quinta-feira, 5 de setembro de 2024

São Paulo como laboratório das entranhas da extrema-direita e dos novos intentos do bonapartismo judiciário

A ideia de uma normalização do país com a entrada do governo Lula se sustentou por algum tempo, até mesmo depois dos poucos meses de lua de mel. O governo enfiou goela abaixo um arcabouço fiscal que ataca a saúde e a educação, um arrocho salarial na greve das universidades e institutos federais e mesmo depois da catástrofe ambiental no Rio Grande do Sul segue se vangloriando do Plano Safra que nunca enriqueceu tanto o agronegócio. As coligações do PT com o PL de Bolsonaro em mais de 80 cidades são também expressão disso. De normalização não havia nada, mas se tratava de governar para os capitalistas seguirem lucrando através do aumento da taxa de lucro advinda do suor da classe trabalhadora, o que só é possível seguir de tal maneira com a manutenção das reformas aprovadas como fruto do golpe institucional que tirou Dilma Rousseff do poder, e que Lula nunca revogou apesar de já estar há um ano e meio no poder.

Porém, com um regime político degradado que fez absolutamente todo o tipo de manobra autoritária para superexplorar a classe trabalhadora e manter os lucros capitalistas, não é possível nenhum tipo de normalização. A conciliação de classes que pratica a Frente Ampla é uma ilusão e fortalece sempre os setores mais reacionários que vão nos atacar. Desde o golpe institucional a bandeira da “defesa da democracia” sempre foi uma defesa das instituições deste regime político degradado considerando que este regime e suas instituições poderiam enfrentar a extrema-direita. Porém, o suposto enfrentamento à extrema-direita foi sempre uma tentativa de mão dupla: por um lado tentar incorporá-la, como parte das instituições e, por outro lado, fortalecer os mecanismos autoritários e repressivos que, a qualquer momento, pudessem novamente ser utilizados contra a classe trabalhadora.

É isto que explica a localização de Tarcísio de Freitas como expressão máxima da extrema-direita que “aceitou o jogo do regime político” jogando por dentro das instituições. Ele não somente faz parte do regime, se utiliza das instituições para atacar a classe trabalhadora, mas governa em base a um pacto com Lula que através do BNDES financia as privatizações dos bastiões dos serviços públicos em São Paulo enquanto o Republicanos, partido de Tarcísio, tem Ministério no governo de Lula. Tarcísio está, ao mesmo tempo, lado a lado com Bolsonaro, que, para ele, deveria ser o candidato à presidência em 2026. Este que, inelegível, precisa agora fazer acordos com candidatos do centrão, como Ricardo Nunes, para negociar sua liberdade para voltar a se eleger. São as consequências do pós 8 de janeiro, quando sua base mais radicalizada fracassou em radicalizar contra este regime que estava fortalecido em seu autoritarismo.

Esta institucionalização das alas da extrema-direita abre espaço para novos fenômenos, também importados dos Estados Unidos, como Pablo Marçal e seu empreendedorismo anti-operário para fazer os trabalhadores trabalharem até morrer. Mas principalmente tenta reformular a maneira de fazer política convencional para a qual nem essa extrema-direita institucionalizada estava preparada, nem a Frente Ampla. Mas não nos enganamos. São distintos tons de bolsonarismo que estão em jogo. Marçal e Nunes expressam as distintas tonalidades dos que querem superexplorar, privatizar, terceirizar e acabar com os direitos da classe trabalhadora, das mulheres, dos negros, indígenas e LGBTs. A política de conciliação de classes só fortaleceu setores como eles.

Neste momento em que a extrema-direita, dividida eleitoralmente, buscará se unificar em um ato pela “liberdade” no próximo 7 de setembro, a Frente Ampla estará de mãos dadas com o regime político e suas instituições como o STF, que atuaram há poucos anos atrás pela prisão arbitrária de Lula e por inúmeras medidas arbitrárias e aberrantes. Quando existe por parte da extrema-direita uma reação contra a institucionalização de seus principais líderes, não vemos o mesmo no caso dos setores da esquerda, deixando o discurso anti-sistêmico na boca de um “coach” capitalista.

