As tarifas de Trump vão acelerar acordo
Mercosul-UE?
As
tensões comerciais entre os Estados Unidos e a União Europeia se
intensificaram nesta semana, depois que Bruxelas anunciou 26 bilhões de euros (R$ 164 bilhões)
em tarifas sobre
bens americanos, em resposta às sobretaxas de 25% implementadas por Washington
em importações de aço e alumínio.
Para
analistas ouvidos pela DW, a retórica dura do presidente dos EUA, Donald Trump, em relação ao comércio com os europeus gera
oportunidades aos brasileiros. A avaliação é de que uma guerra comercial pode
acelerar os próximos passos do acordo entre UE e Mercosul, que foi assinado no final do ano passado, mas ainda precisa
ser ratificado pelo Parlamento Europeu e os legislativos de cada país dos
blocos.
Em
publicação na rede social Truth Social nesta quinta-feira (13/03), Trump
chamou a UE de "uma das autoridades tarifárias mais hostis e
abusivas" do mundo e disse que o bloco foi criado com o propósito
primário de "tirar vantagem" da maior economia do planeta.
O
republicano também ameaçou aplicar tarifa de 200% sobre vinhos, champanhes e
bebidas alcoólicas vindas da França e de outros países europeus.
Comissária
de comércio da UE na época do primeiro governo Trump, Cecilia Malmstrom
reconheceu que o cenário representa um "conflito em escalada", mas
disse que uma guerra comercial não costumar ter vencedores.
"É
um jogo de perde-perde”, afirmou à DW, antes de acrescentar que o fardo mais
pesado das tensões tende a recair sobre consumidores, com consequências para
inflação, emprego e crescimento econômico.
·
Brasil
não deve retaliar imediatamente
No
Brasil, também afetado pelas tarifas sobre aço e alumínio, a ordem é
manter a cautela antes das negociações. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse a
jornalistas na quarta-feira que o governo brasileiro não pretende
retaliar imediatamente.
"Nós
já negociamos outras vezes em condições até muito mais desfavoráveis do que
essa. Vamos levar a consideração ao governo americano de que há um equívoco de
diagnóstico", ressaltou.
Uma
equipe técnica liderada pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio
e Serviços (MDIC) tem reunião marcada para esta sexta-feira (14/03) com
representantes da administração Trump. Será a primeira oportunidade de os
dois países discutirem as tarifas iniciadas nesta semana. O vice-presidente e
chefe da pasta, Geraldo Alckmin, porém, não participará do encontro.
Os
esforços refletem a posição do setor siderúrgico para a balança comercial
brasileira. Em 2024, o país exportou 3,2 bilhões de dólares em aço e alumínio
para os EUA, segundo o MDIC e o Ministério das Relações Exteriores.
Neste
ambiente, o tarifaço americano pode impor uma perda de 1,5 bilhão de dólares
aos exportadores de aço brasileiro em 2025, de acordo com estimativas do
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). O resultado equivale a uma
queda de produção de quase 700 mil toneladas no ano.
·
Urgência
por novos mercados
Os
riscos tendem a incentivar o país a buscar novos mercados e tornam mais urgente
o acordo do Mercosul com a UE, afirma o professor de direito internacional
Alberto do Amaral, da Universidade de São Paulo.
Em
2024, o Brasil exportou o equivalente a 48,27 bilhões de dólares para a UE,
conforme números da Secretaria de Comércio Exterior do MDIC. Os embarques
para os EUA, por sua vez, somaram 40,36 bilhões de dólares no ano passado.
"A
grande vantagem da celebração do tratado decorre precisamente do fato de que a
redução das exportações europeias e brasileiras para os EUA poderá ser compensada pelo aumento do
intercâmbio comercial entre os dois blocos", explica Amaral.
Para
ele, a economia brasileira seria particularmente beneficiada, sobretudo pelo
acesso a bens de capitais europeus, o que contribuiria para o aumento da
competitividade da indústria . "Os setores beneficiados seriam os de
comércio de bens de transporte, de celulose, papel, além de commodities e
produtos agrícolas", cita.
O
professor de relações Internacionais Vinicius Rodrigues Vieira, do Centro
Universitário Armando Alvares Penteado (FAAP), também avalia que o ambiente
atual é favorável ao pacto de livre-comércio. Na visão dele, a estagnação da indústria alemã e os crescentes gastos europeus em defesa reforçam a
necessidade de abertura de novos mercados consumidores como o Mercosul.
No
outro lado da moeda, Vieira pondera que a volta de Trump à Casa Branca também
pode influenciar a ascensão da ultradireita na Europa, mais resistente à liberalização
do comércio internacional. "A agenda dele pode levar, no médio prazo,
forças ao poder em países-chave, como a França, que acabariam por derrubar o
acordo de vez", alerta.
