quarta-feira, 3 de maio de 2023

Denise Assis: Em meio a cenário político conturbado, Lira rufa os tambores de guerra

 A tal da mídia “profissional”, sempre ela, é mestra em adubar malfeitos, para depois cobrar mudanças éticas, em nome do que deixou passar. Fez vistas grossas. Foi assim que nos últimos anos do governo findo (graças a Deus e ao eleitorado consciente desse Brasil varonil), víamos manchetes que tratavam com naturalidade de temas ligados ao “orçamento secreto”, como se aquilo fosse uma rubrica burocrática aceitável. Não era. Era, isto sim, uma ilegalidade tratada com a desfaçatez de quem tolera o intolerável para manter tudo no lugar. Ou seja: não fazer marola.

 Da mesma maneira, toleraram a “PEC kamikaze”, que arrombou a festa do teto de gastos, sem que ninguém incomodasse o governo de plantão. Passou no congresso o jorro de milhões para a compra de votos, tratado como um fato inserido na vida política, com a naturalidade de quem fala em colégio eleitoral, coeficiente de votos, ou coisa parecida. Tudo sob a batuta ritmada do presidente da Câmara, Arthur Lira, reconduzido ao posto com o apoio do governo chegante. Enquanto Lira tirava do corpo a camisa azul com o reluzente número 22 em amarelo, com que foi àquela festa de lançamento da campanha da ultradireita, e jurava fidelidade eterna ao novo governo, no Supremo Tribunal Federal (STF), a ministra Rosa Weber finalizava o julgamento das tais emendas – “orçamento secreto” -, concluindo que, por inconstitucionais (e quem não sabia?) assim não podia ficar. Deu-se um jeito.  

 O jeito foi pegar os cerca de R$ 20 bilhões dos cofres do Tesouro Nacional, cuja execução Bolsonaro terceirizava sob a forma de emendas sigilosas, e redistribuí-las. Destinou-se um naco desse montante ao conjunto de emendas individuais e de bancada. O outro tanto, de cerca de R$ 9 bilhões, passou a ter um apelido: de RP9 foi para RP2, sendo gerido pelos ministérios. Com a manobra, apesar dos parlamentares continuarem definindo o destino da verba, dissolveu-se a vergonhosa fila que se formava no corredor em frente ao gabinete de Lira, e transferiram a “boca, o movimento”, para os gabinetes ministeriais.

 Mera maquiagem para a redistribuição de emendas, dentro do jogo de interesses, mas fora das mãos do insaciável Arthur Lira, que em entrevista para o jornalão, deixou claro que não está gostando nada da nova brincadeira. E, mais: trocaria de bom grado os cargos conseguidos na Codevasf e os ministérios dados ao seu partido, desde que pudesse manejar a bufunfa ao seu bel prazer. Pelo que se depreende, o pupilo superou o mentor, Eduardo Cunha.  

 Não fora tudo isso, Lira ainda resolveu – mais uma vez com a naturalização da mídia “profissional” -, bater pé e não mais cumprir o que estava descrito na Constituição de 1988 (lembremos, a Carta Magna), para a formação de comissões que cuidam dos trâmites das medidas provisórias. Não queria mais fazer do jeito que estava na Lei. Queria mudar tudo, para designar mais deputados para as comissões mistas, pois como estava previsto não lhe saciava a sede de poder e domínio sobre o Centrão. Mesmo que como consequência tivesse de trocar de mal com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco. Justiça seja feita, cordato a que tudo voltasse ao seu lugar e os trâmites fossem seguidos.

 Algum posicionamento sério na “mídia profissional”? Não. Seguiram-se as análises e comentários, dando conta de que o furdunço estava formado, e rendendo notícias e fofocas, daí seguiram com o baile. Qual seria a atitude consequente? Pera lá! Existe uma lei anterior à pandemia, que foi um tempo de excepcionalidades e exigiu adaptações para que o Congresso desse providências condizentes com as necessidades da população. Passada a excepcionalidade, tudo como d’antes no quartel de Abrantes, não? Não foi o que aconteceu.

 Permitiram que Lira abrisse as suas asas e entrasse na festa das “exigências”, como se fosse a coisa mais natural do mundo, alguém que participa da elaboração das leis, cismar em descumpri-las.

