Liderança indígena denuncia governo por
privilegiar o agronegócio; Lula presente se enfureceu
Em pleno evento
oficial, a liderança Yakui Tupinambá fez críticas ao Congresso, ao Judiciário e
ao governo de Luiz Inácio durante um evento no dia 12 de setembro, no Rio de
Janeiro. Luiz Inácio, que estava presente, se enfureceu e atacou a liderança.
O evento era uma
entrega de um Manto Tupinambá que estava em museu na Dinamarca e foi devolvido
ao Brasil. A liderança indígena Yakui Tupinambá pediu permissão para “quebrar o
protocolo” durante o discurso e abriu as críticas. “Temos hoje o pior Congresso
da história da República”, começou. “Um Judiciário egocêntrico e parcial”. “E
um governo, que sabemos o motivo senhor presidente, enfraquecido, acorrentado,
que faz alianças e conchavos para se manter no poder”.
Takui atacou ainda a
falta de uma política de entrega de terras. Segundo ela, seu povo, que vive em
território delimitado, aguarda desde 2009 a demarcação das terras por parte da
presidência da república e do ministério da Justiça.
O monopólio de
imprensa também foi alvo de suas justas críticas. “[Temos] ainda uma quantidade
considerável de veículos de imprensa que faz o papel sujo para o sistema
dominante”, diz. “Vivemos em uma democracia distorcida”.
Luiz Inácio não falou
nada durante o discurso. Quando assumiu o púlpito, fez questão de atacar
diretamente Takui e seu discurso.
“Eu queria apenas que
a companheira que falou aqui, mudasse o seu discurso”, começou. Aos berros e
gesticulando, prosseguiu: “Aqui não tem subserviência para ficar no poder! Eu
não preciso disso. O que tem é inteligência política, para saber que eu tenho
um partido com 70 deputados, em 513, eu tenho nove senadores, em 81!”. “E pra
aprovar as coisas eu sou obrigado a conversar com quem não gosta de mim”,
arrematou, como a dar aulas sobre política.
A reação de Luiz
Inácio gerou críticas nas redes sociais. “Lula tem que abaixar muito a bola.
Admitiu ao vivo que tá fazendo um governo de conciliação… Não tem combate, não
tem crítica, não tem nada. É um governo de direita porque se entregou a
conciliação com a direita”, disse um internauta no perfil geopoliticahoje, que
compartilhou o vídeo de Luiz Inácio. “Para mim Lula não entendeu e ainda
confirmou o que a indígena falou”, disse outro.
A revolta de Takui
ocorre em um momento crítico para os povos indígenas brasileiros. O Congresso
Nacional, de fato, moveu ataques sem precedentes contra os povos do campo; no
caso dos indígenas, o marco temporal, apelidado de “PL do genocídio indígena”.
O Supremo Tribunal
Federal (STF), que inicialmente declarou a tese como inconstitucional, agora
concilia com latifundiários para aprovar uma versão “meio a meio”, que não
deixará de tirar direitos dos povos indígenas e paralisar o processo já quase
inexistente de demarcação de terras. Antes do discurso de Takui, a Articulação
dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) rompeu com a Câmara de Conciliação do STF
para o marco temporal com acusações similares às de Takui.
No terreno mais
imediato, em diferentes Terras Indígenas (TIs), as várias etnias têm sido alvo
de bandos paramilitares organizados pelo latifúndio ou mesmo pelas tropas
federais enviadas por Luiz Inácio. É o caso dos Guarani-Kaiowá, no MS, ou dos
Avá-Guarani, no Oeste paranaense.
E Luiz Inácio tem sido
negligente em reverter qualquer um desses pontos. O presidente ainda fomentou
projetos que vão violar direitos indígenas, como a ferrovia Ferrogrão,
incorporada ao Projeto de Aceleração e Crescimento (PAC) e que vai atravessar
diversas TI’s. Luiz Inácio também não se pronunciou sobre a tentativa de
massacre indígena no MS ou sobre a atuação da Força Nacional no PR.
O desmascaramento do
papel latifundista do governo tem crescido entre os movimentos de luta pela
terra. Ainda em 2023, a Liga dos Camponeses Pobres (LCP) convocou “lideranças
camponesas que não dobraram os joelhos, as lideranças de posseiros, os povos indígenas,
as organizações quilombolas, as populações atingidas por barragens, por
mineração e por cultivos de eucalipto, as massas proletárias e demais
trabalhadores da cidade, que cada vez mais lutam em defesa de seus direitos
pisoteados, a cerrar fileiras com nosso bravo campesinato, com o caminho da
Revolução Agrária“.
