A pergunta
de trilhões de dólares no centro da COP29
A
cúpula climática da ONU deste ano (COP29) em Baku,
Azerbaijão, está sendo chamada de "uma COP de financiamento
climático".
O
assunto central é o dinheiro necessário para lidar com a crise climática, desde a
mudança para energia limpa ou infraestrutura de proteção climática, até a
instalação de sistemas de alerta precoce e a agricultura resistente à seca.
O
principal resultado pode ser uma nova promessa de apoio financeiro de países
ricos para os países mais afetados no sul global — a Nova Meta Quantificada
Coletiva.
E
enquanto antes esses países desenvolvidos — que têm responsabilidade histórica
por causar as emissões responsáveis pelas mudanças climáticas — prometiam investir 100 bilhões de dólares em
financiamento climático por ano, desta vez o valor pode estar na casa dos
trilhões.
·
Quanto dinheiro é
necessário?
Um
grupo de 45 países menos desenvolvidos, que negocia na COP como um bloco, diz
que precisará de US$ 1 trilhão em financiamento climático anualmente até 2030
para permitir que seus membros implementem seus planos de ação climática.
Outro
grupo, que representa 54 países africanos, enquanto isso, diz que os países
desenvolvidos precisam contribuir com US$ 1,3 trilhão em financiamento
climático até 2030.
Os
países menos desenvolvidos e pequenos estados insulares querem que o Novo
Objetivo Coletivo Quantificado inclua dinheiro para um fundo de perdas e danos
recém-criado também.
O
fundo é para impactos climáticos severos aos quais as comunidades não podem se
adaptar e precisarão ser reassentadas ou apoiadas por perdas irrecuperáveis.
Um
estudo do Independent High-Level Expert Group on Climate Finance (um grupo
independente formado sob o processo de negociação climática da ONU) disse que
investimentos relacionados ao clima, de cerca de US$ 2,4 trilhões por ano serão
necessários até 2030 em países em desenvolvimento, excluindo a China.
Isso
incluiria investimento doméstico, não apenas financiamento climático
internacional, e cobriria a conservação e restauração da natureza, bem como a
mudança para energia renovável e adaptação para lidar com o impacto das
mudanças climáticas.
Isso
é um aumento de quatro vezes em relação aos níveis atuais, diz o grupo.
Um
relatório recente da ONU diz que os países em desenvolvimento precisam de US$
187 bilhões a US$ 359 bilhões por ano apenas para adaptação, enquanto em 2022
eles receberam apenas US$ 28 bilhões para esse propósito.
"O
nível atual de financiamento climático fica bem aquém quando se considera a
escala do desafio que o mundo enfrenta", diz Tom Mitchell, diretor
executivo do Instituto Internacional para o Meio Ambiente e Desenvolvimento
(IIED), uma organização de pesquisa sediada em Londres.
"É
como tentar combater um incêndio florestal com copos d'água."
·
Quanto dinheiro os
países em desenvolvimento estão recebendo agora?
Na
COP de Copenhague, há 15 anos, foi acordado que, a partir de 2020, os países
ricos forneceriam US$ 100 bilhões anualmente como financiamento climático, para
pagar pela mudança para energia limpa e adaptação para lidar com o impacto das
mudanças climáticas.
Os
países em desenvolvimento dizem que promessa continua não sendo cumprida, e que
isso está minando a confiança nas negociações climáticas da ONU.
Eles
dizem que os países ricos contam duas vezes a ajuda regular como financiamento
climático, e que mesmo quando os fundos climáticos estão disponíveis, eles não
são facilmente acessíveis.
Os
países desenvolvidos discordam. A Organização para Cooperação e Desenvolvimento
Econômico (OCDE) diz que US$ 116 bilhões foram fornecidos em 2022.
·
As novas grandes
economias também devem pagar?
O
Acordo de Paris assinado em 2015 diz que os países desenvolvidos, como os
maiores emissores históricos de gases de efeito estufa, devem fornecer
financiamento climático aos países em desenvolvimento.
Mas
agora os países desenvolvidos dizem que economias emergentes como China, Índia
e Arábia Saudita — que também são grandes emissoras de carbono — devem
contribuir para os esforços de ajudar países pobres e vulneráveis.
"É
inteiramente justo adicionar novas partes contribuintes, dada a evolução
contínua das realidades e capacidades econômicas", disseram os EUA.
A
UE concorda que países com altas emissões de gases de efeito estufa e
capacidades econômicas devem se esforçar.
Mas
o G77 China, um grande bloco de negociação de países em desenvolvimento em
conferências climáticas da ONU, rejeita essa ideia.
