domingo, 6 de dezembro de 2015

“A direita brasileira sempre foi golpista”, por Emir Sader

A direita brasileira, como expressão das elites, sempre considerou que era possuidora da visão correta sobre o acontecia no pais. Que era derrotada eleitoralmente pela manipulação que lideranças populistas fazem da consciência de amplas camadas do povo, sem instrução, comprado por benesses de políticas assistencialistas.
Foi assim contra o Getulio que, segundo ela, governava sem métodos democráticos. Quando a democracia liberal foi restaurada em 1945, para sua decepção, o candidato lançado por Getulio triunfou sobre o candidato das elites. O próprio Getulio voltou a vencer em 1950.
Dai nasceram as teses do voto qualitativo. O voto de um engenheiro ou de um medico nao podia valer o que valia o voto de um operário – chamado depreciativamente de “marmiteiro”, por levar a comida para o trabalho em marmitas. Havia distintas propostas, até aquela que dava aos profissionais com formação superior o valor 10, contra o valor 1 aos menos instruídos.
Mas desde que foi formada a Escola Superior de Guerra, por Golbery do Couto e Silva e Humberto Castelo Branco, retornados da campanha da Italia na segunda guerra mundial sob a influencia norte-americana, que identificada os EUA como o berço da democracia, as estratégias golpistas começaram a ser formuladas explicitamente.
A ESG difundia e formava  militares, no Brasil e na Escola das Américas, no Panamá, na  Doutrina de Segurança Nacional. A doutrina, expressão clara do período da guerra fria, considerar que as sociedades e o próprio Estado era objeto de trabalho subversivo inoculado de fora para dentro, desde a URSS, a China e, depois, também de Cuba.
Era necessário depura-los desses riscos, tomando o Estado e transformando-o num quartel general da luta para depurar o pais desses riscos. O corpo social deveria funcionar como o corpo humano, em que cada parte atua em função do todo. Qualquer distúrbio perturba esse bom funcionamento e deveria ser extirpado. Em termos políticos, era o que se considerava os subversivos, vias de introdução das contradições sociais, que sabotava o bom funcionamento da sociedade e do Estado.
O governo do Getulio entre 1950 até sua morte em 1954 foi acompanhado por intenso trabalho de conspiração militar, que desembocou na conjuntura que o levou ao suicídio e, com isso postertou por 10 anos o golpe militar. Mas durante o governo de JK o trabalho continuou, com duas esporádicas tentativas golpistas por parte de militares sublevados.
A eleição de Janio Quadros parecia finalmente impor a vontade da maioria influenciada pela direita que, tal qual hoje, considerava que o problema fundamental do pais era a corrupção, de que a construção de Brasilia seria o exemplo mais escandaloso. Janio, com sua vassoura, iria varrer a corrupção e regenerar a democracia no pais.
O fracasso rápido do Janio acionou imediatamente os mecanismos golpistas, que só foram evitados pela reação popular e pela ameaça de potencia-la com a força militar que o Brizola, governador’ do Rio Grande do Sul, ameaça acionar.
Mas a preparação do golpe foi ganhando formas orgânicas, políticas, empresariais, religiosas e militares, até que desembocou no golpe de 1964 que unificou praticamente à totalidade do grande empresariado, de toda a mídia – com raras exceções -, da Igreja e de grande parte da elite política, com o apoio explicito dos EUA. Nunca como naquele momento a direita se expressou, de forma unificada, em um projeto próprio, que era o da mais brutal ditadura que o pais conheceu. A pregação dos riscos que a democracia correria eram apenas um instrumento para destruir o que havia de democracia e impor uma ditadura militar. Os editorias dos principais jornais saudavam o golpe como o resgato da democracia.
A ditadura não apenas destruiu tudo o que havia de democrático no Brasil, sob o pretexto de ser instrumentos da subversão comunista, como impôs o arrocho salarial e interveio em todos os sindicatos, para felicidade do grandes empresários nacionais e estrangeiros. Arrocho que foi o santo e a chave para entender o “milagre econômico”.
A transição à democracia do suportada com incomodidade pela direita, que buscou, de todas formas, limitar seu alcance, impedindo a eleição direta para presidente, elegendo o primeiro presidente civil através do Colegio Eleitoral. Assim que Ulysses Guimaraes promulgou a “Constituição cidadã”, Jose’ Sarney colocou o tema da ingovernabilidade da democracia, em que a excessiva quantidade de direitos reconhecidos tornava o Estado ingovernável – uma temática que começava a introduzir a agenda neoliberal no Brasil.
A agenda neoliberal era centralmente uma agenda anti-democrática, projetando a centralidade do mercado e do dinheiro a expensas da politica e da democracia. Os direitos sociais foram atacados, o poder do dinheiro penetrou fundo na sociedade e na mentalidade das pessoas, a a sociedade foi sendo reformulada conforme o modelo do mercado, em que tudo se compra, tudo se vende, tudo tem preço.
O fracasso dos governos neoliberais de Collor e de FHC desembocou nos governos do PT, contra os quais a direita sempre conspirou, jogando o poder dos monopólios privados da mídia para tentar desestabilizar os governos. A direita basileira nunca se conformou com as sucessivas derrotas eleitorais, que recordavam as derrotas contra o Getulio e seus candidatos.
As versões do voto qualitativo renasceram no ódio contra os nordestinos e contra as camadas populares em geral, identificadas como as responsáveis pelas derrotas sucessivas da direita nas eleições.
A tese do impeachment hoje é apenas uma versão a mais de uma direita que não consegue conquistar apoio popular no tipo de sistema politico que ela mesma consagrou como democrático. As teses são similares às do passado: “compra” da consciência popular mediante concessões de politicas governamentais, subversão do Estado pela corrupção e pela utilização do governo como forma de se perpetuar no poder.
O objetivo da direita é um só: tirar o PT do governo. Não conseguiu pela via eleitoral, teme que Lula possa dar continuidade ao governo da Dilma e por isso ataca o governo tentando inviabilizá-lo ou derrubá-lo e/o tentar impedir que a liderança popular do Lula leve a uma continuidade dos governos atuais. 


