segunda-feira, 24 de março de 2025

A casta ao resgate de Milei em seu pior momento, com as ruas presentes ao lado dos aposentados

A Câmara de Deputados argentina aprovou e blindou cegamente a autorização para que Milei avance em um novo acordo com o FMI, pressionado pela crise com os “mercados”. Nas ruas, milhares de pessoas se mobilizaram apesar da intimidação do governo e vem se somando experiências de luta. A Ministra da Segurança, Patricia Bullrich, vinha de uma grande derrota semana passada e não pode aplicar o seu Protocolo Antipiquetes. A CGT, novamente, ausente quase por completo e ajudando o governo.

Dentro da Câmara, a sessão foi um escândalo. Os governistas de Milei e a repressão lidaram desde as primeiras horas de quarta-feira com seu próprio desprestígio. Às cenas de briga entre as próprias fileiras do Liberdade Avança durante a semana passada somou-se, agora, um novo fator. Desta vez, o envolvido foi o próprio presidente da Câmara, Martín Menem. Os áudios que percorreram por todos os meios de comunicação destacavam sua voz dizendo: “Eu quero vocês gritando para mim e me xingando, nada de algo pacífico”. As orientações eram para os seus próprios deputados. Uma maravilha institucional.

Daí em diante, toda a sessão foi um exemplo da decadência atual do regime político argentino. A própria deputada Marcela Pagano, das fileiras da patética divisão interna libertária, denunciou haver sofrido uma ameaça de Martín Menem. Quando cortaram seu microfone, pegou um megafone de sua bolsa e continuou a agitação contra o presidente da Câmara.

Houve muitos outros confrontos. Porém, o mais importante era o que acontecia fora da Câmara. As mentiras de Patricia Bullrich caíram. O país inteiro viu que a polícia atirou no fotógrafo Pablo Grillo com a intenção de matá-lo. Também testemunharam que uma aposentada, com mais de 80 anos, foi agredida de forma brutal. Ou que os mais de 140 detidos foram obrigados a serem imediatamente soltos pois nenhum era um “torcedor organizado violento”. O escândalo não foi nacional, mas percorreu os meios de comunicação de todo o mundo.

Nesta situação, Bullrich, a ex-funcionária do Da Rua, de Macri e agora de Milei foi obrigada a mudar de política. Depois de sua derrota, ela mesma teve de mandar o bloqueio das ruas e a formação de um tosco plano operativo de intimidação com alto-falantes nas estações de trem, buscando intimidar os manifestantes para que não fossem à manifestação.

Essa operação repressiva ostensiva foi denunciada tanto dentro como fora do Congresso Nacional. Nicolás de Cano foi contudente: “Não se pode realizar sessões parlamentar com a militarização do Congresso Nacional”. Vanina Biasi, por sua vez, denunciou que “sem declarar Estado de Sítio, este Congresso está militarizado”. Christian Castillo, Alejandro Vilca e Mónica Schlotthauer completavam a bancada da Frente de Esquerda que, mais uma vez, foi a representação das ruas no parlamento, expressando o único espaço que por todo este tempo não deu nem um só voto aos planos de Milei. Myriam Bregman e tanto outros representantes, como sempre, também foram protagonistas da jornada nas ruas.

A casta atuou, como sempre, em sentido contrário. O governo Milei chegou a essa sessão em seu pior momento, encurralado não somente por seu desprestígio político diante do escândalo das criptomoedas, pelas mobilizações de primeiro de fevereiro, 8 de março e pela grande vontade de resistência a seus planos expressa na quarta-feira passada, como também questionado pela repressão e pressionad pelos “mercados”. O ministro Luis “Toto” Caputo não para de vender reservas que o Banco Central não tem e, além disso, anunciou um acordo com o FMI do qual pouco se sabe os detalhes. Nem valores, nem prazos, nem condicionalidades. Nos últimos dias, a volatilidade dos dólares paralelos expressou o nervosismo dos mercados diante da demora em fechar o acordo com o FMI.

