sexta-feira, 26 de maio de 2023

Ricardo Nêgo Tom: Carta aberta de um macaco pedindo a cassação do senador Magno Malta

Desprezado, senador Magno Malta

Venho através desta missiva manifestar o meu silvestre constrangimento e o meu símio repúdio às falas proferidas por vossa excelência – nem sei se deveria estar usando esse pronome de tratamento com alguém que falou o que o senhor disse - em decorrência dos acontecimentos envolvendo o jogador Vinícius Júnior, que vem sendo sistematicamente linchado e submetido às mais cruéis e covardes manifestações racistas, desde que foi jogar na Espanha. Poderia estar me sentindo feliz pela sua citação à minha espécie, se referindo a nós como inteligentes e como seres de um grau de evolução próxima ao homem. Porém, eu acabo me sentindo ofendido por ser considerado alguém com o raciocínio próximo a homens como o senhor. Adendo ainda, que a diferença entre mim e a sua pessoa, não está apenas no rabo. O meu cérebro é capaz de produzir pensamentos e ações mais inteligentes do que as suas. Portanto, peço que não me compare mais a gente como o senhor, que é capaz de naturalizar e relativizar a dor e o sofrimento de um ser da sua mesma espécie. Aqui no planeta dos macacos nós jamais faríamos isso. Se mexeu com um, mexeu com todos. E movemos savanas e pântanos para fazer justiça a um dos nossos.

Encheu-me de vergonha, ouvi-lo pedir para que os jogadores negros entrassem em campo com uma leitoa branca no colo, para provar que não têm nada contra os brancos e que até os comem. A minha inteligência, tão elogiada pelo senhor, só me permite fazer uma leitura a respeito dessa fala. És um completo imbecil! Além de naturalizar a desumanização da espécie de vocês, o senhor ainda sexualiza a leitoa numa piada de duplo sentido sem a menor graça, que o senhor deve ter aprendido com o humorista Léo Lins. Que também não é muito bem-visto por aqui.  Aqui no nosso planeta, o senhor teria sido retirado à unha do plenário e conduzido imediatamente à jaula, por não ter condições de conviver com os demais membros do nosso grupo. Nunca que o senado do planeta dos macacos teria um representante como o senhor. Seria a vergonha da espécie. E ainda dizem que nós somos primatas. O senhor também comparou o racismo com uma picada de cobra, dizendo que a cura está no próprio veneno. Macacos me mordam, mas será que o senhor quis dizer que racismo se combate com racismo? Como um negro pode cometer racismo contra um branco, senador? Ou o senhor também acredita em racismo reverso?  

Quando os macacos-prego são atacados pelos seus predadores, e a cobra que o senhor citou é um deles, eles se juntam a outras espécies de macacos, inclusive, de cores diferentes, que, juntas e trabalhando em cooperação, agem para afugentá-los e evitar o ataque. E não pensamos em comê-los não. Estava conversando com a minha companheira macaquinha aqui, e tentando entender como a espécie humana é capaz de naturalizar ataques feitos aos seus iguais. Que raça estranha a de vocês, hein? O senhor também falou que racismo é inveja, e que os racistas atacam os pretos famosos porque não podem ser eles. Você é burro, cara? Racistas são como predadores, eles só querem se alimentar com a carne e com o sangue de seus alvos. Ou você acha que a cobra queria saber trepar num galho como um macaco ou que a lagartixa gostaria de voar como uma mosca? Eles apenas se sentem maiores, superiores, os donos da selva toda, e tentam impor essa suposta supremacia agindo de forma covarde e violenta para destruir a existência daqueles que julgam inferiores. Olha! Eu que não queria habitar em um planeta onde alguém com um raciocínio tão tosco consegue ser eleito senador. Imagino como deve raciocinar aqueles que o elegeram.

Não vou me estender mais, porque esse assunto me deixa com as barbas de molho. Espero que a parte da sociedade do seu planeta que não pensa como o senhor, se mobilize para cassar o seu mandato. Porque é inadmissível que o senhor continue ocupando um galho, digo, uma cadeira, no senado federal do seu país. Aqui no meu planeta o senhor não serviria nem para fiscal de pântano. Sugiro também que os jogadores de futebol pretos entrem em campo com o senhor no colo, para provar que não têm preconceitos contra os asnos, mas que entendem que o senado não é o habitat natural desses animais. E, para terminar, dispenso a sua preocupação com a minha espécie. Não estamos expostos não, viu? Estamos bem e muito melhor do que aqueles que são obrigados a conviver com o senhor. Cada macaco no seu galho e cada burro no seu estábulo. A sociedade protetora dos animais tem atuado até melhor do que a sociedade protetora dos humanos. Pelo menos, quando eu vejo o caso de um animal que estava sendo maltratado, a solidariedade às vezes é maior do que quando os maus tratos são contra um ser humano. Enfim, aguardo ansiosamente a sua cassação e o seu banimento da vida pública após essas declarações. E nunca mais diga que eu sou parecido com o senhor. Por favor!