Emir Sader: colunista do 247, é um dos principais sociólogos e cientistas políticos brasileiros

“Banda podre da política quer golpe contra Dilma”, por Laurez Cerqueira

Além da força dos negócios na área do petróleo, cristalizada no projeto de lei do senador José Serra, uma das coisas que está por trás da movimentação da oposição, que tem à frente Eduardo Cunha como a mais bem acabada expressão da banda podre da política brasileira, é a ira latente pelo fim da política de Estado de combate à corrupção.
A oposição e Eduardo Cunha não estão aguentando ver os destroços da estrutura da corrupção endêmica que sempre dominou a política brasileira.
Eles não estão suportando olhar para o horizonte e ver o deserto em que está se transformando o cenário político sem os esquemas de financiamento de campanhas eleitorais e de domínio do poder econômico sobe a política.
Eduardo Cunha foi eleito presidente da Câmara dos Deputados com os votos da oposição, que optou por abandonar o candidato dela, Deputado Júlio Delgado, para derrotar o candidato, Arlindo Chinaglia.
Em seguida se juntou com Aécio Neves para o golpe, rompeu com o governo em 16 de julho deste ano, jurou de morte o governo, por ter sido flagrado na Operação Lava-Jato, e disse que faria uma tempestade na vida da Presidenta Dilma.
Eduardo Cunha, em conluio com a oposição, conseguiu aprovar na Câmara, depois de atropelar o Regimento, o financiamento de campanhas eleitorais por empresas privadas, na lei da Reforma Política.
Dilma vetou.
Eles intensificaram as ameaças de impeachment.
Naquele momento, o Supremo Tribunal Federal também havia decidido pela inconstitucionalidade do financiamento de campanhas eleitorais por empresas privadas.
O ministro Gilmar Mendes, que costuma atuar na mesma linha política da oposição, finalmente devolvera o processo, o qual ele havia pedido vista e engavetado, mesmo tendo o STF decidido pela inconstitucionalidade por seis votos a um.
Em seguida o ministro do Tribunal de Contas da União, Augusto Nardes, produziu o tal parecer das tais ” pedaladas fiscais”,  que mais parece uma peça de ficção, com intenções claras de  dar à oposição e a Eduardo Cunha um instrumento para articular o impeachment da Presidenta Dilma.
Augusto Nardes está sendo investigado pelo Ministério Público e pela Polícia Federal por suspeita de ter embolsado R$ 1,65 milhões, segundo a Operação Pelotes.
O que Eduardo Cunha e a banda podre da política querem é desmontar a política de Estado criada pelo Presidente Lula e continuada pela Presidenta Dilma, de combate à corrupção, que está implodindo as bases da estrutura de corrupção no Brasil, levando grandes empresários, banqueiros e políticos inescrupulosos à prisão.
Querem voltar ao que era antes. Consta, por exemplo, nos arquivos do judiciário e do Ministério Público, que durante os dois mandatos do ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso foram arquivadas 217 investigações e engavetadas outras 242, envolvendo 194 deputados, 33 senadores, 11 ministros, e quatro contra o próprio ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso.
O “Mensalão Mineiro”, o escândalo do Metrô de São Paulo, e muitos outros, dormem nos órgãos de fiscalização e controle e no judiciário.
Uma oposição que quer esconder seu passado, assim como escondeu os escândalos dos seus governantes, quando nomeava para cargos dos órgãos de fiscalização e controle do país pessoas para bloquear as iniciativas de investigação dos desmandos contra o Estado.


Laurez Cerqueira: Autor, entre outros trabalhos, de Florestan Fernandes - vida e obra; Florestan Fernandes – um mestre radical; e O Outro Lado do Real

“Independência ou golpe?”, por Neggo Tom

Quarta-feira, 02 de dezembro de 2015.  Um deputado com mania de Imperador ergue a sua panela as margens do mar de lama que rodeia a sua reputação e solta o paranoico brado retumbante: Independência ou golpe?! E assim foi proclamada a república golpista do Brasil, cuja bandeira, além de um tucano careca e cansado como símbolo, traz os dizeres: “Somos todos golpistas.”
Dom Cunha 171 decidiu romper com a democracia e instituir a Eduardocracia. Quem não estiver ao seu lado ou ceder as suas chantagens, está contra. E se está contra, ele faz de tudo para derrubar. Curioso é que, graças ao processo democrático ele se elegeu deputado e mesmo com todas as provas já expostas de que ele é um corrupto de carteirinha, ele ainda permanece exercendo o seu mandato e presidindo a câmara dos deputados. Provas essas que não são suficientes, ou até mesmo inexistem, para legitimar o processo de abertura de impeachment contra a presidente Dilma. Não que ela seja um anjo de candura. Está longe disso. Mas para condenar é preciso provas concretas.
Não vou entrar no campo técnico da política porque não estou apto para isso, mas gostaria de chamar a atenção da população para alguns aspectos e situações simples que envolvem todo esse processo de fritura da atual presidente e consequentemente do seu partido. E que talvez nos permita compreender um pouco do que realmente está por trás disso tudo. Quando as panelas começaram a bater nas varandas gourmets de alguns membros da elite, o argumento era de que se clamava por justiça e pelo fim da corrupção. Pois bem! A indignação do “povão” cresceu, as varandas e sacadas dos apartamentos nos jardins ficaram pequenas para abrigar tamanha sede de justiça e o som das panelas foi parar nas ruas do país, como numa espécie de festa temática, que bem poderia ser batizada de “Coxinhas Part y”.
Manifestantes de origem pobre, que comprometeram a sua “bolsa família” para comprar a camisa da seleção brasileira de futebol por R$ 300,00 para serem bem aceitos nos protestos, se uniram a elite num só grito contra o comunismo petista que estava destruindo o que antes era um país de Alice, cheio de maravilhas, políticos honestos e sonhos encantados. Negros e brancos assalariados participaram ativamente na linha de frente dessas manifestações e eram mostrados com destaque pela mídia patrocinadora do evento. Eles de certo protestavam contra os “privilégios” das cotas sócio-raciais e outras políticas de afirmação social que o governo vermelho e malvado instituiu e os deu maior visibilidade, irritando assim a elite historicamente mal acostumada a deter tudo o que é de melhor na sociedade. Qualquer ironia nesse parágrafo, não é mera coincidência.
Cachorrinhos e suas madames desfilavam pela Av.Paulista e por outras avenidas a beira mar, dividindo o mesmo champanhe e comendo do mesmo caviar, como prova de igualdade social. Os óculos escuros, importados e das mais variadas griffes, escondiam as lágrimas de dor e sofrimento daquele povo que agora sentia o seu poder e o seu status ameaçados pela corja populista que insistia em contrariá-los e continuar concedendo alguma coisa aos que nada tinham. As bolsas Chanel guardavam as panelas bem areadas pelas mãos daqueles que eles sempre julgaram inferiores para ter direitos iguais aos deles, mas superiores na arte de esfregar o seu chão e servir a sua mesa. A cada dez passos de exaustiva caminhada por justiça, debaixo do sol escaldante dos trópicos, um gole na garrafinha de água perrier, repunha as energias. E a luta continua.
A luta foi tão intensa, que eles se cansaram de protestar e deixaram as panelas de lado quando as contas secretas na Suíça, de propriedade do novo herói da república foram descobertas. As panelas também não bateram quando o governo do PSDB surrava os Professores em praça pública no Paraná. As panelas também se omitem quando estudantes paulistas entre 12 e 16 anos são espancados pela polícia de outro governo tucano, apenas por estarem lutando pelo direito de estudar. Pensando bem, nunca ouvimos o som dessas panelas protestando contra o salário mínimo, contra o racismo, contra a desigualdade social, contra a pobreza extrema. As varandas também não se manifestaram contra um helicóptero, que transportava um pó de origem suspeita, e que pousou no território do candidato a salvador da pátria, escolhido pela m esma elite como o restaurador da ordem e da paz no País.
Ao que parece os apoiadores do golpe só erguem as suas panelas quando lhes convém. Não importa se o indivíduo é corrupto ou ladrão. Desde que este esteja disposto a tirar o PT do poder, os seus pecados estão perdoados. É a glamorização da corrupção. É a tradição que precisa ser mantida. Desde o império a elite pode tudo. O sobrenome se sobrepõe a lei. Não defendo esse ou aquele partido. Não ponho a minha mão no fogo por esse ou aquele político. Mas é preciso raciocinar um pouco. O povo tem direito de pensar e chegar as suas conclusões sem interferências. A mídia golpista terá um papel importante nesse processo de impeachment. A manipulação será grande. É preciso estar atento e forte.
Proponho alguns questionamentos. Ainda que as provas tivessem sido suficientes contra ele, você acredita mesmo que foi o povo com a carinha pintada que tirou o Fernando Collor do poder? Depois do seu impeachment a corrupção acabou? Você acredita que veremos caras pintadas nas ruas nesse novo processo? Você acha que a elite, maior interessada no impeachment da Dilma, vai querer estragar a sua cútis tratada com água de coco, com tinta guache? E se a Dilma sair o que vai melhorar para você? Quem assumir o poder vai mudar tudo para melhor da noite para o dia?  A corrupção vai acabar? Você quer um impeachment por convicção ou por pirraça, pelo fato de não ir com a cara da presidente? Você quer um país mais justo ou quer perpetuar a política do “Bom xibom xibom bombom”, onde o rico cada vez fica mais rico e o pobre cada vez fica mais pobre? A quem interessa esse golpe na democracia?
O novo imperador conseguiu chegar às margens do mar da sua loucura pelo poder e dar o seu grito. Mas se ele der mais um passo a frente, se afogará no mar de lama que o cerca. Eu acho que a derrota dos golpistas será mais vergonhosa do que os 7x1.
Gol da Alemanha!


