Terror no Litoral Norte da Bahia: região
paradisíaca é dominada pelas facções
Refúgio de muitos
moradores de Salvador e de turistas do mundo inteiro, o Litoral Norte vem
perdendo a imagem bucólica. Com o passar dos anos, a brisa do mar e o canto dos
pássaros que sobrevoam os rios, perderam espaço para os estampidos de fuzis e o
sangue no asfalto. A região então paradisíaca convive hoje com o caos
causado pelas facções, que ganharam força, a partir da implantação do terror
nas comunidades praieiras, assim como já fazem na capital.
Na última quinta-feira
(05), uma cabeça humana foi encontrada na área externa da Unidade Básica de
Saúde de Malhadas, na cidade de Mata de São João. A cena chocou os moradores.
Gleidson Macedo Santos, o “Saci”, foi retirado de casa, na localidade de Tereré,
e levado para um local, onde foi torturado e decapitado. Segundos moradores, a
vítima foi brutalmente assassinada pelos próprios comparsas do Bonde do Malucos
(BDM). Preso em 2021 por tráfico em Praia do Forte, Gleidson desta vez foi
julgado no “tribunal do crime”, acusado de ser informante do Comando Vermelho
(CV), que tem presença forte em Camaçari e Lauro de Freitas.
A cabeça de Gleison
foi deixada em cima de uma cadeira no corredor do posto, como forma de recado
para os demais. A família dele procura o corpo. Coincidência ou não, a mesma
unidade de saúde foi também cenário para a morte do policial militar Ramon Silva
Figueredo, corrida no último dia 28. Ele e o também PM Matheus Santa Rosa,
ambos do grupo de inteligência do Batalhão Patamo, unidade de elite da Polícia
Militar, foram baleados durante um confronto com integrantes da facção Bonde do
Maluco (BDM) no distrito de Malhadas. Apesar de ter sido socorrido ao Hospital
Menandro de Faria, em Lauro de Freitas, Ramon não resistiu. Já Matheus foi
atingido na perna. Na mesma ação, dois dos criminosos envolvidos na troca de
tiros foram atingidos e não resistiram aos ferimentos.
De acordo com o
especialista em segurança pública, o coronel Antônio Jorge, professor de
Direito do Centro Universitário Estácio FIB da Bahia, “na capital, a ação das
forças de segurança está sendo muito mais presente do que nessas regiões,
principalmente que nós não estamos ainda no verão”. “No verão você tem um
aumento da presença das forças policiais em função do aumento da população
nessas áreas. Então, neste momento em que nós estamos ainda no verão, é
propício para uma ação expansionista dessas organizações criminosas. E o efeito
disso é o aumento da criminalidade, porque nós passamos a ter um cenário muito
semelhante ao que já vivemos aqui na capital e disputa territorial entre essas
organizações criminosas”, declara especialista.
Mata de São João é
considerada por muitos como “um paraíso tropical” do Litoral Norte da Bahia
(Costa dos Coqueiros). Abrange algumas das praias mais conhecidas do estado em
28km de costa e reservas naturais como Praia do Forte, Imbassaí, Diogo, Praia
de Santo Antônio e Sauípe. Localizado a cerca de 60km de Salvador, o
município tem cenários que unem os vilarejos e moradores locais, com a
sofisticação das grandes redes de hotéis e resorts, que atraem visitantes do
mundo todo.
Mas em Malhadas, o
encanto não é mais o mesmo há cinco anos, com a chegada do BDM. “A
tranquilidade aqui não existe mais. Há cinco anos não temos mais o sossego,
pois a gente não fala de drogas. Depois que esse grupo chegou e passou a mandar
aqui, as pessoas não ficam mais na rua, com medo de receber uma bala de graça”,
diz uma moradora de Malhadas. “Antes, a gente amanhecia na porta de casa,
jogando conversa fora com os vizinhos. Hoje, às 08:00 (da noite), ninguém abre
a janela, com medo deles. A sensação é de desamparo, porque ninguém resolve o
problema. A polícia, quando vem, fica alguns minutos e depois vai embora”,
emendou uma outra mulher.
Segundo testemunhas,
no dia 28, Ramon e Matheus desceram de um carro, desceram de um carro
descaracterizado e seguiram para a lateral da Unidade Básica de Saúde da
Família Maria Fernanda Paula L. de Castro, na Rua Direta de Malhadas. “Eles já
tinham passado no local e visto dois jovens fazendo o ‘movimento’ (tráfico). O
carro parou, eles desceram e os rapazes correram para o fundo do posto, onde
lá, houve o confronto. Foram muitos tiros. Foi assustador”, conta um morador.
