terça-feira, 10 de setembro de 2024

Aquiles Lins: ‘A China já está no futuro e quer o Brasil junto’

A transformação espetacular que a China experimentou em apenas 40 anos pôde ser observada nos cinco sentidos por este colunista. Juntamente com o colega jornalista Mario Vitor Santos representando o Brasil 247 e a TV 247, integrei uma delegação composta por 20 jornalistas de diversos veículos brasileiros, além de influenciadores e observadores que visitou a China entre 20 e 31 de agosto. A viagem pelas cidades de Pequim, Wuhan, Chengdu e Mianyang se deu a convite do Partido Comunista da China (PCCh), que custeou o transporte, a hospedagem e a alimentação, numa articulação com o Partido dos Trabalhadores (PT).

Seguimos uma programação intensa, repleta de visitas a instituições e empresas nas áreas da comunicação, de tecnologia de ponta, como fabricação de semicondutores, paineis solares, telas de led para os mais diversos usos. Houve visitas a universidades e centros de pesquisa que têm relações com o Brasil e a lugares históricos da China, como a Grande Muralha, em Pequim, a Torre da Garça Amarela, em Wuhan, e o Parque do Povo, em Chengdu. Na área da política, representantes do departamento internacional do Partido Comunista Chinês, dirigentes das províncias também nos receberam em mais de uma ocasião. Em todos os casos é dito que Brasil e China têm amizade sincera e que compartilham visão comum de mundo. De alguns deles ouvimos que para entender a China é preciso olhar o país com a humildade de ver as particularidades de sua história, do seu povo. Ou seja, se for ver a China com as lentes do Ocidente, a imagem vai sair embaçada.

 preciso entender a história do Partido Comunista da China. De fato não é nenhum pouco corriqueiro na história uma organização política como esta, hoje com 97 milhões de filiados, materializar um crescimento econômico médio de dois dígitos nas últimas três décadas e criar uma classe média de 400 milhões de pessoas, transformando a China no principal país manufatureiro e no maior exportador em nível mundial. O sistema político da China centralizou as decisões em torno do objetivo de melhorar a vida de sua população e até aqui tem conseguido. A capacidade do governo de entregar resultados tangíveis, como a erradicação da pobreza extrema, maior acesso à educação e saúde e a criação de uma infraestrutura robusta, só aumenta sua legitimidade perante o povo. Porque não atende aos preceitos do Ocidente sobre como se governa um país não podemos chamar o modelo chinês de democracia? Obviamente que podemos. Sobre democracia na China fizemos com Leonardo Attuch e Mario Vitor Santos este programa na TV 247. 

A política econômica chinesa tem sido amplamente centrada na soberania popular, na qual as necessidades básicas e a prosperidade da maioria da população são vistas como prioridades centrais do governo. A ascensão econômica da China, com crescimento contínuo e melhorias em setores como habitação, transporte e tecnologia, garante uma base de apoio popular ao governo. Para se ter noção do tamanho do crescimento da China, apenas de cimento, a China consome a cada dois anos o que os Estados Unidos consumiram em todo o século XX, segundo a investigadora Hannah Ritchie, que refez as contas de Bill Gates que viralizaram. O resultado desta imensidão de concreto está espalhado por toda a China com prédios incontáveis, viadutos imensos, ferrovias de alta velocidade, rodovias que rasgam o país continental. A urbanização das cidades chinesas é impressionante. A começar pela capital Pequim, que tem 21 milhões de habitantes e é amplamente arborizada, conectada por avenidas largas, por onde circulam frenéticos motos, carros e ônibus. É possível ver centenas de placas de carros na cor verde, identificação de veículos elétricos ou híbridos. As bicicletas continuam por toda parte a despeito da rápida transformação tecnológica do transporte. Qualquer pessoa pode alugar uma na rua por um aplicativo e sair por aí. O barulho no trânsito é bem menor e a qualidade do ar é bem melhor do que costumamos imaginar no Brasil.

Esta explosão de crescimento e desenvolvimento da China sustentado pela quarta década consecutiva mescla elementos do socialismo e da presença forte e decidida do estado como orientador e regulador do processo, com elementos do modo capitalista de produção. É o socialismo com características distintas chinesas, que foi impulsionado a partir do líder Deng Xiaoping com o início da abertura econômica da China para o mundo ocidental nos anos 1980. O PCCh planejou o que a China deveria fazer, com políticas públicas estáveis e contínuas que criaram condições para que o país chegasse a essa posição de potência global que é hoje. Admitiu a existência e a convivência com o capitalismo, porém subjuga-o a determinadas regras que interessam majoritariamente ao conjunto da população. Diferentemente do Brasil, na China é o estado que detém a última palavra sobre os rumos do país, não o mercado financeiro.  

