quinta-feira, 19 de setembro de 2024

Intelectuais do mundo inteiro convocam 'todos que defendem a democracia' a apoiarem o Brasil contra Elon Musk

Mais de 50 acadêmicos e intelectuais de países como Argentina, França, Estados Unidos, Austrália, Reino Unido, Espanha, Suíça e Itália uniram forças em uma carta aberta que critica as pressões exercidas pelo bilionário Elon Musk sobre o Brasil e convoca "todos aqueles que defendem valores democráticos" a apoiarem a nação sul-americana. O documento, que será divulgado nesta terça-feira (17), foi obtido pela coluna de Mônica Bergamo, da Folha de S. Paulo, e é assinado por renomados economistas e autores reconhecidos mundialmente por suas pesquisas sobre as grandes empresas de tecnologia.

Os signatários expressam sua profunda preocupação com a soberania digital do Brasil e denunciam que grandes corporações tecnológicas "operam como governantes" em um cenário onde faltam acordos regulatórios internacionais. A carta destaca que a situação brasileira se tornou uma frente crucial no conflito global entre megacorporações e aqueles que aspiram a um espaço digital democrático. "A disputa do Brasil com Elon Musk é apenas o mais recente exemplo de um esforço mais amplo para restringir a capacidade de nações soberanas de definir uma agenda de desenvolvimento digital livre do controle de megacorporações sediadas nos EUA", afirmam os intelectuais.

Além disso, o texto alerta que as ações de Musk enviam uma "mensagem preocupante para o mundo": países democráticos que buscam se libertar da dominação das big techs podem ver suas democracias ameaçadas, com algumas dessas empresas apoiando movimentos e partidos de extrema direita. Entre os signatários estão economistas de renome, como Gabriel Zucman, Julia Cagé e Thomas Piketty, além da filósofa Shoshana Zuboff, o ex-ministro argentino Martín Guzmán e o professor do MIT, Daron Acemoglu. O Brasil também está representado por figuras proeminentes como José Graziano, ex-diretor-geral da FAO, e acadêmicos de instituições respeitáveis como a UFRJ e a UFABC.

O texto ressalta que as grandes empresas não apenas dominam o espaço digital, mas também atuam contra agendas públicas independentes. "Quando seus interesses financeiros estão em jogo, elas trabalham de bom grado com governos autoritários", aponta o documento. Os signatários pedem que o Brasil permaneça firme na implementação de sua agenda digital, denunciando quaisquer pressões externas e buscando o apoio da ONU. "Este é um momento crucial para o mundo", afirmam.

A carta expõe ainda que a recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de suspender a plataforma X por não cumprir ordens judiciais é um exemplo de resistência contra as tentativas de influência das big techs.

Em um chamado à ação, os intelectuais conclamam a comunidade internacional a apoiar o Brasil em sua luta pela soberania digital, enfatizando que "uma abordagem independente para recuperar a soberania digital e o controle sobre nossa esfera digital pública não pode esperar". Eles destacam a urgência de estabelecer princípios regulatórios que priorizem o bem-estar da população e do planeta em detrimento dos lucros privados.

A íntegra da carta pode ser lida abaixo:

"Contra o Ataque das Big Tech às Soberanias Digitais

Nós, os signatários, desejamos expressar nossa profunda preocupação em relação aos ataques em curso das empresas Big Tech e seus aliados à soberania digital do Brasil. A disputa do Brasil com Elon Musk é apenas o mais recente exemplo de um esforço mais amplo para restringir a capacidade de nações soberanas de definir uma agenda de desenvolvimento digital livre do controle de megacorporações sediadas nos EUA.

No final de agosto, o Supremo Tribunal Brasileiro baniu o X do ciberespaço brasileiro por não cumprir decisões judiciais, exigindo a suspensão de contas que incitaram extremistas da extrema direita a participar de tumultos e ocupar as sedes do Legislativo, Judiciário e Executivo em 8 de janeiro de 2023. Posteriormente, o presidente Lula da Silva deixou claro a intenção do governo brasileiro de buscar independência digital: reduzir a dependência do país de entidades estrangeiras para dados, capacidades de IA e infraestrutura digital e promover o desenvolvimento de ecossistemas tecnológicos locais. De acordo com esses objetivos, o Estado brasileiro também pretende forçar as empresas de big tech a pagar impostos justos, cumprir as leis locais e ser responsabilizadas pelas externalidades sociais de seus modelos de negócios, que frequentemente promovem violência e desigualdade.

