Os recados do Copom para justificar aumento
na Selic: incerteza nos EUA, real fraco e inflação persistente
O Comitê de Política
Monetária (Copom) decidiu nesta quarta-feira (6) subir a taxa básica de juros do país, a Selic, de 10,75% para
11,25% ao ano. O aumento de 0,50 ponto percentual
significa uma aceleração da sequência de altas, iniciada na reunião de
setembro.
O Banco Central
entende que é necessário adotar uma dose maior de juros para trazer a inflação
brasileira para a meta de 3%. O número estabelecido pelo Conselho Monetário
Nacional (CMN) pode oscilar em 1,5 p.p. para cima ou para baixo, de 1,5% a 4,5%
no ano.
Hoje, o Índice
Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), considerado a inflação oficial
do país, mostra que os preços subiram 4,42% na janela de 12 meses, próximo ao teto de tolerância da meta. E as projeções do BC
estão acima dos 3% tanto para 2025 como para 2026.
A persistência da
expectativa de inflação em patamar acima do centro da meta é chamada pelo
mercado financeira de "desancoragem". O BC condiciona os movimentos
de taxa de juros a depender do quanto será necessário para que os preços voltem
ao lugar — o centro da meta.
Por isso, no
comunicado divulgado nesta quarta, o Copom volta a citar a questão da
desancoragem como preocupação e motivo da alta dos juros, mas não se compromete
com a magnitude de novos aumentos no futuro.
A saída foi reforçar
que o balanço que faz dos riscos de alta ou de baixa está desequilibrado, com
mais chances de alta.
A atividade econômica
ainda potente no Brasil, o mercado de trabalho mais aquecido, e a falta de
resolução da questão das contas públicas — que afeta tanto os juros do país
como a inflação — foram questões ressaltadas pelo Copom no texto.
E, como notaram os
economistas ouvidos pelo g1, surgiu um tempero extra à incerteza na
economia global, em especial nos Estados
Unidos, após a vitória de Donald Trump nas eleições. Com promessas mais inflacionárias do novo presidente, o
Federal Reserve (Fed, o
banco central americano) pode ter mais dificuldade de baixar os juros por
lá.
"O ambiente
externo permanece desafiador, em função, principalmente, da conjuntura
econômica incerta nos Estados Unidos, o que suscita maiores dúvidas sobre os
ritmos da desaceleração, da desinflação e, consequentemente, sobre a postura do
Fed", diz o comitê.
<<<< O
Copom cita os seguintes aspectos como importantes para seu balanço de risco.
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Riscos de alta:
- (i) uma desancoragem das expectativas de inflação por
período mais prolongado;
- (ii) uma maior resiliência na inflação de serviços do que a
projetada em função de um hiato do produto mais apertado [quando a
atividade do país está muito próxima do que ela pode produzir, ainda sem
gerar inflação pela demanda]; e
- (iii) uma conjunção de políticas econômicas externa e
interna que tenham impacto inflacionário, por exemplo, por meio de uma
taxa de câmbio persistentemente mais depreciada.
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Riscos de baixa:
- (i) uma desaceleração da atividade econômica global mais
acentuada do que a projetada; e
- (ii) os impactos do aperto monetário sobre a desinflação
global se mostrarem mais fortes do que o esperado.
Sobre as contas
públicas — parte que o BC não tem ingerência, mas não deixou de citar — o
comitê diz que tem acompanhado "com atenção" como a dificuldade de o
governo federal garantir que vai cumprir a meta de déficit zero impactam a
política monetária e os ativos financeiros. (saiba mais também abaixo)
"A percepção dos
agentes econômicos sobre o cenário fiscal tem afetado, de forma relevante, os
preços de ativos e as expectativas dos agentes, especialmente o prêmio de risco
e a taxa de câmbio", diz o comunicado.
"O Comitê
reafirma que uma política fiscal crível e comprometida com a sustentabilidade
da dívida, com a apresentação e execução de medidas estruturais para o
orçamento fiscal, contribuirá para a ancoragem das expectativas de inflação e
para a redução dos prêmios de risco dos ativos financeiros, consequentemente
impactando a política monetária."
