sexta-feira, 20 de setembro de 2024

Luiz Inácio sentiu o golpe e tenta intimidar liderança indígena

“Temos hoje o pior Congresso da história da república. Um Judiciário egocêntrico e parcial. Um governo – que sabemos o motivo, senhor presidente –, enfraquecido, acorrentado, que faz alianças e conchavos para se manter no poder”. Assim disse Yakui Tupinambá, liderança deste povo, em evento solene oficial, no dia 12 de setembro. Partindo de uma legítima representante indígena, crítica tão franca, não poderia ser mais contundente. Durante essa fala, a televisão estatal flagrou as “caras e bocas” de Luiz Inácio e Janja, primeira-dama, numa reação iracunda às verdades lançadas ali em suas caras, como se fossem aquelas palavras desaforos de uma gente ingrata. Cena patética, um colérico Luiz Inácio, ao tomar a palavra, censurou a liderança do povo Tupinambá com clara intensão de intimidá-la, falando quase aos berros, sugeriu-lhe “mudar o discurso”. Com tal grosseira insinuação de que a liderança indígena não possuía “inteligência política”, tentou justificar sua política de tudo ao “agronegócio” e pouco ou nada aos indígenas, camponeses e quilombolas que não entendem “que o governo é minoria” nas casas legislativas. Ora bolas!

Enquanto posa de sabichão da política, para o qual inteligência significa esperteza e velhacaria, Luiz Inácio agiu como um tolo. Fosse verdade sua miserável justificativa, da “minoria parlamentar”, então é justo que nos perguntemos: por que não vivíamos, de 2005 a 2013, no “paraíso socialista” pequeno-burguês que tanto fora prometido nos programas partidários do PT e na verve de determinadas figuras oportunistas? Afinal, naquele período com acordos tão espúrios como os de hoje, o PT e seus presidentes reinaram absolutos, com maioria em ambas as casas legislativas. Não, não é a falta de “maioria parlamentar” e nem a “correlação de forças” nunca favorável que forçam o governo oportunista a ser, na prática, um governo direitista: o governo é direitista porque, de fato, seus cabeças creem que nenhuma mudança radical da sociedade é possível e, portanto, mais vale se cacifar perante as classes dominantes, ganhar seu aval para administrar a velha ordem de exploração e opressão do povo na promessa vã de fazê-la menos brutal do que deixar que a direita tradicional e extrema-direita gerencie sua manutenção – e nisso, objetivamente, apenas reforçam a escravidão das massas pobres ao fazê-las crer ser sua política o melhor possível, frustram-na e adubam terreno para a reação extrema. Portanto, Yakui está certa.

Mas, vejam, para provar que o Luiz Inácio não é indiferente às demandas do campesinato, o governo anunciou recentemente desapropriação de 174,8 mil hectares de terras para a “reforma agrária”. No portal oficial do governo, se lê que “o objetivo é avançar na regularização fundiária”. Sim, promover regularização na estrutura fundiária… com míseros 174,8 mil hectares. Piada, para não dizer cinismo descarado. Para se ter ideia do ridículo, o reacionário “neoliberal” FHC – como gostam de chamá-lo –, em 1998, em três anos de governo, desapropriou 4,9 milhões de hectares, o que já era uma brincadeira de mau gosto. Luiz Inácio, em dois anos de seu terceiro governo, consegue a marca de fazer 3,5% do que fizera FHC em seu primeiro mandato.