Ele
diz que tanto o Acordo de Paris quanto a Convenção do Clima da ONU de 1992
dizem que os países desenvolvidos devem pagar a conta, e que as negociações da
COP ocorrem como parte dessa estrutura.
·
Todo esse dinheiro
virá dos contribuintes?
Os
países desenvolvidos dizem que o financiamento público por si só não será
suficiente, dada a enormidade da quantia necessária, e que o setor privado
inevitavelmente precisará intervir.
O
Grupo Independente de Peritos de Alto Nível sobre Finanças Climáticas concorda
que o papel do setor privado será crucial. Ele diz que o financiamento privado
internacional — que geralmente vem na forma de empréstimos — precisará crescer
mais de 15 vezes para atingir as metas de mitigação climática.
Mas
os países em desenvolvimento dizem que o financiamento climático deve incluir
subsídios e empréstimos a taxas concessionais.
“Empréstimos
a taxa de mercado e financiamento privado a taxa de retorno de mercado não
podem ser denominados como financiamento climático”, disse o bloco G77 China em
uma declaração.
“Em
vez disso, eles representam um fluxo de capital reverso dos países em
desenvolvimento para os desenvolvidos quando os reembolsos são considerados.”
Os
países pobres disseram que os empréstimos climáticos significam que eles
ficarão mais endividados.
Uma
análise do IIED mostrou que 58 países classificados pela ONU como menos
desenvolvidos ou pequenos Estados insulares gastaram US$ 59 bilhões pagando
dívidas em 2022, em comparação com US$ 28 bilhões que receberam como
financiamento climático.
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Por que o mundo
precisa de um novo acordo de financiamento climático?
As
temperaturas globais já estão 1,2° C acima do nível visto antes da revolução
industrial, mas os cientistas dizem que elas não devem subir mais do que 1,5° C
acima dessa linha de base se quisermos evitar as piores consequências das
mudanças climáticas.
Para
atingir essa meta, os países precisam tomar medidas muito mais drásticas para
limitar as emissões de gases de efeito estufa. Foi calculado que até 2030 eles
precisam cortar as emissões em 42% dos níveis de 2019 — mas os planos de ação
climática anunciados até agora cortarão apenas 2,6%.
Sem
mais financiamento climático, os países em desenvolvimento dizem que há um
limite para o que eles podem fazer.
É
por isso que a Nova Meta Quantificada Coletiva, que deve ser assinada durante a
COP29, é crítica. Mas quanto dinheiro será prometido? Essa é a pergunta de um
trilhão de dólares.
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O que esperar da
Conferência do Clima no Azerbaijão
Baku,
capital do Azerbaijão, foi a cidade escolhida para sediar a 29ª Conferência das
Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas, a COP29. Neste ano, o evento
acontecerá entre os dias 11 e 22 de novembro, e, novamente, terá como sede um
país onde a indústria petrolífera é relevante. Alguns, inclusive, se referem ao
país como o “berço da indústria moderna dos combustíveis fósseis”.
O
Azerbaijão é um país de maioria muçulmana, localizado entre o leste europeu e o
oeste asiático (na região do Cáucaso).
Tem aproximadamente 10 milhões de habitantes e uma economia baseada,
principalmente, na exportação de petróleo e gás natural.
A
indústria petrolífera representa quase a metade do PIB do Azerbaijão e
corresponde a mais de 90% das exportações, segundo a Folha de São Paulo.
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Desafios da COP29
Entre
os maiores desafios da Conferência devem ser mantidas as pautas de cumprimento
do Acordo de Paris, além da urgência de ações de contenção das mudanças
climáticas e das opções de financiamento para a crise climática global.
A
escolha do Azerbaijão como sede da COP29 motivou indagações de alguns ativistas sobre
o processo diplomático da Convenção-Quadro da ONU sobre Mudança do Clima
(UNFCCC) para escolher as sedes dos eventos. Esta é a terceira vez consecutiva
que a COP acontecerá em um país supostamente autoritário, com um histórico
negativo relacionado aos direitos humanos. Por outro lado, o Azerbaijão investe
em energia limpa e aponta redução do uso de combustíveis fósseis.
Além
disso, o Azerbaijão é membro da Organização dos Países Exportadores de Petróleo
(Opep), o que também é motivo de críticas de alguns ativistas.
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A presidência da COP29
Mukhtar Babayev foi eleito para presidir a COP29. Atualmente,
Babayev é ministro da Ecologia e dos Recursos Naturais do Azerbaijão, mas teve
sua carreira fundamentada na Socar, a estatal petroleira do Azerbaijão.
