quarta-feira, 11 de setembro de 2024

Richard D. Wolff: ‘À medida que o império dos EUA declina -  para onde ele está nos levando?’

As evidências sugerem que os impérios muitas vezes reagem a períodos de declínio por meio da superextensão dos seus mecanismos de enfrentamento. Ações militares, problemas de infraestrutura e demandas de bem-estar social podem então se combinar ou colidir, acumulando custos e efeitos adversos que o império em declínio não pode gerenciar. Políticas que visavam fortalecer o império — e que antes funcionavam — agora o enfraquecem. Mudanças sociais contemporâneas dentro e fora do império podem reforçar, retardar ou reverter o declínio. No entanto, quando o declínio leva os líderes a negarem a sua existência, ele pode se acelerar. Nos primeiros anos dos impérios, líderes e liderados podem reprimir aqueles que enfatizam ou simplesmente mencionam o declínio. Problemas sociais podem ser igualmente negados, minimizados ou, se admitidos, culpados em bodes expiatórios convenientes — imigrantes, potências estrangeiras ou minorias étnicas — em vez de serem vinculados ao declínio imperial.

O império dos EUA, proclamado audaciosamente pela Doutrina Monroe logo após duas guerras de independência vencidas contra a Grã-Bretanha, cresceu ao longo dos séculos XIX e XX e atingiu seu auge durante as décadas entre 1945 e 2010. A ascensão do império dos EUA coincidiu com o declínio do império britânico. A União Soviética representou desafios políticos e militares limitados, mas nunca uma competição ou ameaça econômica séria. A Guerra Fria foi uma disputa desigual cujo resultado estava programado desde o início. Todos os potenciais concorrentes ou ameaças econômicas ao império dos EUA foram devastados pela Segunda Guerra Mundial. Nos anos seguintes, a Europa perdeu as suas colônias. A posição global única dos Estados Unidos na época, com a sua posição desproporcional no comércio e no investimento mundial, era anômala e provavelmente insustentável. Uma atitude de negação na época de que o declínio era quase certo transformou-se facilmente na atitude de negação agora que o declínio está bem encaminhado.

Os Estados Unidos não conseguiram prevalecer militarmente sobre toda a Coreia em sua guerra de 1950-53. Os Estados Unidos perderam suas guerras subsequentes no Vietnã, Afeganistão e Iraque. A aliança da OTAN foi insuficiente para alterar qualquer um desses resultados. O apoio militar e financeiro dos EUA à Ucrânia e a massiva guerra de sanções dos Estados Unidos e da OTAN contra a Rússia são, até agora, fracassos e provavelmente continuarão assim. Programas de sanções dos EUA contra Cuba, Irã e China também falharam. Enquanto isso, a aliança BRICS contrapõe-se às políticas dos EUA para proteger o seu império, incluindo a sua guerra de sanções, com eficácia crescente.

Antes da Primeira Guerra Mundial, circulavam teorias de que a evolução das corporações multinacionais a partir das megacorporações nacionais reduziria ou acabaria com os riscos de guerra. Proprietários e diretores de corporações cada vez mais globais trabalhariam contra a guerra entre países como uma extensão lógica de suas estratégias de maximização de lucros. As duas guerras mundiais do século minaram a aparência de verdade dessas teorias. Da mesma forma, o fato de que as megacorporações multinacionais passaram cada vez mais a comprar governos e subordinar políticas de Estado às estratégias de crescimento concorrentes dessas corporações. A competição capitalista governava as políticas de Estado tanto quanto o contrário. Dessa interação, surgiram as guerras do século XXI no Afeganistão, Iraque, Síria, Ucrânia e Gaza. Da mesma interação, emergiram também as tensões entre EUA e China em torno de Taiwan e do Mar da China Meridional.