Neggo Tom: Cantor e compositor. É pobre, detesta doença e mais ainda camarão

“Prefiro viver de pé a morrer ajoelhado”, por Camilo Vanucchi

A frase conhecida é outra. Encontrei num livro com citações do Che: "Prefiro morrer de pé a viver ajoelhado." É assim que aparece gravada, em espanhol, ao lado da famosa foto de Alberto Korda num quadro pendurado atrás da minha mesa de trabalho.
Lembrei-me da frase na quarta-feira, 2 de dezembro, no exato momento em que Eduardo Cunha afirmou que acatoaria o pedido de impeachment de Dilma Rousseff, protocolado em outubro pelos advogados Hélio Bicudo, Miguel Reale Jr. e Janaína Conceição Paschoal.
A frase fazia sentido. Sempre fez e sempre vai fazer. Naquele momento, em especial, o subversivo axioma funcionava como um farol a apontar o único caminho possível para dirigentes, parlamentares, filiados e simpatizantes do Partido dos Trabalhadores. Um caminho de coerência política, de respeito a seu estatuto e à sua história, de sinergia com aqueles que referendaram a continuidade do governo Dilma nas urnas.
Dias antes, ventilava-se na "grande imprensa" o boato de que setores do PT aceitariam salvar Eduardo Cunha na Comissão de Ética da Câmara dos Deputados em troca da promessa de que ele não acolheria nenhum dos pedidos de impeachment presidencial protocolados ao longo do ano. Deflagrados por setores da mídia afeitos ao golpe, esses boatos acenderam o sinal de alerta entre os petistas. Uma situação tão absurda e constrangedora quanto a comparação entre Cunha e Dilma. Repare: Ele está sendo investigado no Brasil e no exterior; ela não. Ele tem quatro contas na Suíça e a suspeita de ter transferido para lá dinheiro obtido de forma ilícita; ela não. Ele tem uma dezena de denúncias de corrupção recebidas desde 1991, ela não. Ele é acusado de coagir e chantagear testemunhas, ela não. Por isso o alívio quando os três deputados petistas da comissão declararam que a bancada havia deliberado pelo apoio à objeção ao projeto. Horas depois, Cunha cumpriu a promessa velada e acolheu pedido de impeachment. Passado um instante de choque e inação, veio a euforia: liberdade ainda que tardia. Se alguém ainda acreditava na existência de conchavos dessa espécie, a resposta veio escaldante: é melhor morrer de pé que viver de joelhos.
Convertida em meme, a frase de Che alçou voo e colecionou erratas. Um amigo contou que um amigo dele, de origem portuguesa, tinha chamado sua atenção ao ver o post: antes do Che, a frase havia sido dita por Dolores Ibárrui, durante a Guerra Civil Espanhola, ele corrigiu. "Antes morrer de pé do que viver de joelhos", ela teria dito nos anos 1930, insuflando os manifestantes contra as tropas do general Franco, segundo a Wikipedia.
Muito antes dela, Emiliano Zapata, no México, discursou igual conteúdo. "É melhor morrer de pé do que viver de joelhos" teria dito o herói nacional, insurgido contra a ditadura de Porfírio Díaz já na década de 1910.
Finalmente, é atribuída a José Marti, o poeta cubano, uma quarta versão da frase: "Mais vale um minuto de pé do que uma vida de joelhos". Isso no século XIX.
Se a frase não fosse boa, de certo não teria sido tantas vezes repetida e imortalizada, em discursos de tão importantes rebeldes visionários. Mas, sem menosprezar José Marti, Zapata, La Pasionaria ou Guevara, é sua inversão que eu proponho: Antes viver de pé do que morrer de joelhos.
Quem vive de joelhos morre. Quem se levanta vive. Assim tem sido desde tempos imemoriais — ou pelo menos desde que Freud apresentou a psicanálise.
No ambiente político brasileiro neste finalzinho de 2015, não é verdade que Dilma ou o PT correm o risco de morrer se estiverem dispostos a se levantar. Ao contrário, ficar de pé é a única maneira de se manterem vivos.