Para conter Pablo Marçal, na medida em que ele parecer perigoso demais para o mercado financeiro e para as instituições do regime político que pós-golpe institucional só querem a extrema-direita domesticada, o regime se utiliza de mais autoritarismo judiciário. Cada aplauso para as medidas autoritárias contra a extrema-direita fortalece as instituições que amanhã estarão novamente arrebentando piquetes, descendo cassetetes em professores, prendendo grevistas. Vão também querer banir redes sociais da esquerda que se reivindica revolucionária com a falácia de que isso é “em defesa da democracia”. Vão forjar novas Lava Jato. Todo este embate de Alexandre de Moraes com medidas em relação a plataformas de redes sociais somente aumentam o poder autoritário do judiciário a serviço dos interesses de outra classe. Nenhum aplauso para o judiciário que nos ataca, recentemente utilizado para declarar a greve dos servidores ambientais ilegal.

Ao mesmo tempo, Ricardo Nunes quer aparecer como “supostamente moderado” frente a “extremos” já que derrotaria ambos no segundo turno, quando na realidade como apontamos é apenas mais um tom de bolsonarismo. Justamente o prefeito que está destruindo São Paulo ao ajudar em todas as privatizações contra a classe trabalhadora e a população, e que governará junto com Bolsonaro e Tarcísio. Bolsonaro, e seus filhos, entre ataques e afagos, vão buscar o melhor caminho para se alçarem por cima das eleições e manter sua “hegemonia” na extrema-direita tendo o 7 de setembro, até o momento, como seu “trunfo”, mobilizando nas ruas.

Para enfrentar esses inimigos, é no mínimo um erro grotesco, estar ao lado de golpistas que apoiaram o principal empreendimento da direita no Brasil que foi o golpe institucional, que abriu espaço para toda essa situação política. Mas vale relembrar que até poucos meses a vice na chapa Boulos, Marta Suplicy, além de golpista, era Secretária de Ricardo Nunes. Boulos não está somente ao lado dela, mas recrutou para seu gabinete um coronel da Polícia Militar que era Comandante da Rota na ocasião da chacina de Osasco e Barueri. Boulos considera que para derrotar essa extrema-direita ele deve jogar o jogo dos capitalistas, responsável por novas caras da extrema direita, nós consideramos que devemos apostar na força da nossa classe e dos setores oprimidos. Não é à toa que tanto Boulos quanto Tábata para atacar Marçal o chamam de bandido, mas nunca falam o que ele defende efetivamente que é o “empreendedorismo” para superexplorar a classe trabalhadora.

Contra todo o bolsonarismo unificado em todo o país no próximo 7 de setembro, seria fundamental as centrais sindicais saírem do modo eleitoral e organizarem uma luta contra o programa ultra-neoliberal de Marçal, Bolsonaro, Nunes e Tarcísio. Revogação imediata de todas as reformas: reforma trabalhista, reforma da previdência, novo ensino médio, lei da terceirização irrestrita. Pela revogação do arcabouço fiscal. Não ao Plano Safra que sustenta os incêndios criminosos, plano de emergência já. Atendimento imediato das reivindicações das greves em curso. Fim da terceirização e efetivação dos terceirizados, plenos direitos aos entregadores e fim da uberização. Nenhum corte na educação e na saúde, mais verbas para as universidades federais e estaduais seguindo o exemplo da luta da UERJ. Um programa operário para atender as demandas da nossa classe.

 

•        Marçal manda recados a Moraes e atiça o Senado contra o STF. Por Moisés Mendes

Esqueçam as lacrações que o próprio Pablo Marçal define como idiotas e prestem atenção no que importa. O que interessa agora é que o sujeito se apresentou no Roda Viva como candidato a protagonista do cenário nacional.

O ex-coach elevou o padrão dos seus recados e ergueu o dedo, olhando para a câmera, na direção de Alexandre de Moraes. Leiam o que ele disse, apenas parecendo que falava de forma genérica contra o Supremo.

