‘Tarifaço’ de Trump passou a valer a partir
deste sábado; veja argumentos a favor e contra as tarifas recíprocas
As tarifas recíprocas detalhadas por
Donald Trump contra
países que possuem relações comerciais com os Estados Unidos entram em vigor
neste sábado (5). A medida inclui alíquotas de 10%
sobre todas as importações do Brasil.
Ao
todo, o "tarifaço" de Trump atinge mais de 180 países e regiões,
incluindo a União Europeia (20%), China (34%), Coreia do Sul (25%) e Japão
(24%).
- 🗽 "Dia da
Libertação": O anúncio foi feito pelo republicano na
última quarta-feira (2), com o discurso de que os EUA ficariam
"livres" de produtos estrangeiros. "É a nossa declaração de
independência econômica", afirmou o líder americano.
- 🤷♂️ Liberdade? No
entanto, Trump e integrantes de sua administração são vozes minoritárias a
favor do tarifaço. Em geral, especialistas atribuem à medida uma série de
efeitos negativos — tanto para a economia dos EUA quando para o resto do
globo.
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Veja abaixo os principais argumentos a favor e contra as taxas.
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Quais são os argumentos a favor das tarifas?
- ➡️ Fortalecimento
da indústria nacional
Trump
utiliza as taxas como uma tentativa de incentivar a indústria nacional, por
meio do aumento da produção e do consumo de itens locais. A ideia é que, ao
priorizar produtos fabricados nos EUA, o país gere mais emprego e fortaleça a
economia — embora analistas enxerguem justamente
o movimento contrário.
- ➡️ Medida de
barganha
O líder
norte-americano também vê a estratégia como uma forma de negociar pautas de
interesse dos EUA, como o aumento da segurança nas fronteiras. Logo no início
do governo, por exemplo, Trump anunciou taxas contra México e Canadá (posteriormente suspensas) para barganhar
maior empenho dos países contra o tráfico de fentanil — opioide sintético 50 vezes mais
poderoso que a heroína.
- ➡️ Redução do
déficit comercial
A
imposição de tarifas pelos EUA está alinhada com as promessas do presidente de taxar seus
parceiros comerciais.
Os principais alvos são países com os quais os EUA têm déficit na balança
comercial — ou seja, gastam mais com importações do que recebem com
exportações. Entre eles, estão o México, o Canadá e a China. Assim, Trump
espera reverter esse quadro.
- ➡️ Potencial
arrecadatório
Outro
possível efeito do tarifaço pode ser a elevação da arrecadação com os impostos
de importação. O resultado, no entanto, vai depender de uma série de fatores,
como a reação dos outros países, o volume de importação nos EUA e o
comportamento do comércio no cenário global.
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Quais são os argumentos contra as tarifas?
- ➡️ Pressão sobre a
inflação
Especialistas
destacam que a aplicação de tarifas tem potencial inflacionário, já que o custo
mais alto de importação deverá encarecer a produção pelas empresas nos EUA.
Consequentemente, os produtos e serviços tendem a subir para o consumidor
final, pressionando o índice de preços do país.
- ➡️ Baixa
capacidade de absorção pelas empresas
Além
disso, há dúvidas sobre a capacidade de produção das empresas norte-americanas
para atender à demanda da população em meio a uma possível queda nas
importações. Ou seja, pode haver falta de insumos no mercado, o que também tem
potencial para elevar preços e pesar sobre a inflação.
- ➡️ Elevação de
juros
A alta
da inflação pressiona o Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA) a manter a taxa básica de
juros do país em níveis elevados. Os efeitos são muitos: a economia americana
desacelera mais, o dólar pode ganhar força contra outras moedas — e assim puxar
a inflação em outros países.
Além
disso, taxas mais altas nos EUA demandam juros elevados em outras nações para
segurar a cotação do dólar. É o caso do Brasil, que acaba sofrendo pressão no
câmbio e encarecimento da tomada de crédito.
- ➡️ Desaquecimento
da economia
Há
ainda o temor de uma recessão econômica nos EUA. Agentes do mercado avaliam
que, com as tarifas, o encarecimento de produtos pode reduzir a produção e o
lucro das empresas. Aliado à piora inflacionária, o receio é de que a maior
economia do mundo esfrie. Esse termômetro foi sentido logo no dia seguinte ao
"Dia da Libertação", com tombo do dólar e de bolsas nos EUA,
Europa e Ásia.
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iPhone, games e compras online: como tarifaço deve afetar
consumidor dos EUA
As
novas tarifas impostas pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, na última quarta-feira (2) devem aumentar
os preços para consumidores americanos no curto prazo.
