O plano de Brasil e China que pode 'furar'
domínio da Starlink de Musk
Os governos do Brasil
e da China preparam um plano que, se implementado, pode ajudar a diminuir a
dominância que a empresa Starlink tem
sobre o serviço de internet via satélite no Brasil.
A Starlink pertence ao
bilionário Elon Musk. O plano prevê o
início das operações da empresa chinesa de satélites SpaceSail no Brasil, que
pretende operar no mercado brasileiro hoje liderado pela Starklink. A
informação foi confirmada à BBC News Brasil pelo secretário de telecomunicações
do Ministério das Comunicações, Hermano Barros Tercius.
A ideia, segundo
Tercius, é que Brasil e China assinem memorandos de entendimento sobre o
assunto durante a visita do presidente chinês, Xi Jinping, ao país, no dia 20
de novembro.
Ainda não há prazo, no
entanto, para que a companhia comece a operar no país. Procurada, a embaixada
da China não respondeu aos questionamentos enviados pela reportagem.
A assinatura dos
memorandos, se ocorrer, acontecerá pouco mais de dois meses depois do ápice
da crise entre Musk e autoridades brasileiras, a qual culminou, em
agosto, com a suspensão do X (antigo Twitter) no Brasil.
A SpaceSail é uma
empresa privada chinesa sediada em Xangai e atua no mercado de internet banda
larga provido por satélites de órbita baixa.
Atualmente, a
companhia conta com 18 satélites, mas seus planos incluem o lançamento de até
15 mil até 2030. A título de comparação, estima-se que a Starlink tenha 6 mil.
Conhecidos como LEO
(Low Earth Orbit), estes satélites são menores e formam verdadeiras
“constelações” ao redor da Terra. Eles ficam a uma distância de aproximadamente
549 km em relação à superfície terrestre, enquanto os convencionais ficariam a
quase 1.000 km.
Por estarem mais
próximos, o tempo para a transmissão de dados é menor, o que permite uma
internet mais rápida e confiável.
No Brasil, a Starlink
de Elon Musk é líder e detém 45,9% do mercado de internet via satélite, segundo
dados da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel).
Mas o agravamento das
tensões entre Musk e autoridades brasileiras levantou rumores sobre os
eventuais impactos da dependência do país em relação à empresa do bilionário.
- Contatos em meio à crise com Musk
Os contatos entre a
SpaceSail e o Brasil começaram oficialmente em meados de agosto. No dia 20
daquele mês, uma comitiva liderada pelo presidente da empresa, Jie Zheng,
reuniu-se com representantes do governo brasileiro, entre eles o
vice-presidente, Geraldo Alckmin.
Os planos da empresa,
apresentados à época, incluem entrar em operação no Brasil até 2025.
Para isso, no entanto,
a empresa precisa de autorizações junto à Anatel para que, entre outras coisas,
a companhia possa construir a infraestrutura em solo que permita que o sinal
dos seus satélites possam ser acessados no Brasil.
A SpaceSail
funcionaria de forma semelhante à Starlink e outros serviços de internet via
satélite. O usuário precisaria instalar uma pequena antena para conseguir
acessar a internet.
Segundo Hermano
Tercius, um dos memorandos de entendimento negociados entre Brasil e China
prevê a colaboração técnica necessária para que serviços como o da SpaceSail
possam entrar em funcionamento no país.
“A gente está
evoluindo nos textos e nas discussões pra gente ver se a gente assina [o
memorando]. Assim, ficaria uma intenção mais concreta de colaboração, que ainda
não é um compromisso. [O memorando] É uma intenção de colaborar com o que pode
estar faltando para eles [SpaceSail] anteciparem [a entrada em operação]”, diz
Tercius à BBC News Brasil.
Ele esteve na China em
outubro e se reuniu com representantes do governo chinês sobre o assunto.
O secretário afirmou
ainda que não está definido se o memorando vai envolver apenas os ministérios
de comunicações dos dois países ou se a SpaceSail e a Telebras, estatal
brasileira no setor de telecomunicações, também vão participar do documento.
Uma possibilidade é
que a Telebras, que já mantém contratos com o governo federal, possa utilizar
os serviços da SpaceSail para fornecer internet de banda larga a escolas ou
outras instalações de interesse do governo brasileiro.