Camilo Vanucchi: Jornalista, escritor, mestre em Ciências da Comunicação (ECA-USP) e assessor parlamentar. E-mail: camilo.vannuchi@gmail.com

sexta-feira, 25 de setembro de 2015

‘Estuprando os anais’, por Helder Caldeira

Deve ser profundamente vergonhoso para a presidente Dilma Rousseff assistir aos descalabros que os anais de seu (des)governo estão produzindo. É demasiado triste, e deveras criminoso, constatar que ideologias político-partidárias, empoleiradas no ambiente de governança, estão escrevendo a História do Brasil sob o signo do absoluto desprezo por aquilo que convencionou-se chamar de Res publica e que, neste quinhão tropical do planeta, ganhou contornos de montículo de apaniguados cupins.
Foi-se a época quando a documentação oficial da Presidência da República e de seus Ministérios, do Congresso Nacional e das cortes de Justiça era farto material a narrar, com seriedade, e até digníssimas transgressões, os tempos da sociedade brasileira. A epistemologia da identidade nacional revelada em cartas, discursos, acórdãos, ofícios, memorandos e todo vasto universo de documentos dos Três Poderes. O extraordinário valor do cacófato: foi-se o tempo...
Daqui 100 anos, quando algum historiador vasculhar os documentos deste nosso conturbado tempo, verificará que as autoridades do Brasil protagonizaram o afogamento das instituições nas águas rasas da imbecilidade. Presidentes, ministros, senadores, deputados e o grosso caldo de assessores de coisa nenhuma vociferando contra o império da Lei, atacando o Estado Democrático de Direito, vomitando impropérios, profanando registros históricos com linhas beócias. A ausência de firmeza de caráter e de convicções abunda nos anais brasileiros deste início de século XXI.
Faz lembrar Guimarães Rosa — por Dilma tão celebrado, ainda que pouco decantado — em sua Magnum opus “Grande sertão: veredas”. Escreveu, em quase vaticínio: “O senhor sabe o mais que é, de se navegar sertão num rumo sem termo, amanhecendo cada manhã num pouso diferente, sem juízo de raiz? Não se tem onde se acostumar os olhos, toda firmeza se dissolve.
Não por acaso — e talvez por enorme simbolismo —, depois que o topo da cadeia santificou a mandioca e beatificou o milho, restou ao Ministério da Cultura cravar nos registros oficiais da República uma peça repugnante. Trata-se de uma nota oficial de esclarecimentos, assinada pela Assessoria de Comunicação Integrada e publicada no dia 17 de setembro de 2015 no site do MinC e nas redes sociais com o título: “Cultura e informação melhoram até os reaças”. Com direito a smile e toda pândega lambança entre partido político e Estado, entre o viés de bandos privados e os bens públicos, marca indelével do aparelhamento que o PT promoveu nas instituições.
É absolutamente inaceitável que um órgão de Estado permita a utilização de instrumentos oficiais para encangalhar ideologias e hastear bandeiras duvidosas. Se o titular da pasta foi aviltado por declarações de “reacionários” — “a despeito da irrelevância”, diz a nota —, há um foro específico para que ele possa, legitimamente, buscar a reparação: chama-se Poder Judiciário. Não será, e isso é certo, uma postagem em redes sociais, carregada de embustes pueris, a adequada defesa.
Aliás, cumpre questionar ao Exmo. Sr. Ministro: está sobrando tempo à vossa equipe para elaboração de respostas a irrelevâncias? O Ministério da Cultura consegue distinguir o que é relevante daquilo que é irrelevante? Afinal, o próprio texto da nota oficial revela o contrassenso ao que se imagina e espera de cidadãos com algum trabalho a executar num governo, não obstante custeados pelos impostos cobrados do povo brasileiro.
Petulância, arrogância, imodéstia, baixíssimo domínio da ferramenta linguística. Nada que remeta minimamente à seriedade que uma nação almeja de seus governantes e dos asseclas que gravitam às cercanias do umbigo do Estado brasileiro. Para resumir a ópera dos malandros, a tal Assessoria de Comunicação Integrada estuprou os anais com sua dialética e pornográfica suruba ideológica. Lamentável.
A propósito, considerando o nível da nota oficial do Ministério da Cultura, destaca-se: por “ANAIS”, este substantivo masculino plural — do latim, annales —, leia-se “1) História de um povo contada ano por ano através de documentos; 2) Publicação periódica, anual; e 3) Publicação referente aos atos e estudos científicos, literários ou de arte” (Dicionário Michaelis, 2015). Parafraseando o vergonhoso texto da turma da Cultura (?!), cumpre reiterar: aprendam mais sobre isso! Qualquer outra acepção revela apenas a necessidade de assepsia.



HELDER CALDEIRA: Escritor e Jornalista Político

“Roubaram nossa Liberdade e Cidadania”, por Hildeberto Aquino

Foi-se o tempo em que podíamos até nos orgulhar de sermos donos de alguma coisa, pouca que fosse, mas pela qual lutamos honestamente. Hoje não!
Relógios, joias, carteiras, celulares, bicicletas, motos, carros, casas e até a nossa vida já não têm garantia.
Nem da sua liberdade você é dono, visto que não sabe sequer se vai e volta como lhe diz assegurar o art. 5, inc. XV da Constituição Federal.
Estamos reféns da bandidagem e das autoridades relapsas!
Em quem então confiar? Nas autoridades policiais com tantos desvios comportamentais como se demonstra em chacinas que escandalizam o mundo?
Na Justiça com sua lerdeza crônica e excessiva condescendência?
Nas autoridades políticas - essas nem cogitar, posto que com tantos escândalos que pululam pelos seus ambientes que transpiram corrupção, seria suicídio.
Estamos mesmo à deriva!
Armas são facilmente encontradas nas mãos da bandidagem enquanto as autoridades negam o porte e até a posse para cidadãos honestos.
As mesmas autoridades que permitem até “cracrolândias” se instalem em plenas ruas e o tráfico de drogas atue livremente sob os olhares complacentes de quem compete reprimir. E ainda têm a cara de pau de discutir a descriminalização das drogas (pior que por trás da “inocente” maconha estão heroína, ópio, craque, cocaína etc.).
Há ainda alguns que se escandalizam com a redução da maioridade penal e invocam os tais “direitos humanos” (direitos que só alcançam o lado bandido e descuram do cidadão honesto).
Esquecem-se das vítimas trucidadas com crueldade e impiedosamente por esses brutamontes, muitos dos quais de compleição física avantajada, como também da dor que sentem parentes, amigos, enfim a sociedade que irá chorar a perda dos entes queridos pelo resto de suas vidas.
A bandidagem já adotou a “Pena De Morte” onde vítimas são escolhidas aleatoriamente, não por culpabilidade da qual possam ser acusadas, mas por exclusiva conveniência dos marginais, e são trucidada, crudelissimamente, mesmo sem esboçar qualquer reação e tendo atendido aos pedidos dos bandidos que levam os seus pertences e a vida.
Enquanto isso nossos ditos “representantes”, eternos displicentes visto que cuidam apenas dos seus interesses enquanto discutem inocuidades - atentem que a discussão em curso é “reforma política” e que só no interesse deles.
Discussões que não focadas prioritariamente para a solução da segurança, saúde, educação, economia que são áreas de precariedade da Nação.
Poderiam pelo menos reavaliar essa postura e tratar de acabar com os privilégios tais como o fim da progressão penal (cumpra-se a pena integralmente); prisão perpétua e até pena de morte (os bandidos já o fizeram) para os crimes considerados hediondos (isto dentro de critérios mais severos possíveis para evitar que erros decorressem).
Estamos fartos de leis protecionistas, da impunidade que grassa vergonhosamente Brasil afora e de tanta leniência da parte dos Poderes constituídos. Liberdade já, e que se nos assegurem nossos direitos cidadãos!


