Mario Vitor Santos:
Contra a mídia golpista e suas fake-news é essencial disputar todos os espaços,
sem ilusões
A
disputa entre a grande mídia corporativa brasileira e as plataformas digitais
internacionais está exposta espetacularmente, como nunca antes, na tramitação
do projeto de lei 2730/20, chamado de "projeto das fake news", que
afinal parece ir para o cemitério.
Retiradas
as acusações de fachada entre os personagens, trata-se de mais uma batalha da
campanha pelo domínio do mercado de comunicação no Brasil. Materialmente, é
disso que se trata, muito além das estocadas de parte a parte.
Globo
e agregados, em crise terminal de seu modelo de negócios, tentam manter
para si algum oxigênio que lhe prolongue o alento vital. Seu estrebuchar é
muito perigoso, apesar da decadência.
Na
disputa encarniçada nenhum dos dois pode assumir suas verdadeiras intenções.
Desviam o foco do assunto real, o da disputa pela dominância de mercado.
De
algum modo, que não ficou claro no relatório do deputado Orlando Silva, o
projeto de lei das Fake News, oriundo do Senado em 2020, incorporou na Câmara,
em 2021, o artigo hoje identificado como 32.
É
um artigo estranho à natureza da proposição, mas atingiu importância política e
econômica maior do que qualquer outro para o governo e a mídia corporativa
brasileira. Trata da remuneração pelas plataformas aos produtores de conteúdo
jornalístico, uma boia de salvação para a Globo e os outros veículos.
É
este o artigo que o relator na Câmara achou por bem enxertar no projeto
original vindo do Senado.
É
uma luta ciclópica, travada em inúmeras frentes e com o recurso às armas, os
olhos e os sons da dissimulação.
A
Globo e seus satélites acusam as plataformas de tudo que há de pior: de
estimular massacres a escolas, suicídio de adolescentes, inimizade nas
famílias, golpes e invasão aos palácios dos três poderes, por exemplo.
As
redes, com apoio da extrema-direita, acusam o projeto de querer impor a censura
ao regular o conteúdo das redes.
Mais
do isso, no projeto original, não havia também nada de imunidade parlamentar
estendida às redes, não havia discussão de conteúdo (deixada ao Código Civil),
não havia tipificação de crimes (para a qual existe o Código Penal).
O
artigo 32 estendia uma ponte do governo Lula com a mídia corporativa em sua
disputa com as plataformas.
Já
uma parte da mídia progressista não via sentido nesse aliança que, por sinal,
parece estender a lua de mel tacita, enganosa e inconfiável existente entre a
esquerda e o centro desde o governo Bolsonaro.
Ironicamente,
a esquerda, Lula e o PT beneficiaram-se, ao menos pontualmente, do novo
ambiente político criado pelo uso que fizeram da nova realidade criada pelas
plataformas. Os portais progressistas e de esquerda puderam estabelecer um
contraponto, tornando-se cada vez mais influentes em dinâmica interação com o
público. Tal movimento não pôde em seguida ser ignorado pela própria
mídia corporativa. É bem verdade que a extrema-direita direita e o bolsonarismo
também se beneficiaram da nova situação.
É
possível especular que a história recente do Brasil seria diferente sem os
meios alternativos de esquerda, sua influência política sobre o jornalismo e
deste sobre a opinião de parcela muito importante dos brasileiros.
Lula
é o primeiro a valorizar e agradecer pelo apoio e a disputa de narrativas
estabelecida com os meios conservadores, inédita em extensão e influência sobre
o desfecho histórico.
O
projeto 2630 colocou em questão também essa outra disputa "de
classes" por espaço e recursos entre a mídia corporativa, que apoiou
tantos ataques ao processo democrático (a Lava-Jato, o impeachment de Dilma e a
prisão de Lula).
Essa
disputa só foi possível pela existência da realidade das plataformas. Há que se
opor à imprensa golpista, à mídia das fake news da Lava-Jato em todos os
momentos. A história passada e recente não autoriza nenhuma ilusão. É possível
uma lei que civilize as plataformas sem alimentar de novo os inimigos de
sempre.
O
cíclope vem aí de novo.
Ø
PL
das Fake News: Moraes compara reação de big techs a milícia digital
O
ministro do Supremo Tribunal
Federal (STF) Alexandre
de Moraes comparou a atuação das big techs no caso do Projeto de Lei das
Fake News com
as condutas de milícia digitais – investigadas em outro inquérito que apura a
atuação de organizadores e financiadores de uma série de protestos que buscavam
o fechamento do Supremo e do Congresso.
A
comparação foi feita na decisão que mandou a Polícia Federal colher depoimentos
dos presidentes ou equivalentes das empresas Google, Meta, Spotify e Brasil
Paralelo para que esclareçam informações
veiculadas no blog oficial da Google sobre o PL das Fake News.