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Sobre as queimadas, nota-se que já atingiram direta ou indiretamente mais de 60% do território nacional. É obra do latifúndio bolsonarista, por razões econômicas e da sua voracidade sobre as áreas de fronteira agrícola, preservação ambiental e áreas de demarcação de Terras Indígenas; ademais, chama a atenção a inação do governo. Mas, apenas isso não explica tal fenômeno. Há focos de grandes incêndio em regiões em que, economicamente, não há nenhuma razão em benefício imediato ao latifúndio (em São Paulo, por exemplo); ademais, chama a atenção o grau de coordenação dessas ações, nessas regiões – que nos traz à memória as ações bolsonaristas de novembro-dezembro de 2022, que, por agora se comprovou, tinha um núcleo operacional militarizado, decerto, com atuação direta dos serviços de operações especiais das Forças Armadas, com o objetivo de desgastar politicamente o governo. Evidencia-se que o movimento anticomunista com significativa base de massas, chefiado politicamente por Bolsonaro e operacionalizado por um núcleo organizador militarizado, não morreu: segue vivo, com a mesma amplitude e apenas aguardando melhores condições – e, de fato, atuando para construí-las – para voltar à ofensiva total.

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As eleições para prefeito de São Paulo tornaram-se a vitrine da desmoralização do processo eleitoral. Primeiro, porque a dinâmica das intenções de voto vão em favor dos candidatos que mais esculhambam o processo eleitoral; as massas têm identidade, não com o sistema pútrido da velha democracia e sua farsa eleitoral, mas com aqueles que desrespeitam-na – porque as próprias massas se sentem desrespeitadas por esse sistema; as massas gostam daqueles que esculhambam esse espetáculo horrendo de enganos e venda de ilusões porque gostariam de esculhambá-lo também, na medida em que se sentem esculhambadas pelo sistema. Claro que a extrema-direita, propositalmente, busca se aproveitar e apresentar-se por “antissistema”, e assim manipular a consciência das massas para a reação extrema – e, sendo a única força política do mundo político oficial a achincalhar a velha democracia, enquanto a falsa esquerda a defende com unhas e dentes e com todas as misérias, acaba por arrebatar parte das massas, disputando com o movimento revolucionário. Porém, quando Datena decide dar uma cadeirada em Pablo “Boçal”, faz com que a dinâmica se volte contra este: na opinião pública, ninguém achou absurdo, afinal, que trabalhador médio não desejaria dar uma cadeirada em qualquer político reacionário? De todo modo, ninguém duvida que as eleições paulistanas têm agora uma forte concorrente, que tem muito mais simpatia popular do que os demais candidatos: a cadeira.

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Urge ao movimento popular e democrático levantar alto a bandeira do boicote à farsa eleitoral, como móvel da campanha de desmascaramento da velha democracia burguesia – ditadura de classe sobre as massas populares –, e contrapor essa velha ordem de enganações e opressão à Revolução Agrária, como primeira fase da Revolução de Nova Democracia. As massas no campo estão realizando novas tomadas de terras sustentadas em grupos armados de autodefesa; nas cidades, cresce a desilusão com o caminho da conciliação de classes entre as massas politicamente ativas. A palavra de ordem permanente, e que nas temporadas eleitoreiras deve tomar o centro da ação política democrático-revolucionária é: “Eleição não, revolução sim!”.

 

•        Latifúndio bolsonarista é responsável por assassinato de indígena, mas governo federal tem cota de envolvimento

O óbvio aconteceu. Depois de meses das primeiras denúncias sobre um cerco montado por pistoleiros em volta das terras Guarani-Kaiowá no Mato Grosso do Sul, um indígena foi assassinado.

O crime foi cometido pela Polícia Militar na manhã do dia 18 de setembro durante uma operação dos policiais, em conjunto com pistoleiros, na Terra Indígena (TI) Nhanderu Marangatu. A PM foi até a terra por ordem da parlamentar do partido de Bolsonaro (PL), Luana Ruiz.

É evidente que os responsáveis imediatos e centrais pelo crime são o latifúndio bolsonarista do Mato Grosso do Sul e seus agentes oficiais e paramilitares, que movem uma verdadeira operação de guerra contra os Guarani-Kaiowá em diferentes municípios do estado.

Mas o governo federal também tem sua cota de responsabilidade na tragédia. Até agora, o Ministério dos Povos Indígenas (MPI) não disse nada sobre o assunto. Nem o presidente Luiz Inácio. Como a PM responde ao governo do Estado, é provável que o governo, se vier a tratar da situação, tente se isentar de qualquer culpa.