O Copom completa que o
cenário segue marcado por "resiliência na atividade, pressões no mercado
de trabalho, hiato do produto positivo, elevação das projeções de inflação e
expectativas desancoradas, o que demanda uma política monetária mais contracionista".
"Era importante o
BC manter essa dependência dos dados por causa da grande incerteza do cenário
com toda a questão relacionada à eleição dos Estados Unidos e a incerteza em
torno do pacote fiscal", avalia Natalie Victal, economista-chefe da SulAmérica
Investimentos.
"Nós temos visto
os ativos brasileiros bem estressados, com bastante prêmio de risco [maior
rentabilidade por conta do aumento de risco], e uma eventual percepção de
leniência com a inflação por parte do BC poderia piorar ainda mais essa
situação."
Para Helena Veronese,
economista-chefe da B.Side Investimentos, o comunicado do Copom e seu tom duro
veio para consolidar a necessidade de um anúncio de corte de gastos pelo
governo federal o quanto antes.
"A autoridade
monetária foi bastante clara ao passar o recado: sem um programa de corte de
gastos crível e de caráter estrutural, a política monetária deverá se manter
dura", diz a economista.
"Sem um bom
pacote fiscal, não haverá ancoragem das expectativas e convergência da dívida,
o que, em outras palavras, implica em uma política monetária ainda mais
apertada."
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Por que teremos novas altas da Selic?
Segundo economistas
consultados pelo g1, uma série de fatores tem influenciado a
percepção do mercado de que o Copom precisará adotar uma postura mais dura na
condução dos juros, subindo as taxas. Entre eles estão:
- A maior incerteza sobre as contas públicas do
país;
- A atividade econômica aquecida e a consequente pressão
inflacionária; e
- O cenário internacional, também mais incerto.
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Incerteza sobre as contas públicas do país
De acordo com os
especialistas, a dúvida sobre a capacidade do governo em cumprir com suas metas
fiscais é um dos principais fatores avaliados pelo mercado nos últimos meses.
“O fiscal é uma
estatística macroeconômica importante e que entra de forma indireta nas
expectativas de inflação”, explica o economista do ASA Leonardo Costa.
Recentemente, o
destaque das discussões econômicas tem sido a promessa feita pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, de que a equipe econômica apresentaria novas medidas de cortes
de gastos após as eleições municipais de 2024.
O ministro ainda não
detalhou as medidas nem indicou quando elas devem ser anunciadas. O governo
federal tem a meta de zerar o déficit público neste ano, e mercado espera que o
pacote que determine cortes entre R$ 50 bilhões e R$ 60 bilhões para cumprir a
promessa, segundo informou o blog do Valdo Cruz.
Segundo o
economista-sênior do Banco Inter André Valério, a expectativa em torno desse valor
leva em consideração o quanto seria necessário para que o governo conseguisse
cumprir com o que prometeu, sem derrubar o arcabouço fiscal, para este e para o
próximo ano.
“Se o governo vier com
um corte menor do que esse ou com medidas menos transparentes, pode ser que
eleve a percepção do mercado de que o arcabouço não será levado tão a sério”,
diz o economista.
O tema também tem sido
abordado de maneira frequente pelo próprio BC, como um fator de influência nas
decisões de política monetária.
Nas últimas semanas,
por exemplo, o presidente da instituição, Roberto Campos Neto, voltou a afirmar
que se o Brasil quiser ter juros estruturalmente mais baixos, precisará
apresentar medidas que sejam interpretadas como um choque fiscal positivo.
"Tem que ser algo
que produza uma mudança nas expectativas que seja grande o suficiente para
reverter o prêmio de risco, a expectativa de inflação e a curva longa de juros,
e isso alimentaria a função de reação [do BC] de maneira positiva", disse
ele, no final de outubro.