Neste contexto, o governismo emitiu - de forma ilegal o DNU (Decreto de Necessidade e Urgência, como a Medida Provisória no Brasil) para dar a autorização a si próprio parar avançar no acordo com o FMI, e a Câmara de Deputados covalidou tal medida. Graças a um regulamento da época de Cristina Kirchner, tão pouco importa o que faça o Senado, dado que é necessário o rechaço de ambas as Câmaras para caia um decreto. Verdadeiros poderes de um monarca. O DNU foi blindado, se depender das instituições do regime argentino. Por isso, durante a votação no parlamento Myriam Bregman denunciou que “ sabem que o que estão fazendo será lembrado pelo povo. Os que levantaram a mão cometeram uma ilegalidade total”. Será preciso ver nos próximos dias como os ’mercados’ recebem esta mensagem e, principalmente, quando anunciarão o acordo com o FMI e em que condições será feito. Ainda não está claro se isso será suficiente para eliminar a incerteza desses dias.

Concretamente, a votação da casta para salvar o governo e os planos do FMI contou com 129 votos do Liberdade Avança, o PRO, radicais, a Coalizão Cívica , os governadores, Pichetto e um setor de uma bancada. Também houveram 5 ausentes do União pela Pátria, enquanto que muitos dirigentes do peronismo só enchem a boca de discursos de pura demagogia pensando na campanha eleitoral, sem se propor de forma alguma derrotar os planos de Milei.

Fora do parlamento, as ruas estão cada vez mais distantes da casta que ajuda Milei. Apesar das intimidações do governo e do medo que tentaram impor com a repressão da semana passada e as medidas de amedrontamento destes dias, foram milhares de pessoas que se mobilizaram para apoiar os aposentados, contra a repressão e contra o acordo com o FMI. Diferentemente da semana passada, os atos foram compostos por mais pessoas de organizações políticas, sociais, sindicatos e centros acadêmicos, e menos espontaneidade. Tiveram menos peso as torcidas organizadas. Mas os milhares que se mobilizaram contaram com o apoio de milhões que repudiam a fome imposta aos aposentados e a repressão.

É verdade. A jornada não foi suficientemente massiva e combativa seja para derrotar a aprovação do acordo com o FMI ou o fim da suspensão de benefícios que deixam com ainda mais fome os aposentados. Isso é responsabilidade, também, da condução da CGT (burocracia sindical da Argentina) que, mais uma vez, evitou convocar uma paralisação para que fosse uma jornada mais contundente de luta. Os principais contingentes, junto aos aposentados e estudantes organizados em suas entidades, os acompanharam as organizações de esquerda, também estatais e organizações sociais. Alguns poucos sindicatos da CGT foram apenas com os “corpos orgânicos”, sem paralisação nem nenhuma política séria para que a base participasse de forma massiva.

Os burocratas e a casta seguem poupando a vida de Milei em seu pior momento. Mas, se tensionam os músculos de uma crescente vontade de luta e se acumulam as experiências de organização e luta de dezenas ou centenas de milhares de pessoas. Deram nesta quarta-feira um respiro para Milei, contudo a instabilidade política e social está inscrita no horizonte e um novo acordo com o FMI - ainda que hoje não podemos dar um prognóstico dos ritmos - culminará, como sempre, em um desastre para as maiorias populares. Assim sempre foi, mas temos o tempo de evitar este cenário com a luta. Para as próximas semanas, estão sendo preparadas novas mobilizações em defesa dos aposentados, o 24 de março em um novo aniversário do golpe militar de 1976 e, se a CGT convocar finalmente uma paralisação nacional, estará colocado tomá-la desde as bases sem nenhuma confiança na burocracia, para que não seja uma medida isolada, e sim uma paralisação nacional ativa que tenha continuidade em um plano de luta rumo a greve geral para derrotar Milei, o FMI e os planos dos grandes empresários.

