domingo, 12 de março de 2017

“A corrupção é ruim, mas a ditadura é pior”. Por Alex Solnik

A lista do material escolar. A lista do supermercado. A lista telefônica. A lista de Furnas. A lista das promessas de início de ano. A lista dos presentes de fim de ano.
A lista de Janot é mais uma que se incorporou à lista das listas brasileiras.
Embora ele já tenha demonstrado ser um especialista em listas e em criar clima de suspense, suas listas costumam ser anunciadas com muito estardalhaço, mas de prático não ocorre nada.
Dão sempre a sensação de que a montanha pariu um rato. Os processos dos listados nunca chegam ao final, deixando os brasileiros sem saber se eles são culpados ou inocentes. Desconfia-se que muitos ou até a maioria o sejam. Mas, da desconfiança à sentença final leva-se anos-luz.
Então para que serve a lista de Janot?
Uma das coisas estranhas dessas delações da Odebrecht ou ao menos dos trechos vazados para a imprensa é que dá a impressão que a empreiteira distribuía dinheiro a rodo, mais de 3 bilhões, segundo as últimas estatísticas, e não recebia nada em troca.
O que se lê nos jornais e se vê na TV é que tal político recebeu tantos milhões, em tais e tais circunstâncias, de tal e de tal forma. Mas nunca nos informam o que a empreiteira recebeu em troca. Distribuiu 3 bilhões e lucrou quanto com esse investimento? No que?
Não dá para acreditar que, numa estrutura tão organizada como a da Odebrecht não houvesse uma planilha referente às contrapartidas, do tipo: demos tantos milhões para Fulano e ele nos vai retribuir com contrato de tantos bilhões em tal situação. Essa informação é fundamental para a população poder separar o joio do trigo, caso haja trigo nesse joio.
No início da Lava Jato, com as delações dos ex-diretores da Petrobrás, Paulo Roberto Costa e Pedro Barusco, dava para entender o que acontecia: eles distribuíam porcentagens de contratos bilionários a representantes de partidos que os apoiavam nos cargos, principalmente PMDB e PP. (O diretor que supostamente seria o canal com o PT continua preso, mas ainda não virou delator.)
Agora, no terceiro ano da operação, a confusão é total. Não se sabe mais quem fez o que, quando, onde, como e por que. A classe política é desmoralizada (ou desmorolizada) por inteiro.
É uma onda que cresce e se retroalimenta mas que deixa margem a algumas preocupações em relação às eleições de 2018: algum candidato sobreviverá à guerra contra os políticos? Poderá haver eleição sem candidatos?
Para a imprensa está sendo ótimo. Todo dia tem uma bomba, uma denúncia, uma mordomia do Sergio Cabral, a negação de habeas corpus ao Eike Batista, mais uma pressão sobre Lula. Isso vende jornal.
A questão é: aonde vai nos levar mais essa onda moralista (ou morolista, como diz minha mulher), uma de tantas que já foram promovidas neste país usando como fachada uma suposta moralização?
Por mais defeitos que tenham nossos políticos não existe democracia sem eles. Regime sem políticos chama-se ditadura, cuja expressão mais notória foi o Estado Novo de Getúlio Vargas, que criou a ditadura sem partidos nem políticos. A corrupção é uma merda, mas a ditadura é pior. Mesmo porque, na ditadura, a corrupção continua, mas fica escondida.
Diminuir a corrupção num país é um processo que leva décadas, leva gerações e exige a elaboração de um programa complexo, que começa na educação das crianças e passa por várias instâncias; um tratamento de choque, como esse proposto pela Lava Jato tende a radicalizar o processo político e jogar a população contra a classe política, sem informá-la que sem políticos é o caos.
A maneira civilizada de quebrar o círculo vicioso da corrupção não é colocar “todos os corruptos na cadeia”, não é promover a malhação de Judas, não é prender e arrebentar e sim promover um amplo programa de educação nacional, efetivo, contínuo, determinado, envolvendo instâncias nacional estadual e municipal, empresas privadas, todos os meios de comunicação a fim de que as pessoas, num futuro breve, em cargos públicos, eletivos ou não, não deixem de “roubar” o estado por medo de prisão e sim por estarem convictas de que assim prejudicam toda a sociedade, inclusive a eles próprios.
Na ditadura de 64, alguns políticos foram cassados corretamente, como o então governador de São Paulo, Adhemar de Barros, por corrupção, mas a esmagadora maioria foi cassada por motivos políticos, com o intuito de eliminar a esquerda da politica.
A Lava Jato repete a mesma experiência, que já sabemos onde e como acaba.

A corrupção é ruim, mas a ditadura é pior.

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