quinta-feira, 5 de setembro de 2024

Soluções contra a escassez de água nas cidades

Seja em Délhi, na Cidade do Cabo ou no México, cada vez mais cidades em todo o mundo estão tendo problemas para abastecer seu número crescente de habitantes com água. Mais de 4 bilhões de pessoas vivem em cidades – e até 2050, estima-se que serão cerca de 6,5 bilhões. De acordo com cálculos das Nações Unidas, até lá mais da metade dos habitantes das cidades poderá sofrer com a escassez de água. A mudança climática só exacerba o problema.

Em casos de escassez crítica, a única solução, geralmente, é racionar a água potável. No longo prazo, muitas cidades já começaram a repensar sua gestão hídrica, com o objetivo de economizar água, adaptar sua infraestrutura e fazer melhor uso das fontes naturais do recurso. Quais soluções funcionam?

<><> Promover a conservação da água em residências particulares

Além da indústria e do comércio, outro setor que também consome muita água é o residencial. No Brasil, o consumo diário per capita médio é de 148,2 litros; nos EUA, chega a 300 litros. Chuveiros (40%), descargas de banheiro (30%) e máquinas de lavar (13%) têm o maior peso no consumo. Apenas 4% da água é utilizada para cozinhar e beber.

Campanhas de conscientização podem levar as pessoas a economizarem água. E caixas de descarga, chuveiros e máquinas de lavar mais eficientes podem reduzir pela metade o que consumo de água desses dispositivos.

A Cidade do Cabo, que há anos enfrenta problemas de água, resolveu focar na conscientização e na modernização. A cidade lançou reparos de encanamento gratuitos em residências de baixa renda e aumentou os preços da água ao consumidor para incentivar as pessoas a economizarem. Em 2018, um ano de seca, a cidade conseguiu reduzir o consumo para uma média de apenas 50 litros por pessoa.

A cidade canadense de Vancouver também tem se preparado para o cenário de aumento do estresse hídrico. Para reduzir o consumo, a água fornecida pelo município custa 25% a mais no verão, que é seco, do que no inverno, que é chuvoso.

<><> Manutenção das redes de tubulação e modernização da infraestrutura

Canos com vazamentos e uma rede de tubulação antiquada levam a grandes perdas de água. Em toda a Europa, mais de um quarto da água potável é perdida dessa forma, e, em algumas cidades do mundo, até 60% da água sequer chega à torneira. Muitas dessas perdas poderiam ser evitadas com o simples reparo das tubulações.

Um exemplo disso é Tóquio, uma das cidades mais densamente povoadas do mundo. Até algumas décadas atrás, a metrópole japonesa tinha de 15% a 20% de perdas devido a vazamentos de canos – atualmente esse percentual é inferior a 3%. A rede de tubulação de mais de 27 mil km é constantemente monitorada para localizar vazamentos e, se necessário, substituída. É uma evidência de quão importante se torna o gerenciamento eficiente da água urbana para atender à crescente demanda em todo o mundo.

Em novas construções, tubulações também podem ser melhor planejadas para evitar perdas de água.

Em muitas cidades, no entanto, ainda falta uma infraestrutura hídrica adequada, especialmente em favelas que crescem rapidamente. Bairros mais ricos, por outro lado, geralmente têm um melhor abastecimento.

<><> Utilizar a água da chuva e reutilizar a água residual tratada

Em vez de gastar a preciosa água potável para tudo, vale considerar também a utilização da água da chuva coletada ou da água residual purificada, chamada de água cinza, para dar descarga em banheiros, usar máquinas de lavar ou na indústria.

Nos bairros novos de Melbourne (Austrália) e de Aarhus (Dinamarca), por exemplo, a água da chuva é drenada das ruas e calçadas, filtrada e usada nos edifícios vizinhos. Em muitas cidades dos EUA, Índia, Taiwan, Espanha e Turquia, o aproveitamento da água da chuva agora é requisito obrigatório na construção de novos edifícios.