Ninguém sabe exatamente como os policiais foram baleados. “Mas um dos
traficantes estava morto em cima de uma cadeira e o outro tentou fugir pulando
o muro, mas não conseguiu”, disse ele, que aponta para o mato rebaixado
por onde os policiais passaram. “A ação dos policiais foi de inteligência
em Malhadas. O objetivo era fazer um levantamento das áreas, um mapeamento do
tráfico na região”, declara o major Jorge Ramos, comandante da 53º CIPM (Mata
de São João).
Atrás do posto de
saúde funciona uma escola municipal. “Rapaz, ficamos aqui quatro dias sem aula.
Apesar de tudo normalizado, muita gente ainda está assustada”, disse um
funcionário. Já a unidade de saúde parou as atividades somente no dia. No
entanto, o clima de terror se propagou. “A creche em que trabalho tem 300
crianças, entre dois e cinco anos. Só voltamos na segunda, porém, a minha
turma de 23 alunos só veio sete. Os pais estão com muito medo dessa violência”,
conta uma professora.
O controle do tráfico
de drogas em Mata de São João é cobiçado também pela A Tropa, que concentra
suas forças na sede do município, como nos bairros de Cajueiro e Monte Líbano,
e no entorno. “Mas eles vêm de lá para tomar aqui. Tem dias que é ‘chuva de bala’
para todo lado. Isso causa um impacto também no comércio e negócios. Tem gente
que prefere almoçar e comprar coisas por aqui, do que em Praia do Forte. Mas,
com toda essa tensão, os clientes estão indo para outras localidades”, relava o
dono de um mercadinho.
·
Tiririca
Dois dias após o
confronto em Malhadas, três pessoas – dois homens e uma mulher – que seriam
ligadas ao BDM foram mortas pela polícia em Barra do Pojuca, costa de Camaçari,
início do Litoral do Norte. “O Serviço de Inteligência constatou que, logo após
a morte do policial, o grupo migrou para outras áreas, em Barra de Pojuca, e
que parte dele estava em uma residência. Eles reagiram. Foi uma operação de
absoluto sucesso. Após o confronto, os três suspeitos foram encontrados
feridos. Eles foram levados para uma unidade de saúde da região, mas não
resistiram aos ferimentos e morreram”, relata o major Jorge Ramos.
Esta operação
aconteceu na localidade conhecida como Tiririca, dominada pelo BDM. A
reportagem também esteve no local e ainda encontrou algumas cápsulas em frente
à casa onde estava o trio. Entre os mortos estava Anderson de Araújo Correa, de
24 anos, conhecido como “Lilico”. Segundo moradores, o jovem, nativo da região,
trabalhava como pedreiro, mas não souberam explicar a relação dele com as
outras duas pessoas. “A gente nunca soube que Lilico era metido com essas
coisas (tráfico). Já o casal, que a gente viu rodando por aqui horas antes do
tiro, tinha envolvimento”, relata a dona de um boteco.
Um vizinho disse que
Anderson era o caseiro do imóvel onde ocorreu o confronto. “Mas não via eles
com essas pessoas. Eu sei que ele vivia aí, mas quanto ao casal, não sei dizer.
No dia dos tiros, os policiais entraram na minha casa para ver se tinha alguém
escondidos e disseram que houve uma troca de tiros”, relatou.
·
“Dama do Crime”
Segundo o Departamento
de Polícia Técnica (DPT), apenas dois dos três corpos foram identificados. Além
de Anderson, Ricardo Marques Amaral Peixoto, de 28 anos. Já a mulher permanece
ignorada no Instituto Médico Legal Nina Rodrigues (IMLNR).
Embora não haja até o
momento a identificação formal, ela é conhecida como “A Dama do Crime”. Logo
após as mortes, fotos e vídeos dela passaram a circular nas redes sociais. Em
algumas imagens, ela apareceu com uma pistola. Em uma gravação publicada numa
rede social, uma mulher, que seria a “Dama do Crime”, aparece exibindo uma
pistola com a seguinte legenda: “A glokkk doidaaa pra cuspiii nos alemão
(sic)”. Neste contexto, “alemão” é uma gíria do usada por traficantes atribuída
a policiais.
