Franco ‘Bifo’ Berardi: ‘A desintegração do
mundo branco’
“It is not Hamas that
is collapsing, but Israel” é o título de um artigo publicado pelo jornal
Haaretz, em 9 de setembro. O autor, Yitzhak Brik, general do exército
israelense, explica o porquê a guerra desencadeada contra a população de Gaza,
apesar de ter causado a destruição de tudo o que existia naquele território,
apesar de ter matado dezenas de milhares de pessoas, está levando à derrota
estratégica de Israel. Se as Forças de Defesa de Israel (FDI) forem obrigadas a
continuar esta guerra ou a expandir diretamente a sua frente, existe o risco,
na opinião de Brik, de que ocorra um verdadeiro colapso. O estado psicofísico
dos soldados envolvidos, durante quase um ano na prática de operações de
extermínio, e a escassez de reservistas disponíveis levariam ao colapso e à
derrota, segundo Brik.
O esgotamento físico e
psicológico dos torturadores israelenses me lembrou o que Jonathan Littell
contou em seu romance Les bienveillantes (2006): o estado de marasmo mental, a
náusea, o horror diante de si mesmos em que se encontram os homens da SS, que
durante meses e anos mataram, torturaram, massacraram e, ao final, não
conseguem mais reconhecer o seu próprio rosto no espelho. O horror que os
exterminadores das FDI provocam em todas as pessoas dotadas de sentimentos
humanos não pode deixar de funcionar como um fator íntimo de desintegração
naqueles que claramente pretendem competir com os assassinos de Hitler.
Em seu artigo, o
general Brik se limita a examinar a situação militar, mas muitos indícios
apontam para o fato de toda a sociedade israelense ter chegado ao limite da
desintegração. A armadilha atroz que o Hamas armou está funcionando
perfeitamente: o dilema dos reféns provoca uma ferida que não cicatrizará. O
ódio sentido em relação a Netanyahu está destinado a ter efeitos políticos
explosivos, quando, mais cedo ou mais tarde, ocorrer um balanço e for
reivindicada uma prestação de contas pela condução cínica do massacre.
Além disso, a economia
israelense está em colapso há muito tempo e não é o caso de uma situação
passageira, porque aqueles que têm competências profissionais demandadas fora
desse maldito país partem. Os médicos partem. Os empresários partem. Nenhum
intelectual digno desse nome pode permanecer em um país que rivaliza com a
Alemanha de Hitler em ferocidade e fanatismo. Permanecem os fanáticos, os
loucos sedentos de sangue, os desgraçados que vieram a Israel apenas para se
apoderar de terras alheias.
E, sobretudo, o que se
supunha que era o lugar mais seguro da terra para os judeus se tornou o lugar
mais perigoso do planeta para eles: um lugar cercado pelo ódio de 1,8 bilhão de
muçulmanos, um lugar onde qualquer carro que passa pela rua pode virar de
repente e matar as pessoas que esperam no ponto de ônibus. Antes, levantava-se
a questão da legitimidade de Israel em existir como Estado, dada a violência
com que se impôs e dada a sua violação sistemática de todas as resoluções da
ONU. Penso que a questão deixará ser colocada: Israel não sobreviverá.
A sua desintegração já
está em curso e nada pode detê-la. A questão que se colocará amanhã é outra:
como conter a fúria assassina de 600.000 colonos fanáticos armados, que se
instalaram ilegalmente na Cisjordânia? Como evitar que a tragédia israelense provoque
um ataque nuclear, uma resposta histérica à proliferação da violência naquele
território cercado pelo ódio?
A desintegração dos
Estados Unidos
Israel é o símbolo da
arrogância do Ocidente, que quis reparar os seus pecados. Depois de isolar e
repelir os judeus que fugiam de Hitler, depois de ter exterminado seis milhões
deles em campos de concentração, os europeus convidaram os judeus sobreviventes
a partir para morrer ou matar em outro lugar. Em troca, prometeram a Israel um
apoio inabalável contra os árabes e os persas que, humilhados pela
superioridade do monstro sionista superarmado, cercam ameaçadoramente Israel,
esperando o momento da vingança. Mas a desintegração de Israel deve ser lida no
contexto da desintegração do conjunto do mundo que gosta de se chamar livre,
esquecendo que está fundado na escravidão.
Vejamos os Estados
Unidos. No dia 11 de setembro de 2024, em homenagem às vítimas do maior
atentado da história, o genocida Joe Biden disse: “Neste dia, há vinte e três
anos, os terroristas acreditaram que poderiam quebrar a nossa vontade e nos
colocar de joelhos. Estavam errados. Sempre vão errar. Nas horas mais sombrias,
encontramos a luz. E diante do medo, nós nos unimos para defender nosso país e
ajudar uns aos outros”. Nós nos unimos, disse o presidente. Mente, como
demonstra a foto em que aparecem Harris e Biden, o então prefeito de Nova York,
Bloomberg, e junto a eles Trump e Vance.