Na área da Comunicação, a delegação brasileira visitou empresas estatais de mídia, com diferentes abrangências. Em Pequim, conhecemos as instalações da CGTN (China Global Television Network), principal grupo de mídia estatal nacional da China, que concentra diversos canais em diferentes línguas. A CGTN utiliza tecnologia de ponta em sua produção diária. Animações gráficas e inteligência artificial estão a serviço da comunicação, da informação e da educação. Um exemplo: a partir da inteligência artificial, os profissionais da CGTN reconstituíram todas as manifestações do líder espiritual Confúcio, bem como sua imagem e criaram um Confúcio virtual que conversa com o interlocutor sobre qualquer assunto. Pergunte diretamente a Confúcio sua dúvida e ele lhe responderá. Assim como este, há inúmeros direcionamentos tecnológicos nas áreas da Comunicação, da Educação e da Cultura. Também visitamos veículos de mídia estatais comandados pelas províncias. O material técnico com o qual trabalham deixaria muitos veículos de comunicação pública totalmente empoderados no Brasil. E há caminhos para uma maior integração e veículos brasileiros, apesar da desconfiança e do despeito da maioria da mídia tradicional brasileira com a China. 

·        No centro da China, tradição milenar e tecnologia de ponta de mãos dadas

Wuhan é uma cidade efervescente, com centenas de prédios em construção. São imagens de guindastes por todo lado, erguendo arranha-céus incontáveis na cidade de 13 milhões de habitantes que diariamente cortam ou margeiam o lindo rio Yangtsé. Lamentavelmente Wuhan ficou mais conhecida no Brasil em função dos primeiros casos de Covid-19 no mundo. A cidade, no entanto, está muito além deste estigma. A mais populosa da China central, Wuhan abriga um parque tecnológico imenso, que conta com empresas que produzem laser, semicondutores, placas solares, drones inteligentes e até carros autônomos, isto é, sem motoristas. Andamos neles para comprovar sua eficiência. Mas, por enquanto, ainda seria impensável vê-los circulando na marginal do Tietê, em São Paulo. Também pudemos experimentar andar de metrô suspenso, cujos trilhos estão no teto e o chão fica passando debaixo de nossos pés a 20 metros de altura.  

Na Universidade de Hubei, uma das maiores do país, fomos recebidos calorosamente por professores e alunos (aliás, nenhuma recepção aos jornalistas brasileiros foi menos efusiva). A instituição é pioneira no estudo sobre o Brasil e no intercâmbio com estudantes brasileiros. Por meio do Instituto Confúcio, organização educacional pública cujo objetivo é promover a língua e a cultura da China e que tem unidades no Brasil, dezenas de estudantes brasileiros estudam cursos de graduação, pós-graduação ou cursos de verão na universidade. A maioria deles oriunda da região Sudeste do Brasil, a partir do Instituto Confúcio da Universidade Estadual Paulista (Unesp). 

A programação oferecida pelos chineses à nossa delegação incluiu visitas nas áreas da Cultura e da história da China. Isso nos levou ao Museu de Arte de Hubei, que abriga artefatos e objetos milenares da China e assistimos à uma apresentação musical a partir de instrumentos tradicionais chineses, como o Bianzhong, carrilhão de doze sinos de bronze, afinados de acordo com a escala cromática de 12 sons, em uso na música cerimonial desde a Dinastia Shang, séc.16 antes de Cristo.

Outra programação cultural oferecida à delegação brasileira foi uma visita à histórica Torre da Garça Amarela, um edifício antigo, reconstruído em 1981 que reflete as características da arquitetura tradicional chinesa. Uma apresentação de luzes projetadas no prédio conta como a torre foi diversas vezes incendiada ao longo da história. Um show de imagens. Tudo muito tecnológico para exaltar a história. De cima da torre, é possível ter uma vista panorâmica de Wuhan e do rio Yangtsé. As dezenas de prédios que compõem o cenário têm suas fachadas iluminadas com luzes led que mostram imagens em movimento, como se todos fossem parte de um único e imenso painel de led. 

