Interiorização
da indústria avança na Bahia
Depois de algumas tentativas de formação de polos
industriais localizados em cidades estratégicas, dos quais nem todos vingaram,
a pulverização e diversificação impulsionam o avanço da indústria no interior
da Bahia.
Algumas empresas se estabelecem em determinadas
regiões atraídas por incentivos governamentais ou, simplesmente, devido à
vocação natural dos municípios envolvidos. É claro que infraestrutura e logística
também contam, mas, fora dos grandes pólos a industrialização também avança a
passos largos.
A disponibilidade de terras oferece ampla
possibilidade de cultivo para a agroindústria, e não apenas para o cultivo de
grãos. Novas tecnologias, investimento em mecanização e desenvolvimento de
geração de energia sustentável e mais barata também contribuem para o avanço da
indústria no estado.
Titular da Secretaria estadual de Desenvolvimento
Econômico (SDE), Ângelo Almeida, destaca o perfil da indústria baiana. Dados da
secretaria, coletados em parceria com a Federação das Indústrias da Bahia
(Fieb) e Serviço de Apoio à Micro e Pequena Empresa (Sebrae), comprovam que são
os micro e pequenos empreendedores os responsáveis pelo avanço da
industrialização.
Das 17 mil indústrias registradas na Bahia, 93,4%
são micro e pequenas empresas, segundo a SDE. “De 2021 a 2002 foram 99.300
novos registros abertos, fazendo nosso setor de micro e pequenos empreendedores
chegar a 1.120.900 pequenos empreendedores industriais, uma quebra de recorde”,
festeja o secretário.
Boa parte desses empreendimentos foram viabilizados
através de políticas públicas e também pela ampliação de oferta de energia
limpa, primeiro eólica, no governo Jaques Wagner, e, na sequência, a solar, durante
as gestões de Rui Costa, de acordo com o secretário.
“A energia eólica e solar puxou esse crescimento.
Podemos citar a indústria calçadista, que direcionou muito investimento para o
interior, as próprias agroindústrias, com o investimento do estado consolidou
com o surgimento da SDR (secretaria de desenvolvimento rural) a expansão para o
interior”.
A produção de alimentos é apontada como a principal
atividade industrial presente em quase todo o estado. Segundo Danilo Peres,
gerente de Estudos Técnicos da Fieb, essa presença pode ser medida pelo
registro de grandes empresas.
Um bom exemplo é a agroindústria de grãos,
estruturada no oeste baiano em torno do cultivo da soja, algodão e milho, com
grandes multinacionais como Bungee e Cargill, ou ainda, no norte, em Juazeiro,
onde a Agrovale projeta uma colheita, este ano, de 1,9 milhão de toneladas de
cana.
Colheita que será revertida em 150 mil toneladas de
açúcar, 56 milhões de litros de etanol e a geração de 50 Megawatts de energia.
Grandes multinacionais de laticínios e refrigerantes, além de frigoríficos
(Nestlè, Pepsi e Avipal), também se utilizam do grande potencial logístico de
Feira de Santana para distribuir sua produção.
A Dass, indústria de calçados, possui plantas em
cinco municípios. Itaberaba, Vitória da Conquista, Iguaí, Santo Antônio de
Jesus e Santo Estevão. Somente em Itaberaba, a empresa responde por 4 mil
postos de trabalho, entre diretos e indiretos, segundo a Prefeitura local. A
Tarde buscou contato com a Dass, mas devido a um “momento de indefinições
econômicas, políticas e jurídicas”, a empresa preferiu não se manifestar.
Outro exemplo de um pólo industrial consolidado são
as fábricas de bebidas instaladas em Alagoinhas. A qualidade da água disponível
no aquífero São Sebastião é um atrativo natural para cervejarias e empresas
produtoras de sucos, refrigerantes e água mineral, claro.
Apesar de dificuldades enfrentadas pelo grupo
Petrópolis, que pediu recuperação judicial, a cadeia produtiva estruturada em
torno da água do município emprega e gera riqueza.
Somente de cerveja, são produzidos 13,8 milhões de
hectolitros (1,38 bilhões de litros) produzidos anualmente, gerando cerca de 2
mil empregos, entre diretos e indiretos, movimentando um entorno de empresas
envolvidas na produção de caixas plásticas, mesas, cadeiras, tampinhas
metálicas e latas de alumínio.
