Empresa
de café que entrou na Lista Suja teve certificação renovada após flagrante
A
EMPRESA MINEIRA FAZENDAS KLEM Importação e Exportação de Café é uma dos 20
produtores de café incluídos na Lista Suja do trabalho escravo, atualizada pelo
MTE (Ministério do Trabalho e Emprego) nesta quarta-feira (9).
Em
junho de 2022, 7 trabalhadores foram resgatados de condições análogas à
escravidão em Manhumirim, Minas Gerais. As vítimas colhiam café na Fazenda do
Ouro, uma das propriedades da companhia.
A
família Klem é dona de cafezais na região da Zona da Mata Mineira e realiza a
venda direta de grãos para clientes no exterior.
• Certificações
Em
outubro de 2022, uma reportagem publicada pela Repórter Brasil mostrou que a
Fazendas Klem Importação e Exportação de Café tinha o selo da Rainforest Alliance, uma das principais
certificadoras globais de critérios socioambientais em produtos agrícolas.
À época
do resgate, a Rainforest Alliance afirmou que a propriedade rural flagrada com
trabalho escravo não era a mesma fazenda da empresa para a qual o selo havia
sido concedido. De acordo com a entidade, a área certificada ficava localizada
em Luisburgo, município a 31 km de onde ocorreu o flagrante.
Mesmo
após o caso, a certificação da Fazendas Klem Importação e Exportação de Café
foi renovada pela Rainforest Alliance, em maio de 2024. A certificação teria
validade de 1 ano.
Na
última quarta (9), depois do contato da reportagem e da publicação da Lista
Suja, a Rainforest Alliance afirmou à Repórter Brasil que “uma vez que o
detentor de certificado foi incluído na Lista Suja, o mesmo perde o certificado
a partir da data de sua inclusão neste cadastro”. A organização explicou que
uso de trabalho análogo à escravidão é uma violação grave das regras da
certificação. “O desrespeito aos direitos trabalhistas nunca foi – e nunca será
– tolerado pela Rainforest Alliance”, diz trecho da nota.
A
Fazendas Klem também possui certificação da USDA Organic, o selo de orgânicos
do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos. Segundo a plataforma da USDA
Organic, a certificação foi garantida em dezembro de 2023. Assim como no caso
da Rainforest Alliance, o selo foi concedido após o flagrante de trabalho
escravo em uma das propriedades da companhia mineira.
A
Fazendas Klem afirmou que a autuação administrativa que resultou na sua
inclusão no cadastro do MTE ainda está em discussão na Justiça, “motivo pelo
qual não há, até o momento, qualquer decisão transitada em julgado que
reconheça a prática de condição análoga à de escravo em nossas propriedades”.
A
empresa contesta a “suposta caracterização dos fatos narrados” e afirma que o
caso envolveu 7 trabalhadores de um grupo formado por cerca de 100 que
“exerciam as mesmas atividades, nos mesmos locais, no mesmo período e com as
mesmas condições laborais à época”. A empresa afirma ainda que vem colaborando
com as autoridades competentes, revisando processos internos e ampliando a
fiscalização sobre suas frentes de trabalho.
A
certificação USDA Organics foi procurada pela Repórter Brasil, mas não
respondeu aos questionamentos enviados até o fechamento desta reportagem. O
espaço segue aberto para manifestações futuras.
• Certificações precisam ser
participativas
Para
Fernanda Drummond, assessora de defesa dos direitos socioambientais na
organização Conectas, as certificadoras não deveriam diferenciar áreas com e
sem selo de boas práticas de um mesmo produtor. “As certificadoras têm que
aumentar o controle. A certificação não pode ser concedida se não englobar
todas as propriedades”, opina.
Existem
dois riscos associados à certificação de apenas parte de um área de um mesmo
grupo econômico, explica Drummond. A primeira é a lavagem do produto: quando a
colheita de uma área não certificada é misturada à da produção da área
certificada. O segundo risco é a divisão intencional, em diferentes pessoas
jurídicas, de fazendas com irregularidades trabalhistas daquelas com
certificação. “Todo o tipo de burla ou de fraude no sistema é muito bem
planejado e delineado”, avalia.
Drummond
afirma que a falta de participação de atores da sociedade civil no processo de
certificação dificulta o monitoramento de irregularidades em propriedades com
selos de boas práticas. “Se não vermos esse monitoramento, essa transparência e
esse processo mais participativo, é muito fácil que essa burla continue, porque
quem monitora não tem acesso às informações e não pode denunciar”, conclui.
