Campanha de Pablo Marçal paga R$ 230 mil a
produtor que ele diz ser seu sócio
O candidato à
prefeitura de São Paulo Pablo Marçal (PRTB) afirmou ser sócio de Nahuel Gomez
Medina em diversos vídeos postados neste ano – informação que também consta no site
de Medina que vende cursos de produção audiovisual. O problema: Marçal não
declarou oficialmente essa sociedade. A participação de Marçal na empresa de
Medina não consta nem no registro junto à Receita Federal nem na declaração de
patrimônio na Justiça Eleitoral.
Segundo a regra
eleitoral, ser sócio oculto em empresas pode configurar falsidade ideológica
eleitoral.
De acordo com apuração
da Agência Pública, a campanha de Marçal a prefeito pagou R$ 230 mil a Medina
para produzir vídeos. Extratos da Justiça Eleitoral mostram que os pagamentos
foram feitos neste mês para Medina Maker, nome fantasia da empresa. Medina é o
único sócio que consta no registro da produtora cinematográfica, localizada em
Confresa, cidade de 35 mil habitantes no nordeste do Mato Grosso.
Segundo o advogado
Fernando Tozi, o caso merece um olhar especial da Justiça Eleitoral. “Se ele
[Marçal] é sócio oculto da empresa [de Medina], temos uma séria dúvida se
estamos tratando de contratação do próprio candidato para a campanha. Sendo
sócio ou não, dependendo de como tudo isso for feito, principalmente de como
esta pessoa jurídica apoia ele, podemos estar diante de uma proibição expressa:
o financiamento de campanha por pessoa jurídica ou um abuso de poder
econômico”, explica.
Para o especialista em
direito público e privado Tauat Resende, a omissão de informações sobre a
propriedade ou sociedade em empresas, especialmente por candidatos, pode ser
interpretada como falsidade ideológica eleitoral, conforme o Código Eleitoral
(Lei 4.737/65, no artigo 350). “Esta legislação exige que todos os candidatos
declarem seus bens e participações empresariais para garantir transparência. Se
for comprovado que Marçal é sócio oculto em uma empresa e não declarar isso à
Justiça Eleitoral, ele poderá estar violando a legislação eleitoral, podendo
ser investigado pelo Ministério Público Eleitoral e enfrentar sanções, como
impugnação de candidatura ou do mandato, caso seja eleito”, afirma.
“Além de violar a
proibição de doações empresariais, essa prática pode ser vista como fraude ou
lavagem de dinheiro, resultando em sérias sanções eleitorais e penais se
comprovada a intenção de burlar as regras de financiamento”, acrescenta.
A reportagem procurou
a assessoria de Marçal e as empresas Medina Maker e Marshall Filmes, que não
responderam até a publicação.
<><> Por
que isso importa?
• A empresa de Medina é hoje o segundo
maior gasto da campanha de Marçal.
• Apesar de dizer em diversas ocasiões que
é sócio de Medina, Marçal não consta no registro da produtora. É obrigatório
que candidatos declarem participação em empresas.
<><> “Nós
viramos sócios, eu e esse cara”, diz Marçal
As relações entre
Marçal e Medina estão evidentes no site da Marshall Filmes, que desde março
vende um curso audiovisual para produtores de conteúdo. Logo na abertura da
página há uma foto do candidato ao lado do empresário. Quem dá os cursos é
Medina. São aulas que vão de operação de drones à criação de conteúdos com o
celular. Vídeos mostram que Marçal aparecia ao final dos cursos para avaliar os
materiais produzidos pelos alunos.
A página foi
registrada no nome de Medina com um e-mail ligado à Medina Maker. No link que
direciona para a “Marshall Films Experience”, uma experiência para passar o dia
com o Marçal vendida por R$ 28 mil, há o CNPJ da empresa Medina Maker.
O site apresenta
Medina como sócio de Marçal. “Hoje, Medina abandonou todos os seus
empreendimentos para se tornar sócio de Pablo Marçal na Marshall Filmes, com o
objetivo de atender clientes de alto nível, e criar um braço educacional,
capacitado para formar uma nova leva de cineastas pelo Brasil”, diz o texto.
A página vende o curso
por R$ 3.564 em 12 parcelas. A compra direciona para uma plataforma online de
pagamentos que foi fundada pelo próprio Marçal, a XGROW (Marçal teve
participação na XGROW até julho de 2022 através da sua empresa Marçal
Participações Ltda.). O curso da Marshall, atualmente com as vendas encerradas,
deixa a seguinte mensagem: “para dúvidas com sua compra fale com
comercial@medinamaker.com.br”.
Em outro vídeo,
postado no TikTok da Medina Maker em maio deste ano, Marçal afirma: “Nós
viramos sócios, eu e esse cara [Medina]. Nós criamos uma empresa de filmes
chamada Marshall Filmes. Ele que deu o nome, não fui eu que pediu isso. Ou
seja, ele é um artista”, diz.
O relacionamento entre
os dois fica ainda mais claro em um vídeo filmado dentro de um jatinho, postado
também em maio, no qual eles fazem propaganda da empresa e, novamente, declaram
ser sócios. Nesse vídeo, eles discutem a necessidade de contratar mais videomakers.
A produtora de Medina
também postou vídeos de Marçal em um jet ski em meio às enchentes que
devastaram o Rio Grande do Sul neste ano. O político foi ao estado, segundo
ele, várias vezes, para auxiliar as vítimas do desastre. No mesmo mês, a
Advocacia-Geral da União (AGU) ingressou com ação judicial com pedido de
direito de resposta em face de Marçal. A ação foi motivada por vídeos na qual o
político afirmava que as Forças Armadas brasileiras estariam inertes diante da
calamidade.
Há um vídeo de Marçal
no TikToK, de março, no qual ele já fazia propaganda da Marshall Filmes. O
vídeo não está mais disponível devido às restrições da Justiça Eleitoral. Em
agosto, a Justiça suspendeu perfis de Marçal em redes sociais por abuso de
poder econômico. A decisão entendeu que haveria pagamentos para editar e
publicar cortes de vídeos do candidato. A Pública mostrou em agosto como cortes
de vídeos de Marçal que violavam a lei eleitoral já haviam sido vistos mais de
825 milhões de vezes no YouTube e TikTok.
Em janeiro deste ano,
o canal de YouTube da Medina Maker, com 2,2 mil pessoas inscritas, publicou um
vídeo de Marçal. O “Chamado dos Generais” é uma gravação de uma palestra de
Marçal no ginásio da Portuguesa, em São Paulo. O clipe é uma propaganda da assinatura
“vitalícia” de conteúdos do guru. O candidato a prefeito tem um livro com esse
nome.
• Banditismo e Política. Por Alberto
Cantalice
O absurdo da presença
de Pablo Marçal na disputa pela prefeitura de São Paulo amplia o escárnio que
envolve o processo eleitoral de 2022 Brasil afora.
O recente episódio da
cadeirada do apresentador e candidato José Luiz Datena em Marçal, no último
debate da TV Cultura, revela o quão baixo pode chegar uma disputa eleitoral.
Exímio mentiroso,
divulgador e criador de inúmeras notícias falsas, as chamadas fakes News, o
“ex-coach”, ao arremedo de seu inspirador, o capitão Bolsonaro, foi correndo ao
hospital atrás de uma imagem, uma gravação da imagem da vítima. Essa encenação escandalizada na maior cidade
do país reflete, miseravelmente, nas outras capitais e no interior do
Brasil.
A quantidade de
pândegos da extrema direita desfilando pelas telas e ruas, cada um com um
figurino mais deletério, é de fazer corar frade de pedra. Uma vergonha.
Fosse só isso, já
serviria para a cidadania brasileira buscar se afastar dos elementos nocivos à
democracia, cuja participação sem observância das regras, serve para a sua
desmoralização. Entretanto, percebe-se, em áreas periféricas, o crescimento de
candidaturas vinculadas ao crime organizado: tráfico e milícias se espalhando a
olhos vistos.
Há comunidades
controladas pelo crime em que postulantes à vereança vêm sofrendo
constrangimento ao atuar com suas campanhas eleitorais; por outro lado, há
apoio do crime a alguns candidatos, garantido exclusividade de atuação em
determinadas áreas, inibindo outros políticos e moradores. Já não é a velha e
criminosa compra de votos, que se aproveita das carências de alguns. É
imposição. Nas redes sociais, circulam dezenas de imagens de criminosos
arrancando placas e adesivos nas casas. Intimidando e expulsando cabos
eleitorais e militantes.
Essa escalada de
violência política afeta e constrange os variados partidos e candidaturas. Seu
enfrentamento tem que se dar pela institucionalidade, se preciso com o uso da
força pelos agentes do Estado. Esse fenômeno é relatado em todos os estados da
federação.
Ou o Brasil enfrenta o
crime organizado com a integração entre todos os entes federados: União,
estados e municípios. Poder judiciário e Ministério Públicos, e a população e
os políticos colaborando com informações. Ou o que nos espera é a lógica
criminosa corroendo o tecido social brasileiro até deixá-lo em frangalhos.