¨      Após ser proibida de entrar nos EUA, Cristina Kirchner responde com dureza a Trump e Milei

A ex-presidenta argentina Cristina Fernández de Kirchner criticou duramente Donald Trump e Javier Milei após o governo dos Estados Unidos oficializar a proibição de entrada no país para ela e seus filhos. A justificativa dada pelo Departamento de Estado norte-americano foi a suposta “participação em corrupção significativa”.

Cristina reagiu imediatamente, questionando a base da decisão e acusando Milei de estar por trás da medida. “Será por uma cripto fraude? Porque, sinceramente, nunca cometi nenhuma cripto fraude nos Estados Unidos nem em nenhum outro lugar. E minha filha, menos ainda”, escreveu em sua conta nas redes sociais. A menção faz referência ao escândalo da criptomoeda $Libra, com o qual Milei tem sido associado.

A ex-presidenta também aproveitou para lembrar os problemas judiciais de Donald Trump, destacando que o ex-presidente dos EUA foi condenado em 2023 por abuso sexual e difamação contra a escritora E. Jean Carroll. Em janeiro de 2024, Trump também foi considerado culpado por difamar uma jornalista.

Em tom irônico, Cristina questionou: “Será que meu filho abusou sexualmente de alguma jornalista ou escritora na loja mais cara de Nova York? Ou será que subornou alguma prostituta norte-americana para impedir que revelasse que ele havia contratado seus serviços porque isso o prejudicaria em sua campanha? Também não… Nenhuma das duas coisas.” A referência é ao caso da ex-atriz de filmes adultos Stormy Daniels, que afirmou ter recebido dinheiro do advogado de Trump para manter silêncio sobre um caso com o então candidato em 2016.

  • Críticas ao empréstimo do FMI

Cristina também atacou Trump por ter apoiado o empréstimo de 45 bilhões de dólares concedido pelo FMI ao então presidente Mauricio Macri em 2018. Para ela, o dinheiro teve como objetivo favorecer a tentativa de reeleição de Macri em 2019.

“Trump ainda não engoliu que seu amigo Mauricio Macri perdeu as eleições”, escreveu. E provocou: “E agora? Vão dar novamente 20 bilhões de dólares ao presidente da cripto fraude? Lembrem-se de que ele também não será reeleito.” Para ilustrar a inutilidade dessa estratégia, Cristina usou uma expressão popular: “No meu bairro chamam isso de gastar pólvora em chimangos.”

Ela alertou que a consequência dessas decisões recai sobre o povo argentino, que acaba arcando com os custos das políticas impostas por acordos com o FMI.

  • Resposta direta a Milei

Após a proibição, Javier Milei comemorou publicamente a decisão dos EUA. Cristina respondeu diretamente ao presidente argentino, chamando-o de “economista especialista em crescimento com ou sem dinheiro… e em cripto fraudes”. Acusou Milei de ter feito o pedido ao governo norte-americano e escreveu: “Como te dói o que eu digo, hein! Você não conseguiu se conter e correu para postar, deixando todos os seus dedos marcados de que foi um pedido seu.”

Ainda o acusou de não ter competência nem na política, nem na economia. “Você, sozinho, não tem combustível… Por isso recorre ao FMI e a Trump. FICA MUITO CLARO, MILEI!”

  • Convocação para o 24 de março

Cristina encerrou sua manifestação com uma convocação à mobilização popular. Relembrou que, mesmo durante a ditadura, figuras centrais da repressão como Jorge Rafael Videla e Emilio Massera nunca foram proibidas de entrar nos Estados Unidos.

“O 24 de março todos às ruas, porque nem Videla nem Massera foram proibidos de entrar nos EUA”, disse, em referência ao Dia Nacional da Memória, pela Verdade e pela Justiça, que marca o golpe militar de 1976 na Argentina.

A fala de Cristina reacendeu o debate sobre a seletividade das políticas externas norte-americanas e reforçou sua posição como voz de oposição a Milei e às alianças do atual governo com setores do conservadorismo internacional.

 

Fonte: Esquerda Diário/Pagina12

 

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