Unidos na luta? Causa
risos ver suas caras de hipócritas com as mãos no coração. Biden está unido a
Trump, e Vance está unido a Harris? Em que sentido estariam unidos esses
sem-vergonhas que diariamente se insultam à espera de saber quem vencerá a
disputa final, destinada a acelerar a desintegração? Certamente, estão unidos
em armar o genocídio sionista. Certamente, estão unidos na deportação de seres
humanos rotulados como estrangeiros ilegais. Sua unidade para por aí. No que
diz respeito ao poder, são inimigos mortais.
Se Donald Trump vencer
em novembro, o jogo termina: começa a maior deportação da história, mas também
a destruição definitiva da aliança atlântica. Mas e se as coisas seguirem um
outro curso? E se Kamala Harris vencer? Os seguidores de Trump não escondem a
sua posição: se o Partido Democrata vencer, isso significará que os Democratas
nos roubaram a vitória e não vamos nos render. Uma senhora, usando o glamoroso
boné MAGA na cabeça, que foi entrevistada pela CNN durante um comício de Trump,
disse isso sem rodeios. Caso vençam, “there will be civil war” [“haverá uma
guerra civil”]. O que significa exatamente que acontecerá uma guerra civil em
um país onde cada cidadão possui pelo menos uma arma de fogo e muitos possuem
quatro, dez ou vinte e cinco?
Não acredito que
ocorra uma guerra civil como nos tempos da Guerra Civil Espanhola, com
multidões armadas se enfrentando ao longo de uma frente mais ou menos definida.
Não, não é assim que se desenrola a guerra civil da era da demência
pós-política e hipermidiática. Ao contrário, assistiremos à multiplicação de
tiroteios racistas, veremos como os massacres passarão por um crescimento
exponencial. Simplesmente, teremos o que já temos, mas em quantidade cada vez
maior e tudo isto com uma intensidade cada vez mais inflamada, mais violenta.
Kamala Harris, por sua
vez, disse o seguinte em 11 de setembro: “Hoje é um dia de solene lembrança.
Enquanto choramos as almas que perdemos no atroz ataque terrorista de 11 de
setembro de 2001, ao comemorarmos este dia, todos nós deveríamos refletir sobre
o que nos une: o orgulho e o privilégio de sermos estadunidenses”. A senhora
disse as coisas como são. O que une os estadunidenses (que estão divididos e
dispostos a entrar em conflito para tomar o poder e saquear) é o privilégio.
O povo estadunidense
consome quatro vezes mais eletricidade do que o consumo médio mundial. E querem
continuar consumindo desmedidamente, porque só o abarrotamento de plástico e
merda dá sentido às suas vidas miseráveis. O atentado de 11-S foi uma
obra-mestra de estratégia. O gigante militar mais poderoso de todos os tempos
não podia ser derrotado por ninguém. Tinha que se voltar contra si mesmo, tinha
que atacar com tanta força que enlouquecesse, que se visse levado a ações
suicidas como a agressão ao Iraque e a guerra travada nas montanhas do Afeganistão,
que terminou com a fuga desordenada de Cabul, o retorno dos talibãs ao poder e
a humilhação da superpotência estadunidense.
Osama Bin Laden venceu
a sua guerra desencadeando o processo de desintegração cultural, psíquica e
militar do colosso, que segue acontecendo diante de nossos olhos. Mas não
podemos esperar uma desintegração pacífica do poder estadunidense. Tal como
Polifemo, cegado por Ulisses, os Estados Unidos lançam golpes terríveis contra
quem deles se aproxima, porque o colosso estadunidense é obrigado a reagir: o
cenário do choque final será a Europa, se os Democratas vencerem, ou o Oceano
Pacífico, se os Republicanos vencerem. Mas, de qualquer modo, o colosso
cambaleia sobre a linha que corre à beira do abismo nuclear.
A desintegração da
União Europeia
Por último, a União
Europeia, que em termos de desintegração se encontra, no momento, em um estágio
muito avançado, certamente, acima do ponto de não retorno. Mario Draghi disse
com a franqueza de quem não tem nada a perder, exceto o seu lugar na história:
se não formos capazes de iniciar um plano de investimento conjunto e de emissão
regular de dívida comum, podemos nos preparar para a desintegração da União. No
dia seguinte, todos esquentaram as mãos com as palmas, mas disseram que as
propostas de Draghi eram quimeras irrealizáveis. Primeiro, a Alemanha se
manifestou dizendo que não quer falar de emissão conjunta de dívida, enquanto
começa a pagar o preço de uma guerra que foi dirigida contra ela em primeiro
lugar. Biden e Hillary Clinton conseguiram provocar uma guerra contra a
Alemanha, que a perdeu imediatamente.
Enquanto a recessão se
torna cada vez mais provável, com a guerra no horizonte, os fascistas assumem o
governo de um país europeu após outro e, assim, anulam o resultado das eleições
europeias que a coalizão de Ursula acreditava ter vencido e nas quais, ao
contrário, não ganhou nada. Embora tenha maioria no inútil Parlamento Europeu,
vê o avanço da direita que, apesar de não ter maioria em Estrasburgo, tende a
tê-la em todos os países do continente.
Na França e na
Alemanha, existem dois governos que não têm maioria. O golpe de Macron pode
levar a um recrudescimento do conflito social marcado por traços cada vez mais
violentos ou evoluir para um golpe definitivo dos lepenistas. Na Alemanha,
iniciou-se o choque entre duas visões geopolíticas inconciliáveis: a visão
atlântica, que postula a obediência aos amos estadunidenses, que já levaram o
governo Scholz a romper os laços econômicos com a Rússia e, portanto, ao
desastre econômico, ou a visão continental, que implica alcançar um equilíbrio
com a Rússia, mas uma ruptura politicamente impossível com a OTAN.
O único fator de
integração que resta aos europeus (bem como aos estadunidenses, neste caso) é o
medo da maré humana que os assedia nas fronteiras e a adoção de medidas cada
vez mais desumanas contra os migrantes. A fortaleza se fecha em torno do mundo
não-branco, mas o desenvolvimento da guerra entre os próprios brancos e a
desintegração política e cultural que padecem conduz à guerra nuclear.
• Aliado de Trump acusado de ter afirmado
ser "nazista negro"
O candidato do Partido
Republicano ao governo do estado da Carolina do Norte, Mark Robinson, afirmou
nesta sexta-feira (20/09) que não cederá a pressões para abandonar a campanha
eleitoral, após a divulgação de postagens atribuídas a ele que contêm comentários
de cunho sexual e racista.
As declarações, que
teriam sido encontradas em seções de comentários de portais de internet
pornográficos, têm potencial para gerar danos significativos à campanha do
candidato republicano à Presidência dos EUA, Donald Trump.
Uma reportagem da
emissora CNN afirmou o candidato publicou uma série de declarações
"gratuitamente sexuais e indecentes" entre 2008 e 2012, antes de
entrar para a política, e que divulgaria apenas uma pequena parcela desses em
razão do "conteúdo gráfico" das declarações.
Segundo a emissora,
muitos de seus comentários contradizem as posições políticas defendidas por ele
durante a campanha em temas como o aborto e os diretos das pessoas transgênero.
Em um comentário de
2012 atribuído ao republicano, ele teria dito que preferia o ditador nazista
Adolf Hitler à liderança do governo americano em Washington. Segundo a
reportagem, Robinson teria se referido a si próprio como um "negro
nazista".
Em outro comentário de
2010, Robinson, um homem negro, teria dito que "a escravidão não é ruim.
Algumas pessoas precisam ser escravas. Gostaria que trouxessem [a escravidão]
de volta. Eu certamente compraria alguns [escravos]."
Segundo a CNN.
Robinson também teria comentado sobre como ele gostava de espiar mulheres em
vestiários de academias de ginásticas quando tinha 14 anos, e expressado seu
gosto por material de pornografia envolvendo pessoas transgênero. Ele chegou a
descrever a si mesmo com um "pervertido".
<><> Danos
à campanha de Trump
Robinson, de 56 anos,
disse que não será impelido a desistir de sua candidatura em razão do que
chamou de "mentiras obscenas de tabloides". O republicano, que possui
um histórico de declarações polêmicas, divulgou um vídeo negando o conteúdo da
reportagem da CNN. "Asseguro que as coisas que vocês verão nessa
reportagem não são palavras de Mark Robinson", afirmou.
O Partido Republicano
da Carolina do Norte saiu em defesa do candidato, acusando os democratas de
lançarem mão de uma campanha difamatória. "Mark Robinson negou
categoricamente as acusações feitas pela CNN, mas isso não vai fazer com que a
esquerda pare de tentar demonizá-lo através de ataques pessoais", disse o
partido, em nota.
As declarações, porém,
têm potencial para ameaçar as chances de Trump de vencer a votação na Carolina
do Norte, um dos estados onde a disputa eleitoral entre o republicano e a
democrata Kamala Harris é mais acirrada.
Robinson, que é
vice-governador e ganhou de maneira decisiva as primárias republicanas no
estado em março, aparece atrás do candidato democrata Josh Stein em várias
pesquisas de intenção de voto.
A campanha de Harris
não perdeu a oportunidade para lembrar que Trump elogiou recentemente Robinson,
dizendo que ele era "melhor do que Martin Luther King", se referindo
ao icônico líder do movimento em prol dos direitos civis e dos negros nos EUA.
Outra imagem divulgada pelos democratas mostra Trump e Robinson lado a lado,
fazendo o tradicional sinal de positivo.
Até o momento, Trump
não comentou o caso. Sua assessoria disse apenas que ele estava
"concentrado em vencer a Casa Branca e salvar o país", e que a
Carolina do Norte é "parte essencial desse plano". O ex-presidente
trouxe Robinson para perto de si em sua campanha na tentativa de ampliar seu
apoio entre os eleitores negros.
Fonte: Diario Red -
tradução do Cepat, em IHU/DW Brasil
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