• No circo de José Datena e Pablo Marçal,
os palhaços somos nós. Por Mário Sabino
No circo de José Luís
Datena e Pablo Marçal, os palhaços somos nós, os pagadores de impostos que
sustentamos um sistema político que vem selecionando os piores desde a
redemocratização. A saber, os mais ignorantes, os mais incapazes, os mais
desonestos.
O resultado é este que
se vê: um circo de horrores do qual José Luís Datena e Pablo Marçal são
ilustração: serzinhos estridentes que divertem quem não enxerga o tamanho da
tragédia.
Assim como a fauna
restante de candidatos nas diferentes cidades, eles são produto do conjunto de
organizações que se autodeclaram partidos, embora o seu único programa seja
avançar sobre o dinheiro público, explicitando pornograficamente o
patrimonialismo de que são herdeiros.
Supostamente nascido
para contrapor-se a tal estado de coisas, o discurso antissistema integra-se ao
sistema e o degenera ainda mais com os seus outsiders de araque.
O apresentador de
programas policiais José Luís Datena é uma apelação oportunista do PSDB, o
partido que nasceu para espelhar a social-democracia europeia e que acabou em
cena de telecatch. Pablo Marçal, sujeito sem profissão definida, mas muito
rentável na sua indefinição, é um avatar de Jair Bolsonaro. Almeja ter vida
própria e continuar reproduzindo a miséria intelectual da direita brasileira.
Ambos são coadjuvantes
pequenos neste espetáculo de depravação institucional a que assistimos,
censurados por ordem judicial, enquanto o país arde literalmente, queimado
também nas suas finanças por um parlamento que seria virtuoso se fosse apenas
concupiscente e pelo governo dessa esquerda interminável no seu anacronismo, na
sua incompetência e na sua má-fé.
A cadeirada que José
Luís Datena desferiu em Pablo Marçal foi um número histriônico, mais um, do
circo brasileiro no qual o palhaço sou eu, é você, somos todos nós, apesar das
aparências em contrário.
• Plano de Pablo Marçal é a presidência da
República, alerta cientista
O propósito do
candidato à Prefeitura de São Paulo, Pablo Marçal, é claro, mas precisa ser
reforçado como um alerta para o futuro democrático: consolidar-se como uma
figura de renovação no cenário político brasileiro, com a meta de alcançar o
cargo mais alto na hierarquia política — a presidência da República.
Para isso, Marçal se
autodeclara um candidato “genuinamente evangélico” adotando uma postura
religiosa recheada de símbolos bíblicos, e que não precisa do apoio
institucional de líderes maiores, posicionamento que o coloca em contraste com
o “velho”, representado por figuras como o pastor Silas Malafaia e o
ex-presidente Jair Bolsonaro.
A análise é do
cientista político Pedro Costa Júnior, em entrevista à jornalista Lourdes
Nassif, no programa TVGGN 20H.
O diferencial
religioso pode atrair eleitores evangélicos que Bolsonaro não conseguiu
conquistar completamente. Embora Bolsonaro tenha participado de um batismo
simbólico no Rio Jordão, em Israel — local onde, segundo a Bíblia, Jesus foi
batizado — ele nunca se declarou explicitamente evangélico, preferindo
identificar-se como um seguidor de valores cristãos.
Pedro Costa Júnior
argumenta que Marçal é um novo fenômeno político, com um discurso alinhado à
direita global, cuja fonte de inspiração parece estar em modelos autoritários
como o de Nayib Bukele, presidente de El Salvador, conhecido por suas políticas
que desafiam os direitos humanos e enfraquecem as liberdades civis.
“Ele [Bukele] é um
açougueiro dos direitos humanos, e Pablo Marçal mira em Bukele. Esse é o
projeto dele em escala nacional. O que está acontecendo agora na prefeitura é
apenas um laboratório para ele ganhar visibilidade no cenário nacional”,
destaca Costa Júnior.
A estratégia de Marçal
de fomentar caos e polarização é central em seu modus operandi, explica o
cientista político, tática comum entre líderes da extrema-direita global. Assim
como Trump e outros líderes autoritários, Marçal constrói uma narrativa de enfrentamento
ao “sistema”, a fim de posicionarem-se como a solução para os problemas que,
muitas vezes, são exacerbados ou criados por suas próprias retóricas.
“Eles não são contra a
política, isso é algo do passado; eles são contra o sistema. O que todos eles
dizem, o que Trump afirmou em 2016 e 2020, é que, se perderem a eleição, é
porque houve fraude. O antissistema não aceita o resultado das urnas. O objetivo
deles é destruir e descredibilizar as instituições”, explica Costa Júnior.
Fonte: Por Diego Feijó
de Abreu e Giovana Girardi, da Agência Pública/Brasil 247/Metrópoles/Jornal GGN
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