• Não, presidente Lula, não queremos a
BR-319. Por Txai Suruí
A Amazônia se tornou o
maior emissor de gases de efeito estufa no mundo. Isso se deu devido às
queimadas e à seca extrema que afetam a região e cobriram com fumaça 60% do
país. O dado é do projeto Copernicus, da União Europeia. Só neste ano, até o
dia 9 de setembro, foram 82 mil focos de incêndio na Amazônia, o dobro em
relação ao mesmo período do ano passado.
A região sofre com uma
grande estiagem, que se intensifica a cada estação, tornando secos os rios e
deixando comunidades ribeirinhas e indígenas isoladas, sem acesso a água e
comida. O climatologista Carlos Nobre, numa entrevista, disse estar apavorado e
que não se previu a rapidez com que a crise do clima impactaria os dias atuais.
No entanto, mesmo
diante dessa crítica realidade, o presidente Lula anunciou a retomada da
pavimentação de um trecho da rodovia BR-319, o Lote C, que liga Manaus (AM) a
Porto Velho (RO). Recebeu críticas de ambientalistas e indígenas. A BR-319
ficou intransitável e, por ser economicamente inviável, suas obras foram
abandonadas em 1988. Houve uma retomada com projetos de manutenção no governo
Dilma, que trouxeram o aumento do desmatamento na região.
Em 2020, o Dnit
anunciou a pavimentação do Lote C, em ação classificada pelo Ministério Público
Federal como de “má-fé” e “afronta ao Judiciário” pelo descumprimento de
decisão transitada em julgado que estabelece consulta prévia, livre, informada
e de boa-fé aos povos indígenas impactados e a realização de Estudo de Impacto
Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental (EIA/Rima).
Os documentos anexados
à portaria emitida pelo Dnit não apresentam os estudos ambientais e a consulta
aos povos indígenas. A BR-319 impacta mais de 18 mil indígenas de 63 terras
indígenas (TI), além de outras cinco comunidades e uma população de isolados. A
rota da rodovia afetará um dos blocos mais preservados da Amazônia brasileira.
Além disso, a
pavimentação permitiria e fomentaria a migração de desmatadores do “arco do
desmatamento” para outras regiões. No total, estima-se que cerca de metade da
floresta amazônica brasileira seria impactada, não apenas a borda da BR-319.
O ministro dos
Transportes, Renan Filho, e parlamentares da região argumentam que a rodovia
pode promover a integração e diminuir o isolamento dos estados de Amazonas e
Roraima. Reutilizam o discurso de integração, como quando da colonização da
Amazônia. Os povos indígenas que sofreram massacres e genocídio sabem muito bem
o que a integração significa para seus povos e territórios.
Ao contrário do que
afirmam seus defensores, a BR-319 não traz benefício algum aos povos da região,
que já sofrem com seus impactos e vêm tendo violados seus direitos de consulta,
previstos no artigo 169 da Organização Internacional do Trabalho.
É um absurdo que se
use a situação de emergência vivida pelos povos da região para beneficiar o
agronegócio. Isso apenas trará mais impactos para suas vidas, agravando a
emergência climática. Não se pode combater a crise do clima desrespeitando
direitos indígenas e incentivando projetos que só beneficiam os destruidores da
floresta.
• Sob riscos graves, povos tradicionais
nos mostram o caminho. Por frei Gilvander Moreira
De 9 a 13 de setembro
de 2024 participamos do histórico VII Colóquio Internacional Povos e
Comunidades Tradicionais – Primavera dos Povos Rumo à COP-30: Ancestralidade,
Justiça Climática e Direitos Territoriais! Com este Tema, o VII Colóquio
aconteceu nos três primeiros dias na Unimontes, em Montes Claros, norte de MG,
e nos dois últimos dias, na exuberante Comunidade Quilombola da Lapinha, que,
no município de Matias Cardoso, luta pela demarcação do seu Território
Tradicional, nas barrancas do rio São Francisco no norte de Minas Gerais, já
quase na divisa com a Bahia.
Viajando de Belo
Horizonte para Montes Claros, atravessamos parte da maior monocultura de
eucalipto do mundo, que começa em Sete Lagoas, passa pelo município de Curvelo
com mais de 80% do seu território tomado por eucalipto e se estende pelo Vale
do Jequitinhonha por mais de 500 Km. Lamentavelmente, em Minas Gerais, após a
devastação do Cerrado nas carvoarias para alimentar a fome das caldeiras das
siderúrgicas, no cerrado, mãe das águas, foi implantado, a partir das décadas
de 1970/80, mais de 50% da monocultura de eucalipto do Brasil. “Eucalipto, pau
certo que entorta a vida do povo”, título de uma das muitas Cartilhas produzida
da Comissão Pastoral da Terra em Minas Gerais (CPT/MG). Monocultura de
Eucalipto, vampiros das águas que desertifica os territórios, expropria os
camponeses e os expulsa para as periferias das cidades.