Vamos pôr em ordem a sequência de lacrações, para facilitar o serviço. A primeira frase: “Por favor, Congresso Nacional, se levantem”. A segunda: “O Supremo está muito político”.

A terceira: “Com todo respeito aos 11 togados na Suprema Corte, esse é um recado meu pessoal para vocês. Já passou essa onda. O Brasil precisa ser unificado, a gente precisa baixar essa pressão”.

A quarta lacração: “Não precisamos ter uma corte política. Vamos voltar a defender a suprema carta, a nossa Constituição Federal de 1988. Ela precisa ser defendida por vocês. Não precisa legislar nem atuar politicamente”.

A quinta lacrada, essa dirigida ao Senado: “Faço aqui um clamor aos 81 senadores. Se o povo está dizendo o que precisa ser feito, que vocês assumam aquilo que o povo tá falando. Que vocês se levantem”.

Marçal fez as lacrações depois de vacilar um pouco, diante das provocações da bancada de jornalistas. Parecia não querer criticar Moraes. Aplicou alguns dribles, mas no fim falou em direção à câmera dando recados ao ministro.

Não citou seu nome, porque qualquer idiota entenderia, mas fez referências ao vazamento de informações trocadas entre assessores de Moraes, no caso que a Folha tentou transformar no escândalo do desrespeito aos ritos.

Queixou-se dos prejuízos com a retirada do X do ar. E chegou a sugerir que o Conselho Nacional de Justiça investigue o ministro, mesmo que o CNJ não tenha autoridade para tanto.

O candidato do PRTB disse três vezes que o Senado (citado uma vez como Congresso) precisa se levantar e repetiu duas vezes que estava dando um recado direto aos ministros do Supremo.

Não estava fazendo alertas à mais alta corte do país na condição de coach, porque se nega a ser definido como tal, mas como “jurista com cinco anos de academia” e como educador.

O jurista Marçal entrou na arena já lotada pelas matilhas que cercam Moraes, dando voltas que pareciam direcionar seus ataques a todo o STF. Mas o alvo prioritário era ululantemente Moraes.

Teve o cuidado de amarrar as lacrações com o conselho ao Senado, para que ouça o povo, com o detalhe da mão no ouvido. Um pedido feito na forma de clamor aos políticos que têm o poder de dar encaminhamento ao impeachment de Moraes.

Marçal quer o impeachment? Não, de jeito nenhum, porque disse já ter muitos inimigos e não pode enfrentar o Supremo, não agora, mas mais adiante, como você verá ao final desse texto.

Diante do questionamento de Malu Gaspar, do Globo, se estava defendendo a cassação de Moraes, esclareceu: “Quem defende o impeachment é o Senado”. Ele, de forma alguma.

Foi também como jurista que deu uma aula aos jornalistas, falando da cassação de Dilma Rousseff pelo Congresso, para acentuar que um impeachment é um processo “político-jurídico”.

Para encerrar, aí vai a última lacração, com mais um dedo na cara de Moraes e do STF: “Daqui a 35 dias eu tô eleito prefeito da cidade de São Paulo, e aqui vou mandar um recado para a suprema corte. Vamos fazer uma política diferente, não dá pra ser desse jeito. Se não, a gente vai atrapalhar o crescimento desse país”.

Não precisa traduzir, mas esse é o alerta: com o poder de prefeito de São Paulo, o ex-coach poderá orientar o STF a não continuar agindo desse jeito. Porque seu projeto é nacional.  

Foi interrompido pela mediadora Vera Magalhães e só assim parou de mandar recados já em tom de ameaça. Se não tivesse sido alertado de que estava passando dos limites, continuaria atacando. Até onde?

Foi esse um dos poucos erros de condução da entrevista. O momento em que a mediadora tirou o embalo de Marçal, que parecia caminhar em direção a um precipício. Carregando Bolsonaro nos braços.

 

Fonte: Esquerda Diário/Brasil 247

 

Nenhum comentário: