segunda-feira, 11 de novembro de 2024

Vitória de Trump acelera aperto de cintos por aqui

O governo Lula torcia pela vitória da vice-presidente democrata, Kamala Harris, pois desenharia um quadro econômico mais favorável ao Brasil, com a continuidade da queda de juros pelo Federal Reserve Bank. Com a vitória do ex-presidente Donald Trump, com maioria republicana no Senado e na Câmara, é esperado um maior alinhamento entre os poderes Executivo e Legislativo. O cenário favorece Trump a implementar suas propostas de campanha, que passam por temas como barreiras e tarifas comerciais – em particular contra a China –, imigração e medidas fiscais. Na economia, novas medidas de cunho protecionista podem ter reflexos inflacionários à frente, o que impactaria a trajetória futura de juros, que fortalece o dólar globalmente.

O efeito de maior pressão inflacionária e o cenário de juros mais altos nos Estados Unidos têm forte impacto no Brasil e no mundo. Com pressão no câmbio e juros mais elevados, que afeta o PIB, o Brasil vai enfrentar mais dificuldades para ajustar as despesas às receitas. Antes de Trump, o Fed iria baixar os juros até maio de 2025, quando o Banco Central baixaria os juros no Brasil, facilitando a retomada do crescimento econômico que turbina a arrecadação e alivia os níveis do endividamento público em relação ao PIB.

Por isso, o governo Lula resolveu mergulhar, mais uma vez, no exame de medidas para ajustar o orçamento em 2025 para não chegar em 2026 com a economia em crise. Como ficou provado nos Estados Unidos, apesar de a inflação ter desacelerado, a sensação de piora do cenário econômico (em boa parte pelos patamares altistas nos preços, desde a invasão da Ucrânia pela Rússia e a retaliação dos membros da OTAN), alardeada por Trump, foi um dos grandes cabos eleitorais da vitória republicana.

No Brasil, o Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) subiu os juros em 0,50% para 11,25% ao ano e deixou clara a relevância de medidas fiscais estruturais, ainda a serem apresentadas. Estas, segundo as autoridades monetárias, podem reduzir os prêmios de risco, ajudando assim a conter a pressão cambial. Em análise do Itaú, o maior banco privado do país assinala que “os desafios orçamentários persistentes representam riscos ascendentes para a inflação e para a trajetória futura das taxas de juros”.

Num país como o Brasil, em que o Orçamento Geral da União já está fortemente comprometido por gastos obrigatórios (salários do funcionalismo e benefícios sociais e subsídios), sobrando pouco espaço para investimentos, o razoável seria usar as projeções do Censo 2022 do IBGE, que apontam a redução do número de crianças e o aumento da participação de idosos com mais de 65 anos na população, para redimensionar os gastos de Saúde e Educação ao horizonte projetado. Mas a Constituição determina a destinação mínima de 18% das receitas da União em Educação e 12% em Saúde.

•        Como negociar com o Congresso

Se não bastasse isso, com o crescimento do Orçamento Secreto no governo Bolsonaro, que delegou mais fatia do OGU às emendas dos senadores e deputados, fica mais difícil a negociação de cortes que precisam envolver não apenas a concordância dos ministros das áreas afetadas pelas indicações da equipe econômica – os ministros da Fazenda, Fernando Haddad, do Planejamento, Simone Tebet, e de Orçamento e Gestão, Ester Dweck – mas a colaboração e compreensão dos Poderes Judiciário (haveria corte dos altos salários da magistratura) e do Legislativo, com aprovação de Projetos de Leis Complementares, Propostas de Emenda Complementar.

Para aprovação de um Projeto de Lei é preciso maioria simples no Senado (41 votos) e na Câmara dos Deputados (257 votos). Para emendas à Constituição o quórum mínimo é de 3/5 dos votos em duas rodadas no Senado (49 votos) e na Câmara (308 votos). Em tempo de formação de novos blocos no Congresso, já antecipando a composição das mesas das duas casas e suas respectivas presidências em 1º de fevereiro de 2025, as negociações ficam ainda mais escorregadias e difíceis.

•        Qual será o pacote fiscal?