Na BR 135, Rodovia
João Guimarães Rosa, da BR 040 até Montes Claros, em cerca de 300 Km, tivemos
que pagar seis pedágios, cada um a R$9,60.
Total: R$57,60. Experimentamos amputação do direito de ir e vir,
garantido na Constituição de 1988, pois com as rodovias privatizadas sob
concessão, elas deixam de ser bens comuns, condições objetivas para garantir o
direito de ir e vir de todas as pessoas, e passam a ser mercadorias para
empresas angariarem lucro e acumulação de capital, o que restringe muito o
direito de ir e vir do povo empobrecido, pois as passagens ficam mais caras… É
injusto além das Rodovias federais, as estradas estaduais estarem sendo
privatizadas, repassadas para concessão. O justo é estrada feita com dinheiro
do povo pelo governo federal ou pelos governos estaduais continuar sendo bem
comum que garante o direito de ir e vir de todo o povo. Para quem pertence à
pequena burguesia pagar pedágio faz pequena diferença (Os enricados viajam de
avião!), mas para o povo pobre viajar em estradas pedagiadas fica muito mais
difícil. Não podemos achar normal e muito menos justo privatizar as estradas e
pagar pedágio. Injustamente, o desgovernador Zema está empurrando goela abaixo
do povo mineiro mais um projeto truculento, que é o Rodoanel na Região Metropolitana
de Belo Horizonte (RMBH). Será mais uma autoestrada privatizada que será
infraestrutura para a mineradora Vale S/A e outras mineradoras ampliarem
mineração em BH e RMBH, o que é insuportável e insustentável
socioambientalmente. 14,5 milhões de metros quadrados de terrenos já foi
desapropriado por Zema e mais de 15 mil famílias serão desapropriadas para se
construir este famigerado e megalomaníaco Rodominério na RMBH. Os Povos e
Comunidades Tradicionais não foram Consultados, como exige a Convenção 169 da
OIT. Exigimos que o poder judiciário acolha as Ações Civis Públicas da
Federação Quilombola e do Ministério Público Federal que demonstram uma série
de ilegalidades no projeto do “Rodoanel” na RMBH.
No VII Colóquio, foi
maravilhoso ver a sabedoria de pessoas dos Povos e Comunidades Tradicionais, a
coragem na luta por direitos a começar da luta pela demarcação de seus
territórios. Que beleza ouvir mestres da sabedoria das lutas populares como Sr.
Braulino Caetano dos Santos, a Cacica Anália do Povo Indígena Tuxá, o Oscarino
Aguiar Cordeiro, de Serranópolis, no norte de MG e tantos outros/as. Verbalizam
os saberes mais profundos da cultura dos povos originários e tradicionais e
apontam o rumo da luta pelos territórios e por todos os direitos. Beleza também
ver professores/as pesquisadores/as comprometidos/as com a causa dos Povos
Tradicionais e produzindo conhecimento que contribui na luta pela emancipação e
libertação da mãe terra e dos seus filhos e filhas.
Dias 12 e 13 de
setembro de 2024, o VII Colóquio Internacional continuou na Comunidade
Quilombola da Lapinha, em Matias Cardoso, nas barrancas do rio São Francisco,
ao lado do Parque Estadual Lagoa do Cajueiro. Inesquecível a acolhida, a
mística ancestral e a história de luta há mais de 20 anos do Quilombo da
Lapinha. Foi inesquecível e energizante ver lá no Quilombo da Lapinha centenas
de representantes de Comunidades Tradicionais – quilombolas, indígenas de
vários povos, geraizeiros/as, catingueiros/as, groteiros/as, vazanteiros/as,
pescadores/as, estudantes e professores de umas vinte universidades do Brasil e
do mundo, professores da Inglaterra, da Alemanha, da Colômbia e Marta, que veio
de Moçambique e passou uma energia ancestral ao encontrar muitos “parentes” que
foram arrancados da mãe África e jogados nos Navios Negreiros e aqui
escravizados.