Condições
de trabalho
As
vítimas resgatadas – quatro homens e três mulheres – haviam começado o trabalho
no dia 21 de junho de 2022. O grupo saiu de Caetanos, na Bahia, a 830 km de
Manhumirim.
Na
propriedade, os resgatados não receberam botas, luvas ou outros equipamentos de
segurança para trabalhar, segundo o relatório de fiscalização, ao qual a
Repórter Brasil teve acesso.
Como
não havia banheiros nos cafezais, os trabalhadores realizavam suas necessidades
fisiológicas no mato. O grupo tampouco dispunha de um abrigo para proteção
contra sol e chuva ou para realizar as refeições na lavoura.
No
alojamento, não havia onde armazenar os alimentos. O vaso sanitário não tinha
descarga. “A água era armazenada em uma caixa de amianto, suja e sem nenhum
laudo comprovando a sua potabilidade”, diz trecho do relatório.
Todos
trabalhavam na informalidade, sem o registro formal do contrato de trabalho.
• Posicionamentos sobre a Fazendas Klem e
a certificação
Manifestação
da Fazendas Klem Importação e Exportação de Café e Rainforest Alliance para a
reportagem "Empresa de café que entrou na Lista Suja teve certificação
renovada após flagrante."
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Fazendas Klem Importação e Exportação de Café
A
Fazendas Klem Importação e Exportação de Café vem, por meio desta, se
manifestar em relação à sua solicitação.
Com o
devido respeito, é importante esclarecer que a inclusão da empresa no cadastro
do Ministério do Trabalho e Emprego (a chamada “lista suja”) decorre de um
procedimento administrativo que ainda esta em discussão no âmbito do Poder
Judiciário, motivo pelo qual não há, até o momento, qualquer decisão transitada
em julgado que reconheça a prática de condição análoga à de escravo em nossas
propriedades.
O caso
em questão envolve sete trabalhadores de um grupo em torno de cem que exerciam
as mesmas atividades, nos mesmos locais, no mesmo período e com as mesmas
condições laborais à época. A empresa contesta formal e veemente a suposta
caracterização dos fatos narrados e ressalta que em nenhuma instância judicial
reconheceu, até o momento, qualquer irregularidade de natureza criminal contra
quaisquer de seus diversos colaboradores.
Sob a
ótica do ordenamento jurídico brasileiro, a presunção de inocência é um direito
fundamental previsto na Constituição Federal. Sendo assim, qualquer conclusão
definitiva sobre conduta ilícita exige o esgotamento de todas as instâncias e
garantias do devido processo legal, o que até o momento não ocorreu.
A
Fazendas Klem reitera que mantém rigoroso compromisso com a legalidade, a
dignidade do trabalho e o respeito às normas sociais, ambientais e de saúde e
segurança. Desde o episódio noticiado, a empresa vem colaborando com as
autoridades competentes, revisando processos internos e ampliando a
fiscalização sobre suas frentes de trabalho.
Por
fim, reforçamos que nossa postura é de total transparência e respeito à verdade
dos fatos, e seguimos à disposição para quaisquer outros esclarecimentos.
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Rainforest Alliance
O
desrespeito aos direitos trabalhistas nunca foi – e nunca será – tolerado pela
Rainforest Alliance. Todos os produtores certificados Rainforest Alliance devem
cumprir a lei trabalhista vigente, além de requisitos e regras específicas da
Norma de Agricultura Sustentável, de modo a oferecer um ambiente de trabalho
salubre para todos os trabalhadores, fixos ou temporários. Os produtores devem,
antes de cada auditoria regular, apresentar declarações sobre os processos
trabalhistas em andamento, que são utilizadas como indicadores de risco pelos
auditores independentes.
Além
disso, nosso time realiza frequentes consultas ao Cadastro de Empregadores que
tenham submetido trabalhadores a condições análogas à de escravo, conhecido
como Lista Suja do Ministério do Trabalho, e também conta com o apoio de partes
externas para nos mantermos atualizados sobre denúncias relevantes envolvendo
fazendas certificadas. O não cumprimento de direitos trabalhistas e/ou o uso de
trabalho análogo à escravidão é uma violação grave das regras de certificação
da Rainforest Alliance. Por esta razão, uma vez que o detentor de certificado
foi incluído na Lista Suja, o mesmo perde o certificado a partir da data de sua
inclusão neste cadastro.
Fonte:
Repórter Brasil
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