O governo vai propor novas medidas de revisão de gastos com o objetivo de garantir o cumprimento do arcabouço fiscal vigente ao menos até 2026, em complemento às medidas administrativas de “pente-fino” de benefícios sociais já anunciadas. As propostas cogitadas até o momento envolvem, entre outras, alterações do Benefício de Prestação Continuada (BPC), Seguro-Desemprego, Fundeb, vinculações ao mínimo, limitação do abono salarial (PIS-Pasep) a dois salários-mínimos, pisos constitucionais de saúde e educação e da previdência dos militares. O Itaú estima que o cumprimento do arcabouço em 2025 depende de ao menos R$ 25 bilhões de redução de despesas, podendo ser obtidos, por exemplo, com o sucesso das medidas de “pente-fino”.

Para 2026, o Itaú considera ser necessário ajuste adicional de ao menos R$ 35 bilhões, para o pacote de revisão de gastos ter sucesso em obter alguma redução da percepção de risco fiscal. O Itaú assinala que o pacote pode ser uma oportunidade para reduzir os receios quanto às iniciativas onerosas do ponto de vista fiscal, como a isenção do imposto de renda das famílias até R$ 5 mil, e ao aumento das criatividades contábeis e retorno de estímulos parafiscais, podendo, por exemplo, garantir que novas políticas públicas (como o programa Pé de Meia) e a expansão de políticas existentes (como o “vale-gás”) sejam contabilizadas de forma transparente e sujeita às regras fiscais vigentes.

Ao longo de novembro serão divulgados dados que mostram a piora do quadro fiscal:

i)        relatório bimestral de novembro com novos bloqueios;

ii)       avanço da regulamentação da reforma tributária do IVA;

iii)      divulgação do bônus de Itaipu para o país inteiro (que pode baixar a conta de energia elétrica residencial);

iv)      divulgação dos nomes dos três novos diretores do Banco Central.

O Itaú calcula cortes de R$ 105 bilhões, equivalentes a 0,9% do PIB, para alinhar os gastos públicos nos limites do Arcabouço Fiscal, já apontados pela equipe econômica, mas que seriam feitos por etapas, pois algumas medidas dependem de aprovação do Congresso. Sendo realista, para garantir o cumprimento do limite de despesas do arcabouço fiscal até 2026, o Itaú estima ser necessário ajuste mínimo de R$ 60 bilhões, sendo R$ 25 bilhões em 2025.

•        Medidas administrativas

As medidas mais eficazes, de ordem administrativa, envolvem o BPC (que paga um salário-mínimo a idosos com mais 65 anos e sem renda suficiente para seu sustento), Seguro-Desemprego, Fundeb, vinculações ao mínimo, pisos constitucionais de saúde e educação e a previdência dos militares:

O corte de R$ 25 bilhões para 2025, equivalente a 0,2% do PIB, seria feito com medidas administrativas antifraude na Previdência e no programa de BPC (dos ministérios da Previdência e Desenvolvimento Social) com incentivo aos servidores na ação de recadastramento. A operação pente-fino em aposentadorias por invalidez, auxílio-doença e BPC, há mais 6 meses sem revisão com perícias, poderia economizar R$ 14 bilhões, ou 0,1% do PIB.

No Bolsa Família, com medidas administrativas para normalizar a participação de famílias unipessoais, pode-se economizar R$ 7 bilhões, o equivalente a 1% do PIB. O MDS deveria focar na redução das participações dos unipessoais de 19% para 14% (uma volta ao patamar de 2019, inchado na pandemia da Covid e na eleição de 2022), para encolher os beneficiários em quase 1,1 milhão.

O terceiro programa requer a revisão de gastos de Proagro e Seguro Defeso, no âmbito do Ministério da Agricultura, e pode economizar R$ 4 bilhões.

•        Medidas de R$ 42 bilhões passam pelo Congresso e STF

Um pacote mais amplo de seis medidas depende da aprovação, no Congresso, de Leis e Propostas de Emendas Constitucionais (PECs) e entendimentos com o Supremo Tribunal Federal. A redução de 50% dos gastos com o abono salarial (PIS-Pasep), que seria limitado a quem ganha até dois salários-mínimos - R$ 2.824 - poderia economizar R$ 15 bilhões (o equivalente a 1% do PIB), mas depende de aprovação de PEC. Outra providência mais simples, também ligada ao Ministério do Trabalho, que depende de Lei, é a reforma do seguro-desemprego, ajustando o programa aos recursos do FGTS como fonte de suporte (a multa dos 40% na demissão sem justa caixa), a partir do 3º mês de desemprego. Prevê-se economia de R$ 10 bilhões ou 0,1% do PIB.

Também dependente de lei simples, no âmbito do Ministério de Gestão, é a regulamentação dos supersalários do setor público (PL 6726/16 regulamenta que tipos de benefícios podem ultrapassar teto salarial dos servidores federais, incluindo juízes e militares). Estima-se uma economia de R$ 4 bilhões.

