quarta-feira, 13 de novembro de 2024

Delator do PCC executado denunciou policiais do DEIC, do DHPP e de duas delegacias de SP, aponta delação premiada

A delação premiada de Antonio Vinicius Lopes Gritzbach, executado no Aeroporto Internacional de São Paulo na sexta-feira (8), cita como supostos corruptos policiais civis de dois departamentos importantes da Polícia Civil e de dois distritos policiais da Zona Leste da capital paulista. Em sua colaboração, homologada (aceita) pela Justiça, ele também entrega esquemas de lavagem de dinheiro da facção criminosa PCC.

No documento, obtido na íntegra pela reportagem, os setores da polícia mencionados são o Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) e o Departamento Estadual de Investigações Criminais (DEIC), dois dos mais relevantes da corporação. Já as delegacias citadas são o 24º DP (Ermelino Matarazzo) e o 30º DP (Tatuapé). A informação foi revelada pelo jornal "O Estado de S.Paulo" nesta terça-feira (12) e confirmada pela GloboNews e pelo g1.

Na delação, Gritzbach explica que o envolvimento do 30º DP e do 24º DP no caso se deu porque a equipe de um distrito foi transferida para outra delegacia, levando consigo os esquemas criminosos. Segundo os promotores, as condutas dos policiais configuram, em tese, os crimes de concussão (extorsão cometida por agentes públicos), corrupção passiva, associação criminosa, entre outros.

Em entrevista à imprensa na segunda (11), o secretário da Segurança Pública, Guilherme Derrite, disse que os policiais civis citados na delação serão afastados, mas não detalhes sobre quem ou quantos são. Derrite contou que, oito dias antes de ser executado, Gritzbach tinha sido ouvido pela Corregedoria da Polícia Civil sobre a denúncia de extorsão por parte de policiais civis e foi aberto um inquérito na Corregedoria.

A Corregedoria da Polícia Civil, no dia 31 de outubro, ouviu, na sede da Corregedoria, o indivíduo Vinicius. Ele foi ouvido por conta de termos recebidos extratos dessa delação no Ministério Público, nós ainda não tivemos acesso a delação, mas extratos dela - onde ele falava nome de policiais civis que teriam, de alguma maneira, participado da extorsão contra ele. O primeiro a ser ouvido foi o próprio Vinicius. — Guilherme Derrite

Em março, Vinicius fechou o acordo de delação premiada com o MP com a promessa de entregar informações sobre o PCC e crimes cometidos por policiais.

Gritzbach acusou um delegado do DHPP de cobrar propina para não implicá-lo no assassinato de Anselmo Bicheli Santa Fausta, conhecido como Cara Preta e que movimentava milhões de reais comprando e vendendo droga e armas para o PCC.

Além disso, forneceu informações que levaram à prisão de dois policiais civis que trabalharam no Departamento de Prevenção e Repressão ao Narcotráfico (Denarc).

A SSP criou uma força-tarefa para investigar a execução, que será coordenada pelo secretário-executivo da SSP, delegado Osvaldo Nico Gonçalves. Ainda segundo Derrite, dentro do veículo utilizado pelos suspeitos, foi encontrado um galão de gasolina. A investigação apura que eles iriam incendiar o carro. O material genético encontrado no Gol também já foi coletado e passará por análise. A polícia também busca por imagens de câmeras de segurança para refazer o trajeto do carro e, verificar se os suspeitos usaram um outro veículo para fugir. Segundo testemunhas, a informação é que eles fugiram a pé.

<><> Seguranças indicados por tenente

Os policiais militares, que faziam a escolta pessoal do delator do PCC, foram indicados para fazer o bico ilegal por meio de um tenente da PM. A prática de bicos, como a segurança particular, é proibida pelo Regulamento Disciplinar da PM e é classificada como uma transgressão grave. As informações foram registradas nos depoimentos de três policiais à Corregedoria da PM e ao Departamento de Homicídios e de Proteção à Pessoa (DHPP), responsáveis pelas investigações.

No sábado (9), os PMs Leandro Ortiz, Adolfo Oliveira Chagas, Jefferson Silva Marques de Sousa e Romarks César Ferreira de Lima foram afastados de suas funções até o final das investigações. Uma das linhas de investigação da Polícia Civil é que os seguranças de Gritzbach teriam falhado de forma proposital e indicado o momento em que o empresário estava desembarcando do aeroporto.