 Enquanto isso, a mesma “mídia profissional” que lhe passou a mão pela cabeça, noticiando as suas birras como se suas manobras fossem do jogo, gastou tempo, saliva, tinta, para dizer que o novo governo estava imobilizado, sem ação, e que há meses o Congresso não votava as questões de interesse da sociedade. Bingo! É o que acontece quando o presidente da Câmara para o que está fazendo, para impor e ditar regras novas, sobre o jogo jogado.

 E a cada crise de mau humor, ele vai para um jornalão e manda os seus recados. Na primeira, disse que o governo chegante não tinha base consolidada e forte para aprovar os seus projetos. Ato seguinte, rodadas de jantares e conversas para novas concessões de “trocas”. Agora, quando percebeu que o seu “blocão” não dava conta de controlar as emendas e subjugar deputados do baixo clero para fazer pressão sobre o governo, a fim de obter mais poderes, cada vez mais poderes, mandou de novo, a real: não vai “sacanear” (sim, esta é a novilíngua reinante na Câmara) o governo, mas quer a cabeça do ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha. É ele agora quem maneja as “emendas” tão cobiçadas por Lira...

 O presidente Luiz Inácio Lula da Silva já avisou que não vai dar. O cenário político é o mais conturbado possível, quando se inicia uma CPMI para apurar o golpe fascista de 8 de janeiro; há uma ameaça de CPMI sobre o Movimento dos Sem-terra (MST) e uma crise instalada no Gabinete de Segurança Institucional (GSI), que a despeito da ótima condução do ministro interino, Ricardo Capelli, ainda não está de todo desenhado e concluído o modelo que vai vigorar.  

 Do forte Apache os milicos olham para tudo de binóculo de campanha. Concordam em dar os anéis – os bagrinhos, para serem investigados -, mas não vão entregar os dedos: os generais do alto Comando, que, sim, deveriam responder porque toleraram e protegeram os acampamentos golpistas, onde o golpe foi gerado, até eclodir em atos terroristas de destruição dos prédios das três instituições mais significativas da República. Nesse contexto, Lira rufa os tambores de guerra. Haja emendas...

 

Ø  Investida de Lira mostra que CPMI não é agenda positiva para Lula. Por Helena Chagas

 

À primeira vista, o Planalto fez limonada do limão da CPMI do golpe e terá maioria no colegiado. Nem por isso vai poder relaxar. Ainda que controlada, nas mãos de presidente e relator da base governista, a CPI não é agenda positiva para o governo Lula.  Melhor seria se não existisse, e que o trabalho legislativo estivesse focado na votação de projetos de interesse imediato, como o arcabouço fiscal e a reforma tributária — o primeiro, com mais chances de sair no curto prazo; a última, seriamente ameaçada de empacar sob o diversionismo da CPMI.           

Parlamentares experientes acreditam que o melhor cenário hoje para o governo seria que seus aliados, com o controle da pauta da CPI, conseguissem dar um nó nos trabalhos e paralisá-la. Depois de algumas primeiras sessões e confrontos espetaculosos — que parecem inevitáveis —  a comissão iria aos poucos saindo dos holofotes, com a oposição imobilizada pela ameaça de convocações e quebra de sigilos de bolsonaristas como Anderson Torres e o general Heleno  — e do próprio Bolsonaro.         

 É um desfecho improvável, mas não impossível. Seria preciso combinar com os russos da própria bancada governista na CPMI. Alguns já estão pintados para a guerra e veem a comissão como uma bela oportunidade para aparecer na mídia e crescer politicamente.         

 O governo teria ainda que se conformar em enterrar a comissão, em vez de, com toda a legitimidade, usar sua maioria para derrotar a tese bizarra de que as vítimas dos atos golpistas seriam responsáveis por eles — a fake news bolsonarista que está na base de sua criação. E abrir mão de expor no picadeiro, com espalhafato, personagens envolvidos no 8/1 e desmoralizá-los de vez.          