José HILDEBERTO Jamacaru de AQUINO:  hildebertoaquino@yahoo.com.br
Leiam também nos endereços: http://blogdoaquino.blogspot.com,
www.tvrussas.com.br, no Jornal Folha do Vale (Limoeiro do Norte-CE) e

Jornal Gazeta de Notícias (Crato-CE).

Porque a ‘esquerda’ enveredou para o crime, por Augusto de Franco

O que está acontecendo com o PT não é um fenômeno isolado.
Aconteceu com vários grupos da esquerda autocrática depois da queda do muro de Berlim. Sobretudo na América Latina, em que muitos dirigentes de
organizações ditas revolucionárias enveredaram para o crime.
Conheci vários desses militantes que viraram bandidos.
Daniel Ortega, da Frente Sandinista, hoje presidente da Nicarágua, foi um deles.
Me lembro como se fosse hoje.
Ele foi convidado de honra no I Congresso do PT (que coordenei), no final de 1991.
Chegando lá, no Hotel Pampa, em São Bernardo, Daniel pediu logo ao tesoureiro do PT à época, se não podia arranjar umas prostitutas.
Esse Daniel e seu irmão Humberto, eram teleguiados de Fidel, que lhes passava pitos, aos berros.
Reuniões decisivas para o futuro da chamada revolução sandinista foram
realizadas em Havana, sob o comando de Fidel.
E enquanto as bases petistas da Igreja idolatravam por aqui os sandinistas como expoentes de uma nova espiritualidade dos pobres, esses bandidos assaltavam patrimônio público (inclusive passavam para seus nomes propriedades imóveis) do Estado nicaraguense.
O mesmo ocorreu com gente da Frente Farabundo Marti de Libertação
Nacional de El Salvador, que também está no governo.
Aconteceu com o Mir chileno (e com o Mir Militar) com alguns Tupamaros.
Com as FARC colombianas e, é claro, com a nova leva de bolivarianos, que não tinham tanta tradição de esquerda, como Chávez, Maduro e Cabello (mas aí já estamos falando de delinquentes da pior espécie, que inclusive
chefiam o narcotráfico na região) e como Rafael Correa e Evo Morales.
Bem, para resumir, aconteceu com boa parte das organizações e pessoas
que frequentam as reuniões do Foro de São Paulo (fundado, não por
acaso, um ano depois da queda do muro – e eu estava presente na
reunião de fundação, no Hotel Danúbio).
Não dando certo a revolução pela insurreição, pelo foquismo ou pela
guerra popular prolongada, esse grupo chegou à conclusão de que seria
preciso fazer a revolução pela corrupção.
Bastaria adotar a via eleitoral contra a democracia e depois assaltar o Estado para financiar um esquema de poder de longo prazo. O plano era simples: conquistar hegemonia sobre a sociedade a partir do Estado aparelhado pelo partido. O objetivo era claro: chegar ao governo pela via
eleitoral, tomar o poder e nunca mais sair do governo.
Para isso, entretanto, era necessário, além do tradicional caixa 2, fazer um
caixa 3, encarregado de custear ações legais e ilegais, ostensivas e
clandestinas, para controlar as instituições, comprar aliados, remover
ou neutralizar obstáculos…
Afinal, pensaram eles: as elites não fizeram sempre assim?
Para jogar o jogo duro do poder não se pode ter escrúpulos. Foi essa a conclusão de Lula, Dirceu e dos dirigentes petistas que tomaram o mesmo caminho.
É claro que, como ninguém é de ferro e como não se pode amarrar a boca
do boi que debulha, alguma compensação em vida esses bravos
revolucionários mereciam ter.
E foi assim que enriqueceram, abriram contas secretas no exterior para guardar os frutos dos seus crimes, adquiriram bens móveis e imóveis em nome próprio ou de terceiros e foram levando a vida numa boa enquanto o paraíso comunista não chegasse.
O ano de 1989 foi decisivo para essa degeneração política e moral da
esquerda.
Mas o que aconteceu não foi um resultado do somatório de
desvios individuais. Não!
Eles viram que seria muito difícil conquistar o mundo e assumir o comando de seus próprios países, contrapondo um bloco a outro bloco.
O bloco dito comunista se desfez.
A União Soviética derreteu em 1991. Ruiu tudo. E agora?
Bem, agora – pensaram eles – seria necessário ter uma nova estratégia. E eis que surgiu uma ideologia pervertida, baseada numa fusão escrota de
maquiavelismo (realpolitik exacerbada) com gramscismo.
Eles, como operadores políticos, conduziriam a realpolitik sem o menor pudor, enquanto que pediriam ajuda aos universitários para dar tratos à bola do gramscismo (e reproduzir mais militantes nas madrassas em que se
transformaram as universidades).
No Brasil, porém, parece que erraram no timing. Precisariam de mais
uns três ou quatro anos para ter tudo dominado, dos tribunais
superiores, passando pelo Congresso, pelo movimento sindical e pelos
fundos de pensão, pelos (falsos) movimentos sociais que atuam como
correias de transmissão do partido, pela academia colonizada, pelas
ONGs que se transformaram em organizações neo governamentais, por uma blogosfera suja financiada com dinheiro de estatais e por grandes
empresas (com destaque para as empreiteiras, atraídas pela promessa de
lucros incessantes quase eternos se estivessem aliadas a um sólido
projeto de poder de longo prazo).

Não deu tempo. O plano foi descoberto antes que as instituições fossem
completamente degeneradas. E chegamos então a este agosto de 2015, ano em que alguns desses dirigentes vão começar a assistir, de seus
camarotes na prisão, o desmoronamento do esquema maléfico que urdiram.


Augusto Franco - Ex-petista e participante da reunião de fundação do
Foro de São Paulo.