 

¨      Os patrões do mundo na pirataria mundial. Por Ronaldo Lima Lins

O cenário que se instalou no planeta depois da II Grande Guerra, em parte em função da grandeza de um estadista como Franklin Roosevelt, terminou por criar em nossos dias algumas anomalias dignas de registro. Os EUA saíram do patamar de liderança reconhecida para uma presença imposta. As bombas atiradas em Nagasaki e Hiroshima contribuíram para isso. Não se podia enfrentar o poderio de uma nação assim, a não ser pela contraposição da União Soviética, outra potência nuclear de destaque, fruto da luta contra os nazistas. Agora, com o surgimento, de início enfraquecido, da Federação Russa, Washington acreditou que ninguém mais lhe faria frente. Como consequência, vieram os desmandos. Sanções de punição a rebeldes em relação a suas determinações provocaram efeitos parciais, aumentando a importância da Casa Branca, mesmo quando errava fragorosamente. Para não falar em Cuba, a estratégia se repetiu com a Venezuela e, em seguida, com a própria Rússia. 

No entanto, as determinações de um mau patrão, como em qualquer empresa, geram desgastes. Armamentos podem ser superados, desde que com recursos financeiros e ciência para o fazer. No exemplo dos conflitos com a Ucrânia, premida pelas sanções, Moscou virou-se para o outro lado. Estreitou relações com a China e a Índia, para não mencionar demais clientes naquela parte do continente. Claro que o esquema fracassou. O que fazer? Invadir um país com as dimensões da Rússia? Decretar uma Terceira Guerra com adversários de arsenal atômico? Só um louco devanearia com uma hipótese dessas.  Enquanto isso, os patrões(!) prosseguem queimando sua imagem pelas bordas da relação internacional. A Venezuela, depois de eleições apenas contestadas por ingênuos ou por gente comprometida com o outro lado, parecia um adversário fácil. Ideia suficiente para que, além das medidas econômicas, os Estados Unidos dessem um passo à frente, agora resvalando na pirataria: apreenderam um avião de Maduro, pousado na República Dominicana. Apoderaram-se da aeronave e a levaram para a Flórida. Para eles, pelo visto, não há leis que coíbam confisco de bens estrangeiros, à semelhança dos bandidos da Somália abordando e saqueando navios que logram alcançar.  Na verdade, não existem argumentos que justifiquem tal barbaridade. Apropriações indébitas de propriedades privadas de outro estado não podem e não devem ser adquiridas a não ser através de entendimento mútuo. Nesse sentido, Trump, o candidato republicano, fez coro ao clamor erguido em toda parte. Condenou os democratas pelo absurdo. Eles, os norte-americanos, que se acenavam como exemplos de democracia, em contraposição com dirigentes ilegítimos, aderem de repente ao crime como se não tivessem opinião pública para condená-los. Maduro grita com razão. Observadores neutros, também. Sabe-se, estudando história, que os patrões injustos um dia são derrubados. Exemplos não faltam. Basta esperar para ver...

 

•        Golfo Árabe foge do eixo 'Washington-Bruxelas' ao chamar Brasil, Rússia e Índia para fórum econômico

O Brasil participou nesta segunda-feira (9) da 161ª reunião ministerial do Conselho de Cooperação do Golfo (CCG), em Riad, Arábia Saudita. Junto da Rússia e da Índia, também convidadas para o evento, a ocasião marca um protagonismo ascendente do BRICS no cenário mundial, apontam analistas.

Enviado ao encontro, o ministro das Relações Exteriores do Brasil, Mauro Vieira, se reuniu não só com seus homólogos do mundo árabe no fórum e em reuniões bilaterais, mas também com os chanceleres da Rússia, Sergei Lavrov, e da Índia, Subrahmanyam Jaishankar.

Fazem parte do Conselho de Cooperação do Golfo Arábia Saudita, Bahrein, Catar, Emirados Árabes Unidos, Kuwait e Omã. Criado em 1981, o CCG tem como objetivo promover a integração regional entre os países em temas de política, infraestrutura, legislação, energia, defesa, ciência e, principalmente, economia.

Não é sempre que os países do Conselho de Cooperação do Golfo convidam outros Estados para suas reuniões. Mais raro ainda é quando esse convite é estendido a nações geograficamente distantes, como é o caso dos três visitantes desse encontro: Brasil, Rússia e Índia.