Em depoimento, Adolfo contou que foi convidado em 2023 pelo tenente Garcia, do 23° Batalhão Metropolitano, a prestar serviço de segurança particular para a família do empresário. Ele ainda disse que trabalhou na escolta pessoal durante aproximadamente dez meses e interrompeu a prestação de serviço, quando descobriu pelo noticiário que Gritzbach estava envolvido com a facção criminosa paulista. Convidado novamente pelo tenente Garcia, Adolfo aceitou fazer um "serviço esporádico" de dois dias entre quinta (7) e sexta-feira (8) para buscar o delator do PCC e namorada no aeroporto, "em razão de sua precária condição financeira".

À Corregedoria da PM, Jefferson também relatou que começou a trabalhar na escolta pessoal de Gritzbach — acusado de lavar dinheiro para o PCC proveniente do tráfico de drogas — por intermédio do tenente Garcia. Ainda disse que tinha a função de garantir a segurança do filho do empresário. Durante o período trabalhado, Jefferson recebeu a informação de um possível envolvimento de Gritzbach com atividades ilícitas e de que não estaria mais sendo investigado, por isso continuou prestando serviço à família.

Procurada, a Secretaria de Segurança Pública (SSP) não respondeu se o soldado Samuel e se o tenente Garcia são investigados e se foram afastados de suas funções.

A pasta se limitou a informar que "a Polícia Militar esclarece que atividades externas à Corporação constituem infração ao regulamento disciplinar da instituição, sujeitando o infrator a sanções administrativas. As punições são aplicadas conforme a gravidade da infração e o histórico de transgressões do autor, podendo variar de advertência até a exclusão das fileiras da Polícia Militar. Quanto ao caso citado, os policiais envolvidos foram ouvidos nos dois inquéritos em curso e permanecem afastados das atividades operacionais".

<><> Como Gritzbach foi morto?

Gritzbach foi executado na área de desembarque do Terminal 2 do Aeroporto Internacional de São Paulo, por volta das 16h. Câmeras de segurança registraram toda a ação. Nas imagens, o empresário aparece carregando uma mala na área externa, onde há uma fila de carros, quando dois homens encapuzados descem de um veículo preto e efetuam ao menos 29 disparos. Gritzbach tenta fugir e pula a mureta que divide a via, porém cai logo em seguida. Ele foi atingido por 10 tiros: 4 tiros no braço direito, 2 no rosto, 1 nas costas, 1 na perna esquerda, 1 no tórax e 1 no flanco direito (região localizada entre a cintura e a costela).

<><> O que os PMs que faziam a proteção de Gritzbach alegaram?

PMs que faziam a segurança de Gritzbach afirmaram que um problema com um dos carros impediu a chegada deles ao aeroporto de Guarulhos antes da execução. Segundo depoimentos à Polícia Civil feito por dois deles, o grupo foi chamado para buscar o empresário e a namorada dele no aeroporto. Eles se dividiram em dois carros. Em um, estavam os policiais Adolfo e Leandro. No outro, foram os policiais Jefferson e Romarks, o filho e um sobrinho do empresário.

Ainda de acordo com os depoimentos, por volta das 15h, eles pararam em um posto Ipiranga próximo ao aeroporto para fazer um lanche. Foi quando o filho de Gritzbach informou aos seguranças sobre a chegada do pai. Um dos veículos, entretanto, teve problema na ignição e não estava mais ligando, segundo os policiais. O outro veículo já estava a caminho, mas, como estava com 4 pessoas, fez meia volta e retornou ao posto para deixar um dos policiais lá e abrir espaço para o empresário e a mulher. Quando esse veículo – com o policial Jefferson, o filho e o sobrinho do empresário – estava se aproximando do portão de desembarque, ocorreram os disparos. Investigadores desconfiam dessa versão. Uma das linhas de investigação do DHPP é que os seguranças teriam falhado de forma proposital.

•                                    Delator estava acompanhado por segurança no voo

Antonio Vinicius Lopes Gritzbach, delator do PCC, estava acompanhado de um segurança durante o voo de Maceió para São Paulo na sexta-feira (8), antes de ser executado no Aeroporto Internacional de São Paulo, em Guarulhos. Ele e a namorada carregavam uma mala com joias avaliadas em R$ 1 milhão. Inicialmente, a informação era a de que apenas quatro seguranças o esperavam em São Paulo.