·        Chengdu: pandas, pimenta e Rota da Seda 

O terceiro e último trecho da viagem se deu na província de Sichuan, oeste da China. É a região dos ursos pandas, além de ser a quinta maior economia entre as províncias chinesas. Na capital Chengdu, uma megalópole de 21 milhões de habitantes, visitamos o centro de preservação e reprodução de pandas, que se apresentaram em toda a sua fofura, quando não estavam dormindo ou recolhidos, em razão das altas temperaturas do verão chinês. 

Também visitamos a cidade de Mianyang, com cerca de 4 milhões de habitantes, conhecida como o Vale do Silício chinês, que concentra empresas de alta tecnologia, além de manter viva sua cultura milenar. Às margens do rio Yangtze. 

O ponto alto da estada em Chengdu foi a participação da delegação brasileira do Fórum Internacional de Cooperação de Mídia do Cinturão e Rota 2024, evento que reuniu cerca de 200 jornalistas estrangeiros, além de 700 chineses, além de dirigentes do governo central, de grandes empresas estatais nas áreas de tecnologia, petróleo e energias renováveis. Uma iniciativa para consolidar cooperação midiática sobre a China para além do que descreve a mídia ocidental, assim como a imagem do ambicioso projeto lançado há 11 anos pelo presidente Xi Jinping para aumentar e tornar mais eficiente a integração econômica, social e cultural da China com diversos países ao redor do mundo. Mais de 150 estados hoje são signatários do Cinturão e Rota e recebem investimentos e financiamentos da China. 

Embora a China seja o maior parceiro comercial do Brasil e ambos mantenham há décadas uma complementaridade de suas atividades econômicas, nós ainda não aderimos à iniciativa Cinturão e Rota. Os presidentes Luiz inácio Lula da Silva e Xi Jinping assinaram diversos acordos de cooperação que elevaram a relação estratégica entre os dois países a um patamar inédito. No entanto, o Brasil ainda não se deixou seduzir pelas possibilidades de desenvolvimento compartilhado que a China está lhe oferecendo. O governo Lula quer ter a certeza de que aproveitará o melhor possível no âmbito das negociações e do conceito ganha-ganha chinês. Nos diversos discursos proferidos pelas autoridades chinesas, ressaltam-se sempre três princípios que norteiam a Rota da Seda para qualquer país interessado: consulta, construção e benefícios compartilhados. Ou seja, após o Brasil manifestar interesse no projeto, os dois países se reúnem e discutem quais projetos, em quais áreas estratégicas, interessam tanto ao Brasil quanto à China. Aí podem entrar investimentos em energia, em infraestrutura de transporte, como ferrovias, por que não um trem bala?. A segunda parte é a execução da modelagem feita anteriormente, e a terceira parte é o desfrute dos benefícios oriundos dos investimentos.

A China se mostra ao mundo uma nação cada vez mais moderna, aberta para dialogar com todos os países, especialmente aqueles do Sul Global. E o Brasil, como integrante do Brics, detentor de grandes recursos natuais e com uma economia emergente e aquecida, tem uma posição privilegiada nas mudanças em curso. Uma maior integração com a China será cada vez mais natural e isso representará um universo de oportunidades na vida dos brasileiros.  A atenção histórica é do oriente, da Ásia, e o Brasil saberá aproveitar o momento e não perder o bonde.

 

¨      Assim como a Terra, a China é redonda. Por Maria Luiza Franco Busse

A China realiza a Primeira Mesa Redonda China-Estados Latino-Americanos e Caribenhos sobre Direitos Humanos, nesta terça-feira, 10 de setembro, no Rio de Janeiro. O objetivo é botar em ação a iniciativa da Civilização Global para aprofundar “os intercâmbios e a aprendizagem mútua entre as civilizações chinesa e latino-americana e caribenha”, e assim seguir “construindo consenso através do diálogo, trabalhando em conjunto para promover o desenvolvimento diversificado da humanidade e dos direitos entre as civilizações no progresso da modernização”.

O encontro é promoção conjunta do Instituto Chongyang de Estudos Financeiros da 

Universidade do Povo da China (RDCY) e da Faculdade de Direito da Universidade 

Federal Fluminense (FD-UFF).  O tema central é “A Diversidade da Civilização

e a Escolha do Caminho para Realizar os Direitos Humanos”, em torno do qual serão apresentados e debatidos três tópicos: Contribuições da China e da América Latina para a Civilização dos Direitos Humanos, Realização do Direito ao Desenvolvimento e Usufruto dos Direitos Fundamentais, e Desafios e soluções atuais para a governança global dos direitos humanos.