Um ponto sensível no relacionamento com o Congresso, o corte de emendas parlamentares vinculadas a verbas do Orçamento para as pastas de Saúde e de Educação – com estimativa de economia de R$ 6 bilhões – depende não apenas do OK da Câmara e do Senado, mas de negociação do STF.

Medida simples, no âmbito do Ministério da Fazenda, seria definir orçamento limitado a cada ano para os subsídios e o seguro-defeso. Já a imposição de limites do total de despesas obrigatórias (como a sua vinculação ao limite do Arcabouço Fiscal, de 2,5% linha a linha, que geraria economia de R$ 8 bilhões, ou 0,1% do PIB), seria mais complexa, exigindo apresentação de PEC.

<><> Pacote de R$ 38 bilhões depende de PECs

Uma terceira etapa de medidas de contenção de gastos exige negociações mais complexas de Propostas de Emenda Complementar (PEC) e uma Lei Complementar, aprovada com maioria simples. Uma PEC para redefinir os gastos para apuração do limite mínimo de Educação e ampliar de 30% para 60% os recursos destinados ao Fundeb considerados para o limite mínimo de Educação gerariam economia de R$ 17 bilhões, ou 0,1% do PIB.

Uma Lei Complementar desobrigaria a execução dos recursos do FNDCT (Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), com economia estimada de R$ 10 bilhões, ou de 0,1% do PIB. Uma PEC para rever os limites mínimos para Educação e Saúde poderia igualar o crescimento dos seus limites mínimos aos parâmetros do Arcabouço Fiscal, com economia de R$ 4 bilhões. Outra PEC ajustaria as verbas do programa Pé de Meia no Orçamento ao vinculá-lo ao Fundeb. A economia seria de R$ 7 bilhões.

<><> Falta combinar com os russos

O problema dos pacotes econômicos é que, na teoria, está tudo bem. Na prática, como dizia Garrincha “falta combinar com os russos”. Ou seja, com o Congresso, que tem representantes de todos os “lobbies”, para cortar subsídios, privilégios de altos salários e ajustar os benefícios sociais às limitações orçamentárias que explodem as contas públicas e mantêm os juros altos. Isso implica o Congresso aceitar cortar na própria carne. E há uma ala que deseja que a economia fique pior para surfar na onda, como Trump.

 

•        Eleição de Trump tem efeito na balança comercial

Sob a promessa de aumentar as tarifas de importação para parceiros comerciais, a vitória de Donald Trump à Presidência dos Estados Unidos traz potenciais impactos para o Brasil e para o cenário econômico global. Com uma política protecionista, uma de suas propostas de campanha prevê a imposição de tarifas de 10% a 20% sobre todas as importações, além de taxas de 60% ou mais sobre produtos vindos da China.

Os Estados Unidos são o segundo principal destino das exportações totais brasileiras, atrás apenas da China. No ano passado, o Brasil exportou US$ 36,9 bilhões para os norte-americanos, o que representa cerca de um terço do total exportado para os chineses. Na avaliação de analistas, a nova rota da economia representa tanto implicações como oportunidades.

Para Marcelo Vitali, diretor da consultoria de internacionalização How2Go no Brasil, o comércio internacional certamente é um dos principais perdedores com a eleição de Trump. "México, China e Brasil serão os principais impactados, com efeito negativo especialmente no setor de exportação. Em um de seus últimos discursos antes da eleição, Trump já enfatizou sua preferência pela aplicação de novas tarifas, ampliando a proteção para as empresas locais em detrimento das internacionais", destacou.

O especialista lembrou que em seu último governo, por exemplo, o americano adotou uma alta tarifa contra o aço brasileiro, afetando diretamente as siderúrgicas. "Setores como aço, etanol, suco de laranja e outras commodities estão na mira, já que o Brasil é um grande exportador desses produtos", apontou.

Segundo ele, as medidas protecionistas podem obrigar a indústria brasileira a ter que buscar novos parceiros comerciais. "Diversificar mercados é uma estratégia inteligente para exportadores que dependem fortemente dos Estados Unidos. Grandes empresas podem até ser incentivadas a estabelecer unidades produtivas nos EUA para mitigar o impacto das tarifas. Ainda assim, o problema sempre pode ser visto como oportunidade, apesar das dificuldades, como a necessidade de explorar novos mercados", ponderou.