Em vez de despejar as águas residuais nos rios após o tratamento, muitas cidades estão agora promovendo sua reutilização. Um terço da água em Pequim, por exemplo, é água residual reciclada. Ela é usada principalmente para vegetação, limpeza de ruas, lavagem de carros e descarga de banheiros.

Já em Madri, águas residuais tratadas são usadas para irrigar os parques da cidade, enquanto que, em Singapura, elas são até mesmo transformadas em água potável por meio de um estágio adicional de purificação.

<><> Economizar água com o modelo de cidade-esponja

Embora falte água nos períodos de seca, o número de chuvas fortes seguidos de inundações está aumentando. Nas cidades, o problema é agravado por sistemas de esgoto sobrecarregados e pelo excesso de superfícies impermeáveis, que não permitem que a água da chuva escoe de forma suficientemente rápida. Aqui destacam-se Wuhan, na China, e Singapura, pioneiras no conceito de cidade-esponja.

Em ambas as cidades, foram criados locais onde o excesso de água da chuva pode ser armazenado – desde bacias de captação subterrâneas até faixas e telhados verdes onde a água da chuva pode escoar. O calçamento permeável de ruas também ajuda na infiltração da água.

A água coletada pode ser reutilizada, e a vegetação urbana adicional ajuda no resfriamento.

Só na China existem mais de 60 cidades-esponja, e o conceito vem sendo usado em todo o mundo para o redesenvolvimento urbano. Na Europa, a capital dinamarquesa, Copenhague, está sendo remodelada dessa forma.

<><> Regeneração de reservatórios naturais e proteção de fontes de água

O mais importante para as cidades é proteger e regenerar as suas fontes naturais de água.

A capital colombiana, Bogotá, por exemplo, recebe 80% de sua água da paisagem montanhosa vizinha, um ecossistema único, com pântanos e lagos. No entanto, o uso excessivo da terra para agricultura está comprometendo esse abastecimento natural. Para combater o problema e regenerar essas fontes hídricas, o órgão fornecedor de água na Colômbia aposta na compra de terras e no aumento da conscientização.

Outra solução é a remoção de plantas de elevado consumo de água na área de captação de água. Na Cidade do Cabo, por exemplo, muitos pinheiros e eucaliptos de uma região foram substituídos pelo plantio do arbusto nativo fynbus, que necessita de menos água.

 

•        Metade da população somali não tem acesso a água potável

Metade da população da Somália não tem, presentemente, acesso a água potável e as crianças no país sofrem de cólera e desidratação. Com esses fundamentos, foi lançada uma petição que pretende angariar fundos para o abastecimento de água naquele país africano.

“A Somália tem água doce, mas é muito profunda, o que torna difícil a sua extração. As empresas vendem-na a preços elevados e, em algumas aldeias, um litro de água custa mais do que em Miami”, diz uma nota da organização não-governamental (ONG) Avaaz enviada ao 7MARGENS.

Perante esta realidade, a Durdur, uma outra ONG financiada diretamente pelos membros da Avaaz, lançou um projeto inicial de abastecimento de água potável à população.

A Avaaz apela a que sejam feitos donativos para que esta pequena ONG “possa comprar o equipamento de perfuração e os camiões-cisterna necessários para abastecer milhões de pessoas com água”. “Também ajudaremos a financiar as análises ambientais antes da perfuração, o recrutamento de pessoal local e as campanhas da Avaaz para tornar a água potável acessível a todos”, afirma a Avaaz.

“Na Somália, 40% das fontes de água existentes estão fora de serviço. A inação das autoridades públicas, combinada com as repercussões catastróficas das alterações climáticas, está a permitir que as empresas enriqueçam, colocando as famílias perante escolhas impossíveis”, diz a organização, sobre o contexto em que aquele país se encontra.

Sob o lema “Sem água, morremos”, a Durdur promove a perfuração de “furos, constrói estações de tratamento e fornece água a casas, escolas e centros de saúde para que mesmo os mais vulneráveis possam ter acesso a água limpa”.

