terça-feira, 10 de setembro de 2024

As lições de Japão e Nova Zelândia para reconstrução após desastre no Rio Grande do Sul

Em tempos de mudanças climáticas cada vez mais radicais e perigosas, o planejamento urbano e regional é uma estratégia essencial para o desenvolvimento sustentável e a resiliência de territórios.

No Rio Grande do Sul, os impactos devastadores das inundações ainda são sentidos pela população, demonstrando fragilidades estruturais, falta de preparo adequado e a urgência de um planejamento que vá além da resposta emergencial.

A saída para isso é complexa, mas exemplos não faltam, vindos de países e cidades que se desenvolveram sobre terrenos historicamente sujeitos a desastres naturais.

<><> Tóquio e Christchurch, onde planejamento é a palavra-chave

A importância do planejamento reside na sua capacidade de orientar o crescimento ordenado das cidades, integrar diferentes setores econômicos e sociais e promover a inclusão e a equidade.

No contexto atual do Rio Grande do Sul, onde a reconstrução é inevitável, o planejamento deve ser visto como um processo para transformar a crise em uma oportunidade de inovação e sustentabilidade.

Tóquio, por exemplo, devido à sua localização geopolítica em uma região altamente sísmica e densamente povoada, poderia facilmente ter enfrentado enormes desafios de desenvolvimento urbano.

No entanto, a cidade transformou essas potenciais fraquezas em forças por meio de um planejamento urbano estratégico e do uso de tecnologias avançadas.

Com uma abordagem que integra resiliência e inovação, Tóquio adotou sistemas de construção altamente resistentes a terremotos, utilizando engenharia de ponta para garantir a segurança dos edifícios e infraestruturas.

Além disso, a cidade investiu em soluções tecnológicas para melhorar a mobilidade urbana, a gestão de energia e a segurança pública, tornando-se um exemplo de como a combinação de planejamento rigoroso e tecnologia pode criar um ambiente urbano eficiente, seguro e preparado para enfrentar futuros desafios.

Outro exemplo notável é a cidade de Christchurch, na Nova Zelândia.

Após o devastador terremoto de 2011, a cidade enfrentou a tarefa monumental de se reconstruir quase do zero. Em vez de simplesmente restaurar a cidade como era antes, Christchurch adotou uma abordagem inovadora, focada na inteligência tecnológica e na sustentabilidade.

O novo plano urbano incluiu a criação de espaços verdes, infraestrutura de energia renovável e a implementação de tecnologias que tornaram a cidade mais preparada para enfrentar futuros desastres naturais.

Este exemplo demonstra como um planejamento estratégico e visionário pode não apenas reconstruir, mas transformar uma cidade, aproveitando uma crise como catalisadora para um desenvolvimento mais inteligente e sustentável.

Em um planeta em constante mutação, a proatividade se torna a chave-mestra.

Ao invés do histórico brasileiro em procrastinar o planejamento, é crucial que seja elaborado, urgentemente, o planejamento urbano e regional do Rio Grande do Sul, com equipes especializadas, para a construção e/ou reconstrução dos territórios atingidos, abordando uma série de problemas críticos que historicamente têm sido negligenciados.

Primeiramente, a infraestrutura de drenagem urbana precisa ser reavaliada e modernizada, especialmente em áreas vulneráveis a inundações, como os municípios mais afetados pelas chuvas torrenciais recentes.

Isso inclui a implementação de sistemas de drenagem eficientes, a recuperação de áreas verdes que atuam como zonas de retenção natural de água e a promoção do conceito de "cidade esponja', onde a água da chuva é coletada e reutilizada localmente para mitigar os impactos das enchentes.

Novos projetos urbanos devem também ser pensados desde o início com critérios de sustentabilidade, priorizando a mobilidade urbana eficiente, o uso de energias renováveis e a construção de moradias adaptadas às mudanças climáticas.

A implementação de tecnologias inteligentes, como redes elétricas inteligentes e sistemas de monitoramento ambiental em tempo real, também deve ser uma prioridade.

