congresso das Províncias Unidas reunido em Buenos Aires",
enumera.
O
avanço dos rebeldes foi fulminante: em 20 de abril tomaram Soriano, em 29
surpreenderam e capturaram o brigadeiro Fructuoso Rivera, comandante militar da
Cisplatina, que aderiu à revolução, e em 14 de junho instalaram um governo
provisório em Florida.
Montevidéu
e Colonia, as principais cidades, caíram sob cerco e tiveram de ser abastecidas
pela Armada brasileira por mar.
O
governo da Província Cisplatina, encabeçado pelo tenente-general Carlos
Frederico Lecor, visconde de Laguna, controlava apenas parte do litoral.
Em 25
de agosto, uma assembleia de representantes reunida em Florida declarou
"írritos, nulos e dissolvidos todos os atos de incorporação e juramentos
arrancados aos povos da Província Oriental".
A
região foi proclamada livre e independente "do rei de Portugal, do
imperador do Brasil e de qualquer outro poder do universo, e com pleno poder
para dar-se a forma de governo que estimasse conveniente".
Em
outras duas votações históricas, aprovaram-se a união às Províncias Unidas e a
adoção da bandeira dos insurretos como pavilhão nacional.
Em
setembro e outubro, a força terrestre brasileira sofreu duas graves derrotas.
Na
primeira, em Rincón de Gallinas (Rincão de Galinhas), Rivera bateu o único
contingente do exército imperial a operar no interior do país, que perdeu em
combate o comandante, coronel José Luís Menna Barreto, de apenas 27 anos.
Na
segunda, junto ao Arroio Sarandí (Sarandi), Lavalleja e Rivera dispersaram a
força comandada pelos coronéis Bento Manuel Ribeiro e Bento Gonçalves e fizeram
mais de 500 prisioneiros.
Mais de
60 anos depois, o Barão do Rio Branco, patrono da diplomacia brasileira,
lamentaria: "O combate do Rincón foi o primeiro revés que sofremos, depois
de continuadas vitórias nas campanhas do sul, de 1801 a 1820, quando tínhamos
sobre os nossos vizinhos a superioridade da disciplina e da instrução
militar".
No
final de outubro de 1825, o Congresso das Províncias Unidas aprovou a
reincorporação da Província Oriental.
Em
dezembro, o Brasil declarou guerra às Províncias Unidas, às quais acusava de
estar por trás da revolução.
Depois
de três anos de luta, sem que nenhum dos beligerantes conseguisse se impor
decididamente sobre o inimigo, prevaleceu a solução de compromisso preconizada
pelos ingleses.
Nasceu
a República Oriental do Uruguai, tendo como fiadores os dois poderosos
vizinhos, que se reservavam o direito de intervir no Estado recém-criado em
nome da lei e da ordem.
O
conflito consumiu homens e recursos do Império, contribuindo para o desgaste da
imagem de Dom Pedro 1º na Corte e nas províncias.
As
cicatrizes deixadas na província vizinha do Rio Grande do Sul teriam
desdobramentos nas décadas seguintes.
A
região das Missões chegou a ser ocupada por Rivera, partindo de Santa Fe, nos
últimos meses da guerra, de abril a agosto de 1828.
"Ao
recuar para o sul do Rio Quaraí, por disposição da Convenção de Paz, Rivera
leva consigo boa parte da população indígena das Missões, com a qual vai
colonizar as terras abandonadas pelos brasileiros no norte do Uruguai",
avalia Tau Golin, doutor em História pela Pontifícia Universidade Católica do
Rio Grande do Sul (PUCRS) e autor de A Fronteira (L&PM), com quatro volumes
publicados e um quinto no prelo.
Veteranos
da Cisplatina como Bento Gonçalves, Bento Manuel e David Canabarro e outros
sublevariam a província por 10 anos na Revolução Farroupilha (1835-1845).
"A
Cisplatina foi a primeira guerra do Brasil independente contra um inimigo
externo. Ao mesmo tempo, trouxe uma carga muito grande das disputas coloniais,
ao ser resultado de uma expansão portuguesa", diz Golin.
• Nem 33, nem orientais
Autointitulados
como Cruzada Libertadora, os combatentes de Lavalleja passaram à história sob a
alcunha de 33 Orientais.
O
título heroico permanece controvertido: não teriam sido 33, e nem todos seriam
orientais no sentido corrente de nascidos na região hoje compreendida pelo
Uruguai.
O
número seria uma alusão ao grau máximo da maçonaria, à qual pertenciam muitos
dos revoltosos.
Registros
surgidos nos anos seguintes em 16 listas diferentes dão conta de até 59 nomes.
Faziam
parte do grupo quatro argentinos, quatro paraguaios e pelo menos dois
africanos.
Embora
os veteranos tenham colhido reconhecimento público e muitos tenham seguido
prestigiosas carreiras políticas e administrativas, o culto em torno do 19 de
abril levaria mais de três décadas para emergir.
"Somente
em 1860 começa-se a celebrar a data e se decide que isso é um feito histórico
capaz de contribuir para a formação cívica dos habitantes do país em
1860", assinala Ana Frega.
A
primeira legislação sobre feriados no Uruguai, em 1834, estabelece como datas
nacionais os dias 25 de maio (data da Revolução de Maio, com formação da Junta
de Governo autônoma em Buenos Aires) e 18 de julho (quando foi jurada em 1830 a
primeira Constituição uruguaia).