Mas foi o governo federal que, frente há meses de uma operação de cerco e aniquilamento contra os Guarani-Kaiowá, não ordenou que as tropas federais, da Força Nacional ou Polícia Federal, agissem com dureza contra a pistolagem. Desde julho, o AND acompanha a situação no MS. As reportagens in loco registraram as viaturas da Força Nacional ao lado dos acampamentos dos pistoleiros, sem que nada fizessem. À noite, quando holofotes eram ligados contra os Guarani-Kaiowá para impedir o sono das famílias, as tropas continuavam inertes.

E o povo brasileiro lembra de quando, nesse cenário de guerra, as tropas da Força Nacional abandonaram (!) as redondezas da retomadas Pikyxyin, Kurapa’yty e Yvy Ajere, em Douradina, abrindo espaço para a livre atuação dos pistoleiros, que deixaram 10 indígenas feridos. Depois do absurdo, nacionalmente denunciado, não houve nenhuma cobrança pública por parte do MPI ou de Luiz Inácio sobre a atuação das tropas. Não houve abertura de investigação para saber o porquê do abandono das terras e averiguar as denúncias dos Guarani-Kaiowá de que se tratou de conluio das tropas federais e pistoleiros.

Dias depois, quando a ministra Sonia Guajajara visitou a região, limitou-se ao discurso de que “ambos os lados precisavam ser ouvidos”.

E no mês seguinte, a mesma Força Nacional tentou despejar indígenas Avá-Guarani no Oeste paranaense de uma terra reivindicada pelos povos originários. Os indígenas conseguiram resistir e expulsaram as tropas das terras. Mais uma vez, silêncio do governo.

O governo não precisa ordenar despejo, criar uma megaoperação ou aprovar um projeto de retirada de despejos para ter responsabilidade sobre o cenário de crimes contra os povos indígenas. Ao abrir espaço em seu governo para representantes do latifúndio, não condenar tropas que abandonam um terreno de guerra sem explicações, ordenar que tropas federais tentem despejar indígenas em luta pela terra e ao manter, nos salões oficiais, uma política de conciliação e mediação mesmo nos projetos mais absurdos, mais vis, mais cruéis, como o marco temporal, Luiz Inácio mostra que é um governo de sinal verde à atuação do latifúndio bolsonarista.

A líder Yakui Tupinambá foi pedagógica na descrição que fez do governo em um evento oficial na semana passada: “um governo, que sabemos o motivo senhor presidente, enfraquecido, acorrentado, que faz alianças e conchavos para se manter no poder”.

Em setembro do ano passado, a Liga dos Camponeses Pobres alertou: “A história não perdoa. Conciliar com a reação sempre levou a banhos de sangue das massas!”. E logo abaixou, convocou:

“Nós conclamamos e exortamos os camponeses a armarem as organizações de autodefesa da luta pela terra na mesma proporção e calibre!“

“Conclamamos as lideranças camponesas que não dobraram os joelhos, e são milhares por esse Brasil afora, as lideranças de posseiros, os povos indígenas, as organizações quilombolas, as populações atingidas por barragens, por mineração e por cultivos de eucalipto, as massas proletárias e demais trabalhadores da cidade, que cada vez mais lutam em defesa de seus direitos pisoteados, a cerrar fileiras com nosso bravo campesinato, com o caminho da Revolução Agrária“

ENTENDA O CASO

<><> Guarani Kaiowá é executado em ação da PM em retomada no Mato Grosso do Sul

Nesta quarta-feira (18), o indígena Neri Kaiowá foi assassinado a tiros por tropas da polícia militar em uma operação na Terra Indígena (TI) Nhanderu Marangatu. A polícia militar estava no local a pedido de Luana Ruiz (PL), uma das principais articuladoras do latifúndio no MS, assessora especial da Casa Civil do Governo Estadual do Mato Grosso do Sul. Luana é filha de Roseli Ruiz e Pio Queiroz Silva, proprietários da Fazenda Barra, onde ocorre a retomada dos Guarani-Kaiowá.