Muitas
empresas de tecnologia vendem nos EUA produtos fabricados fora do país, que
agora enfrentarão taxas maiores. Para analistas, os novos custos serão
repassados, ao menos em parte, para os consumidores.
É o que
pode acontecer com o iPhone, que tem a maior parte da produção na China, para a
qual os EUA vão cobrar uma nova tarifa de 34%.
Agora,
a Apple deve decidir se
os novos custos serão absorvidos, o que reduzirá sua margem de lucro, ou
repassados aos consumidores.
Se as
novas taxas forem repassadas para clientes, o preço do iPhone 16 Pro Max nos EUA
pode subir de US$ 1.599 para quase US$ 2.300, segundo afirmou a Reuters com base
em projeções da empresa de investimentos Rosenblatt Securities.
O
mercado de games também poderá ser impactado. A Nintendo anunciou nesta sexta (4) que vai adiar
o início da pré-venda do Switch 2, que aconteceria na próxima quarta-feira (9).
A data
tinha sido revelada na última quarta, horas antes do anúncio do tarifaço de
Trump.
Agora,
a empresa diz que vai "avaliar o impacto potencial das tarifas e das
condições de mercado em evolução" e promete atualizar seu cronograma em
uma data posterior.
Lojas
online como Amazon e eBay também
podem ser afetadas, já que boa parte dos produtos de seus sites são de
vendedores parceiros que estão na China.
Trump
fez uma exceção para semicondutores, o que, segundo a revista Wired, deve
poupar empresas como a Nvidia, que fabricam unidades de processamento gráfico
com chips de Taiwan.
Ainda
assim, a empresa está entre as que mais perderam valor de mercado desde o
tarifaço. Na sexta-feira (4), o prejuízo
chegava a US$ 393 bilhões, ficando atrás apenas da Apple, que perdeu US$ 533
bilhões.
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Fórmula de Trump para
calcular ‘tarifaço’ pune países pobres e gera críticas pelo mundo; entenda
A fórmula matemática usada pelo
governo dos Estados Unidos para calcular as “tarifas recíprocas” sobre as
importações tem
gerado críticas ao redor do mundo.
De um
lado, o presidente americano Donald Trump afirma que os valores foram
calculados a partir das taxas que outros países já cobram para importar
produtos dos EUA, com um piso de 10% (leia mais abaixo sobre a taxa
mínima).
“Vamos
calcular a taxa combinada de todas as suas tarifas, barreiras
não monetárias e outras formas de trapaça. [...] Cobraremos deles
aproximadamente metade do que eles têm cobrado de nós”, disse Trump.
No
entanto, economistas alegam que, na prática, a fórmula divulgada pela Casa
Branca não considera a alíquota cobrada pelos países e, sim, o déficit
comercial dos EUA em relação a eles.
- 🔎 Déficit
comercial ocorre quando um país importa mais produtos do que
exporta, ou seja, compra mais do que vende, resultando em um saldo
financeiro negativo.
Consequentemente, a
fórmula afeta mais fortemente algumas das nações mais pobres do mundo, que
vendem, mas não podem comprar muito dos EUA, resultando em tarifas recíprocas
maiores, destacou a Reuters
Madagascar é um exemplo.
Com um produto interno bruto (PIB) per capita de pouco mais de US$ 500, o país
enfrentará uma tarifa de 47% sobre os US$ 733 milhões em exportações de
baunilha, metais e vestuário para os EUA no ano passado.
"Presumivelmente
ninguém está comprando Teslas lá", disse John Denton, chefe da Câmara de
Comércio Internacional (ICC), à Reuters, uma referência irônica à
improbabilidade de Madagascar conseguir apaziguar Trump comprando produtos
americanos de luxo.
Outro
país afetado é Lesoto, na África Austral,
que Trump descreveu em março como um país "do qual ninguém nunca ouviu
falar". Uma das nações mais pobres do mundo, tem um PIB de pouco mais
de US$ 2 bilhões e recebeu a maior taxa da lista de Trump.
Lesoto
tem um grande superávit comercial com os Estados Unidos, composto por diamantes
e tecidos, incluindo jeans Levi's. Em 2024, suas exportações para os EUA
totalizaram US$ 237 milhões, representando mais de 10% do seu PIB.
"A
tarifa recíproca de 50% introduzida pelo governo dos EUA vai acabar com o setor
têxtil e de vestuário no Lesoto", disse Thabo Qhesi, analista econômico
independente de Maseru, à Reuters.
Para
Denton, o tarifaço de Trump “corre o risco de prejudicar ainda mais as
perspectivas de desenvolvimento de países que já enfrentam uma piora nos termos
de troca".