Sem mais!

 

Ø  Visitando Magno Malta na Wikipédia. Por Paulo Henrique Arantes

 

Magno Malta é um símbolo. Encarna o oportunismo político de alguns pastores evangélicos que, com a Bíblia nas mãos, apregoam seu medievalismo. Tempero do Mundo era o nome da banda gospel que integrou, cujo repertório este colunista nunca ouviu, por graça divina. Temperar o mundo com obscurantismo é a missão dele e de assemelhados.

A fala de Malta sobre o caso Vini Jr. foi repulsiva, como tem sido repulsiva toda sua atuação parlamentar. Em 2016, comparou o impeachment da presidenta Dilma Rousseff a um “enterro de indigente”. 

A Wikipédia lembra hoje que o perfil de Magno Malta na enciclopédia livre, em 2016, “foi adulterado por um computador localizado dentro do Senado Federal, e todos os seus escândalos contidos no verbete foram apagados”. 

A capivara de Malta havia sumido da Wikipédia, mas, ao que parece, foi restaurada. Reproduzo aqui alguns trechos biográficos do senador, segundo a enciclopédia livre, à guisa de aculturamento:

# Acusações de denúncia falsa e tortura:

Em setembro de 2018, o ex-cobrador de ônibus Luiz Alves de Lima acusou o político de tê-lo torturado a ponto de quase ter sido morto, após acusá-lo de ter estuprado da própria filha. Magno Malta convocou a imprensa acusando o cobrador de estuprador, sendo apresentado pela mídia como o herói que denunciou o caso. Face às provas que indicavam não ter havido violência contra a menor, Luíz Alves de Lima foi absolvido em 2016. Praticamente cego, devido às torturas a que foi submetido, e sem condições de voltar a trabalhar, restou-lhe buscar indenização ao Estado, ficando com um pensão de R$ 2 mil mensais.

# Ministério dos Transportes:

O chamado "escândalo do Ministério dos Transportes" revelou acertos entre empreiteiras com o PR, partido de Magno Malta, que receberia propinas em troca de obras superfaturadas. O escândalo derrubou o ministro Alfredo Nascimento (PR-AM) e Geraldo Lourenço, diretor de Infraestrutura Ferroviária e diretor interino de Administração e Finanças do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), indicado por Magno Malta. Outra indicação do senador no Ministério foi seu próprio irmão, Maurício Pereira Malta, para o cargo de chefia da assessoria parlamentar do Dnit, que cuida dos interesses dos parlamentares ligados às obras do Orçamento.

# "Sanguessugas":

Em 2007, seu nome foi envolvido entre os políticos que desviaram recursos públicos destinados à compra de ambulâncias no Ministério da Saúde. A família Ventoin, dona da empresa Planam, afirmou ter dado um Fiat Ducato para Malta como parte do pagamento de propina pela apresentação e liberação de uma emenda parlamentar para aquisição de ambulâncias. Chegou a ser indiciado pela CPI dos Sanguessugas, mas acabou absolvido na Comissão de Ética do Senado, que seguiu o parecer do relator Demóstenes Torres, que orientava arquivamento por falta de provas, em 28 de novembro daquele ano, juntamente com os dois outros senadores acusados: Ney Suassuna e Serys Slhessarenko.

# Atos secretos:

O nome de Magno Malta também aparece entre os beneficiados dos atos secretos que vieram a público após uma série de denúncias sobre a não publicação de atos administrativos, tais como de nepotismo e medidas impopulares, por exemplo, a extensão da assistência odontológica e psicológica vitalícia a cônjuges de ex-parlamentares, como noticiado na mídia em junho de 2009. O então professor da Faculdade de Direito da UERJ, Gustavo Binenbojm afirmou "A não publicação é o caminho mais usado para a prática de improbidade administrativa. Evita o conhecimento da sociedade e dos órgãos de controle. Provavelmente foi este o objetivo". Investigações internas do Senado, motivadas pelas denúncias, apontaram irregularidades em todos os contratos de prestação de mão de obra.

# Recebimento de valores não declarados:

Em agosto de 2016, a Folha de S. Paulo publica trechos de e-mails enviados em 8 de setembro de 2014, indicando um suposto repasse de 100 mil reais não declarados a Magno Malta. Nota fiscal referente a uma consultoria prestada à fabricante de móveis Itatiaia com valor superior ao que seria recebido (nota fria) seria utilizada para a operação. O senador negou, por nota à imprensa, o recebimento de dinheiro da Itatiaia e ressaltou não ter cometido crime algum, relacionando as acusações à exposição de sua imagem durante o impeachment de Dilma Rousseff.

