Racismo no futebol e o direito do trabalho
O racismo é uma chaga social que persiste em
diversas esferas da vida. No Brasil, a Constituição consagra o princípio da
igualdade, vedando qualquer forma de discriminação, incluindo a racial. Além
disso, a CLT e outras normas infraconstitucionais reforçam a proteção contra
práticas discriminatórias no ambiente de trabalho. No entanto, apesar desse
arcabouço legal, o racismo ainda se manifesta de forma velada ou explícita, exigindo
uma atuação firme do direito para coibir tais condutas.
No âmbito trabalhista, a discriminação racial
pode ocorrer de diversas formas, como em processos seletivos que excluem
candidatos com base em sua cor ou origem étnica, em diferenças salariais injustificadas,
no assédio moral com conotação racial ou na dificuldade de ascensão
profissional para grupos.
A Lei 12.288/2010, que instituiu o Estatuto
da Igualdade Racial, reforça a necessidade de políticas públicas e privadas
para a promoção da igualdade de oportunidades e a eliminação das desigualdades
raciais. No ambiente de trabalho, isso se traduz na obrigação das empresas de
adotarem práticas inclusivas e de combate à discriminação.
O Tribunal Superior do Trabalho (TST) tem
desempenhado um papel fundamental na interpretação e aplicação das normas que
combatem o racismo no trabalho. Em diversos julgados, o TST tem reconhecido a
gravidade da discriminação racial e estabelecido parâmetros para a
responsabilização dos empregadores.
Um exemplo emblemático é o entendimento de
que a prática de racismo no ambiente de trabalho configura dano moral,
independentemente da intenção do ofensor. Isso significa que, mesmo que o ato
discriminatório não seja intencional, a empresa pode ser responsabilizada por
falhas na prevenção e no tratamento adequado dessas situações. Além disso, o
TST tem reforçado a importância de políticas de diversidade e inclusão nas
empresas para prevenir condutas discriminatórias.
O empregador tem o dever de garantir um
ambiente de trabalho livre de discriminação e adotar medidas eficazes para
coibir práticas racistas. Isso inclui a implementação de códigos de conduta, a
realização de treinamentos sobre diversidade e a criação de canais de denúncia
seguros e confidenciais.
Em caso de omissão, a empresa pode ser
responsabilizada. A vítima de racismo no trabalho tem direito a indenização por
danos morais e materiais, além de poder requerer a rescisão indireta do
contrato de trabalho, caso a conduta discriminatória torne insuportável sua
permanência no emprego.
O racismo não se limita ao ambiente
corporativo tradicional; também se manifesta em outros contextos profissionais,
como no esporte. Um exemplo recente e emblemático é o caso do jogador Luighi,
do Palmeiras, que sofreu insultos racistas durante uma partida do Sub-20 da
Libertadores da América. O atleta foi alvo de cânticos discriminatórios por
parte da torcida adversária, que imitavam sons de macaco e proferiam ofensas
relacionadas à sua cor de pele.
O caso de Luighi não é isolado. Diversos jogadores
brasileiros, como Vinícius Júnior, Taison e Tinga, foram vítimas de racismo
tanto no Brasil quanto no exterior. Esses episódios evidenciam a necessidade de
uma atuação mais firme das entidades esportivas, dos clubes e das autoridades
para coibir tais práticas. Os atletas também são profissionais, e os clubes têm
a responsabilidade de garantir um ambiente de trabalho seguro e livre de
discriminação.
O clube tem papel crucial não apenas no apoio
ao atleta, mas também na exigência de investigação e punição dos agressores. A
responsabilidade do clube vai além da emissão de notas de repúdio; deve agir de
forma proativa, colaborando com as autoridades e as entidades esportivas para
identificar os responsáveis pelos atos racistas e garantir que sejam punidos
conforme a lei. A equipe pode e deve pressionar a Conmebol para que medidas
mais rigorosas sejam tomadas, como a aplicação de multas, a suspensão de
estádios ou, até, a desclassificação da equipe na competição.
Essa postura firme não só protege os direitos
do atleta, mas também envia uma mensagem clara de que o racismo não será
tolerado. A atuação do clube é fundamental para transformar o ambiente
esportivo em um espaço verdadeiramente inclusivo e respeitoso.
A luta contra o racismo é um dever de todos, e
o ambiente de trabalho e o esporte devem ser espaços de inclusão, respeito e
oportunidades iguais para todos, independentemente de sua cor ou origem étnica.
Casos como o de Luighi nos lembram que, enquanto o racismo persistir, o jogo
não estará ganho.
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Cresce o número de ações
trabalhistas por assédio sexual. Por Maria Eduarda Lavocat
Em 2024, o número de ações sobre assédio
sexual na Justiça do Trabalho atingiu um total de 8.612, representando um
aumento de 35% em relação aos 6.367 casos registrados em 2023. No entanto, esse
crescimento não deve ser visto apenas de forma negativa. O presidente do
Tribunal Superior do Trabalho (TST), ministro Aloysio Corrêa da Veiga, destaca
que esse aumento reflete a crescente disposição das mulheres em denunciar essa
forma de violência no ambiente de trabalho. "Denunciar é um passo
essencial para transformar essa realidade", afirma o ministro.
