segunda-feira, 7 de abril de 2025

‘Tarifaço’ de Trump passou a valer a partir deste sábado; veja argumentos a favor e contra as tarifas recíprocas

As tarifas recíprocas detalhadas por Donald Trump contra países que possuem relações comerciais com os Estados Unidos entram em vigor neste sábado (5). A medida inclui alíquotas de 10% sobre todas as importações do Brasil.

Ao todo, o "tarifaço" de Trump atinge mais de 180 países e regiões, incluindo a União Europeia (20%), China (34%), Coreia do Sul (25%) e Japão (24%). 

  • 🗽 "Dia da Libertação": O anúncio foi feito pelo republicano na última quarta-feira (2), com o discurso de que os EUA ficariam "livres" de produtos estrangeiros. "É a nossa declaração de independência econômica", afirmou o líder americano.
  • 🤷‍♂️ Liberdade? No entanto, Trump e integrantes de sua administração são vozes minoritárias a favor do tarifaço. Em geral, especialistas atribuem à medida uma série de efeitos negativos — tanto para a economia dos EUA quando para o resto do globo.

<><> Veja abaixo os principais argumentos a favor e contra as taxas.

>>>>> Quais são os argumentos a favor das tarifas?

  • ➡️ Fortalecimento da indústria nacional

Trump utiliza as taxas como uma tentativa de incentivar a indústria nacional, por meio do aumento da produção e do consumo de itens locais. A ideia é que, ao priorizar produtos fabricados nos EUA, o país gere mais emprego e fortaleça a economia — embora analistas enxerguem justamente o movimento contrário.

  • ➡️ Medida de barganha

O líder norte-americano também vê a estratégia como uma forma de negociar pautas de interesse dos EUA, como o aumento da segurança nas fronteiras. Logo no início do governo, por exemplo, Trump anunciou taxas contra México e Canadá (posteriormente suspensas) para barganhar maior empenho dos países contra o tráfico de fentanil — opioide sintético 50 vezes mais poderoso que a heroína.

  • ➡️ Redução do déficit comercial

A imposição de tarifas pelos EUA está alinhada com as promessas do presidente de taxar seus parceiros comerciais. Os principais alvos são países com os quais os EUA têm déficit na balança comercial — ou seja, gastam mais com importações do que recebem com exportações. Entre eles, estão o México, o Canadá e a China. Assim, Trump espera reverter esse quadro.

  • ➡️ Potencial arrecadatório

Outro possível efeito do tarifaço pode ser a elevação da arrecadação com os impostos de importação. O resultado, no entanto, vai depender de uma série de fatores, como a reação dos outros países, o volume de importação nos EUA e o comportamento do comércio no cenário global.

>>>>> Quais são os argumentos contra as tarifas?

  • ➡️ Pressão sobre a inflação

Especialistas destacam que a aplicação de tarifas tem potencial inflacionário, já que o custo mais alto de importação deverá encarecer a produção pelas empresas nos EUA. Consequentemente, os produtos e serviços tendem a subir para o consumidor final, pressionando o índice de preços do país.

  • ➡️ Baixa capacidade de absorção pelas empresas

Além disso, há dúvidas sobre a capacidade de produção das empresas norte-americanas para atender à demanda da população em meio a uma possível queda nas importações. Ou seja, pode haver falta de insumos no mercado, o que também tem potencial para elevar preços e pesar sobre a inflação.

  • ➡️ Elevação de juros

A alta da inflação pressiona o Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA) a manter a taxa básica de juros do país em níveis elevados. Os efeitos são muitos: a economia americana desacelera mais, o dólar pode ganhar força contra outras moedas — e assim puxar a inflação em outros países.

Além disso, taxas mais altas nos EUA demandam juros elevados em outras nações para segurar a cotação do dólar. É o caso do Brasil, que acaba sofrendo pressão no câmbio e encarecimento da tomada de crédito.

  • ➡️ Desaquecimento da economia

Há ainda o temor de uma recessão econômica nos EUA. Agentes do mercado avaliam que, com as tarifas, o encarecimento de produtos pode reduzir a produção e o lucro das empresas. Aliado à piora inflacionária, o receio é de que a maior economia do mundo esfrie. Esse termômetro foi sentido logo no dia seguinte ao "Dia da Libertação", com tombo do dólar e de bolsas nos EUA, Europa e Ásia.

¨      iPhone, games e compras online: como tarifaço deve afetar consumidor dos EUA

As novas tarifas impostas pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, na última quarta-feira (2) devem aumentar os preços para consumidores americanos no curto prazo.