Esses esforços têm sido alvo de ataques do proprietário da X e dos líderes de extrema direita, que reclamam sobre democracia e liberdade de expressão. Mas justamente porque o espaço digital carece de acordos regulatórios internacionais e democraticamente decididos, as grandes empresas de tecnologia operam como governantes, determinando o que deve ser moderado e promovido em suas plataformas.

Além disso, o X e outras empresas começaram a se organizar, juntamente com seus aliados dentro e fora do país, para minar iniciativas que visam a autonomia tecnológica do Brasil. Mais do que advertir o Brasil, suas ações enviam uma mensagem preocupante para o mundo: que países democráticos que buscam independência da dominação das big techs correm o risco de ter suas democracias perturbadas, com algumas big techs apoiando movimentos e partidos de extrema direita.

O caso brasileiro se tornou a principal frente no conflito global em evolução entre as grandes corporações de tecnologia e aqueles que buscam construir um espaço digital democrático e centrado nas pessoas, com foco no desenvolvimento social e econômico.

As empresas de tecnologia não apenas controlam o mundo digital, mas também fazem lobby e operam contra a capacidade do setor público de criar e manter uma agenda digital independente baseada em valores, necessidades e aspirações locais. Quando seus interesses financeiros estão em jogo, elas trabalham de bom grado com governos autoritários. O que precisamos é de espaço digital suficiente para que os Estados possam direcionar as tecnologias colocando as pessoas e o planeta à frente dos lucros privados ou do controle unilateral do Estado.

Todos aqueles que defendem valores democráticos devem apoiar o Brasil em sua busca pela soberania digital. Exigimos que as big techs cessem suas tentativas de sabotar as iniciativas do Brasil voltadas para a construção de capacidades independentes em inteligência artificial, infraestrutura pública digital, gestão de dados e tecnologia em nuvem. Esses ataques minam não apenas os direitos dos cidadãos brasileiros, mas também as aspirações mais amplas de cada nação democrática de alcançar a soberania tecnológica.

Também pedimos ao governo do Brasil que seja firme na implementação de sua agenda digital e denuncie as pressões contra ela. O sistema da ONU e os governos ao redor do mundo devem apoiar esses esforços. Este é um momento crucial para o mundo. Uma abordagem independente para recuperar a soberania digital e o controle sobre nossa esfera digital pública não pode esperar. Também há uma necessidade urgente de desenvolver, dentro do quadro da ONU, os princípios básicos de regulação transnacional para acessar e usar serviços digitais, promovendo ecossistemas digitais que coloquem as pessoas e o planeta à frente dos lucros, para que esse campo de provas das Big Tech não se torne prática comum em outros territórios."

 

•        Casa Branca critica Elon Musk por postagem que sugere assassinato de Biden e Harris

A Casa Branca condenou duramente uma postagem de Elon Musk, dono da plataforma X, antiga Twitter, que fez uma declaração controversa envolvendo o presidente Joe Biden e a vice-presidente Kamala Harris. Musk respondeu a um usuário do X, que questionava por que alguém queria matar Donald Trump, afirmando: "Ninguém está nem tentando assassinar Biden/Kamala", acompanhado de um emoji de rosto com a sobrancelha levantada. A resposta, publicada no último domingo, rapidamente gerou críticas de várias partes, com preocupações de que a fala pudesse incitar violência política.

Em comunicado emitido na segunda-feira, o governo de Biden classificou o post como “irresponsável” e ressaltou que a violência deve ser sempre condenada e jamais incentivada ou usada como motivo de brincadeira, segundo reportagem do The Guardian. “Este tipo de retórica é irresponsável”, destacou a Casa Branca, acrescentando que “não há espaço para violência política ou qualquer tipo de violência em nosso país”.

Além da Casa Branca, o Serviço Secreto dos Estados Unidos, responsável pela proteção de presidentes e vice-presidentes, confirmou estar ciente da publicação de Musk. Em comunicado enviado à imprensa, um porta-voz afirmou: "O Serviço Secreto está ciente da postagem feita por Elon Musk nas redes sociais. Como prática, não comentamos questões relacionadas à inteligência protetiva." No entanto, o órgão frisou que todas as ameaças contra seus protegidos são investigadas com seriedade.

A polêmica em torno da declaração de Musk surge em meio à recente prisão de um homem suspeito de planejar o assassinato de Donald Trump em um campo de golfe em West Palm Beach, na Flórida. O bilionário, conhecido por ser um apoiador do ex-presidente Trump, apagou a postagem, mas não antes de despertar a atenção do Serviço Secreto e de gerar preocupações entre usuários da rede.