Para o estrategista de
macroeconomia do BTG
Pactual Portfolio Solutions Álvaro Frasson,
mais do que um valor específico de cortes de gastos, o mercado espera um “plano
de voo” por parte do governo, que indique um roteiro concreto e factível para
estabilizar a dívida pública.
“Não estou falando que
o mercado quer a estabilidade da dívida em relação ao PIB para hoje, mas o
mercado quer um plano de voo. Claro que um dos fatores para chegar a esse
cenário é um custo de refinanciamento mais baixo, mas esse custo não se baixa
com Selic, e sim com credibilidade do lado fiscal”, afirma.
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Economia aquecida e a pressão inflacionária
O forte desempenho
econômico do país ao longo nos últimos meses é outro fator observado pelo BC.
Dados do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) indicam que o Produto Interno Bruto (PIB) do país cresceu 1,4% no segundo trimestre deste ano, no 12º resultado positivo do indicador.
Somado a isso, a
Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) Contínua indicou na semana
passada que a taxa de desemprego do país estava em 6,4% em setembro, na segunda menor taxa de desocupação da série histórica.
“Há uma percepção de
que a economia está mais forte do que o esperado ou de que a desaceleração está
acontecendo bem aquém das expectativas. Tudo isso faz com que a projeção [de
inflação] do BC não alcance o centro da meta. Por isso, começamos um novo ajuste
[de alta de juros]”, afirma a economista-chefe da SulAmerica Investimentos, Natalie Victal.
Esse, no entanto, não
é o único fator de pressão inflacionária no país. Pontos como a forte alta do
dólar – que já acumula ganhos de mais de 20% no ano – e a pressão mencionada acima, das contas públicas,
também aumentam as expectativas de inflação e fazem com que o mercado projete
novas altas de juros à frente.
“Mas não é só a
política monetária que define qual o patamar da inflação, é a política
econômica como um todo. E são vários fatores. Temos a política monetária do BC,
a política fiscal do governo e a política setorial, por exemplo, que afetam
esse cenário”, explica Victal.
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Cenário internacional mais difícil
O que analistas têm
batido na tecla é de que o cenário internacional, da economia global, não é
favorável para os próximos meses. Com potências economias desacelerando,
inflação persistente no mundo todo e mercados de trabalho com taxas bastante
baixas, a expectativa é de que os juros globais permaneçam mais altos.
“É um cenário geral
difícil, que já estava dado. A resposta que se esperava era o resultado das
eleições americanas, para entender a intensidade da dinâmica de fortalecimento
do dólar, que atrapalha as economias emergentes. Com Kamala atrapalharia menos,
com Trump atrapalha mais”, diz o economista-chefe do banco BV, Roberto
Padovani.
A vitória de Trump
prevê maior protecionismo para a indústria americana, com elevação de tarifas
para produtos importados e possível encarecimento para a população, e renúncias
de receitas para baixar impostos.
Com produtos
importados mais caros e menos recursos entrando no caixa do governo, há um
aumento das preocupações com a capacidade de o país cumprir com o pagamento da
dívida norte-americana. Essas dúvidas também tendem a aumentar a exigência de
investidores por um prêmio maior, ou seja, juros mais altos.
Juros maiores (e por
mais tempo) nos Estados Unidos aumentam a rentabilidade dos títulos do Tesouro
norte-americano (as Treasuries), considerados os ativos financeiros mais
seguros do mundo. Assim, quem busca segurança e boa remuneração em
momentos turbulentos prioriza o investimento por lá e se afasta dos emergentes,
como o Brasil.
Com o fluxo de dólares
direcionado para os Estados Unidos, a taxa de câmbio tende a piorar por aqui,
piorando também a inflação local. “A agenda do ex-presidente Trump é vista como expansionista, o que pode trazer juros mais altos
no país e uma valorização do dólar ante o real”, diz Natalie Victal.
Como os dados ainda
são fortes, espera-se que o Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados
Unidos) deva diminuir o ritmo de cortes de juros. Hoje, as taxas estão entre
4,75% e 5% ao ano, depois de um corte de 0,50 ponto percentual.