Muitas empresas de tecnologia vendem nos EUA produtos fabricados fora do país, que agora enfrentarão taxas maiores. Para analistas, os novos custos serão repassados, ao menos em parte, para os consumidores.

É o que pode acontecer com o iPhone, que tem a maior parte da produção na China, para a qual os EUA vão cobrar uma nova tarifa de 34%.

Agora, a Apple deve decidir se os novos custos serão absorvidos, o que reduzirá sua margem de lucro, ou repassados aos consumidores.

Se as novas taxas forem repassadas para clientes, o preço do iPhone 16 Pro Max nos EUA pode subir de US$ 1.599 para quase US$ 2.300, segundo afirmou a Reuters com base em projeções da empresa de investimentos Rosenblatt Securities.

O mercado de games também poderá ser impactado. A Nintendo anunciou nesta sexta (4) que vai adiar o início da pré-venda do Switch 2, que aconteceria na próxima quarta-feira (9).

A data tinha sido revelada na última quarta, horas antes do anúncio do tarifaço de Trump.

Agora, a empresa diz que vai "avaliar o impacto potencial das tarifas e das condições de mercado em evolução" e promete atualizar seu cronograma em uma data posterior.

Lojas online como Amazon e eBay também podem ser afetadas, já que boa parte dos produtos de seus sites são de vendedores parceiros que estão na China.

Trump fez uma exceção para semicondutores, o que, segundo a revista Wired, deve poupar empresas como a Nvidia, que fabricam unidades de processamento gráfico com chips de Taiwan.

Ainda assim, a empresa está entre as que mais perderam valor de mercado desde o tarifaço. Na sexta-feira (4), o prejuízo chegava a US$ 393 bilhões, ficando atrás apenas da Apple, que perdeu US$ 533 bilhões.

¨      Fórmula de Trump para calcular ‘tarifaço’ pune países pobres e gera críticas pelo mundo; entenda

fórmula matemática usada pelo governo dos Estados Unidos para calcular as “tarifas recíprocas” sobre as importações tem gerado críticas ao redor do mundo.

De um lado, o presidente americano Donald Trump afirma que os valores foram calculados a partir das taxas que outros países já cobram para importar produtos dos EUA, com um piso de 10% (leia mais abaixo sobre a taxa mínima).

“Vamos calcular a taxa combinada de todas as suas tarifas, barreiras não monetárias e outras formas de trapaça. [...] Cobraremos deles aproximadamente metade do que eles têm cobrado de nós”, disse Trump.

No entanto, economistas alegam que, na prática, a fórmula divulgada pela Casa Branca não considera a alíquota cobrada pelos países e, sim, o déficit comercial dos EUA em relação a eles.

  • 🔎 Déficit comercial ocorre quando um país importa mais produtos do que exporta, ou seja, compra mais do que vende, resultando em um saldo financeiro negativo.

Consequentemente, a fórmula afeta mais fortemente algumas das nações mais pobres do mundo, que vendem, mas não podem comprar muito dos EUA, resultando em tarifas recíprocas maiores, destacou a Reuters

Madagascar é um exemplo. Com um produto interno bruto (PIB) per capita de pouco mais de US$ 500, o país enfrentará uma tarifa de 47% sobre os US$ 733 milhões em exportações de baunilha, metais e vestuário para os EUA no ano passado.

"Presumivelmente ninguém está comprando Teslas lá", disse John Denton, chefe da Câmara de Comércio Internacional (ICC), à Reuters, uma referência irônica à improbabilidade de Madagascar conseguir apaziguar Trump comprando produtos americanos de luxo.

Outro país afetado é Lesoto, na África Austral, que Trump descreveu em março como um país "do qual ninguém nunca ouviu falar". Uma das nações mais pobres do mundo, tem um PIB de pouco mais de US$ 2 bilhões e recebeu a maior taxa da lista de Trump.

Lesoto tem um grande superávit comercial com os Estados Unidos, composto por diamantes e tecidos, incluindo jeans Levi's. Em 2024, suas exportações para os EUA totalizaram US$ 237 milhões, representando mais de 10% do seu PIB.

"A tarifa recíproca de 50% introduzida pelo governo dos EUA vai acabar com o setor têxtil e de vestuário no Lesoto", disse Thabo Qhesi, analista econômico independente de Maseru, à Reuters.

Para Denton, o tarifaço de Trump “corre o risco de prejudicar ainda mais as perspectivas de desenvolvimento de países que já enfrentam uma piora nos termos de troca".