Foi revoltante saber
dia 12 de setembro que o desgovernador de Minas Gerais, Romeu Zema, tinha
assinado o decreto Nº 48.893. Em meio à seca histórica e às gigantescas nuvens
de fumaça que cobrem os céus do Brasil e se chover, como uma chuva no Rio
Grande do Sul, que veio com as águas tóxicas com cinzas das queimadas, em
situação de calamidade pública não declarada pelos governos ainda, com o povo
inalando fuligem invisível que se aloja nos alvéolos pulmonares e causa sérias
doenças respiratórias, o governador de Minas Gerais, em mais um ato perverso de
ataque aos Direitos dos Povos e Comunidades Tradicionais e da Natureza,
publicou dia 11/09/2024 um DECRETO, que viola o direito dos Povos e Comunidades
Tradicionais à Consulta Livre, Prévia,
Informada, Consentida e de Boa-fé, e favorece o avanço dos grandes
projetos do capital que causam morte e devastação nos territórios tradicionais
e compromete as condições de vida de
toda a sociedade e da biodiversidade. O Decreto em si já é uma aberração
jurídica, uma vez que a Convenção 169 da OIT da ONU não precisa de
regulamentação para ser plenamente aplicada. Um decreto semelhante a este
editado pelo Governador do Pará já foi anulado. Desde 2003, quando entrou em
vigor no Brasil a Convenção 169 da OIT, suas disposições são obrigatórias e
nenhum órgão governamental pode descumpri-la ou limitar os direitos nela
abarcados. Além disso, não houve nenhuma participação ou Consulta aos Povos e
às Comunidades Tradicionais, violando o artigo 6° da mencionada Convenção. O teor
deste decreto é o praticamente o mesmo da famigerada Resolução da SEDESE/SEMAD
que foi revogada, após muita pressão dos Movimentos Sociais, Povos e
Comunidades Tradicionais. Este Decreto eivado de ilegalidades e de
inconstitucionalidades busca amordaçar e aniquilar os Direitos dos Povos e
Comunidades Tradicionais protegidos pela Convenção 169 da OIT.
Exigimos a imediata
revogação e anulação do Decreto Nº 48.893/2024, garantindo de forma plena o
Direito das Comunidades e Povos Tradicionais à sua autodeterminação. Neste
momento, em que a “terra geme em dores de parto” (Romanos 8,22), é urgente
avançarmos nas lutas concretas nos Territórios, em defesa dos Povos e das
Comunidades Tradicionais e de todos os seres vivos que formam a comunidade que
nutre nossa mãe Terra. É absurdo dos absurdos um Decreto como este em tempos de
Emergência Climática. As sirenes dos eventos extremos estão gritando de forma
estridente. Revogação e Anulação do Decreto 48.893/24, JÁ! Apelamos a todas as
autoridades compromisso com a derrubada deste brutal Decreto.
Senti e observei que
as gigantescas nuvens de fumaça causadas pelos incêndios criminosos que assolam
o Brasil e vários outros países estão mais densas em Belo Horizonte do que nas
pequenas cidades e na zona rural, no Quilombo Lapinha, por exemplo, onde se tem
preservação ambiental, o ar está menos poluído. A capital de São Paulo teve na
última semana o pior ar do mundo, a cidade mais poluída. Ou seja, os povos das
grandes cidades serão os primeiros a adoecer e a morrer na brutal “pandemia dos
incêndios”, ainda não declarada oficialmente, mas já identificada pelo Supremo
Tribunal Federal, sob a liderança do ministro Flávio Dino, que está exigindo
dos governos federal e estaduais medidas urgentes para enfrentar e superar a
“pandemia dos incêndios”.
Recordo-me da anedota
do sapo que foi colocado na panela dentro de água fria. Atiçaram fogo debaixo
da panela e aos poucos a água foi esquentando e o sapo, inicialmente curtindo a
água morna, foi se esquentando devagar, mas quando pensou em tentar se salvar
já era tarde demais. Morreu cozido pela água fervendo. Recordo também de três
jovens que foram postos para dormir em um quarto onde tinha vários botijões de
gás. À noite, após eles dormirem, iniciou-se um vazamento de gás e, eles
dormindo, foram sufocados e amanheceram o dia mortos. Enfim, irmãos e irmãs, a
humanidade vive hora gravíssima. Se não interrompermos os grandes projetos do
capital – mineração depredatória, agronegócio com monoculturas com uso
indiscriminado de agrotóxicos, trabalho escravo e tecnologia de ponta,
devastação dos biomas Cerrado, Amazônia, Pantanal, Mata Atlântica, Pampas e
Caatinga – seremos mortos aos poucos, mas em velocidade que cresce em
progressão geométrica.
Os Povos e Comunidades
Tradicionais e os Povos Originários (Indígenas) estão nos mostrando o caminho a
seguir para impedirmos a extinção da humanidade: preservação socioambiental, o
que passa necessariamente pela demarcação de todos os Territórios dos Povos
Indígenas, Quilombolas e outras centenas de Povos e Comunidades Tradicionais
existentes no Brasil. A idolatria do mercado em uma sociedade capitalista,
máquina brutal de moer vidas, está nos levando ao abismo. Feliz quem se
converter ecologicamente e se tornar um/a aguerrido/a militante da preservação
socioambiental e do resgate das florestas.
17/09/2024
Fonte: A Nova
Democracia/IHU/Racismo Ambiental
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