No
documento, Moraes afirma que as big techs fazem uso de “mecanismos imorais e
ilegais que podem, em tese, constituir abuso de poder econômico, bem como,
eventualmente, caracterizar ilícita contribuição com a desinformação praticada
pelas milícias digitais nas redes sociais”.
“Tais condutas podem configurar, em tese, não
só abuso de poder econômico às vésperas da votação do projeto de lei por tentar
impactar de maneira ILEGAL e IMORAL a opinião pública e o voto dos
parlamentares, mas também flagrante induzimento e instigação à manutenção de
diversas condutas criminosas praticadas pelas milícias digitais investigadas no
INQ 4.874 [contra milícias digitais], com agravamento dos riscos à segurança do
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL e do próprio Estado Democrático de Direito, cuja
proteção é a causa da instauração do INQ. 4.781 [contra fake news].”
·
Nova
decisão
Além
dos depoimentos, Moraes determinou a remoção integral, em no máximo uma hora,
de todos os anúncios, textos e informações veiculados, propagados e
impulsionados com ataques ao PL nº 2.630. “Inclusive aqueles que se referem ao
texto como ‘PL da censura’”, diz a decisão.
A
multa por descumprimento da determinação é de R$ 150 mil por hora. As empresas
também deverão remeter relatório circunstanciado sobre os anúncios realizados e
valores investidos em 48 horas, além de explicar os métodos e algoritimos de
impulsionamento e induzimento à busca sobre “PL da Censura”.
Campanha
da Google
A
determinação ocorre após uma campanha da gigante da
tecnologia contra o Projeto de Lei 2.630, o PL das Fake News. A home do Google
foi usada para fazer campanha contra o projeto de lei, com um link intitulado
“O PL das Fake News pode aumentar
a confusão sobre o que é verdade ou mentira no Brasil”.
Além
disso, a Folha de S.Paulo e o laboratório NetLab, da UFRJ, revelaram que o
Google estaria privilegiando links contrários ao PL das Fake News.
Em
documento anexado no inquérito sobre propagação de desinformação nas redes
sociais, Moraes determinou que os presidentes se pronunciam. O Ministério Público
Federal (MPF) também cobrou
informações detalhadas sobre essa campanha do Google. Entre os pedidos, está a
quantidade de usuários impactados com publicidade no Facebook e Instagram.
·
Entenda o projeto
O
PL das Fake News cria a Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e
Transparência na Internet. Em linhas gerais, o texto torna obrigatória a
moderação de conteúdo na internet, para que postagens criminosas sejam
identificadas e excluídas.
O
projeto deve afetar conteúdos publicados em plataformas como Facebook,
Instagram, WhatsApp, Twitter, Google e TikTok. A ideia é que as empresas sejam
obrigadas a seguir normas para evitar o compartilhamento de discursos de ódio e
informações falsas e atuem na proteção de crianças, adolescentes e todos os
usuários que utilizam as plataformas.
Além
disso, o projeto busca exigir que as mídias digitais divulguem relatórios de
transparência e sejam responsabilizadas por danos oriundos de publicações
impulsionadas por robôs.
Ø
PL
das Fake News: Lira e governo Lula recuam da briga contra big techs
Ao
bancar a votação em regime de urgência do PL das Fake News, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o
presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL),
desafiaram algumas das mais poderosas empresas do mundo, como Google, Meta e
TikTok. O texto, que estava previsto para votação na noite de terça-feira
(2/5), foi adiado após pedido do relator, Orlando Silva (PCdoB-SP), que tinha
apresentado o texto final, porém pediu mais tempo. O recuo pode ser visto como
um revés para o governo e o próprio Lira, que não conseguiram aprovar a matéria.
Entre
vários pontos contra desinformação, o projeto prevê, por exemplo, a
regulamentação das plataformas digitais por meio de ações, como a criação de
uma agência reguladora e punições quando houver o descumprimento de uma ordem
judicial.
Em
resposta, as gigantes da internet se mobilizaram desde que Lira começou a se
movimentar para aprovar o PL nº 2630. No entanto, a ofensiva ganhou força mesmo
no fim da tarde de segunda-feira (1º/5), quando o Google
passou a exibir, em sua página inicial, um link contrário à matéria.
Com
o título “O PL das Fake News pode aumentar a confusão sobre o que é verdade ou
mentira no Brasil”, o link direcionava quem clicasse para um artigo assinado
por Marcelo Lacerda, diretor de Relações Governamentais e Políticas Públicas da
empresa no Brasil.
A
iniciativa do Google contra o PL causou reações rápidas tanto do governo Lula
quanto de órgãos investigativos e do Poder Judiciário. O Ministério Público
Federal (MPF) cobrou
esclarecimentos do Google ainda na noite do feriado.
Já
na terça (2/5), o ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, convocou a imprensa
para protestar contra as supostas práticas abusivas das plataformas digitais.