Tercius disse não
saber se a crise envolvendo Elon Musk e o Supremo Tribunal Federal (STF)
tiveram influência nas negociações entre os dois governos. Segundo ele, a busca
por novos fornecedores de internet via satélite é uma tentativa do Brasil de
evitar a formação de "monopólios" no setor.
"A gente procura,
é lógico, evitar monopólios e ter essa competição para que saibamos quem presta
o melhor serviço e quem oferece um custo melhor para que a população tenha mais
acessibilidade a este tipo de serviço [...] Independentemente de como vai
evoluir a situação da Starlink, a gente espera que haja maior quantidade de
prestadores”, afirma o secretário.
O secretário disse
ainda que o governo brasileiro levou à China a proposta de que parte dos
lançamentos dos satélites da constelação da SpaceSail sejam feitos a partir do
Centro de Lançamento de Alcântara (CLA), no Maranhão.
“O que a gente tentou
foi ver com eles a possibilidade de, além deles prestarem serviço ao Brasil,
eles possam usar nossa base lançamento de foguetes para lançar os satélites
daqui [...] vai ser bom para eles porque pode agilizar o cronograma de funcionamento
deles, e para nós também é bom porque daria um melhor uso à base de Alcântara”,
diz Tercius.
Segundo ele, outro
memorando de entendimento que está sendo negociado com a China é sobre a
construção de um satélite geoestacionário para atender o Brasil.
De acordo com o
secretário, ainda não há definição sobre se este novo satélite atenderia apenas
às necessidades de comunicação ou se também poderia ser usado nos sistemas de
defesa brasileiro.
- Tensão e domínio
O ápice da crise entre
Musk e as autoridades brasileiras aconteceu no dia 30 de agosto, quando o STF
decidiu suspender as operações do X (antigo Twitter, que Musk comprou em 2022).
A suspensão do X no
Brasil foi determinada pelo ministro do STF Alexandre de Moraes após a
plataforma fechar seu escritório no Brasil, ficar sem representante legal no
país e se recusar a cumprir determinações da Corte relacionadas a inquéritos
que investigam milícias digitais.
Musk reagiu às
decisões do STF e fez diversas críticas diretas a Moraes. Segundo o bilionário,
as decisões seriam um atentado à liberdade de expressão.
A crise, porém,
espirrou em outro negócio de Musk: a rede de satélites de órbita baixa
Starlink. O STF chegou a determinar o bloqueio das contas da empresa no Brasil
depois que o X deixou de pagar multas aplicadas pela Corte.
Em 8 de outubro, o STF
autorizou o retorno do funcionamento do X no Brasil após a empresa, segundo a
Corte, atender às exigências feitas pelo tribunal.
A escalada da crise em
direção à Starlink, no entanto, levou a rumores de que a empresa poderia ter
seu funcionamento suspenso no Brasil, a exemplo do que aconteceu com o X. E
isso deixou setores da economia e até militares preocupados.
A Starlink é um braço
da SpaceX, a companhia de exploração espacial de Elon Musk.
A empresa fornece
serviços de internet por meio de uma enorme rede de satélites. No Brasil, ela é
frequentemente utilizada por pessoas e instituições que vivem em áreas remotas,
onde não há infraestrutura local como cabos e postes — caso de boa parte da Amazônia.
Especialistas no
assunto afirmam que a empresa tem hoje a maior constelação de satélites
operando no mundo e que é capaz de atender a pelo menos 37 países.
No Brasil, a ascensão
da empresa no mercado foi meteórica.
Em janeiro de 2023,
segundo a Anatel, a Starlink era a quinta principal provedora do mercado e
responsável por 4,7% do mercado de internet via satélite.
Um ano e meio depois,
em julho deste ano, a empresa já havia assumido a liderança com 45,9% de
participação no mercado.
Atualmente, além de
fornecer internet de banda larga para pessoas físicas em áreas isoladas, ela
também fornece conexão para embarcações da Marinha, instalações militares do
Exército e para plataformas e navios da Petrobras.
Apesar de Hermano
Tercius dizer que não sabe se a crise entre Musk e as autoridades brasileiras
influenciaram na decisão do governo de buscar novos fornecedores de internet
via satélite, no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o
bilionário não é visto com bons olhos.
Ao longo das eleições
presidenciais de 2022, Musk declarou apoio ao então presidente Jair Bolsonaro
(PL). Em meio à crise com o STF, ele acusou o ministro Alexandre de Moraes de
ter interferido no resultado das eleições vencidas por Lula.