Segundo informações do Conselho Indigenista Missionário (CIMI), uma mulher também teria sido atingida na perna por disparos de arma de fogo e os barracos da retomada foram destruídos. A Força Nacional de Segurança, que foi enviada ao Mato Grosso do Sul por Luiz Inácio para supostamente defender os indígenas, não estava na área. Um correspondente local de AND informou que os policiais atuaram em conjunto com pistoleiros do latifúndio. Aty Guasu, Grande Assembleia Guarani-Kaiowá, denunciou que a PM não está deixando pessoas de fora da TI entrarem para noticiarem ou ajudarem os indígenas.

A violência contra os Guarani-Kaiowá começou na madrugada desta quarta e seguiu pela manhã. Os Guarani-Kaiowá acusam a PM de alterar a cena do crime. Segundo os indígenas, policiais arrastaram o corpo de Neri para um pedaço de mata. A ação dos policiais gerou revolta entre os indígenas, que passaram a avançar para o local em que o corpo foi levado na tentativa de recuperá-lo. Vídeos gravados pelos Guarani-Kaiowá, na noite de terça-feira (17), já anunciavam os preparativos para o ataque.

<><> Ataques contra povo Guarani-Kaiowá são frequentes

A última semana foi marcada por ataques de pistoleiros com auxílio da PM. Na quinta-feira (12), três indígenas foram baleados pela PM na TI Nhanderu Marangatu: Juliana Gomes segue hospitalizada em Ponta Porã depois de levar um tiro de arma letal no joelho; a irmã e um jovem levaram tiros de bala de borracha.

Um dia após este ataque contra a retomada, os indígenas terem recebido a Missão de Direitos Humanos, organizada pelo Coletivo de Solidariedade e Compromisso aos Povos Guarani, em 13 de setembro. A Missão percorreu o oeste do Paraná e o Mato Grosso do Sul, visitando a TI Nhanderu Marangatu, que já havia sofrido ataques um dia antes, a TI Panambi – Lagoa Rica, em Douradina.

No município de Antônio João (MS), a TI Nhanderu Marangatu tem cerca de 9,5 mil hectares. O latifúndio da família de Luana Ruiz (PL), ocupa 1.352,86 hectares, com situação no Cadastro Ambiental Rural (CAR) pendente por sobreposição de 98% em TI. A Fazenda Barra é a única área da TI Nhanderu Marangatu que ainda não está sob a posse dos Guarani-Kaiowá.

<><> Justiça à serviço de latifundiários

Luana Ruiz é a advogada da ação deferida pela Justiça Federal de Ponta Porã que determina a proteção do latifúndio de sua família. A determinação permite rondas ostensivas pela Polícia Militar do governador Eduardo Riedel (PSDB), além de presença 24 horas por dia como seguranças privados. A latifundiária já foi chefe de gabinete na Secretaria de Estado de Infraestrutura e Logística, mas foi exonerada a pedido no início do mês de julho deste ano. No último mês de agosto, a advogada latifundista foi nomeada para o cargo com símbolo CCA-04, na função de Assessor Especial III, na Secretaria de Estado da Casa Civil, com salário mensal de R$ 22 mil. Ativa contra a demarcação de terras indígenas, Luana Ruiz estava a frente da tentativa de implementar uma CPI contra o CIMI em 2019.

Nas eleições de 2022, Luana saiu candidata à Câmara Federal e terminou como primeira suplente do PL no Congresso Nacional. Durante o governo do capitão do mato Jair Bolsonaro (PL), a advogada foi Secretária Adjunta da Secretaria Especial de Assuntos Fundiários do Ministério da Agricultura, que tinha como ministra a senadora Tereza Cristina (PMDB/MS).

 

Fonte: A Nova Democracia

 

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