Esse
é um ponto de questionamento sobre a presidência, assim como aconteceu com o
presidente da COP28, o sultão Al Jaber, que na ocasião presidia uma empresa
petrolífera e foi acusado, na época, de usar a COP28 para discutir interesses
da indústria e não do planeta como um todo.
Um
fato que chamou a atenção do mundo sobre o comitê organizador da COP29 é que
não há nenhuma mulher entre os 28 escolhidos pelo presidente do Azerbaijão, Ilham Aliyev, para compor a
cúpula.
A Organização
das Nações Unidas (ONU) declarou que a presidência da
COP28 trabalhou junto à presidência da COP29 para garantir um processo
transparente e inclusivo na preparação da 29ª Conferência das Nações Unidas
sobre as Mudanças Climáticas.
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O que esperar da COP29?
O
financiamento climático deve ser um dos assuntos mais importantes na pauta da
COP29, a exemplo do que aconteceu na COP28, em
Dubai. Isto porque muitos países dependem de iniciativas externas para o
financiamento de suas ações de mitigação das mudanças climáticas. Os mecanismos
de financiamento mistos (blended finance), desta vez, devem ser mais
discutidos.
Maria
Netto, diretora-executiva do Instituto Clima e Sociedade (iCS), em entrevista
ao Valor,
declarou que alguns avanços das discussões a respeito do financiamento
climático que serão feitos no G20 (bloco
econômico presidido pelo Brasil neste ano) terão reflexo na COP29. “Uma das
principais expectativas para a COP29 é sair do encontro com um acordo que possa
dar bastante certeza ao mundo de que há uma ambição financeira que permita aos
países mudarem suas políticas e entrarem em uma trajetória de baixo carbono”,
apontou a especialista.
A
governança e a regulação do sistema financeiro também deve ser um dos assuntos
da COP29, uma vez que os fundos de financiamentos climáticos devem ser operados
de forma transparente, com o intuito de incentivar novos investimentos.
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Transição energética na COP29
Outro
assunto que deve estar no topo das discussões da COP29 é a transição
energética. A maioria dos especialistas no assunto apontam a transição energética como
a única opção viável para reduzir as emissões dos gases de efeito estufa (GEE).
De fato, a produção de petróleo é a principal fonte de emissões de gases de efeito estufa e, portanto, é o primeiro
problema que a ONU se propõe a resolver.
O presidente da COP29 declarou recentemente que, mesmo os novos governantes
(2024 é ano de eleição presidencial em vários países) deverão seguir os
compromissos assumidos pelos antecessores. “Mesmo que sejam formadas novas
administrações, elas enfrentarão a mesma necessidade de reduzir as emissões de
gases com efeito de estufa e de combater o aquecimento global”, disse Babayev.
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As metas de Babayev
Em
entrevista ao The Guardian, Babayev afirmou que o governo do Azerbaijão está tomando
medidas pontuais para descarbonizar a economia. Segundo ele, o país está
trabalhando no impulsionamento de energias renováveis para promover a transição dos combustíveis fósseis. “Temos de
entregar [gás] ao mercado europeu, devido a um grande pedido da União Europeia.
Já adotamos um programa para entregar mais gás. A estratégia do governo é
transformar a economia numa direção verde”, apontou.
Para
Babayev, o país tem várias estratégias para descarbonizar a economia, inclusive
tem como meta sair dos atuais 98% de participação dos combustíveis fósseis no
seu mix energético para 30% de representatividade das energias renováveis até 2030.
Babayev
acredita na manutenção dos planos para atingir a meta do Acordo de Paris. Segundo
ele, esse ainda deve ser o foco da convenção-quadro da ONU sobre negociações
sobre mudanças climáticas. “Precisamos consolidar nossos esforços para 1,5°C”,
declarou. Não sou pessimista nesta questão. Temos que avançar na meta e na
implementação do programa [para reduzir as emissões globais]. Se iniciarmos a
ação, iniciarmos a implementação dos acordos feitos nas COPs anteriores, temos
uma chance. Nós faremos nosso melhor”, justificou o presidente da COP29.
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De olho na COP30, no Brasil
Uma parceria firmada
em fevereiro de 2024, em Dubai, entre Brasil, Emirados Árabes Unidos e
Azerbaijão, tem como objetivo assegurar o cumprimento das (novas) Contribuições
Nacionalmente Determinadas (NDCs). Na prática, isso significa que os 198
países-membros da convenção do clima devem apresentar em 2025, durante a COP30
que acontecerá no Brasil, não somente as metas climáticas, mas ações que
contemplem a prática das suas contribuições.