Em agosto, Lula disse
que Musk precisava respeitar as leis brasileiras e que o Brasil não poderia ter
“complexo de vira-latas”.
“Ele tem que respeitar
a decisão da Suprema Corte Brasileira. Se quiser bem, se não quiser, paciência.
Se não for assim, esse país nunca será soberano, esse país não é um país que
tem uma sociedade com complexo de vira-lata. Porque o cara americano gritou e a
gente fica com medo. Não! Esse cara tem que aceitar as regras desse país”,
disse Lula em entrevista à Rádio MaisPB, da Paraíba.
Para o diretor de
tecnologia da empresa Sage Networks, Thiago Ayub, a liderança da Starlink se
deve à qualidade do serviço oferecido em comparação com seus atuais
competidores.
“Essa dominância da
Starlink se revela nos indicadores que observamos esse ano, como a de 90% das
cidades da Amazônia contendo clientes do serviço ou da preocupação revelada
pelas Forças Armadas do Brasil diante de uma possível suspensão do serviço
diante do atrito entre a empresa e o STF”, diz Ayub.
Ele avalia, porém, que
ampliar o número de fornecedores de internet via satélite pode ser bom para o
país.
“Ter múltiplos
fornecedores do mesmo produto é um indicador de saúde de qualquer mercado, mas
nesse em especial, por ser estratégico, é essencial que o Brasil consiga atrair
outros competidores da Starlink na categoria LEO para atender tanto o setor
público como o privado”, afirma.
Do ponto de vista
chinês, obter novos mercados para este setor é uma das prioridades do governo.
Em 2020, a Comissão Nacional de Desenvolvimento e Reforma da China, um dos
órgãos executivos mais importantes do país, elencou a criação de uma nova
infraestrutura de internet via satélite como um dos principais objetivos do
país no curto e médio prazos.
¨
Especialistas afirmam
que Musk e X são epicentro da desinformação eleitoral dos EUA
Para especialistas em
eleições e desinformação ouvidos pela mídia europeia, a plataforma X desempenha
um papel central em permitir a disseminação de informações falsas sobre os
estados críticos, que normalmente definem os resultados das eleições nos EUA.
De acordo com a
Reuters, alegações falsas ou enganosas do bilionário Elon Musk sobre a eleição
dos EUA acumularam dois bilhões de visualizações na plataforma de mídia social
X neste ano, de acordo com um relatório do grupo sem fins lucrativos Center for
Countering Digital Hate (Centro de Combate ao Ódio Digital).
Segundo especialistas
ouvidos pela apuração, a plataforma também está desempenhando um papel central
em permitir a disseminação de informações falsas sobre os estados críticos. A
plataforma se defende, argumentando que possui um recurso, o Community Notes
(Notas da Comunidade), que permite aos usuários adicionar contexto adicional às
postagens, possibilitando que as pessoas identifiquem conteúdo enganoso.
Musk restringiu a
moderação de conteúdo e demitiu milhares de funcionários desde que assumiu a
empresa, e seu apoio ao ex-presidente Donald Trump tem levantado questões sobre
o efeito que quase 203 milhões de seguidores pode ter no resultado da corrida eleitoral.
Para a professora de
ciência da computação na Carnegie Mellon University e especialista em
desinformação, Kathleen Carley, o alcance massivo e o "efeito de
rede" dos conteúdos do X podem saltar para outras mídias sociais e
plataformas de mensagens.
Pelo menos 87 das
postagens de Musk neste ano promoveram alegações sobre a eleição dos EUA que os
verificadores de fatos classificaram como falsas ou enganosas, acumulando 2
bilhões de visualizações, de acordo com o relatório do Center for Countering
Digital Hate.
A Cyabra, uma empresa
que usa IA para detectar desinformação on-line, disse na segunda-feira (4) que
uma conta no X com 117.000 seguidores desempenhou um papel fundamental em
ajudar a espalhar um vídeo falso que pretendia mostrar cédulas de votação pelo correio
da Pensilvânia para Trump sendo destruídas, e apesar de um porta-voz do X ter
dito que medidas contra as contas que compartilharam o vídeo, especialistas
afirmam que a velocidade de disseminação de desinformação é muito superior à de
reparação desse mesmo conteúdo.
Fonte: BBC News
Brasil/Sputnik Brasil/DW Brasil
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