Analistas entrevistados pela Sputnik afirmaram que a aproximação desse grupo de países não só representa benefícios para o Brasil, como também é um reflexo de uma mudança que aflora na geopolítica do planeta.

Brasil e Golfo Árabe: cooperação além da economia

Os países do Conselho de Cooperação do Golfo são um importante parceiro comercial do Brasil, com uma balança comercial que ultrapassou US$ 16 bilhões (R$ 89 bilhões) no ano passado, sendo US$ 9,3 bilhões (R$ 51 bilhões) em exportações e US$ 6,7 bilhões (R$ 37 bilhões) em importações, segundo dados do Itamaraty.

"Os países-membros do CCG são em conjunto o quinto maior mercado para as exportações brasileiras", afirma à reportagem Silvia Ferabolli, doutora em política e estudos internacionais pela Escola de Estudos Orientais e Africanos da Universidade de Londres, e coordenadora do Núcleo de Pesquisa sobre as Relações Internacionais do Mundo Árabe (Nuprima), da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

Dentro desse grupo, naturalmente por ter o maior território e a maior população, a Arábia Saudita tem mais destaque. "A Arábia Saudita está para o Golfo como o Brasil está para o Mercosul", equipara a professora.

Dessa forma, a presença brasileira na 161ª reunião ministerial do CCG não só reforça os laços econômicos que o país tem com a Casa de Saud, mas também deixa claro para os demais países do golfo Árabe que o Brasil quer estreitar relações com todos da região.

"O Brasil está de olho nos investimentos dos fundos soberanos dos Emirados Árabes Unidos, do Catar, do Kuwait, países que estão se dando conta de que o fim da era dos combustíveis fósseis está se aproximando."

"Eles sabem que o recurso sobre o qual se assenta toda a riqueza deles é um recurso finito e, por isso, eles precisam garantir a sobrevivência do Estado através de investimentos em vários lugares do mundo. E o Brasil hoje tem esse lugar privilegiado porque é um dos garantidores da segurança alimentar do Golfo", explica Ferabolli.

Esses investimentos visam não só diversificar a economia dos países, como também gerar emprego para os cidadãos, uma vez que o crescimento populacional tornou impossível empregar a todos no maquinário estatal, destaca a pesquisadora do Nuprima.

"Hoje eles investem no desenvolvimento da indústria nacional e precisam de mercados para exportar. E o Brasil vai ser um desses mercados."

"Se o Brasil quiser estabelecer uma relação de equilíbrio com os países-membros do Conselho de Cooperação do Golfo, ele vai ter que dar um jeito no déficit da balança comercial para o lado do CCG. Ou seja, o Brasil vai ter que comprar mais."

Além da área econômica, Ferabolli sublinha que a aproximação do Brasil com a região é bastante significativa na esfera política, uma vez que a Arábia Saudita e os Emirados Árabes Unidos foram convidados a se juntar ao BRICS, grupo de países emergentes que lideram a luta pelo multilateralismo.

O mesmo é ressaltado por Charles Pennaforte, professor da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e coordenador do Laboratório de Geopolítica, Relações Internacionais e Movimentos Antissistêmicos (LabGRIMA).

Além do Brasil, outros dois membros fundadores do BRICS, Rússia e Índia, estiveram presentes nesse encontro, revelando o caráter de diálogo Sul-Sul do evento e demonstrando, "sem dúvida nenhuma, o aumento no protagonismo desses países por meio do BRICS, que alcançou uma força muito grande", diz Pennaforte.

"Mostra também uma diversificação dos países do Golfo, em tentar fugir um pouco dessa dinâmica de ligação muito acentuada com o eixo Washington-Bruxelas."

De certa maneira, compara o coordenador do LabGRIMA, o Sul Global é uma versão do século XXI do movimento dos não alinhados durante a Guerra Fria. Nesse sentido, o Oriente Médio "tem essa percepção clara de apresentar uma política externa de modo independente que priorize o novo polo de poder que está se formando".

 

Fonte: Sputnik Brasil

 

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