Dados científicos, afirma a Avaaz, dizem que as alterações climáticas aumentaram em 100 vezes o risco de seca na Somália. Mais uma razão para ser feita uma doação à Durdur, argumenta a organização.

 

•        Os estudantes que querem ajudar a mitigar a crise mundial da água

Consciencializar a sociedade sobre a crise mundial da água e contribuir para a combater são os grandes propósitos do Nova Thirst Project. Sediado na Nova School of Business and Economics (Nova SBE, a escola de Economia da Universidade Nova de Lisboa, que agora usa uma designação em inglês), em Carcavelos, este projeto, dinamizado por estudantes universitários já permitiu a construção de um furo de água potável, no Reino de Essuatíni (antiga Suazilândia, na África Austral) permitindo levar água a 500 pessoas durante 40 anos.

Miguel Ferreira, responsável pelas relações externas do Nova Thirst Project, confirma, em declarações ao 7MARGENS o êxito que esta iniciativa tem conquistado: “A verdade é que já mudámos a vida de algumas comunidades porque quando construímos um poço acabamos mesmo por ter impacto em toda a comunidade envolvente do lugar onde o poço é construído.” O estudante da Nova não deixa ainda de referir o contexto muito precário em que vivem as populações que o projeto procura auxiliar: “Relativamente a esta comunidade em que nós atuamos, o Reino do Essuatíni, crianças e mulheres, que são os grupos mais afetados com esta crise de água mundial, costumam diariamente andar seis a oito horas para obter água e, muitas vezes, essa água não é potável, está cheia de um conjunto muito vasto de [agentes de transmissão de] doenças e acaba por ser mais perniciosa do que benéfica para a vida das pessoas.”

Através da organização de várias iniciativas, como vendas de bolos ou um torneio de padel e também de doações em missas, estes jovens conseguiram angariar 4520€ no semestre universitário que terminou no passado mês de junho. Isso permitiu atingir a meta do valor necessário (aproximadamente 12 mil euros) para a construção de um segundo furo de água potável. Esta verba será, depois, enviada para a sede do Thirst Project, nos Estados Unidos da América, a partir de onde é feita a gestão do dinheiro recolhido, mas não sem antes passar pelo crivo do Thirst Project Portugal (TPP), a delegação do projeto a nível nacional. “Esta gestão inclui a identificação das comunidades de Essuatíni que mais necessitam de um furo, executar a construção do furo em si e assegurar a manutenção do mesmo”, refere o estudante da escola de Economia e Negócios da Nova.

<><> 785 milhões sem acesso a água em todo o mundo

Em Portugal há diversos polos do Thirst Project: além do núcleo da Universidade Nova, há grupos também em várias escolas secundárias, na Faculdade de Ciências e Tecnologias da Universidade Nova de Lisboa, no Instituto Superior Técnico (TagusPark e Alameda), na escola de Direito (designada também em inglês, School of Law) da Nova, na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, na Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa, Politécnico de Viseu, ISCTE, Universidade de Aveiro, Instituto Superior de Economia e Gestão, Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e Universidade da Beira Interior, entre outras.

O Thirst Project mundial encontra-se, presentemente, a atuar em quatro países (Essuatíni, Uganda, El Salvador e Kenya), mas desenvolve a maior parte do seu trabalho no país da África Austral entalado entre Moçambique e a África do Sul. Os polos do projeto em Portugal estão apenas a atuar em benefício do Essuatíni.

De acordo com um relatório de 2017 da Organização Mundial da Saúde e da Unicef, apenas 69% da população do Essuatíni tem acesso a serviços básicos de água, enquanto apenas 58% tem acesso a serviços sanitários. O mesmo documento revela que apenas em 24% das casas no país se pratica a lavagem das mãos. Estes valores realçam a urgência de fornecer água limpa como uma medida essencial para melhorar as condições de vida e saúde da população, diz o projeto.

Estima-se que, atualmente, 785 milhões de pessoas não têm acesso a água de forma segura e limpa, a nível mundial.

 

Fonte: Deutsche Welle/7Margens

 

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