quarta-feira, 11 de setembro de 2024

Quanto de medicina preventiva é positiva (ou não) para a sua saúde?

Antigamente, algo mais restrito à população mais velha. Hoje em dia, metade dos 34 tipos de câncer mais comuns está aumentando entre as populações da Geração X e dos millenniums, enquanto nove deles, incluindo o câncer de cólon, estão diminuindo em adultos com mais de 65 anos.

Com o aumento do câncer em um grupo demográfico mais jovem, a detecção precoce é fundamental para o tratamento, a recuperação e a longevidade, como aconselham os profissionais da área médica.

Os procedimentos mais comuns para identificar possíveis cânceres são as tomografias computadorizadas e os raios X que investigam sintomas preocupantes. Eles procuram sinais de tumores e outras anormalidades em partes específicas do corpo. Mas e se o corpo inteiro pudesse ser examinado antes mesmo do surgimento dos sintomas?

“Algumas das categorias de câncer que crescem mais rapidamente – pâncreas, ovário e câncer de cólon em jovens e pulmão em não fumantes – não têm programas de triagem padrão. A abordagem do sistema médico atual é esperar até que os sintomas apareçam, momento em que muitos desses cânceres têm um prognóstico ruim”, explica Andrew Lacy, CEO da Prenuvo, uma empresa que está abrindo clínicas de ressonância magnética (MRI) de corpo inteiro em todo os Estados Unidos. A empresa se tornou viral no ano passado depois que uma postagem nas redes sociais da empresária, atriz e influenciadora Kim Kardashian, que chamou os exames de “salvadores de vidas”.

A Prenuvo faz parte de uma tendência crescente de empresas em todo o mundo que prometem uma medicina preventiva melhor e mais abrangente – que deve ser paga por um preço, quase sempre bem alto.

Além das ressonâncias magnéticas de corpo inteiro, os pacientes estão buscando exames preventivos abrangentes, voando ao redor do mundo para maratonas de check-ups médicos. Um TikToks viral mostrou uma instalação na Turquia onde uma mulher recebeu limpeza dentária, exames de sangue inovadores e várias varreduras para detecção de doenças.

Os médicos, no entanto, continuam céticos quanto ao fato de que todo esse cuidado com a saúde vale a pena. O American College of Preventive Medicine dos Estados Unidos não recomenda exames de corpo inteiro para pessoas sem sintomas. E, da forma como está, apenas cerca de 5% dos norte-americanos estão atualizados com relação às opções de tratamento médico preventivo existentes.

<><> O que as ressonâncias magnéticas podem ver em nossos corpos?

O valor da ressonância magnética é sua capacidade de enxergar profundamente os músculos, tecidos moles e ossos em busca de sinais de tumores - um feixe aberrante de células - e outras anormalidades, como aneurismas.

Patenteada em 1972 pelo médico Raymond Damadian, a ressonância magnética chegou ao mercado na década de 1980 e foi aclamada: Damadian havia encontrado uma maneira de uma máquina conseguir diferenciar as células cancerosas das não cancerosas. Usando uma corrente de radiofrequência, os prótons nos tecidos moles e órgãos se espalham; quando a corrente é desligada, eles se reorganizam.

Os dados retornados nesse processo permitem que os médicos determinem, na maioria dos casos, a diferença entre o que é normal e o que não é.

As tecnologias de imagem, como as ressonâncias magnéticas, podem “nos dizer o quão saudável você está antes de uma doença”, diz Bernardo Lamos, codiretor do Coit Center for Longevity & NeuroTherapeutics da Universidade do Arizona (também nos Estados Unidos), cujo trabalho se concentra no envelhecimento e na população sênior. “E se você tiver conhecimento [de um problema], poderá intervir. Há uma taxa de erro em tudo isso, claro, e é preciso ter cuidado, mas certamente não quero intervir tarde demais.”

A Ezra, uma empresa de saúde sediada em Nova York, torna as ressonâncias magnéticas mais inteligentes e as imagens finais mais nítidas por meio de seu software de inteligência artificial (IA). Assim como a Pernuvo, a Ezra se lançou em serviços de ressonância magnética de corpo inteiro com clínicas espalhadas por todo os Estados Unidos, a mais recente em Austin, no Texas, sua “cidade mais solicitada até o momento”, de acordo com o site da empresa.

As atualizações de IA do Ezra também reduzem o tempo que uma pessoa tem que ficar dentro da máquina de ressonância magnética, de uma hora para 30 minutos.

Eric Verdin, presidente e CEO do Buck Institute for Research on Aging , tem feito uma ressonância magnética de corpo inteiro anualmente nos últimos cinco anos e diz que esses tipos de serviços avançados de imagem podem preencher uma lacuna crítica na detecção precoce. Apenas cerca de 14% dos cânceres são detectados por meio de testes de triagem preventiva padrão, de acordo com pesquisa realizada pelo National Opinion Research Center da Universidade de Chicago.

Entretanto, essas taxas de detecção diferem drasticamente de acordo com o tipo de câncer detectado. Os cânceres de próstata e de cânceres de mama foram detectados por exames precoces em 77% e 61% das vezes, respectivamente, enquanto os exames preventivos de rastreamento detectaram apenas 3% dos casos de câncer de pulmão.

Muitas vezes não coberto pelo seguro de saúde – a menos que seja prescrito por um médico para um teste específico – Verdin acredita que o custo de uma ressonância magnética de corpo inteiro poderá cair  com o tempo. E as seguradoras poderiam aderir, como fizeram, por exemplo, com as mamografias.

“A busca é mais sobre a 'duração da saúde' do que sobre o tempo de vida. Trata-se de aumentar nosso número de anos saudáveis”, afirma Verdin.

<><> Custos altos e falsos positivos

Um estudo de 2023 descobriu que aqueles que ganham mais de 250 mil dólares por ano nos Estados Unidos – ou seja, 15 milhões de lares norte-americanos – tinham “muito mais probabilidade de gastar tempo e dinheiro com sua saúde”.

Por mais caros que eles sejam no país norte-americano, cerca de 1.500 a 2.500 dólares por exame, a aposta é que mais pessoas se arriscarão.

Outra grande desvantagem é que os exames de ressonância magnética com IA provavelmente registrarão mais anomalias – ou “incidentalomas” – que não são preocupantes do ponto de vista médico, mas podem levar a exames adicionais e caros; procedimentos cirúrgicos desnecessários e possivelmente perigosos; e ansiedade desnecessária.

Um estudo publicado em 2019 examinou uma dúzia de estudos que avaliaram os prós e os contras da realização de ressonâncias magnéticas de corpo inteiro em pacientes sem sintomas perceptíveis de doenças e encontrou resultados mistos.

As RMs encontraram anormalidades em pouco mais de um terço das pessoas testadas, mas não ficou claro qual era o risco à saúde dessas anormalidades. Falsos positivos foram relatados em cerca de 16% das vezes.

Esses falsos positivos ou anormalidades benignas podem resultar no que os médicos chamam de “diagnóstico excessivo”. Não exclusivos das RMs de corpo inteiro, os ônus do excesso de diagnóstico são conhecidos há décadas. 

O neurocirurgião britânico Richard Hayward cunhou o que ele chamou de “acrônimo de nossos tempos”:  VOMIT, ou “vítimas da moderna tecnologia de imagem”.

 

Fonte: National Geographic Brasil

 

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