As projeções para as
próximas reuniões, nesta semana e em dezembro, são de reduções de 0,25 p.p. Com
arrecadação menor e inflação pressionada, o Fed terá dificuldade de baixar
juros.
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“Estão cometendo um
crime contra o Brasil”, diz Cappelli sobre aumento da taxa de juros
O presidente da
Associação Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), Ricardo Cappelli,
criticou nesta quinta-feira (7) o aumento da taxa de juros de 10,75% para
11,25% após decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central.
Segundo Cappelli, a iniciativa do Copom vai frear a economia brasileira e
interromper a alta na criação de empregos, influenciando diretamente no bolso
dos brasileiros.
“A prestação daquilo
que você comprou ou daquilo que você está pensando em comprar no Natal vai
ficar ainda mais cara. O que eles querem é frear a economia, parar com a
criação de empregos. Eles estão cometendo um crime contra o Brasil. Eles
argumentam que o problema é que a dívida do Brasil é muito grande. Isso é uma
cascata. O Brasil tem, agora, a terceira taxa de juros mais alta do mundo. Mas
os países que têm taxa de juros menores que o Brasil tem uma dívida igual ou
menor que a dívida brasileira”, disse.
Cappelli também
criticou a pressão para que o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva
(PT) promova cortes em gastos sociais em tocar nos privilégios dos mais ricos.
“Eles querem que o governo do presidente Lula corte o BPC, corte o salário
mínimo, corte a aposentadoria, corte recursos da saúde e da educação, para que
eles, os banqueiros e rentistas parasitários, continuem recebendo centenas de
bilhões de reais do orçamento públicos. Precisamos enfrentá-los e trocar os
limites por ousadia para garantir o desenvolvimento do Brasil, a geração de
empregos e a justiça para o povo brasileiro”, defendeu.
¨
Aumento da Selic
preocupa os pequenos negócios, alerta Sebrae
Após reunião do Comitê
de Política Monetária (Copom), do Banco Central (BC), ocorrida nesta
quarta-feira (6), a taxa básica de juros (Selic) – atualmente em 10,75% ao ano
– subiu para 11,25% ao ano. "Mais uma vez, o Banco Central prejudica os
pequenos negócios com a taxa de juros, que ainda se apresenta como uma das
maiores do mundo. A situação dificulta ainda mais a tomada de crédito por parte
do segmento", argumenta o presidente do Sebrae Nacional, Décio Lima.
Uma dessas
alternativas é o programa Acredita, do governo federal, do qual o Sebrae
participa. Em outubro, a entidade e o Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social (BNDES) anunciaram a criação de um fundo garantidor que pode
alavancar mais de R$ 9,4 bilhões em crédito para microempreendedores e pequenos
empresários, somado ao acompanhamento do tomador por meio de suporte do Sebrae.
Além disso, no início do ano, a instituição disponibilizou R$ 2 bilhões por
meio do Fundo de Aval às Micro e Pequenas Empresas (Fampe), o que possibilitará
R$ 30 bilhões em crédito ao setor em três anos. Saiba mais
em sebrae.com.br/acredita.
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Pesquisa
De acordo com
levantamento do Sebrae, com base em dados do Banco Central, a taxa de juros em
empréstimo para um microempreendedor individual (MEI) fica, na média nacional,
mais que quatro vezes maior que a Selic e pode chegar, no caso dos MEI da
região Nordeste, ao nível de 51% ao ano. Segundo o estudo, a taxa média para os
microempreendedores individuais está atualmente em 44%. Já para as
microempresas, a média atual é de 42,49% e, para as empresas de pequeno porte
(EPP), fira em torno de 31,54%.
Quando os dados são
observados por regiões, a situação é ainda mais crítica. A região Nordeste
superou a média nacional e tem a taxa para o Microempreendedor individual (MEI)
em torno de 51% ao ano. A Região Norte está em segundo lugar, com uma taxa de 47,62%
ao ano, seguida pelo Sudeste (47,09%), Centro-Oeste (44,41%) e Sul (37,21%).
Fonte: g1/Brasil 247
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