Por que os
jovens se distanciaram dos sindicatos?
A
sindicalização é uma ação contínua e essencial no trabalho de base dos
dirigentes e ativistas sindicais. Os desafios para atrair e engajar
trabalhadores de todas as idades são constantes, mas os jovens sempre
representam uma barreira a ser enfrentada. Os debates indicam a necessidade de
inovações nas estratégias que visam à filiação dos trabalhadores aos
sindicatos, ampliando, assim, a representatividade, a proteção e o poder
sindical. Estudos da OCDE1 indicam que a baixa taxa de adesão sindical entre os
jovens é um fator importante na queda global da densidade sindical. De acordo
com o levantamento, apenas 7% dos sindicalizados na área da OCDE são jovens e a
adesão a sindicatos tende a seguir uma curva em “U” invertido, atingindo seu
ponto mais alto em trabalhadores com cerca de 40 anos.
Para
que um trabalhador decida se sindicalizar é fundamental que se sinta conectado
ao sindicato e veja valor em sua atuação e, com o jovem, não é diferente. O que
cabe considerar é quais são as características que marcam as atuais novas
gerações que chegam para ingressar no mundo do trabalho remunerado. As
transformações econômicas, sociais, políticas e culturais definem a visão de
mundo e as novas gerações desenvolvem abordagem existenciais e de modo de vida
que se diferem das gerações anteriores.
O
desenvolvimento da relação com o sindicato passa pela presença constante e
significativa dos dirigentes no ambiente de trabalho, pela apresentação dos
benefícios que a filiação pode proporcionar e pela demonstração do impacto
positivo que o sindicato pode ter nas condições de trabalho e de vida dos
trabalhadores. Quando um sindicato é percebido como ativo e eficaz, capaz de
melhorar salários, defender direitos e cuidar das condições de trabalho, ele se
torna mais atrativo também para os jovens, que buscam suporte e segurança em
suas trajetórias profissionais.
O
sindicato também tem o desafio de se apresentar como um espaço de encontro, de
acesso e de promoção de atividades culturais e recreativas, de lazer, de
momentos lúdicos, com sessões de cinema, teatro, atividades de literatura e de
música, com atividades esportivas, entre outras possibilidades. Nesses espaços
e momentos as pessoas se conhecem, relacionam-se, criam identidades e
confiança.
• Quem é
jovem?
Segundo
a OIT – Organização Internacional do Trabalho, jovem é a população na faixa
etária de 15 a 24 anos. As políticas públicas no Brasil consideram juventude a
população na faixa etária de 15 a 29 anos. É longa a extensão da faixa etária
da juventude, compreendendo a possibilidade de identificar-se vários recortes
que estarão associados a outras características como a inserção educacional, a
formação profissional acumulada, a experiência em curso ou vivida de transição
escola – trabalho, a necessidade ou urgência de um emprego e de renda etc. E a
sua situação econômica, suas carências e necessidades, suas expectativas com o
presente e o futuro.
A
juventude é uma diversidade complexa de vivências, é um período de arriscar-se,
de colocar-se no e para o mundo, de conquistar autonomia, de estabelecer
relacionamentos. Vencer o desafio de agregar-se, relacionar-se, posicionar-se,
estabelecer metas, tomar iniciativa, ser recebido e incluído. A juventude
irrompe suas demandas, seus anseios, seus sonhos e esperanças e é com elas que
o sindicato deve saber trabalhar.
Chegar
ao mundo do trabalho é vencer barreiras que estão associadas a educação formal
recebida, a qualificação profissional, a origem de classe, de gênero, de raça.
Chegar para a procura do primeiro emprego em um mercado de trabalho aquecido é
uma coisa, outra é chegar com o desemprego bombando. Procurar o primeiro
emprego, ser demitido ou pedir demissão pela primeira vez gera expectativas,
ansiedade e causa insegurança, algumas das questões que afligem os jovens.
• Desafios
para a sindicalização dos jovens
A
dificuldade em sindicalizar os jovens sempre esteve relacionada ao menor tempo
de vida laboral, à experiência de ingresso no mundo do trabalho, à falta de
experiência e de cultura da ação coletiva e do seu valor. Além disso, muitos
dos direitos trabalhistas e sociais conquistados ao longo das décadas acabam
sendo vistos como “naturais” pelas novas gerações, que não vivenciaram a luta
histórica que os garantiu. Nesse contexto, a formação e a comunicação sindical
têm o papel de revelar a origem desses direitos e reforçar a importância de
preservá-los e expandi-los.
Além
do contexto histórico e de acesso à informação, há outros fatores que
desmotivam a sindicalização entre os jovens. A crescente flexibilização do
trabalho, com o aumento de contratos temporários e empregos informais, a alta
rotatividade e a precariedade das condições laborais, dificultam a
sindicalização de todos os trabalhadores. Muitos jovens são empregados em
setores menos organizados sindicalmente, como serviços, comércio e trabalho
informal, onde a rotatividade é alta e os direitos são mais frágeis. O medo da
demissão e a insegurança podem afastá-los, mas de outro lado, seu ímpeto para
enfrentar desafios e querer mudanças, podem atraí-los.
O
trabalho em plataformas digitais, que cresceu enormemente entre os jovens,
apresenta um obstáculo significativo para o sindicalismo. Muitos desses
trabalhadores, como motoristas e entregadores, atuam sem vínculo formal e
enfrentam dificuldades para se organizarem, devido à dispersão geográfica e ao
isolamento característico desse modelo de trabalho. A OCDE destaca que o
aumento do trabalho não padronizado representa um desafio adicional, pois esses
trabalhadores têm menor probabilidade de serem sindicalizados do que os
trabalhadores assalariados clássicos.
• A visão dos
jovens sobre os sindicatos
A
percepção dos jovens em relação aos sindicatos é mista, embora de acordo com a
OCDE, em 23 de 32 países analisados, a confiança dos jovens em sindicatos é
superior à dos trabalhadores mais velhos, porém muitos ainda veem as entidades
sindicais como distantes ou antiquadas. Ou seja, reconhecem a importância dos
sindicatos, mas não se sentem representados.
É
comum que os jovens valorizem a liberdade individual e a flexibilidade, o que
às vezes entra em conflito com a visão dominante do sindicalismo, que enfatiza
o coletivo e as ações coordenadas. Mesmo assim, os jovens demonstram interesse
em participar de ações coletivas, como manifestações e arrecadações para causas
sociais, o que aponta para uma base potencial para engajamento. É fundamental
compreender que são muitas as portas de entrada para a vida sindical e a maior
parte delas estão relacionadas às múltiplas atividades e oportunidades
oferecidas em termos culturais, esportivos, de lazer, de propiciar espaços para
o encontro.
A
literatura sobre a participação da juventude no sindicalismo destaca uma série
de desafios e tendências que refletem a complexidade do mercado de trabalho
atual e as mudanças nas expectativas dos jovens.
• Percepções
de distanciamento dos sindicatos
Uma
parte da juventude vê os sindicatos como instituições distantes ou
desconectadas das realidades e desafios do mercado de trabalho moderno. A
literatura aponta que, para muitos jovens, a linguagem e as estratégias
sindicais tradicionais parecem pouco atrativas e inadequadas para lidar com os
novos tipos de trabalho, como o digital e o por plataformas. Esse descompasso
entre expectativas e abordagem sindical é um dos principais motivos da baixa
adesão. Por isso, é importante atuar em espaços educacionais para esclarecer e
fomentar a sindicalização, especialmente para os jovens que estão ingressando
no mercado de trabalho e desconhecem as alternativas de organização coletiva.
Mas, é preciso compreender que é necessário construir uma forma específica de
informar e formar os jovens. Esta precisa ser dinâmica, participativa,
divertida, interativa. Outra atuação importante é oferecer um bom serviço de
intermediação para o emprego, inclusive com apoio em termos de orientação
profissional.
• Preferência
por formas de mobilização alternativas
Pesquisas
indicam que os jovens tendem a preferir formas de mobilização mais flexíveis e
descentralizadas, como movimentos sociais e ativismo digital. Eles demonstram
um alto grau de engajamento em causas sociais, ambientais e de direitos civis,
o que sugere uma disposição para a ação coletiva, mas em formatos que diferem
do sindicalismo clássico. Neste caso, a inserção dos sindicatos em movimentos
diversos, culturais, sociais e políticos, abre a possibilidade de conexão entre
a diversidades de processos sociais que se conectam também com a vida sindical.