Em Ilhéus, das 50 empresas que chegaram a integrar o
pólo de informática, cerca de 20 ainda sobrevivem, mas com boas perspectivas.
Atualmente, o setor emprega de 2,5 a 3 mil trabalhadores, chegando a 6 mil com
os indiretos.
Sílvio Comin, diretor da Daten e presidente do
Sinec, Sindicato das Indústrias de Informática e Eletrônica de Ilhéus e
Itabuna, festeja a renovação do decreto governamental de 1995 que garante
redução de ICMS para o setor e relata uma demanda crescente.
“O principal desafio hoje é nos manter competitivos
e atrair novas empresas”, diz Comin, que vê na presença de um Instituto Federal
de duas universidades com cursos voltados à área de tecnologia como um
diferencial no desenvolvimento de novos sistemas e produtos, que se traduziu
num crescimento de 61,9% em 2022.
• Pelos
municípios
Mas, a despeito dos números impactantes e da
concentração desses polos, a produção, segundo Peres, está pulverizada em
vários municípios, em sua maioria com empresas de menor porte e processos de
produção menos elaborados.
Nesse perfil se encaixam as vinícolas do vale do São
Francisco, indústrias de plásticos e detergentes em Vitória da Conquista, além
de uma vasta variedade de itens. “À exceção do
oeste, são todas empresas baianas, ao contrário das indústrias
instaladas na Região Metropolitana de Salvador”, afirma Peres.
Um caso de sucesso é a indústria de biscoitos
Itália, que há 43 anos opera em Feira de Santana, vendendo para toda a região do
entorno. Segundo o diretor Geraldo Pires, a pandemia não afetou a produção,
pelo contrário.
Este ano, apesar de uma leve queda nas vendas no
primeiro trimestre, a empresa projeta crescimento e espera produzir 4,2 mil
toneladas das quatro linhas de biscoito da empresa, além de salgadinhos de
milho. Com 80 funcionário, a pequena indústria planeja expandir em 50% a
capacidade de produção a a partir do segundo semestre, com investimento
aproximado de R$ 2 milhões.
Para acompanhar o crescimento das indústrias no
interior e contribuir com o surgimento de novas empresas, a Fieb promoveu a
expansão dos Núcleos de Apoio ao Crédito (NAC/Fieb) para seis regiões da Bahia.
Além de Salvador, Feira de Santana, Ilhéus, Jequié,
Vitória da Conquista, Barreiras e Juazeiro passaram a contar com os serviços
voltados especialmente para as pequenas indústrias. Por meio do NAC, o
empresário é orientado sobre as várias linhas disponíveis com condição melhor
do que o que é oferecido normalmente no balcão dos bancos.
“O NAC talvez seja uma das ações mais importantes da
Fieb porque o crédito no Brasil é uma via crucis”, define o empresário
Waldomiro Araújo Filho, proprietário da WUniformes, do segmento têxtil. “O
pequeno empresário nunca consegue tomar um crédito de qualidade se não for
agregado a um serviço que não interessa para ele”, detalha Araújo.
Bahia
enfrenta desafio de atrair novos investimentos industriais
O panorama é, sobretudo, desafiador diante da
urgência de neoindustrializar o Brasil e dos avanços tecnológicos nas atividades
produtivas e administrativas do setor industrial. Dentro deste contexto, a
indústria na Bahia – maior da região Nordeste e sétima posição na indústria de
transformação do país – exerce papel relevante ao continuar atraindo
investimentos no segmento de geração de energias eólica e solar, mineração,
automotivo e produção de hidrogênio verde. Em contrapartida, o Estado tem
apresentado baixa atratividade para novos empenhos, na avaliação da Federação
das Indústrias da Bahia (Fieb) que, nesta quinta-feira, 25 de maio, celebra o
Dia da Indústria e comemora mais de sete décadas de atuação com a campanha “75
anos – nosso presente continua sendo o futuro”.