Esse planejamento diferenciado exige um rompimento com práticas antiquadas e uma adoção de metodologias inovadoras que privilegiem o bem-estar da população e a sustentabilidade a longo prazo.

<><> Reconstrução com base na ciência

Adiar o planejamento é adiar o desenvolvimento. O Estado e os governos que se recusam a planejar o futuro das cidades nos condenarão à desordem, à ineficiência e à falta de oportunidades.

É hora de conclamar a ciência e os pesquisadores para o planejamento. Exigirá a sinergia e a cooperação de pesquisadores, universidades, governos e a sociedade civil.

A reconstrução das áreas afetadas pelas inundações no Rio Grande do Sul será uma oportunidade para criar novos empregos verdes e impulsionar a economia local de forma justa e inclusiva.

É importante que essa reconstrução seja feita de forma sustentável, utilizando materiais ecológicos e tecnologias inovadoras que contribuam para a mitigação das mudanças climáticas e a geração de renda para as comunidades afetadas.

Ao investir em planejamento urbano e regional de qualidade, poderemos construir cidades sustentáveis e inteligentes, onde a economia floresce, o meio ambiente é preservado e as comunidades prosperam.

<><> Cidades inteligentes

Uma cidade inteligente é uma área urbana que utiliza tecnologias avançadas para melhorar a qualidade de vida de seus habitantes, aumentar a eficiência dos serviços públicos e promover a sustentabilidade.

Essas cidades são caracterizadas pela integração de sistemas de informação, comunicação e tecnologias da Internet das Coisas (IoT) para coletar e analisar dados em tempo real, permitindo uma gestão mais eficaz dos recursos.

Sistemas inteligentes de transporte podem otimizar o fluxo de tráfego e reduzir congestionamentos, enquanto redes elétricas inteligentes podem equilibrar a demanda de energia e promover o uso de fontes renováveis.

Além disso, a participação cidadã é incentivada por meio de plataformas digitais que facilitam a comunicação entre os residentes e o governo local.

As cidades inteligentes se diferenciam das tradicionais por sua abordagem proativa na resolução de problemas urbanos e pela capacidade de se adaptar rapidamente às mudanças e desafios.

Enquanto as cidades tradicionais tendem a responder reativamente às crises, as cidades inteligentes utilizam dados e tecnologia para antecipar e mitigar problemas antes que eles se agravem.

•        Mudanças na cidade e no campo

Para além das cidades, o planejamento da infraestrutura das áreas rurais é de suma importância, como estradas, pontes, armazenamento de grãos e acesso à internet, para facilitar o escoamento da produção e a integração das áreas rurais com as cidades; bem como o desenvolvimento do turismo rural, valorizando a cultura e a gastronomia local, gerando renda e oportunidades para as comunidades rurais.

Importa um planejamento que fortaleça a agricultura familiar, oferecendo crédito, assistência técnica e infraestrutura para que os pequenos agricultores possam aumentar sua produtividade e renda.

O planejamento e o desenvolvimento sustentável, que respeita o meio ambiente e o bem-estar animal, garantirá a qualidade dos produtos e o aumento da competitividade do mercado agropecuário brasileiro.

É essencial ainda a criação de políticas públicas que promovam a diversificação da produção agrícola, permitindo que os pequenos agricultores explorem novos mercados e se tornem mais adaptáveis às mudanças climáticas e às oscilações do mercado.

Incentivar práticas agroecológicas e a adoção de tecnologias sustentáveis são passos fundamentais para garantir a preservação do solo, da água e da biodiversidade, ao mesmo tempo que se aumenta a produtividade e a qualidade dos alimentos produzidos.

O apoio governamental nesse sentido pode incluir subsídios para a aquisição de tecnologias verdes, programas de capacitação e incentivos fiscais para a adoção de práticas agrícolas sustentáveis.

A criação de redes de cooperação entre agricultores, cooperativas e associações também pode ajudar a compartilhar recursos, conhecimento e a melhorar o acesso a mercados nacionais e internacionais.