• Individualismo
versus coletivismo
A
literatura destaca que existe um certo paradoxo pois, enquanto os jovens
valorizam a liberdade e autonomia no ambiente de trabalho, muitos também
reconhecem a importância do apoio coletivo. Pesquisas mostram que os jovens
atualmente têm uma percepção de individualismo maior do que os jovens de
gerações anteriores, mas ao mesmo tempo são inclinados a apoiar movimentos de
justiça social e igualdade, o que pode ser uma base potencial para a
sindicalização, desde que os sindicatos ajustem suas abordagens. Nesse mundo
que fortalece o individualismo, cabe ao sindicato oferecer possibilidades
múltiplas de encontros e ações conjuntas e coletivas oportunizadas pelas
atividades culturais, recreativas, esportivas, comunitárias, de solidariedade,
de ajuda e apoio. Mobilizá-los para estarem juntos a seu modo e aprenderem com
os outros a atuarem coletivamente.
• A atração
por um sindicalismo mais representativo e inclusivo
Estudos
sugerem que os jovens se sentem mais atraídos por sindicatos que promovem a
inclusão e a diversidade e que adotam uma postura progressista em questões de
justiça social. Os sindicatos que integram as pautas econômicas e sociais e
oferecem um espaço de acolhimento para minorias têm mais sucesso em atrair
jovens, que desejam ver representadas suas preocupações com temas como
igualdade de gênero, antirracismo e direitos LGBTQIAPN+.
• Sindicalização
de trabalhadores em plataformas
Expansão
do trabalho em plataformas, como transporte e entrega, traz novos desafios para
o sindicalismo, pois esses trabalhadores muitas vezes não possuem vínculo
empregatício formal e estão dispersos geograficamente. A literatura enfatiza
que é necessário inovar nos modelos de organização sindical para alcançar esses
trabalhadores, considerando que muitos deles são jovens que enfrentam um
ambiente de trabalho isolado e precário. A oferta de serviços como assessoria
jurídica, oportunidades de qualificação, orientação profissional, assistência
saúde, entre outros, pode atrair os jovens que enfrentam condições de trabalho
precárias. Abrir os sindicatos para trabalhadores autônomos e temporários,
oferecendo serviços que os ajudem a se organizar para manter o veículo,
realizar sua renovação em condições adequadas, formular pautas e organizar
negociações com empresas plataformizadas, é uma estratégia importante para
também alcançar um público jovem.
• A
necessidade de comunicação digital e inovadora
Os
sindicatos que utilizam comunicação digital, como redes sociais e plataformas
online, têm mais sucesso em alcançar jovens. A digitalização das atividades
sindicais, incluindo campanhas, assembleias virtuais e canais de suporte
online, pode criar um ambiente mais atraente e acessível para os jovens,
facilitando o engajamento e a compreensão do papel dos sindicatos e
desenvolvendo uma comunicação direta e transparente sobre os benefícios da
filiação sindical.
• Confiança em
sindicatos e potencial de engajamento
Embora
muitos jovens ainda vejam os sindicatos como pouco atrativos, existe confiança
nas organizações sindicais, o que representa um potencial para engajá-los no
movimento sindical, desde que este adote estratégias que se alinhem com suas
demandas e expectativas.
A
literatura destaca que, embora a sindicalização entre jovens enfrente desafios
significativos, há um potencial inexplorado. Orientar o sindicalismo para
responder às preocupações específicas dos jovens, oferecer um ambiente
inclusivo e diversificado, e investir em formas inovadoras de comunicação e
organização podem ser estratégias eficazes para revitalizar o movimento
sindical e envolver uma nova geração de trabalhadores.
A
sindicalização dos jovens é um desafio para o movimento sindical global. No
entanto, as demandas dos jovens por segurança, dignidade e condições de
trabalho justas são similares às dos trabalhadores de gerações anteriores,
mesmo que as formas de engajamento sejam diferentes. Um sindicalismo que se
adapte às necessidades e às perspectivas da juventude poderá renovar suas bases
e fortalecer sua representatividade.
Os
sindicatos têm a responsabilidade de construir um futuro que ofereça
oportunidades justas para os jovens e promova uma cultura de solidariedade e
apoio mútuo. Diante das pressões por maior individualismo e flexibilização
crescente das relações de trabalho, é crucial que o movimento sindical se
aproxime dos jovens para demonstrar que a união e a ação coletiva são as
melhores ferramentas para a defesa e conquista de direitos.
Fonte:
Por Clemente Ganz Lúcio, em Outras Palavras
Nenhum comentário:
Postar um comentário