Em outros vídeos, a
“Dama do Crime” aparece ao lado de Ricardo que também exige uma pistola e faz o
símbolo do BDM com uma das mãos. “Ela era uma pessoa atuante na facção, exibia
armamentos, exercia influência no tráfico de drogas”, declara o comandante
do Batalhão Especializado de Policiamento Tático Móvel (Batamo),
tenente-coronel Flávio Farias.
Ainda de acordo com a
polícia, só foi possível chegar ao trio através de denúncias. “Faço apelo para
que a comunidade participe da segurança pública. Conclamamos toda a sociedade a
participar do Disque Denúncia 181. O sigilo é garantido, total, porque não
temos bola de cristal”, declara o major Jorge Ramos, da 53º CIPM.
·
Chacina
A facção BDM é
responsável por uma chacina que resultou nas mortes de
nove pessoas em novembro do ano passado, na localidade de JK, em Mata de São
João. De acordo com a Polícia Civil, a
matança foi motivada pelos ciúmes que um dos criminosos sentia de uma das
vítimas. O principal alvo dos criminosos era o homem identificado como
Preá, ex-namorado de uma mulher que atualmente namorava o mandante do crime. A
mãe dessa mulher, ex-sogra de Preá, identificada como Cristiane, também foi
assassinada na chacina.
O mandante foi com os
comparsas até a casa de Preá para matar ele, mas lá matou também Cristiane,
outro homem, outra mulher e mais três crianças. Um bebê foi preservado pelos
bandidos e resgatado pelo pai em meio à casa em chamas - os bandidos atearam fogo
ao imóvel. Um adolescente de 12 anos conseguiu fugir e correu pedindo ajuda.
Duas vizinhas que abriram a porta para ele foram mortas a tiros. O garoto
sobreviveu.
¨ Criminalidade à moda baiana: traficante vira-casaca, taxistas em
pânico e arrastões
A situação é
preocupante para quem precisa garantir o ganha-pão no trânsito de Salvador.
Mais uma categoria vive um período de treva: 270 taxistas foram assaltados
neste ano na capital - 23 tiveram os carros levados, segundo a Associação Geral
dos Taxistas (AGT).
Os meses mais críticos
foram: junho, com 49 ocorrências; seguido de julho (35) e agosto (38). E nos
últimos 60 dias, três táxis foram queimados por traficantes durante ataques a
grupos rivais. A AGT listou alguns bairros que oferecem mais riscos à categoria,
entre eles Itapuã, Boca do Rio, Cidade Nova e Cabula.
Na era do Big Brother,
onde a tecnologia precisa andar lado a lado com a segurança pública, por que as
1.500 câmeras inteligentes da SSP não funcionam como deveriam? Se há uma
atitude suspeita, por que não deslocar uma viatura mais próxima para averiguar
aquele casal, aquela moto? É preciso acontecer, para ter repercussão e só assim
tomar providência?
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Vira-casaca: líder do CV era BDM
Trairagem é um prato
que se come frio e não seria diferente com o traficante Robson Costa Uzeda da
Silva, morto pela polícia no último dia 3, na Avenida Centenário. Quando estava
no Bonde do Maluco (BDM), ele foi passado para trás pelos comparsas e mudou de
lado, tornando-se um dos homens mais cruéis do Comando Vermelho (CV) no Brongo,
no bairro do Engenho Velho de Brotas.
Ele passou a
frequentar o Rio de Janeiro, onde em 2021 foi preso em Cabo Frio. Lá, ele foi
condenado por tráfico de drogas e lavagem de dinheiro. Já na Bahia, em 2018,
Robson tentou subornar um policial com R$ 18 mil. Agora, resta saber, porque
ele voltou a Salvador.
A operação que
terminou com a morte dele teve participação de agentes daqui e de Valença.
Seria o surgimento de uma articulação entre o CV do Brongo e o Recôncavo?
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Arrastões em Lauro de Freitas
Não é fácil para
ninguém ser recebido com uma arma no meio da rua. Um grupo de criminosos
está praticando uma série de “arrastões” em Lauro de Freitas, Região
Metropolitana de Salvador.
Em um carro vermelho,
os assaltantes abordam as pessoas ali mesmo, na rua, e fazem “a limpa”. Em um
dos casos, aconteceu no dia 1º deste mês, na Rua Almirante Tamandaré, conhecida
como Vila Praiana.
A abordagem gerou um
pânico generalizado.
Fonte: Correio da
Bahia
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