“Estamos
diante de uma situação de agressividade, de prepotência, que reforça a
importância da regulação. O que estamos vendo de publicidade enganosa, cifrada,
abusiva, mostra o tanto que a regulação é necessária e urgente”, afirmou Dino.
Empresas
como o Google e o Twitter estariam, segundo o governo, impulsionando conteúdos
nas redes sociais contrários ao PL e diminuindo o alcance de posições
favoráveis à proposta.
Também
na terça, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) instaurou um
procedimento preliminar de inquérito contra Google e Meta, dona do Facebook,
Instagram e WhatsApp, por suposto “abuso de posição dominante”.
Na
noite de terça, durante a sessão plenária, quando o PL poderia ter ido à
apreciação dos deputados, o próprio Arthur Lira reclamou da ofensiva das
gigantes tecnológicas e cobrou respeito ao parlamento, inclusive se referindo
aos próprios colegas.
“Demos
oito dias para que as big techs fizessem o horror que fizeram com a Câmara
Federal. Não vi aqui ninguém defender a Câmara Federal. Como você tem num site
de pesquisa tratamento desonroso com esta Casa?”, questionou.
·
Pedido
Havia
expectativa de que o texto fosse votado na terça-feira (2/5), mas, após as
reuniões, o relator Orlando Silva decidiu recuar e pedir a retirada do projeto
de pauta. A solicitação foi acatada pelo presidente da Casa, Arthur Lira
(PP-AL), após consulta aos líderes partidários.
Silva,
que tinha apresentado seu relatório a Lira na semana passada, informando que
era o texto final, teve de recuar. Após os desdobramentos dos últimos dias e
prevendo dificuldades em plenário (ainda que petistas achassem que tinha chance
de ser aprovado), ele pediu mais tempo para aprimorar a redação.
O
PL das Fake News, projeto protocolado no Senado por Alessandro Vieira
(PSDB-SE), ganhou força no Congresso com a eleição do presidente Luiz Inácio
Lula da Silva (PT) e as recentes discussões sobre a relação das redes sociais e
plataformas não somente com disseminação de desinformação, mas também fomento a
atentados ao estado democrático de direito e a ataques a escolas.
Reação
pesada de Moraes
A
resposta mais dura contra a ofensiva das big techs veio do Supremo Tribunal
Federal (STF), em decisão do ministro Alexandre de Moraes, quando os
parlamentares ainda debatiam na residência oficial do presidente da Câmara se
votariam ou não o PL das Fake News.
Moraes
comparou a atuação das empresas com as condutas de milícias digitais que a
Corte investiga desde o governo de Jair Bolsonaro (PL) e determinou que a
Polícia Federal colha, no prazo de cinco dias, os depoimentos dos
presidentes ou equivalentes das empresas Google, Meta, Spotify e Brasil
Paralelo, para que esclareçam informações veiculadas no blog oficial da Google
sobre o PL das Fake News.
Além
disso, o magistrado determinou a remoção integral, em no máximo uma hora, de
todos os anúncios, textos e informações veiculados, propagados e impulsionados
com ataques ao PL nº 2630. “Inclusive aqueles que se referem ao texto como ‘PL
da censura’”, diz a decisão.
Segundo
Moraes, as condutas podem configurar “abuso de poder econômico”, às vésperas da
votação do projeto de lei, por “tentar impactar, de maneira ilegal e imoral, a
opinião pública e o voto dos parlamentares, mas também flagrante induzimento e
instigação à manutenção de diversas condutas criminosas praticadas pelas
milícias digitais”.
A
manifestação dura do ministro do STF foi encarada na Câmara como uma pressão
para que o Legislativo resolvesse a questão – ou os parlamentares teriam de ver
o Judiciário mais uma vez tomando o protagonismo para si.
·
Regularização das big techs
O
governo federal pretende regular as grandes empresas de tecnologia no Brasil
por meio de algumas ações, como a criação de uma agência reguladora para as
plataformas e punições severas quando houver o descumprimento de uma ordem
judicial.
Entre
os principais pontos do texto, há a previsão de que empresas passem a produzir
relatórios sobre os critérios de recomendação de conteúdo, detalhando seus
algoritmos e os parâmetros usados para recomendarem os conteúdos, assim como
trazer informações sobre as denúncias, notificações e remoções de conteúdo.
Outra
medida revela a possibilidade de as plataformas se tornarem alvo de punição
civil por danos causados por conteúdos postados por usuários. Atualmente, as
plataformas não têm responsabilidade sobre a publicação de um usuário. Entre as
medidas previstas no texto do PL, está a aplicação de multa nos valores de R$
50 mil a até R$ 1 milhão por hora em razão de descumprimento de uma decisão da
Justiça, após 24 horas da notificação.
Fonte:
Brasil 247/Metrópoles
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