O soldado Samuel Tillvitz da Luz, do 18° Batalhão Metropolitano, é o quinto integrante da escolta pessoal do empresário. Ele prestou depoimento à Corregedoria da PM, e a TV Globo teve acesso ao documento. Em depoimento à Corregedoria da PM, Samuel contou que há um ano presta serviço para Gritzbach. Na sexta, antes de o avião pousar, ele entrou em contato com a equipe em terra (formada por outros quatro PMs) por meio do celular. Quando a equipe terrestre avisou que a área estava segura, Samuel desembarcou com Gritzbach e a namorada dele. Ele relatou que, após atravessar a porta de vidro da entrada, se posicionou à frente do casal, quando ouviu o barulho de disparos.

O segurança, então, se escondeu atrás de um ônibus estacionado e "partiu em deslocamento a pé por seu lado direito, subindo por um barranco e acessando a via que dá acesso ao pavimento superior do aeroporto". À Corregedoria, ele explicou que estava em desvantagem, por isso decidiu proteger a própria vida.

•                                    Quais são os próximos passos da investigação

As investigações sobre a execução de Antônio Vinicius Lopes Gritzbach, delator da facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC), na sexta-feira (8) em Guarulhos, serão realizadas por uma força-tarefa a ser criada pela Secretaria da Segurança Pública de São Paulo (SSP). Nesta segunda (11), o secretário da pasta, Guilherme Derrite, afirmou que o grupo terá a participação de seis membros das forças de segurança do estado e será coordenado pelo secretário-executivo da SSP, delegado Osvaldo Nico Gonçalves.

Gritzbach fechou em março um acordo de delação premiada com o Ministério Público de São Paulo para delatar crimes da facção e de policiais. Em sua colaboração, ele citou como supostos corruptos policiais civis de dois departamentos importantes da Polícia Civil e de dois distritos policiais da Zona Leste da capital paulista. O delator chegou a pedir mais proteção aos promotores, em virtude de ter sido jurado de morte.

<><> Confira abaixo os próximos passos da investigação e o que se sabe sobre o caso:

<>< 1. Quem vai fazer parte da força-tarefa?

A coordenação será feita pelo secretário-executivo da SSP, delegado Osvaldo Nico Gonçalves. Os seis integrantes serão:

•                                    Caetano Paulo Filho – delegado de polícia, diretor do DIPOL;

•                                    Ivalda Oliveira Aleixo – delegada de polícia, diretora do DHPP;

•                                    Pedro Luís de Souza Lopes – coronel da PM, chefe do Centro de Inteligência da Polícia Militar;

•                                    Fábio Sérgio do Amaral – coronel da PM, corregedor da Polícia Militar;

•                                    Karin Kawakami de Vicente – perita criminal de Classe Especial.

<><> 2. Como a força-tarefa vai funcionar?

O colegiado obedece a um pedido do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), para as forças policiais darem uma resposta rápida sobre a execução.

O objetivo da força-tarefa, segundo o decreto que a criou, é fazer uma cooperação direta com o Ministério Público para o “compartilhamento de informações necessárias ao cumprimento de suas atribuições e, caso necessário, colaborando de forma complementar com autoridades federais, sem prejuízo da condução principal das investigações pelo estado”. O grupo também deverá informar Derrite do rumo dos trabalhos periodicamente, com relatórios semanais.

<><> 3. Por que a Polícia Federal entrou no caso?

Além da força-tarefa, a Polícia Federal também vai investigar o assassinato, por ordem do Palácio do Planalto. A avaliação é a de que a forma como o crime ocorreu, o suposto envolvimento de facção criminosa e de agentes públicos, além do local do homicídio no aeroporto mais movimentado do país durante o dia, demandam também uma investigação federal. Por segurança, o inquérito será tocado por uma equipe de fora de São Paulo. Há uma suspeita de que o empresário pode ter sido morto por ordem e com envolvimento de agentes de segurança, e não necessariamente por ordem direta do PCC.

<><> 4. O que a GCM de Guarulhos está apurando?