 

Ø  Racismo coletivo e elogio ao nazismo. Por Rui Martins

 

Milhares de torcedores num estádio cheio repetindo a altos brados, durante 70 minutos, xingamentos contra um jogador de futebol, por ser negro, equivalem a um linchamento. Inacreditável não ter havido uma suspensão definitiva do jogo com sua anulação ou a decisão de transferir a partida para outra data sem público. As declarações ou constrições posteriores pronunciadas e divulgadas pelo governo espanhol, diante da vergonhosa imagem exposta do país por esse escândalo mundial de racismo coletivo num estádio de futebol, chegam um tanto tarde.

O que esperavam a liga espanhola de futebol, as instâncias esportivas do pais, o ministro de esportes, o governo espanhol no seu todo para intervir, já que não foi essa a primeira vez? A FIFA e a UEFA só interferem no caso de haver vítimas fatais, ou desconhecem ser o racismo um crime punido pela maioria dos países e, quem sabe, mesmo pela totalidade dos países europeus, sem se esquecer da ONU e dos órgãos internacionais de defesa dos direitos humanos?

E os patrocinadores dos clubes espanhóis toleram esse clima de arena, consideram normal a excitação lúdica racista para a promoção de seus produtos comerciáveis?

Haveria essa reação mundial sem a denúncia da imprensa? Talvez não, essa não foi a primeira vez que Vinícius Júnior foi alvo de racistas. Mas os dirigentes do futebol espanhol preferiam fechar os olhos… Uma mostra: o árbitro Ricardo de Burgos Bengoecheado, 37 anos, no encontro Real Madrid com Valência, registrou apenas um caso de torcedor chamando Vinícius de macaco, tendo interrompido o jogo por oito minutos por incidente racista. Na sequência, Vini Jr. acabou sendo expulso e sujeito a não participar nos próximos jogos do Real Madrid. Seria o caso da vítima ser punida?

Gianni Infantino, presidente da FIFA, diante das repercussões da crise criada, afirmou já existir um procedimento específico para se aplicar no caso de racismo durante o jogo. Deve ser suspensa a partida, os jogadores se retiram e se faz um anúncio no estádio informando que, se prosseguirem os insultos racistas, o jogo será suspenso e a vitória com seus três pontos será atribuída ao clube do jogador ou jogadores alvos de racismo. Infantino não disse por que esse procedimento ainda não é obrigatório, mas afirmou que deveria ser adotado por todos os países. E por que ainda não foi?

Por sua vez, embora também tardiamente, Luis Rubiales, presidente da Federação Real Espanhola de Futebol, reconheceu haver um problema de comportamento, de educação e de racismo no país, confessando-se consternado por atos que devem ser erradicados. O comitê de competição da Federação, dirigido por Rubiales, tem poderes para fechar tribunas, estádios e convocar uma Comissão governamental contra a violência, xenofobia e racismo nos esportes. Não se entende por que essa comissão ainda não foi convocada.

Não se pode esquecer estar uma parte do racismo espanhol ligada diretamente à extrema-direita fascista, vinda do antigo movimento fascista Fuerza Nueva, dentro da qual se destaca o partido Vox, ultraconservador ultranacionalista, militarista, racista, clerical, pró-imperialista, antifeminista e neoliberal. Partido que conta com o apoio do presidente de La Liga, Javier Tebas Medrano.

Essa crise do racismo espanhol no futebol lembra o velho franquismo e sua longa existência na Europa, mais longa que o salazarismo, como uma perniciosa doença cujas raízes permanecem vivas e, vez ou outra, afloram.

Esse cheiro do enxofre nazista não ficou restrito, na semana, ao episódio vergonhoso do racismo na Espanha. A pretexto de fazer um elogio familiar citando a atual guerra da Ucrânia contra a Rússia, o deputado federal Paulo Bilynskyj, do PL bolsonarista, citou o avô Bohdan Bilynskyj. Seu avô teria sido um herói por ter lutado aos 20 anos contra os comunistas soviéticos numa guerra mundial.

Ora, o deputado que era delegado, portanto deve ter feito curso universitário em Direito, deve saber que, na época do seu avô, havia uma guerra mundial dos aliados EUA, Inglaterra e União Soviética contra a Alemanha nazista. E que lutar contra os comunistas soviéticos equivalia a lutar com os nazistas de Adolf Hitler.]

E que a 14.ª Divisão de Granadeiros da Waffen-SS Galizien, à qual pertencia seu venerado avô, era uma divisão nazista de ucranianos comandada por oficiais alemães. E que ao fazer o elogio póstumo do avô, emigrado ao Brasil em 1948, três anos depois do fim da Segunda Guerra Mundial, fez também o elogio da Waffen-SS e não dos ucranianos que hoje lutam contra a Rússia. Qualquer dúvida, perguntem ao Zelenski.

 

Fonte: Brasil 247/Observatório da Imprensa

 

Nenhum comentário: