segunda-feira, 9 de setembro de 2024

Das florestas às cidades: como entender 'as muitas amazônias' na ajuda na conservação do bioma?

Com cerca de 30 milhões de habitantes espalhados por nove estados, a região amazônica tem 74% das populações em área urbana, principalmente nas capitais. Especialistas explicam que entender a existência das 'muitas amazônias' ajuda a elaborar políticas eficazes de conservação e atender as necessidades locais.

Da Bolívia à Colômbia, da Venezuela ao Suriname, das Guianas ao Peru, do Equador ao Brasil. Bioma único que cobre cerca de 420 milhões de hectares da América do Sul, caso a Amazônia fosse um país seria o sexto maior do mundo em extensão territorial, à frente de nações como Austrália e Índia. Esses números expressivos ajudam a explicar o motivo da região ser considerada a maior floresta tropical do mundo. Para além da biodiversidade, possui um papel crucial na regulação do clima mundial e pode ser vista até da Estação Espacial Internacional.

No Brasil, que tem a maior cobertura florestal entre os oito países do bioma, a floresta representa 59% do território, que atravessa nove estados onde vivem cerca de 30 milhões de pessoas. Em meio à pior seca da história enfrentada pela região, com rios outrora caudalosos em que sequer é possível navegar e capitais como Manaus e Belém cobertas por fumaça dos incêndios florestais, o Brasil celebra nesta quinta-feira (5) o Dia Nacional da Amazônia. O especialista em gestão ambiental e gerente da Rede Origens Brasil (iniciativa premiada pela Organização das Nações Unidas), Luiz Brasi Filho, ressaltou ao podcast Jabuticaba Sem Caroço, da Sputnik Brasil, que a Amazônia coloca o país em um outro patamar em um período de discussão das mudanças climáticas e perda da biodiversidade no mundo.

Mas para enfrentar os desafios de se manter a floresta em pé é crucial entender que existem "diversas amazônias", segundo o especialista. "Temos que compreender que existe a região de florestas, onde estão as terras indígenas, unidades de conservação e áreas que ainda não foram destinadas [para proteção] com imensa vegetação. Ali existem desafios e também oportunidades. Temos também a área onde a agropecuária já se consolidou com áreas produtivas, com fazendas grandes, médias e pequenas. E também existe dentro desse bioma as cidades, em que é preciso também discutir caminhos e soluções, assim como oportunidades para quem vive nessas regiões", pontua.

Já a pesquisadora do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), Andréia Pinto, acrescenta ao podcast Jabuticaba Sem Caroço que 74% da população brasileira amazônica está nos centros urbanos, principalmente nas capitais dos nove estados da Amazônia Legal. "Isso também traz um elemento a mais, porque muitas pessoas que vivem nas cidades estão desconectados dessas percepções [dos impactos da destruição das florestas], como ver um riacho secando e de uma floresta morrendo. Já quem vive da terra, como um produtor rural, começa a perceber mais essa ligação entre desmatar e degradar com a escassez de água, principalmente o pequeno agricultor familiar, que não tem condição de fazer grandes irrigações", defende.

<><> O que falar sobre a Amazônia?

Conforme a especialista, a Amazônia desempenha vários "serviços ambientais" a nível regional, nacional e mundial. Entre os principais, está a liberação do vapor d'água pela vegetação (evapotranspiração) e, com isso, equilibrar o regime de chuvas em todo o Brasil. É com a formação dos chamados rios voadores que ocorre boa parte dos índices pluviométricos nas regiões Centro-Oeste, Sudeste e Sul, fechando um ciclo crucial para a regulação do clima — o desmatamento da floresta tem reduzido a força desse fenômeno natural, o que explica em parte tantos eventos climáticos extremos nos últimos anos no Brasil.

"E quando a gente olha para a região Norte, serão muitos outros serviços ambientais, como facilitar a geração de alimento a partir da agricultura familiar nas comunidades locais", diz. Atualmente, explica a pesquisadora, o Brasil está próximo a um limite perigoso que ameaça a própria existência do país: a destruição ser tão grande a ponto de não possibilitar mais a recuperação da maior floresta tropical do mundo. De toda a área que a vegetação amazônica um dia ocupou no país, mais de 20% já foi desmatada (a maior parte para dar espaço à pecuária). Já outros 20% são de locais degradados.

"É onde existe floresta, mas não possui as mesmas características e capacidade de absorção de carbono, evapotranspiração. A mata está de pé, não teve uma retirada completa, mas sofreu grandes alterações [provocadas pelos humanos] ao longo do tempo [...]. E agora, com esses eventos climáticos, isso fica muito mais perceptível. Quem mora na região convive com estações de chuva mais intensas, enquanto o período de seca é muito mais intenso", conta.

Apesar desse indicador, Andréia Pinto enfatiza que a Amazônia possui grande capacidade de regeneração e até 2022 havia na região mais de 5,7 milhões de hectares de vegetação secundária (em uma área antes devastada), com idade a partir de seis anos. "O primeiro passo é tentar auxiliar a floresta nessa recuperação. É simplesmente deixar que a natureza faça a parte dela e o homem não atrapalhar", comenta.

<><> O que o garimpo causa na Amazônia?

Entre 2016 e 2022, cerca de 241 mil hectares de florestas da região foram ocupadas de forma ilegal pelo garimpo, área duas vezes maior que Belém, a segunda maior cidade da região. De acordo com o estudo do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), o crescimento registrado no período foi de 361% e, desse total, 25 mil hectares foram em áreas de 17 terras indígenas, protegidas pela legislação brasileira. Luiz Brasi Filho vê que essa atividade ilegal e predatória é o maior problema enfrentado atualmente pela Amazônia.

"Se você olhar o mapa do garimpo hoje, há grandes impactos nas terras indígenas Yanomami e Kayapó. Precisamos de uma ação coordenada entre os governos federal e estaduais para um efetivo combate ao garimpo [...]. Outro ponto é a extração de madeira ilegal, comercializada não só no Brasil. Essas atividades são extremamente desafiadoras para a conservação do bioma", afirma.

<><> Facções criminosas também avançam na região

Estudo do ano passado publicado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) revela ainda o avanço das facções criminosas pelos estados amazônicos: foram mapeados 22 grupos presentes em 178 municípios da região, onde vivem quase 58% da população da Amazônia Legal. Para além da violência, crescem também problemas como tráfico, grilagem e desmatamento.

"A presença do narcotráfico na Amazônia tem trazido um conjunto de desafios para as comunidades locais, principalmente por conta da insegurança dentro desses territórios. Precisamos ter ações efetivas de comando e controle que são políticas de governo", resume o especialista, que ressalta a importância de conciliar o ativo florestal com atividades econômicas sustentáveis que gerem renda para a população. Isso, inclusive, desestimula a atuação dessas organizações criminosas.

•        Potencial de lítio no Paraguai atrai conglomerado de empresas e investimentos de até US$ 700 milhões

Um conglomerado de empresas iniciou as atividades de prospecção de lítio no norte do Paraguai, na região do Chaco, e promete investir mais de 700 milhões de dólares em sua exploração.

O Paraguai espera com isso integrar o "triângulo do lítio", formado na região por Bolívia, Chile e Argentina, e mesmo gerar condições para a fabricação de baterias.

Na última semana, o vice-ministro de Minas e Energia do Paraguai, Mauricio Bejarano, visitou a área do Chaco Paraguaio para acompanhar de perto as atividades de prospecção realizadas pela Chaco Minerals, um conglomerado de cinco empresas de origem canadense e paraguaia encarregadas pela busca de lítio.

As atividades de prospecção começaram em maio de 2024, a partir de estudos geológicos que há algum tempo especulavam a possibilidade de a região conter quantidades significativas de carbonato de lítio.

Segundo informações do governo paraguaio, a Chaco Minerals tem uma área total de 2 milhões de hectares, dividida em cinco partes destinadas a cada uma das cinco empresas que integram o conglomerado.

Em diálogo com a Sputnik, o engenheiro e especialista em assuntos energéticos Eduardo Viedma destacou que o país tem vantagem sobre seus vizinhos por contar com energia renovável e mais econômica.

"Atualmente, há um investimento de US$ 30 milhões [cerca de 115 milhões] deste conglomerado canadense-paraguaio e eles estão realizando a prospecção através do método sísmico para saber qual volume de lítio pode ser obtido e se é rentável", explicou Viedma.

Ele, que também é presidente da Associação Paraguaia de Energias Renováveis (APER), destacou que os geólogos que trabalham para a empresa indicam que a região do Chaco Paraguaoo possui "as mesmas condições geológicas" que a área de salinas no território boliviano, o que faz pensar que "deveria haver concentrações interessantes de lítio".

Ele comentou que o carbonato de lítio pode não ser tão fácil de extrair do lado paraguaio. Nesse sentido, enquanto os movimentos telúricos fizeram com que essas salinas de lítio emergissem à superfície, na região do Chaco Paraguaio o lítio está no subsolo:

"Essas veias de lítio ainda estão dentro da terra e não estão expostas. O lítio está misturado com terra e, por isso, a forma de acessá-lo é relativamente mais cara do que nas salinas da Argentina, Chile e Bolívia, que possuem lítio em estado quase puro", apontou.

Em declarações feitas em maio ao jornal paraguaio La Nación, o gerente da Chaco Minerals, Rodrigo Díaz Mallorquín, adiantou que, se as atividades de prospecção forem positivas, a próxima etapa de exploração terá investimentos cerca de US$ 50 milhões (cerca de 270 milhões) entre seis a oito anos. Após isso, a empresa avançaria com a exploração do mineral, o que exigiria um investimento de cerca de US$ 700 milhões (cerca de R$ 3,9 bilhões).

<><> Um ímã para investidores estrangeiros

Para o engenheiro e representante do setor energético, se o projeto tiver sucesso, pode abrir as portas para o Paraguai em uma cadeia produtiva que se ramifica para setores-chave, como a fabricação de automóveis e trens elétricos, além de incluir computação e telefonia.

"Todos os aparelhos com energia remota têm uma bateria de lítio porque são as baterias mais eficientes, as mais duráveis e as que podem fornecer a energia que esses novos produtos criados a cada dia no mundo precisam", destacou. "Já há muitas consultas por parte de investidores estrangeiros e, se for confirmada a presença de lítio, será um polo de desenvolvimento muito importante", celebrou.

 

Fonte: Sputnik Brasil

 

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