·
Acordo
UE-Mercosul ainda tem riscos
O
embaixador José Alfredo Graça Lima, que já atuou na Organização Mundial do
Comércio (OMC) e em negociações com a UE, é mais cético em relação ao acordo. O
diplomata considera que o comércio brasileiro com os EUA vem ganhando mais
força nos últimos anos, em detrimento das trocas com os europeus. "O
acordo tem seu valor, mas do ponto de vista de acesso a mercados, é
limitado", opina.
Graça
Lima entende que os trâmites de ratificação estão reproduzindo um comportamento observado em 2019,
quando os blocos chegaram a firmar um acordo. Desde o anúncio do final do ano
passado, poucos passos foram dados em direção à implementação. "Não é
possível que uma revisão jurídica demore três meses. Parece exagerado como
prazo", argumenta ele, que é conselheiro do Centro Brasileiro de
Relações Internacionais (Cebri).
Há um
particular movimento de oposição na França, onde o poderoso setor agropecuário teme a
concorrência com os produtos sul-americanos. No ano passado, o partido do
presidente Emmanuel Macron perdeu espaço na Assembleia Nacional em uma eleição
que resultou no avanço da ultradireita de Marine Le Pene também da esquerda mais radical.
Vieira,
da Faap, acredita que Macron evitará ceder a pauta para os grupos rivais. O
parlamento francês precisaria dar o aval aos pontos mais sensíveis do acordo,
como os compromissos referentes ao meio ambiente. "Não tem clima político,
até o próximo ciclo eleitoral, para aprovação do acordo na França",
afirma.
·
'Fator
Milei' também complica
Do
outro lado do Atlântico, a aproximação do presidente da Argentina, Javier Milei, com Trump também complica o processo. O
libertário já declarou estar disposto a retirar o país do Mercosul se
necessário para
o fechamento de um tratado com os EUA, alegando que a união aduaneira só serviu
para enriquecer industriais brasileiros.
Para o
embaixador Graça Lima, o movimento de Milei representa uma crise existencial
para a integração sul-americana. "No momento em que a Argentina assinar um
acordo ou se engajar em negociações comerciais com os EUA, o Mercosul se
descaracterizaria, porque deixaria de existir como União Aduaneira que se
obriga a concluir acordos conjuntamente entre os quatro países", explica.
¨
Câmara do Comércio dos
EUA alerta governo Trump sobre prejuízo com tarifas ao Brasil
O governo de Donald Trump foi alertado pela
Câmara Americana de Comércio (Amcham) sobre o risco de prejudicar o interesse
das próprias empresas dos Estados Unidos com a imposição de tarifas adicionais
ao Brasil. O alerta foi feito uma semana depois da reunião do vice-presidente
Geraldo Alckmin com representantes do Departamento de Comércio dos EUA.
Em documento enviado na última terça-feira,
11, a Amcham faz um apelo por diálogo entre os países. A entidade coloca na balança
que o Brasil foi responsável pelo terceiro maior superávit comercial dos
Estados Unidos com as economias do G20. E ressalta que o saldo positivo não se
limita ao comércio de bens.
“Impor tarifas adicionais sobre o comércio
bilateral prejudicaria os interesses de companhias dos EUA e enfraqueceria
fluxos recíprocos de comércio e de investimentos. Priorizar o diálogo
institucionalizado e estruturado continua sendo a abordagem mais efetiva para
avançar”, diz trecho do ofício, divulgado pela CNN.
Em serviços, segundo a Amcham, os Estados
Unidos acumulam superávit de US$ 165,4 bilhões com o Brasil no período de 2015
a 2024. O país representa o 12º maior mercado para as exortações americanas de
serviços (como tecnologia, produtos digitais e financeiros, turismo, companhias
aéreas).
Além disso, nos últimos dez anos,
subsidiárias instaladas no Brasil de multinacionais americanas enviaram aos
Estados Unidos um valor total de US$ 54,2 bilhões em lucros e dividendos.
¨
Tesla teme que tarifas
de Trump prejudiquem negócios
A
Tesla, montadora de carros elétricos do bilionário Elon Musk, reclamou
da política de tarifas de importação impostas pelo
governo de Donald Trump numa carta enviada a uma agência
federal do governo americano de fomento ao comércio exterior.
A
empresa afirma que ela e outros grandes exportadores correm o risco de
ser prejudicadas por medidas retaliatórias, o que pode aumentar
o custo de fabricação de carros no país.
A
mensagem foi enviada ao chefe do escritório do representante de comércio
dos Estados Unidos, Jamieson Greer. A
agência é responsável por desenvolver e promover políticas americanas de
comércio exterior.