Musk, em postagens subsequentes, tentou amenizar o impacto da declaração, sugerindo que sua intenção era fazer uma piada. “Bem, uma lição que aprendi é que só porque eu digo algo para um grupo e eles riem, não significa que vai ser tão engraçado como uma postagem no X”, escreveu Musk. “Descobri que as piadas são MUITO menos engraçadas se as pessoas não entendem o contexto e a entrega é em texto simples.”

A controvérsia também levantou discussões sobre os limites da liberdade de expressão nas redes sociais, especialmente quando se trata de figuras públicas de grande influência. Musk, que tem quase 200 milhões de seguidores no X, foi criticado tanto por usuários de esquerda quanto de direita, que expressaram receio de que a fala pudesse incitar ataques contra Biden e Harris.

Tanto o presidente Biden quanto a vice-presidente Harris, que também concorre contra Trump nas eleições de 2024, expressaram alívio pelo fato de o ex-presidente Trump não ter sido ferido no incidente na Flórida. A situação reacendeu o debate sobre a responsabilidade de grandes figuras nas redes sociais e os impactos de suas declarações, mesmo que feitas de maneira informal ou como supostas brincadeiras.

 

•        França usa lei de crimes cibernéticos rígida e não testada contra dono do Telegram

Quando os promotores franceses colocaram a mira no dono do Telegram, Pavel Durov, eles tinham uma carta na manga -- uma nova lei rígida e sem precedente internacional que criminaliza os titãs da tecnologia cujas plataformas permitem produtos ou atividades ilegais.

A chamada lei LOPMI, promulgada em janeiro de 2023, colocou a França na vanguarda de um grupo de nações que estão adotando uma postura mais rígida em relação a sites repletos de crimes. Mas a lei é tão recente que os promotores ainda não conseguiram obter uma condenação.

Com a lei ainda não testada no tribunal, o esforço pioneiro da França para processar figuras como Durov pode sair pela culatra se os juízes se recusarem a penalizar os chefes de tecnologia por suposta criminalidade em suas plataformas.

Um juiz francês colocou Durov sob investigação formal no mês passado, acusando-o de vários crimes, incluindo um delito de 2023 -- "cumplicidade na administração de uma plataforma online para permitir uma transação ilícita, em uma quadrilha organizada", que acarreta uma sentença máxima de 10 anos e uma multa de 500.000 euros.

O fato de estar sob investigação formal não implica culpa nem necessariamente leva a julgamento, mas indica que os juízes acreditam que há provas suficientes para prosseguir com a investigação. As investigações podem durar anos antes de serem levadas a julgamento ou serem arquivadas.

Durov, em liberdade sob fiança, nega que o Telegram fosse um "paraíso anárquico". O Telegram disse que "cumpre as leis da UE" e que é "absurdo afirmar que uma plataforma ou seu proprietário são responsáveis pelo abuso dessa plataforma".

Em uma entrevista de rádio na semana passada, a promotora de Paris, Laure Beccuau, saudou a lei de 2023 como uma ferramenta poderosa para combater grupos de crime organizado que estão cada vez mais operando online.

A lei parece ser única. Oito advogados e acadêmicos disseram à Reuters que não tinham conhecimento de nenhum outro país com um estatuto semelhante.

"Não há nenhum crime na legislação dos EUA diretamente análogo a esse e nenhum que eu conheça no mundo ocidental", disse Adam Hickey, ex-vice-procurador-geral adjunto dos EUA que estabeleceu o programa cibernético de segurança nacional do Departamento de Justiça (DOJ).

Hickey, agora no escritório de advocacia norte-americano Mayer Brown, disse que os promotores dos EUA poderiam acusar um chefe de empresa de tecnologia como "co-conspirador ou cúmplice dos crimes cometidos pelos usuários", mas somente se houvesse provas de que o "operador pretende que seus usuários se envolvam em atividades criminosas e ele próprio as facilite".

Ele citou a condenação de 2015 de Ross Ulbricht, cujo site Silk Road hospedava vendas de drogas.

Os promotores dos EUA argumentaram que Ulbricht "operava deliberadamente o Silk Road como um mercado criminoso online... fora do alcance das autoridades policiais", de acordo com o DOJ. Ulbricht foi condenado à prisão perpétua.

 

Fonte: Brasil 247

 

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