Na avaliação do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, Trump fez um discurso mais moderado após a vitória do que o da campanha. "Foram ditas muitas coisas que causam apreensão no mundo inteiro. Causam a apreensão nos mercados emergentes, nos países endividados, na Europa, no mundo", destacou o chefe da equipe econômica, que disse acreditar em um distanciamento dessa postura ao longo do governo.

"Entre o que foi dito e o que vai ser feito, nós sabemos que isso já aconteceu no passado, as coisas às vezes não se traduzem da maneira como foram anunciadas", avaliou. "Nós temos que aguardar um pouquinho e cuidar da nossa casa para ser o menos afetado possível, qualquer que seja o cenário externo", completou.

O primeiro governo de Trump foi marcado pela política "America First" (América em Primeiro), com forte protecionismo da indústria norte-americana e taxação de produtos, sobretudo vindos da China, retomando a guerra comercial entre os dois países. À época, o republicano implementou taxas de 7,5% a 25% para a segunda maior economia mundial.

A tensão entre os países é conhecida desde o século 20, no entanto, desde a década de 1990, empresas norte-americanas decidiram centralizar produções na China, devido ao baixo custo de produção, legislação flexível e leis trabalhistas mais brandas.

"Se tudo isso ocorrer, possivelmente o consumo de produtos brasileiros pelos americanos vai crescer, a exportação brasileira para os americanos deve crescer, e os produtos brasileiros passarão a ter maior competitividade. Essa é a parte positiva", afirmou Volnei Eyng, CEO da gestora Multiplike.

"É bom para a indústria brasileira que exporta, mas em muitas situações é ruim para o Brasil com o aumento do juros e aumento da inflação brasileira levando a uma desvalorização do real", acrescentou o economista. Ele considera crucial para o Brasil adotar uma postura "diplomática e pragmática" para minimizar impactos negativos na relação bilateral e no mercado econômico global.

<><> Oportunidade para o agro

O Brasil é um importante fornecedor de alimentos para os EUA, liderando as exportações de café para o país. Outros itens agrícolas também têm peso na corrente comercial como suco de laranja, carne bovina, produtos da cana-de-açúcar, couro e soja. Na avaliação dos analistas, é difícil que Trump taxe a importação de produtos de primeira necessidade, sob o risco de provocar um aumento nos preços dos alimentos.

"A ampliação do setor privado deverá intensificar a atividade econômica nos Estados Unidos, gerando uma demanda adicional por produtos agrícolas, o que beneficia a produção nacional", avaliou Luiz Felipe Baggio, consultor jurídico da Evoinc. O cenário, de acordo com ele, ainda pode abrir portas para que o Brasil intensifique parcerias com países do Oriente Médio e diversifique sua pauta de exportação.

No entanto, Baggio alerta para possíveis barreiras alfandegárias impostas aos produtos brasileiros, já que o Brasil se posiciona como um dos principais concorrentes agrícolas dos EUA. "Nosso setor agro compete diretamente com o americano em várias bolsas de commodities, o que pode levar a uma política protecionista nos EUA", destaca.

Um dólar mais forte pode impactar diretamente economias emergentes, mas também fortalecer as exportações brasileiras, especialmente no agronegócio. "Com a postura de Trump em adotar medidas protecionistas e restringir importações da China, o Brasil poderia ganhar competitividade no mercado americano, aumentando suas exportações de commodities e produtos agrícolas", aponta Juliana Tescaro, sócia e diretora do hub de soluções financeiras Grupo Studio.

Uma eventual guerra comercial com a China também pode aproximar ainda mais o agronegócio brasileiro dos chineses como aconteceu no primeiro mandato de Trump, quando houve aumento das vendas de soja, carne bovina e milho do Brasil para o país asiático.

"Além disso, a firmeza nas relações com a China pode gerar oportunidades para o Brasil substituir produtos chineses, embora a política econômica americana também possa influenciar a inflação e os juros brasileiros, o que exigirá atenção na condução da política econômica do país", completou Tescaro.

<><> Dólar x inflação

A perspectiva de políticas econômicas mais protecionistas e de estímulo fiscal nos EUA fortalece o dólar, que atingiu patamares elevados em relação ao real na última semana. Suas políticas protecionistas e de incentivo à indústria interna tendem a valorizar a moeda norte-americana, o que pode pressionar ainda mais as economias emergentes, incluindo o Brasil.