<><> A fórmula polêmica

Fórmula utilizada pelos EUA para calcular as chamadas 'tarifas recíprocas' — Foto: US Trade Representative/Reprodução

A fórmula divulgada pela Casa Branca calcula as tarifas de forma a zerar os déficits comerciais bilaterais entre os EUA e seus parceiros comerciais. Na teoria, considera uma série de fatores.

Além do número de importações (mi) e exportações (xi) dos EUA para cada país, ela inclui a elasticidade das importações com relação aos preços de importação (ε) e o repasse das tarifas para os preços de importação (φ).

“Nós literalmente calculamos barreiras tarifárias e não tarifárias”, afirmou no X o vice-secretário de imprensa da Casa Branca, Kush Desai, quando questionado sobre a sua metodologia.

Mas economistas se apressaram em salientar que os termos ε e φ se cancelavam de tal forma que a fórmula poderia ser reduzida a um simples quociente entre o déficit comercial de bens e as importações dos EUA.

➡️ Entenda o cálculo abaixo a partir do exemplo da China, que vendeu US$ 438,9 bilhões para os EUA em 2024 e comprou US$ 143,5 bilhões, segundo dados do US Census Bureau.

  • 1. A fórmula pega o total de exportações dos EUA (xi) e subtrai o total de importações (mi), chegando ao déficit comercial.

Ou seja: 143,5 - 438,9 = -295,4.

  • 2. Em seguida, o número é dividido pelo número de importações (mi) multiplicado por ε e φ. Mas esses termos tiveram valores fixos definidos pelo governo: 4 e 0,25, respectivamente, de modo que, multiplicados, equivalem a 1 e não interferem no resultado.

Na conta: 295,4 / 438,9*1 = 0,67 = 67%, o que Trump alega ser “a tarifa cobrada pela China dos EUA, incluindo manipulação cambial e barreiras comerciais”.

  • 3. Então, para definir a “tarifa recíproca”, que será cobrada pelos EUA, esse valor foi dividido pela metade, um “desconto” aplicado porque os americanos são “muito gentis”, segundo Trump.

Resultado: 67% / 2 = 34%.

Com o cálculo feito dessa forma, quanto maior o déficit comercial dos EUA com um determinado país, maior a tarifa, explica o economista Pedro Rossi, professor do Instituto de Economia da Unicamp.

“Trump falou como se a China cobrasse 67% de tarifas dos EUA, o que não é verdade. Na tabela, havia uma informação que dizia que o cálculo considerava manipulação cambial e barreiras não tarifárias, mas o cálculo mostra que os valores são determinados em função do déficit comercial dos EUA com esses países”, resume o professor.

Post no X ironiza fórmula utilizada por Trump para calcular 'tarifas recíprocas' dos EUA — Foto: X/Reprodução

<><> Então, as tarifas podem ser chamadas de ‘recíprocas’?

Para a União Europeia, a fórmula matemática produziu uma tarifa punitiva de 20% — quatro vezes os 5% que a Organização Mundial do Comércio (OMC) calcula como a taxa média da UE.

"Então, pelo menos para nós, é uma imprecisão colossal", disse Stefano Berni, gerente-geral do consórcio que representa os fabricantes do queijo especial Grana Padano na Itália.

"Hoje, custa três vezes mais para nós entrar nos EUA do que para os queijos americanos entrarem em nosso mercado", afirmou em um comunicado.

"Realmente não há metodologia aí", disse à Reuters Mary Lovely, membro sênior do Instituto Peterson de Economia Internacional.

"É como descobrir que você tem câncer e descobrir que o medicamento é baseado no seu peso dividido pela sua idade. A palavra 'recíproco' é profundamente enganosa."

Para Pedro Rossi, da Unicamp, o governo americano manipulou as estatísticas “para vender essas tarifas como recíprocas, quando na verdade são unilaterais”.

Ele disse que, para a reciprocidade fazer sentido, o cálculo deveria observar as tarifas cobradas de cada setor, sem relação com o déficit ou superávit comercial. E cobrar as taxas por setor, não por país.

Além disso, Rossi explicou que “é natural que países tenham déficit comercial com alguns países e superávit com outros, de acordo com a complementaridade produtiva e comercial”.

“Por exemplo, um país pode exportar automóveis para um parceiro com o qual tem superávit e importar peças de outro com o qual ele tem déficit. Zerar o resultado comercial com ambos os países desmonta as cadeias produtivas e cria problemas econômicos.”

 

Fonte: g1

 

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