Politicamente, esse seria o melhor resultado— concluir as investigações mostrando ao país os autores intelectuais da tentativa de golpe, aqueles que aparentemente todo mundo sabe quem são mas que ainda não foram desmascarados com provas. Dificilmente, porém, uma CPI instalada quatro meses depois dos atentados terá condições de ir além das apurações da PF e do Ministério Público, que caminham bem e, muito provavelmente, vão chegar primeiro aos mesmos resultados.            

Sem contar que, antes mesmo de ser instalada, ou ter seus dirigentes indicados, a CPMI já deixou o governo mais dependente ainda de aliados do centrão e, claro, do presidente da Câmara, Arthur Lira. Sem cerimônias, Lira, que indicará o presidente da comissão e boa parte dos deputados, aproveitou o fim de semana para dar entrevista ao Globo pedindo a cabeça do ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha — que vem centralizando a distribuição das emendas orçamentárias, esvaziando seus poderes.          

 Lula não vai dar a cabeça de Padilha, mas deveria se acautelar em relação à abertura de

 mais uma frente de batalha em território onde, na prática, não terá maioria real e ficará nas mãos do centrão — caso da CPMI dos atos golpistas, como vem ficando cada vez mais claro.

 

Ø  Arthur Lira diz que "não vai sacanear" Lula na Câmara, mas critica Alexandre Padilha e pede mais emendas

 

O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, concedeu entrevista ao jornal O Globo, em que disse que o governo Lula não tem uma base sólida no Congresso, mas prometeu "não sacanear". Na entrevista, Lira pediu mais emendas parlamentares. "Aprovamos a PEC da Transição, que foi votada no governo anterior, mas com gerência completa da equipe do Lula. Depois, houve uma acomodação e a formatação de um governo de coalizão, com troca de ministérios por apoios, que está comprovado que não vai dar certo. As emendas resolvem isto sem ser necessário um ministério", diz ele. "Eu sempre disse que o orçamento é muito mais democrático se decidido por 600 parlamentares do que por dez ministros", acrescenta.

Lira fez elogios pessoais ao ministro Alexandre Padilha, mas criticou sua atuação política. "Um sujeito fino e educado, mas que tem tido dificuldades. Não tem se refletido em uma relação de satisfação boa. Talvez a turma precise descentralizar mais, confiar mais", ponderou. "Trabalho para dar tranquilidade ao Brasil. Poderia ter sido eleito presidente da Câmara sem o PT, mas aceitei o apoio e não vou sacanear o governo. Não vou trabalhar contra nem atuar deliberadamente para prejudicar. Mas o presidente da Câmara não é um agregado, ele é um parceiro", reforçou.

Lira também fez alertas sobre os perigos da CPI do 8 de janeiro. "O governo tentou derrubar, mas se tornou inevitável depois do vídeo do Gonçalves Dias. A minha pergunta é o porquê deste vídeo não ter aparecido antes. Quem segurou as imagens e decretou sigilo? Como foi parar na mídia? Quem tinha acesso? Se foi o Gonçalves Dias, ele é o homem de confiança do Lula. Se foi o GSI, isto também precisará ser explicado. O governo também quer apurar quem estava por trás dos movimentos nos quartéis, quem financiou e o que era a minuta do golpe. Será uma guerra de narrativas", afirmou.

Lira também previu uma votação dura no PL 2630, o das fake news, que é uma das principais causas da Globo e que preocupa comunicadores progressistas. "Teremos que chamar líder por líder e contar votos", disse ele.

·         Lula avisa a aliados que não entregará a cabeça de Padilha a Arthur Lira

“O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) avisou a aliados que não pretende afastar da coordenação política o ministro-chefe das Relações Institucionais, Alexandre Padilha”, informa o jornalista Tales Faria em sua coluna no portal UOL.

“Lula não gostou do que considera um pedido público para entregar a cabeça de Padilha feito pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), em entrevista ao jornal O Globo publicada neste domingo, 30. Na entrevista, Lira disse que Padilha não está satisfazendo a base governista. Ele cobrou uma descentralização da coordenação política”, informa.

De acordo com o colunista, “a afirmação foi entendida no Planalto como a senha para entregar mais autoridade ao líder do PT na Câmara, o deputado José Guimarães (CE), a quem Lira considera um aliado fiel”.

 

Fonte: Brasil 247

 

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