A Guarda Civil Municipal (GCM) de Guarulhos, na Grande São Paulo, vai investigar por que não havia nenhum agente na base da corporação no Aeroporto Internacional de São Paulo no momento em que um delator do PCC foi executado com dez tiros. O crime aconteceu na tarde do dia 8, bem em frente ao micro-ônibus da GCM que fica estacionado no aeroporto, mas nenhum guarda estava no local para prestar suporte ou intervir na ação dos atiradores. Segundo o comando da Guarda, naquele mesmo horário, os agentes da corporação, que andam armados, atendiam outra ocorrência na Delegacia da Polícia Civil de Cumbica. Fontes ligadas à gestão municipal querem saber se a ocorrência foi "plantada" para desviar a atenção dos guardas na hora do tiroteio ou se foi só uma coincidência. A sindicância foi aberta no sábado (9).

<><> 5. Por que ele não tinha uma escolta oficial?

Gritzbach pediu mais segurança ao Ministério Público. A TV Globo teve acesso a um trecho da reunião do empresário com os promotores, cuja data não foi informada.

"Tenho comprovantes de pagamento, tenho contrato, tenho matrícula, tenho as contas de onde vinham o dinheiro, então dá pra gente fazer o caminho inverso. Tenho as conversas de Whatsapp com os proprietários. Eu apresento, doutor, mas cada vez mais eu preciso de mais segurança. Então, eu precisava de um amparo de vocês também do que eu vou ter. Se não, vocês estão falando com um morto-vivo aqui", disse, na reunião. À GloboNews, o promotor Lincoln Gakiya disse que ele recusou as ofertas de segurança feitas a ele. Alegava que podia bancar a própria segurança e não queria abrir mão do estilo de vida que levava. Ao entrar no programa, ele precisaria mudar de casa e deixar de conviver com a família e amigos.

Para se proteger, o empresário contratou cinco policiais militares para fazerem sua escolta particular: Quatro deles, Leandro Ortiz, Adolfo Oliveira Chagas, Jefferson Silva Marques de Sousa e Romarks César Ferreira de Lima, estavam em terra, mas não estavam com Gritzbach quando ele foi morto. Disseram que um dos carros usados para buscar o empresário teve um problema na ignição. O quinto, soldado Samuel Tillvitz da Luz, viajava com o empresário, mas disse que, quando ouviu o barulho de disparos, se escondeu atrás de um ônibus estacionado e "partiu em deslocamento a pé por seu lado direito, subindo por um barranco e acessando a via que dá acesso ao pavimento superior do aeroporto". À Corregedoria, ele explicou que estava em desvantagem, por isso decidiu proteger a própria vida.

<><> 6. Os seguranças estão sendo investigados?

Sim. Leandro Ortiz, Adolfo Oliveira Chagas, Jefferson Silva Marques de Sousa e Romarks César Ferreira de Lima são investigados pelo Departamento de Homicídios e de Proteção à Pessoa (DHPP) e foram afastados de suas funções no sábado (9). A investigação está refazendo os passos deles, seguindo o trajeto antes de o carro supostamente quebrar, além de extrair dados dos celulares dos PMs.

<><> 7. Por que a Corregedoria da PM já investigava os seguranças de Gritzbach?

A Corregedoria da Polícia Militar havia instaurado um inquérito para apurar o suposto envolvimento dos seguranças dele com a facção criminosa. Os cinco seguranças de Gritzbach são praças da PM (soldados, cabos e sargentos) e foram indicados pelo mesmo tenente, Garcia, do 23° Batalhão Metropolitano. Depois do assassinato, os corregedores revisitaram o Inquérito Policial Militar (IPM) e verificaram que os nomes dos seguranças de Gritzbach já apareciam na investigação. Agora, vão juntar informações que constavam no IPM com os novos elementos, obtidos principalmente após a apreensão dos celulares dos PMs.

<><> 8. Por que ele denunciou policiais civis à Corregedoria?

Gritzbach foi ouvido em 31 de outubro, oito dias antes de ser executado, na Corregedoria da Polícia Civil sobre a denúncia de que policiais civis estavam cometendo extorsão. Segundo Derrite, ele citava, na delação feita ao MP, "nomes de policiais civis que teriam, de alguma maneira, participado de extorsão contra ele". Ele foi o primeiro a ser ouvido e o inquérito, instaurado na Corregedoria, "para que ele pudesse apontar os nomes e quais desvios de conduta, esses policiais civis teriam cometido".

 

Fonte: g1

 

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