Outras
duas festas eram observadas: 20 de fevereiro, data da vitória uruguaia na
Batalha de Ituzaingó (no Brasil, Batalha do Passo do Rosário) contra o exército
imperial em 1827, e 4 de outubro, quando, em 1828, representantes brasileiros e
argentinos trocaram em Montevidéu a ratificação da Convenção de Paz.
A
valorização do 19 de abril ganhará impulso durante o governo do presidente
Bernardo Berro (1803-1868).
"Essa
ideia vai surgir em um contexto preciso, depois da chamada Guerra Grande
(1836-1851), como parte de um conjunto de medidas que tendem a 'nacionalizar
nossos destinos', como diz Berro em um de seus discursos", explica Ana
Frega.
Tratava-se,
para o governo uruguaio, de apresentar o Uruguai como uma nação plenamente
independente.
Fica
estabelecido que, a cada quatro anos, haverá uma grande festa em memória do
desembarque de 1825 nos dias 18, 19 e 20 de abril.
A
vigência da lei acaba adiada em razão da invasão do país pelo general colorado
Venâncio Flores (1808-1868).
Flores
planejava derrubar Berro e abortar sua política de conciliação entre blancos e
colorados.
Em
1865, apoiado pelo Brasil e pela Argentina, Flores tomou Montevidéu e tornou-se
ditador.
• Lenda sobrevive na mais célebre pintura
uruguaia
A lenda
dos 33 sobreviveu na mais célebre tela produzida por um artista uruguaio: O
Juramento dos Trinta e Três Orientais, de Juan Manuel Blanes (1830-1901).
Nascido
em Montevidéu, Blanes estudou em Florença com o pintor Antonio Ciseri
(1821-1891), preferido dos artistas sul-americanos de passagem pela Itália.
Além de
Blanes, os pupilos de Ciseri incluíram o brasileiro Pedro Américo (1843-1905),
o peruano Luis Montero (1826-1869) e os argentinos Ángel Della Valle
(1852-1903) e Lucio Correa Morales (1852-1923).
Em um
país unificado com Roma como capital, contra a vontade do Vaticano, e no qual a
Igreja sofria forte oposição popular, Ciseri atraiu multidões à Galeria dos
Uffizi com uma tela de temática a um só tempo religiosa e política: Ecce Homo
(1871).
No
quadro, Pilatos, mostrado de costas, inclina-se servilmente perante a multidão
para consultá-la sobre o destino do prisioneiro Jesus.
As
figuras das telas de Ciseri aparecem em poses dramáticas, sob luzes que parecem
enfatizar ou obscurecer traços de personalidade.
"Blanes
aprendeu em Florença essa teatralidade da pintura. Isso tornou-o muito famoso
em Montevidéu e Buenos Aires quando regressou e pintou em 1871 Um Episódio da
Febre Amarela em Buenos Aires", afirma Laura Malosetti Costa, doutora em
História da Arte pela Universidade de Buenos Aires e integrante da Academia
Nacional de Belas Artes da Argentina.
Em O
Juramento, o artista utiliza igualmente recursos plásticos variados a serviço
de um propósito político: a pacificação do país.
"Blanes
não escolheu pintar o desembarque dos 33, e sim um juramento. É um pacto
cívico. As cores do quadro são muito equilibradas entre o branco e o vermelho
(colorado). Os olhares dos orientais para o sol nascente indicam a mirada ao
futuro", diz Malosetti.
Assim
como o presidente Bernardo Berro, o pintor pertencia a um grupo de intelectuais
que preconizava o fim da brutal série de guerras civis entre os partidos Blanco
e Colorado que sacudiu o Uruguai, com breves intervalos, de 1836 a 1904.
"O
Juramento contém um programa político para toda a região. E digo mais: era um
programa maçônico", avalia Malosetti, referindo-se ao vínculo do artista
com a maçonaria, explicitado em boa parte de sua produção.
A
descoberta de O Juramento, em 1877, no ateliê de Blanes, foi um acontecimento
nacional celebrado com uma cerimônia assistida pelo ditador Lorenzo Latorre.
O
vernissage, na Sociedade de Ciências e Artes do Uruguai, teve visitação
mediante venda de ingressos e distribuição nas ruas de folhetos com descrição
dos personagens.
No ano
seguinte, a tela atravessou o rio da Prata rumo à Argentina. A abertura da
exposição em Buenos Aires teve a presença do presidente Nicolás Avellaneda
(1837-1885).
A obra
foi louvada pelo jurista Carlos Tejedor (1817-1903) e pelo ex-presidente
Domingo Faustino Sarmiento (1811-1888).
O poeta
José Hernández (1834-1836), autor de Martín Fierro, obra máxima da literatura
argentina, pagou 10 pesos para contemplar O Juramento.
Em
seguida, compôs em sua homenagem o poema Carta que o Gaucho Martín Fierro
Dirige a Seu Amigo D. Juan Manuel Blanes a Propósito de Seu Quadro Os Trinta e
Três.
Com 33
estrofes em estilo gauchesco, na voz de seu mítico personagem, a composição
termina com os versos: "Conte se são trinta e três, / Se em meu cálculo
não erro: / Com esta carta encerro, / amigo, me planto aqui. / Nem Cristo
passou dali / Nem tampouco Martín Fierro".
Fonte:
BBC News Brasil

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