<><> A fórmula polêmica
Fórmula utilizada pelos EUA para calcular as
chamadas 'tarifas recíprocas' — Foto: US Trade Representative/Reprodução
A fórmula divulgada pela Casa Branca calcula
as tarifas de forma a zerar os déficits comerciais bilaterais entre os EUA e
seus parceiros comerciais. Na teoria, considera uma série de fatores.
Além do número de importações
(mi) e exportações (xi) dos EUA para cada país, ela inclui
a elasticidade das importações com relação aos preços de importação
(ε) e o repasse das tarifas para os preços de importação (φ).
“Nós literalmente calculamos barreiras
tarifárias e não tarifárias”, afirmou no X o vice-secretário de imprensa da
Casa Branca, Kush Desai, quando questionado sobre a sua metodologia.
Mas economistas se apressaram em salientar
que os termos ε e φ se cancelavam de tal forma que a fórmula poderia ser
reduzida a um simples quociente entre o déficit comercial de bens e as
importações dos EUA.
➡️ Entenda o cálculo abaixo a partir do exemplo da China, que vendeu US$ 438,9
bilhões para os EUA em 2024 e comprou US$ 143,5 bilhões, segundo dados do US Census Bureau.
- 1. A
fórmula pega o total de exportações dos EUA (xi) e subtrai
o total de importações (mi), chegando ao déficit comercial.
Ou seja: 143,5 - 438,9 = -295,4.
- 2. Em
seguida, o número é dividido pelo número de importações
(mi) multiplicado por ε e φ. Mas esses termos tiveram
valores fixos definidos pelo governo: 4 e 0,25, respectivamente, de modo
que, multiplicados, equivalem a 1 e não interferem no resultado.
Na conta: 295,4 / 438,9*1 = 0,67
= 67%, o que Trump alega ser “a tarifa cobrada pela China dos EUA,
incluindo manipulação cambial e barreiras comerciais”.
- 3. Então,
para definir a “tarifa recíproca”, que será cobrada pelos EUA, esse
valor foi dividido pela metade, um “desconto” aplicado porque os
americanos são “muito gentis”, segundo Trump.
Resultado: 67% / 2 = 34%.
Com o cálculo feito dessa forma, quanto maior
o déficit comercial dos EUA com um determinado país, maior a tarifa, explica o
economista Pedro Rossi, professor do Instituto de Economia da Unicamp.
“Trump falou como se a China cobrasse 67% de
tarifas dos EUA, o que não é verdade. Na tabela, havia uma informação que dizia
que o cálculo considerava manipulação cambial e barreiras não tarifárias, mas o
cálculo mostra que os valores são determinados em função do déficit comercial
dos EUA com esses países”, resume o professor.
Post no X ironiza fórmula utilizada por Trump
para calcular 'tarifas recíprocas' dos EUA — Foto: X/Reprodução
<><> Então, as tarifas podem ser
chamadas de ‘recíprocas’?
Para a União Europeia, a fórmula matemática
produziu uma tarifa punitiva de 20% — quatro vezes os 5% que a Organização
Mundial do Comércio (OMC) calcula como a taxa média da UE.
"Então, pelo menos para nós, é uma
imprecisão colossal", disse Stefano Berni, gerente-geral do consórcio que
representa os fabricantes do queijo especial Grana Padano na Itália.
"Hoje, custa três vezes mais para nós
entrar nos EUA do que para os queijos americanos entrarem em nosso
mercado", afirmou em um comunicado.
"Realmente não há metodologia aí",
disse à Reuters Mary Lovely, membro sênior do Instituto Peterson de Economia
Internacional.
"É como descobrir que você tem câncer e
descobrir que o medicamento é baseado no seu peso dividido pela sua idade. A
palavra 'recíproco' é profundamente enganosa."
Para Pedro Rossi, da Unicamp, o governo
americano manipulou as estatísticas “para vender essas tarifas como
recíprocas, quando na verdade são unilaterais”.
Ele disse que, para a reciprocidade fazer
sentido, o cálculo deveria observar as tarifas cobradas de cada setor, sem
relação com o déficit ou superávit comercial. E cobrar as taxas por setor, não
por país.
Além disso, Rossi explicou que “é natural que
países tenham déficit comercial com alguns países e superávit com outros, de
acordo com a complementaridade produtiva e comercial”.
“Por exemplo, um país pode exportar
automóveis para um parceiro com o qual tem superávit e importar peças de outro
com o qual ele tem déficit. Zerar o resultado comercial com ambos os países
desmonta as cadeias produtivas e cria problemas econômicos.”
Fonte: g1
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