As
presidências das COPs 28, 29 e 30 devem incentivar a cooperação internacional
na Missão 1,5ºC, promovendo uma série de reuniões políticas para avaliar as barreiras ao desenvolvimento das NDCs. São
essas reuniões que discutirão a “quantidade e qualidade do apoio necessário”
para garantir que as NDCs, sejam colocadas em prática e que, em 2025 apresentem
ações proporcionais para manter o objetivo de 1,5°C.
“A
COP29 tem como objetivo chegar a um acordo sobre o financiamento necessário
para enfrentar a mudança do clima, incluindo a nova meta que os países
desenvolvidos precisarão assumir para ajudar os países em desenvolvimento”,
afirmou Ana Toni, secretária nacional de Mudança do Clima do Ministério do Meio
Ambiente e Mudança do Clima (MMA).
Durante
o evento, Marina Silva, ministra do Meio Ambiente, falou sobre a importância do
cumprimento do calendário assumido pelas nações para a transição proposta pelo
Balanço Global. “Cabe a nós conectar os recursos de que a espécie humana dispõe
para acelerar ação e ambição em compromissos climáticos. É preciso desde já
alinhar ao máximo as NDCs existentes ao objetivo de 1,5ºC, e apoiá-las com
financiamento igualmente ambicioso, que nos leve a zerar as emissões líquidas
da humanidade até 2050”, afirmou a ministra, que se comprometeu publicamente em
trabalhar “incansavelmente para isso”.
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Belém como sede da COP30
A
cidade de Belém (PA) sediará o mais importante evento global sobre o clima. Em
novembro de 2025, a capital paraense receberá líderes globais na COP30 para
discutir o futuro do planeta na conferência climática.
O
papel da floresta amazônica brasileira foi essencial para que Belém fosse
escolhida como sede da COP30. De acordo com o governo brasileiro, Belém foi apresentada como possível sede do evento durante a
COP27, que aconteceu em 2022 no Egito. “Se todos falavam da Amazônia, por que,
então, não fazer a COP num estado da Amazônia, para que eles conheçam o que é?
O que são os rios, as florestas, a fauna. O pessoal se prepare porque vai ter
gente do mundo inteiro e vão ficar maravilhados com a cidade de Belém”, disse o
presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Para
o governador do Pará, Helder Barbalho, trata-se de um privilégio para o Brasil
e o Pará sediar uma conferência tão relevante. “O Estado do Pará e Belém estão
ávidos para receber a todos, e trabalhando para que possamos, por um lado,
fazer um belo evento, mostrarmos que a Amazônia está preparada para receber o
planeta, mas por outro também para a construção do desenvolvimento sustentável
em favor da região”, declarou.
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Belém já recebe investimentos para a COP30
De
acordo com a Agência Brasil, três convênios foram firmados em maio (2024), envolvendo o
governo federal, o Estado do Pará e a cidade de Belém. São cerca de R$1,3
bilhão para investimentos com o propósito de apresentar melhorias para receber
a COP30.
A
maior parte do recurso, cerca de R$ 1 bilhão, será destinado à modernização da
infraestrutura viária de Belém e a implantação do Parque Linear Doca. Também
estão previstas ações de saneamento (50 quilômetros de rede coletora de esgoto
e 4,8 mil ligações de tubulações), e a pavimentação de vias de acesso ao local
da COP30, além da implantação de vias marginais e a instalação de equipamentos
para controlar o tráfego.
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Como será a COP30 no Brasil?
A
Fundação Getúlio Vargas (FGV) estima um
fluxo de mais de 40 mil visitantes durante os principais dias da Conferência.
Destes, cerca de 7 mil pessoas devem ser das equipes da ONU e delegações de
países membros.
A
expectativa do governo é mostrar a Amazônia real, vista de perto, além de
apontar alternativas para o enfrentamento do aquecimento global e as mudanças
climáticas.
O Greenpeace Brasil também
estará presente na COP30, em Belém, e vem estudando formas de contribuir.
Segundo o grupo, a expectativa é que a edição da COP no Brasil apresente
propostas que contemplem ações efetivas como:
- alternativas socioeconômicas para a região;
- zerar o desmatamento da floresta Amazônica até 2030;
- garantir uma Amazônia livre de garimpo;
- proteção dos povos indígenas com fortalecimento dos
mecanismos de proteção territorial;
- políticas de prevenção e adaptação às mudanças climáticas;
- fortalecimento de políticas que estimulem a agroecologia.
Fonte:
BBC Word/Além da Energia
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