terça-feira, 1 de setembro de 2015

‘Lista de Furnas é a maior pedra no caminho de Aécio’, por Durval Ângelo

Não resisto a, mais uma vez, parafrasear o poeta mineiro Carlos Drummond de Andrade. "No meio do caminho tinha uma pedra/ Tinha uma pedra no meio do caminho/ Tinha uma pedra/ No meio do caminho tinha uma pedra."
Na última terça-feira (25), em depoimento à CPI da Petrobras na Câmara Federal, o doleiro Alberto Youssef trouxe à tona uma das maiores pedras no caminho do senador Aécio Neves (PSDB): a Lista de Furnas. Ele confirmou à CPI ter tomado conhecimento de que o então deputado federal recebia dinheiro de um esquema de corrupção na Centrais Elétricas de Furnas. A informação lhe teria sido passada por José Janene, ex-deputado do PP, morto em 2010, apontado como um dos beneficiários do esquema de pagamento de propinas investigado na Operação Lava Jato.
Vale recordar que, em depoimento anterior à Polícia Federal, o doleiro já havia afirmado que PP e PSDB "compartilhavam" uma diretoria de Furnas e que os pagamentos a políticos seriam de pelo menos 100 mil dólares mensais entre 1996 e 2000. Por sinal, denúncia oferecida pela procuradora Andréia Baião, da Procuradoria Geral da República (PGR) do Rio de Janeiro, em 2010, também havia revelado o esquema. Assim como Yousseff, ela apontava a empresa Bauruense como intermediária dos recursos arrecadados pela estatal para financiar as campanhas de 2002 do candidato derrotado à presidência, José Serra, de Geraldo Alckmin, eleito governador de São Paulo e Aécio Neves, eleito para o governo de Minas, todos do PSDB. O esquema seria operado pela irmã de Aécio, Andréa Neves.
E já se vão mais de dez anos desde que a bancada do Partido dos Trabalhadores (PT) na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), especialmente o deputado estadual Rogério Correia, trouxe a público a denúncia do envolvimento do ex-governador em um esquema ilegal de repasse de recursos da estatal para políticos. Segundo o documento denominado Lista de Furnas, cuja autenticidade foi comprovada por perícia da Polícia Federal, quase R$ 40 milhões foram distribuídos a 156 políticos, sendo 69% para as três campanhas citadas. Nos bastidores, vários deputados confirmaram terem recebido as quantias vindas de Furnas, que variavam entre R$ 70 mil e R$ 100 mil. Um deles, o então deputado Antônio Júlio (PMDB), hoje presidente da Associação Mineira de Municípios (AMM), corajosamente, assumiu na imprensa que recebeu R$ 50 mil para doação a um hospital.
Em março desse ano, mais uma tentativa de que o esquema fosse apurado. Rogério Correia e os deputados federais petistas Adelmo Leão e Padre João apresentaram requerimento à PGR para que a delação premiada de Youssef sobre Furnas fosse desarquivada e investigada na Operação Lava Jato. Sem efeito, lamentavelmente.
Pois bem. O fato volta à baila, agora, denunciado aos olhos de todos, na transmissão em rede nacional do depoimento de Youssef à CPI. A grande pergunta que fazemos é: se o delator tem credibilidade ao denunciar outros políticos, do PP, PMDB, PT e PSDB, por que não o teria, em se tratando de Aécio Neves? Dizem que "pau que dá em Chico dá em Francisco". Será? Se assim o for, aguardamos também a denúncia do senador pela PGR e, quem sabe, até o pedido de sua prisão.
Se mantida a avaliação anterior do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, de que a delação de Youssef contra Aécio não tem consistência, há que se exigir uma mudança nos rumos da Operação Lava Jato. Prevaleceria o princípio de que a delação premiada não pode ser vista como prova absoluta, precisando, portanto, ser investigada e confrontada com outras evidências. Ou seja, o próprio procurador assumiria que nem todas as acusações dos delatores são verdadeiras. Nesta lógica, todos os demais denunciados por eles teriam também direito ao benefício da dúvida.
Sobretudo, o que o novo capítulo da Lava Jato evidencia é que as pedras que estavam no caminho de Aécio e do PSDB começam a ser atiradas neles. Caem sobre as cabeças dos que, de forma hipócrita e inconsequente, criaram fatos midiáticos artificiais e utilizaram a Operação Lava Jato para tentar enfraquecer adversários políticos, mesmo conscientes de que jogavam contra o Brasil. Não foi à toa que o empresário Abílio Diniz, presidente da Brasil Foods, declarou recentemente ser a crise do país "fundamentalmente política, muito mais do que econômica".
É fato que a corrupção sempre foi uma "chaga" no Brasil, sobretudo no campo político. Desde 1500, quando Pero Vaz de Caminha, em sua carta ao rei para falar das belezas, virtudes e potencialidades dessa terra, praticou tráfico de influência, pedindo emprego para um parente. E é verdade também que este é um mal praticamente generalizado, independente de ideologia ou agremiação partidária. Chegou o momento de Aécio Neves e o PSDB se haverem com suas "pedras". E agora, Janot?


Durval Ângelo: deputado estadual pelo PT em Minas Gerais. Lider do governo na ALMG