A indústria na Bahia, conforme dados da Fieb,
representa mais da metade da arrecadação de Imposto sobre Circulação de
Mercadorias e Serviços (ICMS) do Estado e emprega 437 mil trabalhadores com
carteira assinada, gerando uma massa salarial anual superior a R$ 10 bilhões. O
parque industrial baiano responde por 39,8% do Valor se Transformação
Industrial (VTI) do território nordestino, correspondendo a um montante
superior a R$ 52,6 bilhões, ou seja, maior que a soma do que é produzido pelas
indústrias de Pernambuco e Ceará, que, juntas, alcançam R$ 48,2 bilhões. No âmbito nacional, a economia brasileira perdeu
o ritmo de crescimento desde março de 2022 ao alcançar taxas anuais de
crescimento de 4,9% em fevereiro de 2022, encerrando o ano com crescimento de
2,9% e projeção para 2023 de baixo crescimento do Produto Interno Bruto (PIB)
brasileiro e da produção.
Considerando o horizonte de médio prazo, o
presidente da Fieb, Ricardo Alban, ressalta que, na Bahia, a grande expectativa
em relação à produção de hidrogênio verde é o início e a conclusão das
operações da primeira fábrica de Hidrogênio Verde do Brasil (Unigel). Também em
termos setoriais, a entidade avalia que a Construção Civil, após ter vivido um
bom momento em 2022, deve desacelerar este ano, por conta dos juros altos. Na
Indústria de Transformação se destaca a área de Refino, que deve continuar em alta.
A Petroquímica deve ter estabilidade na produção, uma vez que não há fato
significativo no cenário interno e os preços internacionais estão estáveis nos
últimos meses. Um ponto de atenção, ainda segundo a federação, é a questão do
preço do gás natural.
• Cenário
de incertezas
Ricardo Alban considera que o cenário do setor
industrial baiano e brasileiro está coberto de incertezas. “Este ano, deveremos
ter um nível baixo de crescimento econômico no mundo, como consequência dos
desarranjos da pandemia e, sobretudo, dos efeitos da guerra na Ucrânia. No
contexto interno, também enxergamos uma série de dificuldades por parte do
setor público no âmbito fiscal e na construção de políticas. Adicionalmente,
enfrentamos uma política de aperto monetário, com elevadas taxas de juros, que
encarecem o crédito e inibem a economia”.
Frente à longa crise de competitividade em nível
internacional, a atividade industrial, afirma o presidente da Fieb, tem se
comportado “incapaz de compensar o que se costuma chamar de Custo Brasil”, que
se refere a questões como sistema tributário ineficiente, caro e injusto; baixo
investimento em infraestrutura e oferta de mão-de-obra qualificada; energia
cara e insegurança jurídica, entre outras. “Com isso, ano a ano a participação
do setor industrial na economia brasileira e baiana cai, configurando o que
entendemos ser um processo acelerado e precoce de desindustrialização, que
precisamos encontrar caminhos de reverter sob pena de nos tornarmos um mero
país exportador de bens primários, ou seja, agrícolas e minerais”.
O gerente de Estudos Técnicos da Fieb, Ricardo
Kawabe, reforça que a economia brasileira vive um momento desafiador, com uma
série de dificuldades a superar. “O mundo vive, hoje, um momento de restrição,
com baixo crescimento nas principais economias, reduzindo o comércio
internacional e os preços dos bens tradable (commodities). O mercado interno
também está em desaceleração desde o segundo semestre de 2022, com expressiva
influência das taxas de juros elevadas que encarecem o crédito e inibem o
consumo. Desse modo, as perspectivas para o setor industrial, este ano, são de
estabilidade ou baixo crescimento”.
Para Kawabe, o Brasil precisa recolocar a indústria
na sua estratégia de desenvolvimento, percebendo que “é quase impossível”
alcançar níveis elevados de desenvolvimento econômico e social sem uma
indústria forte, que reduza a dependência do país por bens importados. “As
dificuldades vividas na pandemia foram ilustrativas nesse sentido. Um país do
tamanho do Brasil não pode depender tanto do fornecimento externo em coisas
como medicamentos, equipamentos médicos, produtos de higiene, fertilizantes e
tantas demandas que a indústria nacional poderia atender”.
Os maiores desafios enfrentados pela Indústria,
completa o especialista, passam pela superação dos componentes do citado Custo
Brasil, bem como pelo enfrentamento dessas questões externas estruturais
internas. “As empresas industriais precisam se ajustar às tendências globais e
investir, por exemplo, na inovação e na renovação dos portifólios, na
descarbonização de processos e produtos, apostando, por exemplo, na Indústria
4.0”, opina.
Fonte: A Tarde
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