De acordo com Felipe Vasconcellos, sócio da Equss Capital, esse movimento pressiona moedas de mercados emergentes e tende a adicionar uma nova fonte de pressão à inflação brasileira devido ao aumento dos custos de importação. Segundo ele, o fenômeno conhecido como "Trump Trade" impulsiona ações, criptomoedas e o dólar, refletindo expectativas de políticas que favoreçam o crescimento econômico nos EUA. "Para o Brasil, a valorização do dólar pode agravar o deficit em transações correntes e dificultar o controle da inflação", alerta.

Se a tendência de alta continuar, o analista afirma que há possibilidade de o dólar se estabilizar na casa dos R$ 6, o que exigiria medidas adicionais de política monetária para mitigar os impactos na economia brasileira. "No entanto, é importante lembrar que sempre há uma diferença entre o discurso e a prática, de modo que precisaremos acompanhar quais pautas da campanha de Trump irão de fato se tornar realidade. Os próximos meses serão interessantes", completou Vasconcellos.

Com o dólar mais forte, os custos de importação aumentam e a inflação tende a subir, o que poderia levar o Banco Central a ajustar suas taxas de juros, avalia João Kepler, CEO da Equity Fund Group. "Para o Brasil, isso representa tanto oportunidades no aumento das exportações, especialmente de commodities, como desafios, com um possível enfraquecimento do real e uma maior pressão sobre a política monetária interna", diz.

•        Brasil deve manter relação pragmática com Trump e aproveitar brecha para reindustrialização

Vencedor no voto popular e no Colégio Eleitoral, Donald Trump deve obter para os republicanos também o controle da Câmara e do Senado. Essa conjunção de vitórias marca uma importante ascensão do populismo conservador, que de diversas maneiras parece ter capturado a rejeição ao governo de Joe Biden. Trump optou pela defesa, ainda que xenófoba, de postos de trabalho, de melhores empregos e da reindustrialização do país.

Os democratas saíram derrotados em razão de suas próprias contradições. Deixaram-se ser associados a um liberalismo prejudicial ao eleitor e afastaram-se de largas parcelas do eleitorado.

Esses setores acabaram migrando para a mistificação trumpista, na esperança do ressurgimento de bons empregos e salários. Trump navegou novamente nas promessas de construção da "América Grande de Novo", um slogan emblemático da situação atual de decadência do país.

Os EUA de Trump embarcam em uma empreitada de recriar um país que já foram.

O objetivo é trazer de volta a liderança industrial perdida para a China. Trump promete criar taxas e tarifas contra produtos industriais de outros países, em especial a China, num típico programa de substituição de importações.

A ideia replica aqueles planos de desenvolvimento, inclusive o brasileiro, que foram tão combatidos como geradores de protecionismo ineficiente. Os próprios estadunidenses propagaram esse conceito ao longo da segunda metade do século passado como forma de bloquear o florescimento de projetos nacionais de industrialização, especialmente o brasileiro. Não deixa, portanto, de ser irônica essa migração da posição estadunidense, que sempre encontrou defensores entreguistas locais.

O Brasil exporta produtos manufaturados para os Estados Unidos e pode ser afetado pelas medidas protecionistas.

Além disso, o presidente Lula declarou apoio a Kamala Harris nas eleições recentes, além de qualificar Trump como desumano e compará-lo ao nazismo.

Embora a apuração, a rigor, ainda não tenha terminado, Lula já parabenizou Trump pela vitória. Pela relevância dos EUA, o Brasil de Lula, a despeito das evidentes diferenças com Trump, deve manter uma atitude pragmática com o novo governante, mantendo o foco, claro, na defesa dos interesses nacionais. Esse posicionamento institucional deve governar as relações não apenas com os EUA, mas com todos os países.

Além disso, cabe ao Brasil perceber que se abrem espaços geopolíticos de disputa em torno do tema da reindustrialização.

O país deve definir metas ambiciosas nessa reorganização da divisão internacional do trabalho, que se dará, com certeza, num período de transição e reorganização das cadeias produtivas globais a partir de demandas de sustentabilidade e de transformações tecnológicas cada vez mais disruptivas.

Uma questão inquietante, por exemplo, está na ameaça de que os EUA de Trump busquem se reindustrializar à revelia de qualquer consideração pelo meio ambiente, o que pode ser desastroso para todo o planeta.

Neste jogo, o Brasil deve aproveitar, com responsabilidade, todas as oportunidades para sair dessa transição em condições de competir em igualdade com outras nações de dimensões continentais e grande mercado.

 

Fonte: Por Gilberto Menezes Côrtes, no JB/Correio Braziliense/Brasil 247

 

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