“Governo novo, ideias novas. Já!”, por Leopoldo Vieira

Faz nove meses que a pauta do país é golpe e ajuste fiscal (ou seria o oposto como causa e efeito?). A solução para isso é programa, agenda e mensagem política para os trabalhadores.
Quando perceberão que a rejeição ao governo e à presidenta aparece com todo este tamanho pela insatisfação dos que votaram em Dilma? Do outro lado, a insatisfação já estava consolidada. A redução do tradicional, desde 2002, 54% x 46% para a diferença entre Dilma e Aécio se deveu ao deslocamento de parte da classe C para lá. É aqui que reside a resolução do jogo.
O povo não pode ser subestimado. Ele até cria seus próprios argumentos para defender projetos com os quais ele se identifica. Por isso, é quase um sacrilégio tomar medidas e se comportar de uma maneira que o povo não seja capaz de defender, até porque isso - não conseguir defender - duplica a irritação popular.
A tecla do golpe já virou uma novela mexicana chata. Os democratas já estão contra isso, a maioria das lideranças políticas, os artistas, mas continuará sendo apertada enquanto o governo não começar em conformidade com as urnas. E enquanto ele não começa, o povo vai se irritando, a classe política também, os empresários idem e a minoria golpista no parlamento, governos locais, judiciário, polícia federal e nas ruas retomam espaço.
O maior medo do lado de cá tem que ser a oposição voltar a ter coesão interna pelo deslocamento do setor que aposta na tática do "sangramento" até 2018 para o "tem fato jurídico e vamos derrubar" diante de um governo tão enfraquecido. Por isso, o setor mais radicalizado da oposição não para de perseguir a busca deste "fato", como é o caso do Gilmar Mendes. Eles estão vendo que o governo está lhes dando tempo para criar o "fato" e atrair quem ainda segura o governo enquanto mira em Lula e no PT. Enquanto isso, uns ficam correndo atrás da cauda com a conversa de "os erros do PT", pensando-se construtores da uma república dos sonhos e não a de carne, sangue e osso construída na luta de classes. Basta ver a resposta à acusação de Gilmar Mendes de que este governo usaria a corrupção como método de gestão..."se fosse assim este governo não se investigaria e não criaria mecanismos para as investigações". Ora, por favor!
O risco maior é a transição da insatisfação popular para a antipatia popular. Essa é mortal e a gravidade do que está ocorrendo exige o fim do tempo do "aguarde, há uma estratégia, é que o modus operandi ". Se a aposta dos estrategas do governo é pactuar com setores do lado de lá porque, aqui, haverá defesa em qualquer circunstância estão errados. Haverá sim defesa, mas se ela se resumir à militância ou as parcelas mais abnegadas dela, sem a massa dos eleitores da presidenta, pode tudo se perder. E isso com as lideranças do PMDB correndo por fora, ocupando espaços vazios e fazendo política com legitimidade, já que apenas assumem um protagonismo que foi abandonado. Não pelo PT, que depende dos rumos do governo, mas deste, que se enclausurou na psicografia do gerencialismo, aquela versão de um suposto "Dilmismo" do primeiro mandato, onde a gerente substituiu, no simbólico da gestão pública, a guerrilheira da democracia. Marca esta que as eleições de 2014 resgatou.
Quando se esperava transitar do pacto nacional que marcou os governos Lula para uma hegemonia mais clara de esquerda vem o Ajuste. Este vindo, foca-se em medidas trabalhistas. Quando se anuncia que "o ajuste não é um fim em si mesmo", a resposta é a Agenda Brasil. Quando Janot encurrala Aécio e Eduardo Cunha, com motivadas suspeitas, anuncia-se o corte de ministérios sem sequer uma narrativa. Aí, gira a roda do Impeachment e mais uma semana de nhem-nhem-nhem!
Há, inclusive, quem esteja defendendo isso devido ao fato de que o suposto elevado número deles se deu em razão da quantidade de partidos políticos a contemplar no Congresso Nacional, o que é concordar com o argumento liberal, que sempre acusou Lula e Dilma de ampliar ministérios para contemplar a "politicagem" do parlamento, que o PT teria aceitado em nome de um "projeto de poder" e não em razão da expansão das políticas e dos serviços públicos, da necessidade de, junto com isso, empoderar novos temas, abordagens e estratégias na gestão pública federal (com repercussão federativa) etc.
Sem falar no corte de mil cargos comissionados, como se esta conjuntura demandasse menos inteligência política no primeiro, segundo, terceiro, "rabugésimo" escalão e, sim, mais bons técnicos, que o governo e o Estado já dispõem, para aperfeiçoar o ajuste das contas.
Está em jogo mais do que estes três anos e meio, mas o futuro, confirmando ou não a tendência até então de ampliar políticas, serviços e direitos do povo, o que vai depender do que se fizer nesta conjuntura para assegurar a continuidade do projeto em 2018, e em termos de gestão, que dá o conteúdo a este projeto.
Não é à toa que, em paralelo ao movimento pró-Impeachment, outro movimento é feito pelas elites:a pressão pela imposição da tecnocracia, do poder não-eletivo como poder moderador da democracia, portanto, anti-democrática política e socialmente. É isto que une a Agenda Brasil e o julgamento das "pedaladas". Se Dilma cair, há novo governo neoliberal com Agenda liberal escondida pelo argumento tecnocrático. Se ficar, fica, mas com esta Agenda. A pressão política sobre o TCU e o TSE visam a ambos os casos. No mínimo, a condenação das "pedaladas" deve impor a retirada do direito democrático de gestão política das contas públicas em acordo com o programa consagrado pelos eleitores. Ao cabo, impedir que programas de esquerda, populares, nacionalistas, democratizadores em amplo sentido governem efetivamente daqui para a frente. É o golpe branco alternativo ao próprio golpe branco do Impeachment.
Eles querem que a passagem do "o ajuste fiscal" ao "não é um fim em si mesmo" corresponda a um governo de técnicos com mandato formalmente autônomo no BC, num órgão de fiscalização das contas públicas ainda pior que o TCU e na burocracia jurídico-militar do Ministério Público e Polícia Federal.
Por isso, na seara da participação social, o governo não pode fazer o o discurso técnico como se participação fosse apenas "accountability". É fazer política, muita política com os mais de 50 milhões que, um dia, já puderam ser chamados de "nossa turma", principalmente, com os movimentos sociais, a classe C do DataPopular e os beneficiários dos programas sociais. É preciso pactuar com eles a "outra agenda".
Saímos da revisão da meta fiscal para uma proposta de orçamento com déficit primário, tendo como única solução para evitá-lo a ressurreição da CPMF, que é um imposto conceitualmente correto, mas foi um tiro no pé seu anúncio sem discussão prévia e, ainda mais, sua retirada precoce nos mesmos termos, provocando um desgaste a mais com a indústria e no seio do povo, pois, neste interregno de crise, é obviamente uma medida impopular falar em aumentar tributos.
A equipe econômica faz um discurso envelhecido, planilheiro, que sequer mais se traduz em credibilidade para as Agências de Rating. Se, antes, Mantega foi acusado de não ser transparente, agora a "transparência" é para resultados negativos. E é um absurdo que tudo se baseie em "projeções do mercado" para crescimento, inflação ou emprego: se o mercado projeta, ele pode evitar. Trata-se tão somente de cirandas financeiras e orquestração política com orelha e focinho de economia.
O governo tem que se mirar é na jovialidade da turma que "esfaqueou" o acintoso boneco inflável de Lula na ponte Octávio Frias sobre a Avenida Roberto Marinho, em São Paulo, que revela que o golpe segue em marcha devidamente chocado por hordas da fascistas. Jovialidade esta que combina com a jovem guerrilheira Coração Valente das eleições e do semblante que exibe a presidenta hoje, infelizmente, marcado pelo olhar preocupado ao invés de esperançoso e confiante. Como traduzir isso? Como fez a Argentina, que nomeou toda uma geração de novos líderes para dirigir fatias estratégicas do governo, como a economista María Delfina Rossi, de 26 anos, diretora do Banco de la Nación, maior instituição financeira do país, ou o próprio ministro de Economia, Axel Kicillof, agora com 40 anos e expoente da La Campora. Axel não só enfrentou os Fundos Abutres como, desta disputa fez uma limonada, assegurando à Cristina 40% de aprovação popular em Bom e Ótimo, raridade em terras latino-americanas neste quadrante da história.
Isso é "Governo Novo, Ideias Novas" para "Mais Mudanças, Mais Futuro". Nomes não faltam: Marcio Pochmann, Alessandro Teixeira, entre outros. Ou, quem sabe, algum aluno ou aluna da professora Conceição Tavares, daqueles bons desenvolvimentistas "juniors". Tem uma nova guarda formada no PT e nos partidos populares a rodo para reoxigenar este ambiente fétido a 32, 54 e 64. Há também uma velha guarda que nunca pôde estar na condução deste processo, como Beluzzo e companhia. Eles se unem na perspectiva de atualizar um programa reformador para o Brasil no sentido na justiça social, soberania política, independência econômica, integração regional e nova ordem mundial. Há, ainda, quem, no governo, espere apenas um "start" para trocar "excel" por "IPADs" da retórica política.
Vamos lá! É a hora de levantar, sacudir a poeira e dar a volta por cima!