Dessa forma, o planejamento urbano e rural se torna um catalisador para o desenvolvimento socioeconômico sustentável, fortalecendo a agricultura familiar e garantindo uma produção mais justa e equilibrada no Brasil.

O eficiente e eficaz planejamento urbano e regional no Rio Grande do Sul poderá ser um exemplo para todo o Brasil e para o mundo ao melhorar ou requalificar os territórios urbanos e rurais. Planejamento para o Rio Grande do Sul, já!

 

•        Qual a relação entre o combate às mudanças climáticas e o estímulo à economia?

O aquecimento global é um problema grave ao qual é preciso responder, mas também pode ser visto de outro ângulo, afirma o economista Aleksandr Shirov ao portal Nauchnaya Rossiya (Rússia Científica). A redução das emissões de gases de efeito estufa oferece potencial para o desenvolvimento da economia, explica.

A natureza global e a difusão generalizada do problema das alterações climáticas se deve principalmente ao seu forte impacto na economia, destaca o membro da Academia Russa de Ciências. É paradoxal, mas o próprio clima e a manutenção do aumento da temperatura global devem ser atribuídos a fatores secundários, acredita.

"A política climática se tornou um problema global principalmente devido ao seu forte impacto na economia", destaca o especialista.

Inicialmente, foram os países com grandes economias que começaram a promover a agenda ambiental e a eliminação gradual da produção de energia com elevado impacto ambiental, lembra Shirov, que também é especialista em análises e previsões macroeconômicas.

"Um número significativo de Estados com economias desenvolvidas atingiu certos pontos de saturação nas necessidades tanto de infraestruturas como de consumo das suas populações", explica.

No entanto, necessitam de rendimentos adicionais para avançar e manter um nível social elevado, salienta. A agenda ambiental, por sua vez, estimula o surgimento de novas indústrias – desenvolvimento de energias renováveis ou modernização da energia tradicional – na economia que criam procura adicional e impulsionam o crescimento econômico. Essas mudanças na estrutura de produção e nos preços criam a renda necessária, explica.

"É a agenda climática que está a impulsionar essas mudanças estruturais. Como consequência, estamos a ver uma maior atenção a ela por parte dos países que possuem as tecnologias relevantes", indica.

Aos poucos, países não só com economias grandes e desenvolvidas, mas também emergentes, como a China e a Rússia, vão se integrando nesse processo, defende o analista.

Abordando a questão das novas indústrias que estimulam a economia nacional, o especialista menciona a estratégia russa de desenvolvimento de baixo carbono. O plano, que inclui a modernização das centrais de carvão e gás, o aumento da quota de energia nuclear e a reorganização da gestão de resíduos, cria procura adicional e gera novos fundos.

<><> Estratégia elaborada

Para se beneficiar da política ambiental global, um país tem de desenvolver uma estratégia que tenha em conta as características individuais da economia, energia, produção, entre outras, bem como as projeções relativas às alterações climáticas, sublinha Shirov.

"O processo de previsão da descarbonização é uma tarefa não só de previsão econômica, mas também especificamente científica e tecnológica", salienta.

Por outro lado, medidas impensadas e impulsivas para reduzir as emissões de gases com efeito estufa podem afetar tanto a economia do país como a sua população, alerta o especialista.

"Podem ser introduzidas massivamente centrais solares ou eólicas, que, do ponto de vista da redução de uma tonelada de emissões de dióxido de carbono, são muito mais caras do que a modernização da energia convencional", detalha.

A recusa total em seguir os objetivos de descarbonização continuará naturalmente a prejudicar o ambiente e atingirá também a economia nacional, alerta o especialista. As restrições econômicas externas impostas, juntamente com uma modernização mais lenta, levarão a baixas taxas de crescimento do produto interno bruto (PIB), argumenta.

"A agenda climática neste contexto é única. Por um lado, ajuda a reduzir o impacto negativo no clima e, por outro, vários países conseguem resolver simultaneamente problemas econômicos dessa forma", resume Shirov.

 

Fonte: Por Maria Alice Nunes Costa, para The Conversation/Sputnik Brasil

 

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