O evento faz parte dos muitos que celebram os 50 anos do que o delicado modo chinês de tratar assuntos espinhosos chama “estabelecimento”, a rigor o restabelecimento das relações diplomáticas que o Brasil rompeu em 1949 quando a China se fundou como República Popular da China. Em 1974, efetivou-se o “pragmatismo responsável” defendido pelo então chanceler Azeredo da Silveira cumprindo a trajetória soberana da diplomacia brasileira. O Brasil reconheceu uma única China, fechou o consulado em Taiwan, estabeleceu embaixada em Pequim, tudo formalizado no comunicado assinado pelos dois países: "O Governo da República Federativa do Brasil e o governo da República Popular da China, em conformidade com os interesses e os desejos dos dois povos, decidem estabelecer relações diplomáticas em nível de embaixadas, a partir desta data. O Governo da República Federativa do Brasil reconhece que o governo da República Popular da China é o único governo legal da China. o governo chinês reafirma que Taiwan é parte inalienável do território da República Popular da China. O governo brasileiro toma nota dessa posição do governo chinês. Os dois governos concordam em desenvolver as relações amistosas entre os dois países com base nos princípios de respeito recíproco à soberania e à integridade territorial, não-agressão, não-intervenção nos assuntos internos de um dos países por parte do outro, igualmente e vantagens mútuas e coexistência pacífica.O governo da República Federativa do Brasil e o governo da República Popular da China concordam em trocar embaixadores dentro do mais breve prazo possível e em prestar um ao outro toda a assistência necessária para a instalação e funcionamento das embaixadas em suas respectivas capitais".

A mesa redonda também comemora os 10 anos do 1º Fórum China-Celac realizado em Pequim, em 2015, um ano depois do giro do presidente Xi Jinping pela América Latina e Caribe quando, então, visitou a Venezuela e assinou acordos com o presidente Nicolas Maduro. Na ocasião, o presidente Xi Jinping declarou “Um mais um é maior do que dois”. O Fórum China-Celac foi criado para promover o desenvolvimento compartilhado caracterizado pela igualdade e pelo benefício mutuo por meio de uma agenda conjunta baseada na confiança e no respeito.

Festejar o Fórum não é um gesto qualquer. É aceno que fortalece o empenho da Venezuela em manter viva a CELAC. Na reunião da ALBA-TCP, Tratado de Comercio dos Povos da Aliança Bolivariana para os povos da Nossa América, Maduro denunciou o bombardeio do imperialismo estadunidense contra a instituição por meio do lançamento massivo dos muitos mísseis narrativos-midiáticos somados às sanções econômicas terroristas praticadas contra a república bolivariana democrática de protagonismo popular. Um República de protagonismo popular assentada sobre 300 bilhões de barris de petróleo, maior reserva estratégica do planeta. Inaceitável para a democracia liberal autoritária e autocentrada que edificou uma sociedade sobre os recursos que não tem porque certa de que o mundo seria o seu espaço vital, conquistado por afinidades ou mantido sob constante ameaça e instabilidade pela violência da máquina de guerra que desenvolveu ao longo de sua história.

O mundo gira e a rotação da China segue sua viagem de circuntransformação, trazendo a memória de ter sido uma nação invadida, retalhada e extraterritorializada, e na bagagem a firmeza de que nunca mais será uma terra de ninguém. Movimento soberano e popular que a Venezuela vem fazendo desde quando refundada como República bolivariana. 

Falando em rotação e movimento, o movimento de rotação que a Terra realiza sobre si mesma, não deixando dúvidas sobre sua ‘redondura’, e é responsável pela sucessão dos dias e das noites em cada um dos seus quatro hemisférios, é a inspiração para a maior festa chinesa só equivalente ao Ano Novo local. Sempre conectada com os fenômenos da natureza, ainda neste mês de setembro a China comemora o Festival da Lua. Também conhecido como Festival de Meio de Outono, o acontecimento celebra o fim da colheita que assegura o alimento das famílias durante os três meses do rigoroso inverno chinês, que tem início oficial em dezembro, mas desde novembro começa a dizer a que vem com temperaturas médias em torno de 7 graus no máximo e mínimas que chegam a menos de 40 graus. O Festival da Lua é a festa da reunião da família que se encontra quando o calendário lunar informa o dia em que a lua estará no seu momento mais formoso, cheio e brilhante. Sob o plenilúnio, os afetos familiares e eletivos se juntam para apreciar e agradecer a beleza da abundância e da união iluminada pela generosa luz do luar e repartir o delicioso Bolo da Lua, prato principal da noite carregada de votos de Paz, Felicidade e Alegria. Así es.

 

Fonte: Brasil 247

 

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