Leopoldo Vieira: Foi coordenador do monitoramento participativo do PPA 2012-2015 e do programa de governo sobre desenvolvimento regional da campanha à reeleição da presidenta Dilma Rousseff

“Por que não?”, por Amir Khair

Com a morte prematura do ajuste fiscal, o governo partiu para outra tentativa: “Agenda Brasil”, um amontoado de propostas enferrujadas no Congresso e no governo.
Para não ficar atrás, representantes de 15 partidos da “base aliada” na Câmara lançaram, na quarta-feira, um conjunto de propostas para retomar o desenvolvimento e superar a crise política. O documento fala em “Pauta da Virada” e é uma contribuição à “Agenda Brasil”. Mais um amontoado de propostas de caráter genérico.
Isso mostra a falta de estratégia na busca de saída para a recessão que inferniza o País.
Ficou provado em poucos meses que não há melhora fiscal sem dois importantes fatores: crescimento e redução da Selic. A recessão aprofunda a queda da arrecadação e tentativas de elevação de tributos agravam ainda mais a recessão e fracassarão no Congresso.
Os limites para redução de despesas não financeiras são estreitos, pois:
a) orçamento federal é engessado em 90% devido às amarrações legislativas e;
b) 64% da despesa pública não financeira pertence a Estados e municípios, que gozam de autonomia para a realização de despesas e procuram maximizá-las em busca de dividendos políticos.
Além dessas limitações, o Congresso e o Judiciário cravaram despesas extras ao governo federal aproveitando a fragilidade política do Executivo. E agora vêm com essas propostas....O agravamento fiscal vai continuar e a culpa é exclusivamente do governo que cometeu o gravíssimo erro de elevar a Selic. Sancionou a recessão e estourou as contas públicas.
Impõe-se novos caminhos para a política econômica visando o crescimento e o equilíbrio das contas internas e externas. Equilíbrio fiscal é muito mais do que registrar superávits primários. Estes nunca ultrapassaram 4% do PIB e os juros sempre ficaram acima de 5% do PIB e em junho alcançaram 7,3% do PIB causando um rombo fiscal de 8,1% do PIB!
Neste artigo abordo alguns desafios para o crescimento. São avaliações e sugestões para o enfrentamento das diversas travas ao crescimento. Vejamos.
Investimento x Consumo 
Muitas análises econômicas têm pregado que o modelo de crescimento baseado no consumo das famílias se esgotou e em seu lugar deve ficar um modelo baseado no investimento. Consideram que há uma oposição entre consumo e investimento como polos opostos em disputa. Há, por assim dizer, nesta pregação um excesso de consumo facilitado por crédito abundante e programas de renda que irrigam as classes de menor renda, bem como excesso de gastos com a Previdência Social, que deveria ter idade mínima para aposentadoria. Discordo.
Para retomar o crescimento a visão que considero adequada é a que vê interação positiva entre consumo e investimento: maior consumo induz o investimento e maior investimento cria consumo. Ambos precisam ser estimulados e as barreiras que os limitam devem ser retiradas.
Vale considerar que o carro-chefe do crescimento é o consumo das famílias. Nos cinco anos (2004/2008) que antecederam a crise, este consumo foi responsável por 55% do crescimento médio anual de 4,8%. Nos cinco anos (2009/2013) posteriores à crise responderam por 68% do crescimento médio anual de 2,7%. Para os investimentos nestes períodos as contribuições foram respectivamente 27% e 13%.
Mais de 80% dos investimentos no País são feitos pelas empresas. O setor público responde por menos de 20% do investimento total e como está em déficit permanente e crescente, retomar o investimento pressupõe depender principalmente das empresas.
Ocorre que a empresa para investir precisa ter mercado crescente para seu produto e se aproximar do uso de sua capacidade produtiva. Como a ociosidade está elevada para vários setores, a resposta das empresas para investir não será imediata diante da perspectiva de crescimento. Assim, há que estimular com vigor o consumo reduzindo as taxas de juros do crediário, invertendo a forte ascensão ocorrida em benefício do sistema financeiro, que amplia lucros com a recessão (vide balanços dos principais bancos).
Segundo a última pesquisa da Associação Nacional dos Executivos de Finanças Administração e Contabilidade(Anefac), no período de março/2013 a julho/2015 o Banco Central elevou a Selic em sete pontos porcentuais (elevação de 96,55%) de 7,25% ao ano para 14,25% ao ano. Neste período a taxa de juros média para pessoa física apresentou uma elevação de 38,77 pontos porcentuais (elevação de 44,07%) de 87,97% ao ano para 126,74% ao ano. Nos países emergentes esta taxa gira em torno de 10% ao ano. Essa anomalia é o principal freio ao consumo e ao crescimento. Eliminá-la é o desafio.
Isso não se faz, no entanto, na marra, nem com ameaças. Já foi tentada pela presidente, que ameaçou os bancos e recuou logo em seguida. Foi um grave erro, que serviu ao sistema financeiro para argumentar que não dá para reduzir estas taxas de juros. Mas dá e pode ocorrer caso se estimule um processo concorrencial de mercado a ser feito em três ações simultâneas e duradouras, sem recuos.
A primeira é começar a prática de taxas de juros civilizados dentro de casa, ou seja, nas instituições oficiais de crédito (Caixa Econômica, Banco do Brasil e BNDES). Num ranking de 30 bancos, no site do Banco Central, a Caixa Econômica Federal figura na 21ª posição nos juros do cheque especial (209,98%) e o Banco do Brasil em 22ª (214,62%). Tem 20 bancos privados cobrando menos. Os três últimos no ranking são: Citibank (318,06%), HSBC (345,44%) e Santander (383,32%).
A segunda é colocar a Selic no lugar, ou seja, no nível da inflação, como fazem os países desde a crise do subprime americano. Assim, deveria ser reduzida até o final deste ano para 9% e em 2016 acompanhar a queda prevista da inflação.
A terceira é reduzir e tabelar as elevadas tarifas bancárias. Nenhuma destas ações depende do Congresso.
Ao reduzir a Selic e as tarifas bancárias os bancos passam a procurar compensar os elevados ganhos destas duas fontes com o que deveria ser sua função precípua, que é o financiamento de atividades. A disputa pelo mercado de crédito se acirra e o sistema financeiro passa a ser aliado do crescimento econômico. Seu lucro irá crescer com o crescimento e não com a recessão como ocorre.
Não dá mais para conviver com essa situação. É necessário fazer valer o que estabelece a Constituição em seu artigo 192, que trata do sistema financeiro. “Art.192 - O sistema financeiro nacional, estruturado de forma a promover o desenvolvimento equilibrado do País e a servir aos interesses da coletividade, em todas as partes que o compõem,...”.
Outro forte estímulo ao consumo se dá com políticas públicas de renda como Bolsa Família, Benefício de Prestação Continuada (um salário mínimo para idosos carentes), salário mínimo, etc. É injeção na veia do consumo. Dinheiro que retorna imediatamente para a atividade econômica gerando emprego e mais renda às pessoas, lucro para as empresas e expansão da arrecadação. Uma melhor distribuição de renda é a via natural para a expansão do consumo e do desenvolvimento social.
Juros civilizados e melhor distribuição de renda são caminhos que podem ser trilhados, com forte respaldo na sociedade. É importante conquistá-los. Por que não?



Amir Khair, engenheiro e mestre em finanças públicas pela EAESP/FGV, foi secretário de Finanças da Prefeitura de São Paulo (1989/92).