No
texto, a Tesla, que também mantém fábricas na China e na Alemanha, diz
reconhecer e apoiar "a importância do comércio justo", mas que
"os exportadores americanos estão naturalmente expostos a impactos desproporcionais
quando outros países reagem às ações comerciais dos EUA".
A
montadora afirma estar fazendo mudanças em suas cadeias de suprimentos para
encontrar o maior número possível de fornecedores locais para seus carros e
baterias, mas adverte que "certas cadeias de suprimentos ainda estão em
estágios iniciais de desenvolvimento".
A
empresa sugere ainda estar preocupada com um impacto sobre as vendas da
montadora fora dos EUA. "Por exemplo, no passado, ações dos Estados
Unidos resultaram em reações imediatas pelos países visados, incluindo aumento
de tarifas sobre veículos elétricos importados por esses países."
O
documento foi enviado após uma sequência de políticas comerciais criticadas
pelo mercado devido a preocupações com uma potencial guerra comercial e pressão
inflacionária.
No
início de março, por exemplo, Trump implementou tarifas de 25% sobre
importações do México e do Canadá, utilizando o combate ao tráfico
de fentanil como
justificativa. Essa medida rompeu o tratado comercial entre os três países,
afetando cadeias de suprimentos.
Após a
província canadense de Ontário reagir com uma sobretaxa de 25% à
eletricidade que exporta para os EUA, Trump subiu para 50% das tarifas sobre
produtos de aço e alumínio vindos do Canadá. Ambos os lados recuaram das
medidas no início desta semana.
<<>
Queda nas vendas e vandalismo
Apesar
de não ser assinada, a carta da Tesla causou estranhamento por vir de uma
empresa comandada por um aliado de primeira hora de Trump e consultor para
os cortes de gastos em curso no seu
governo.
Não está claro se Musk estava a par do comunicado.
A carta
tem a data do dia em que Trump organizou um evento na Casa Branca no qual
prometeu comprar um Tesla, numa demonstração de apoio a Musk.
Não
está claro quem na Tesla escreveu a carta, pois ela não é assinada, ou se Musk
estava ciente dela.
O alinhamento do empresário com a
administração do republicano tem sido associado, contudo, à queda nas ações e nas vendas de
carros da companhia.
Uma onda de vandalismo contra carros, estações de recarga e concessionárias da
marca tem se alastrado, inclusive na Alemanha, onde Musk declarou apoio ao controverso partido de ultradireita Alternativa para Alemanha (AfD).
O preço das ações da Tesla caiu 40% desde o
início do ano. Musk é o presidente-executivo da montadora e, embora alguns
tenham argumentado que seu alinhamento com o governo Trump está prejudicando
sua marca, analistas de mercado dizem que a queda nas ações é mais sobre
preocupações com a Tesla atingir as metas de produção e uma queda nas vendas em
2024.
Na carta, a Tesla diz que faz mudanças em
suas cadeias de suprimentos para encontrar o máximo de fornecedores locais para
seus carros e baterias, para defender menos de mercados estrangeiros.
"Mesmo assim", alertou, "mesmo
com a localização agressiva da cadeia de suprimentos, certas peças e
componentes são difíceis ou impossíveis de obter dentro dos Estados
Unidos".
O presidente dos EUA impôs uma tarifa
adicional de 20% sobre todas as importações da China, levando Pequim a
responder com taxas retaliatórias, inclusive sobre carros. A China é o segundo
maior mercado da Tesla depois dos EUA.
"Por exemplo, ações comerciais
anteriores dos Estados Unidos resultaram em reações imediatas dos países-alvo,
incluindo tarifas aumentadas sobre veículos elétricos importados para esses
países", diz a carta.
A União Europeia e o Canadá ameaçaram
retaliações radicais por conta de novas tarifas sobre exportações de aço e
alumínio para os Estados Unidos, que entraram em vigor no início desta semana.
Manifestantes atacaram showrooms da Tesla nas
últimas semanas em protesto contra o cargo de responsável por cortes de custos
de Musk na administração de Trump, na qual ele é chefe do Departamento de
Eficiência Governamental (Doge).
No início desta semana, Trump organizou um
evento na Casa Branca onde disse que as pessoas que protestavam contra a Tesla
deveriam ser rotuladas como terroristas domésticos, enquanto estava sentado no
banco do motorista de um Tesla vermelho novinho que ele disse que planejava
comprar.
Trump disse que os manifestantes estavam
"prejudicando uma grande empresa americana" e qualquer um que usasse
violência contra a fabricante de carros elétricos "passaria pelo
inferno".
Fonte: DW Brasil/Portal Terra/BBC Brasil

Nenhum comentário:
Postar um comentário