De acordo com a advogada especialista em
Direito Trabalhista do escritório Abe Advogados, Priscila Soeiro Moreira,
embora o aumento das ações trabalhistas relacionadas ao assédio sexual possa
sugerir um crescimento dessas condutas, ele está fortemente ligado a uma maior
conscientização e disposição das vítimas para denunciar comportamentos
abusivos.
"O crescimento das denúncias e ações
judiciais pode refletir tanto a maior visibilidade do problema e das
consequências do assédio quanto uma mudança no comportamento das vítimas, que
agora se sentem mais empoderadas para agir. Muitas delas passaram a denunciar
condutas que antes eram vistas como 'normais' ou 'toleráveis'", explica a
especialista.
Esse aumento é um indicativo, também, de que
as empresas precisam estar mais preparadas para enfrentar e prevenir essas
questões, que estão se mostrando cada vez mais atuais e sensíveis à sociedade
(a alteração trazida na NR 1, e que passará a valer a partir de maio, demonstra
essa preocupação). É crucial que as empresas invistam em treinamentos e que
preparem suas equipes e líderes para lidar com situações dessa natureza.
Já a advogada sênior da área trabalhista no
Lopes Muniz Advogados, Juliana Campão Pires Fernandes Roque, ressalta que esse
aumento também pode estar relacionado ao maior conhecimento dos direitos das
vítimas de assédio sexual no ambiente de trabalho. Segundo ela, o acesso à informação
tem estimulado cada vez mais pessoas a buscarem seus direitos.
"Muitas vezes, essas informações são
adquiridas dentro da própria empresa, por meio de políticas internas e canais
de denúncia. Além disso, a mídia tem desempenhado um papel importante ao
divulgar as diferentes formas de assédio sexual, contribuindo para
conscientizar e encorajar as vítimas a tomarem providências", pontua.
Juliana também afirma que o empenho da
Justiça do Trabalho em punir práticas que caracterizam o assédio sexual no ambiente
do trabalho também contribui no encorajamento das vítimas levarem os fatos para
os tribunais trabalhistas.
<><> Direitos
Priscila Soeiro Moreira explica que
trabalhadores vítimas de assédio sexual podem ajuizar uma reclamação
trabalhista, solicitando a condenação da empresa ao pagamento de indenização
por danos morais e materiais. Além disso, é possível denunciar o caso ao
Ministério Público do Trabalho (MPT), que conduzirá uma investigação. Caso
sejam identificadas irregularidades, o MPT pode propor um Termo de Ajustamento
de Conduta para que a empresa corrija a situação ou, em caso de recusa, ajuizar
uma Ação Civil Pública com pedido de indenização por danos morais coletivos.
Juliana complementa que o assédio sexual no
ambiente de trabalho é considerado falta grave do empregador, o que pode
justificar a rescisão indireta do contrato de trabalho por iniciativa da
vítima. "Para isso, é necessário que a vítima ingresse com uma ação
trabalhista requerendo a rescisão indireta do contrato, conforme previsto no
artigo 483 da CLT. Nesse caso, haverá o direito ao recebimento de todas as
verbas rescisórias, além da possibilidade de pleitear indenização por danos
morais", explica.
Além da esfera trabalhista, a vítima também
pode tomar medidas na esfera criminal para responsabilizar o agressor
legalmente.
<><> Maioria mulheres
A Justiça do Trabalho utiliza desde junho de
2020 uma ferramenta chamada Monitor de Trabalho Decente que utiliza
inteligência artificial para mapear sentenças, decisões e acórdãos proferidos
na primeira e na segunda instância. De acordo com os dados fornecidos pelo
monitor em sete de cada 10 processos envolvendo esse tema, a autoria da ação é
de pessoas do gênero feminino.
O assédio sexual no trabalho consiste em
qualquer comportamento de cunho sexual não desejado que cause constrangimento,
intimidação ou humilhação à vítima no ambiente profissional. Ele pode partir de
superiores, colegas ou terceiros.
Essa violência no ambiente profissional pode
se manifestar de diversas formas, como cantadas e comentários inapropriados,
propostas inadequadas ou chantagens que envolvem benefícios na carreira em
troca de favores sexuais. Envio de mensagens ou imagens de teor sexual sem
consentimento e olhares ou gestos invasivos que geram desconforto também são
considerados assédio.
O assédio pode ocorrer de maneira explícita,
quando há abordagens diretas, ou sutilmente, por meio de insinuações e piadas
de duplo sentido. Além de ferir os direitos da vítima, o assédio sexual no
ambiente de trabalho é crime no Brasil, previsto no artigo 216-A do Código
Penal, podendo levar à demissão por justa causa do agressor, além de processos
civis e trabalhistas.
<><> Número de novos casos na
Justiça do Trabalho envolvendo assédio sexual
2020: 5.446
2021: 6.854
2022: 5.771
2023: 6.367
2024: 8.612
Fonte: Por Rômulo Felipe Reis Miron, no
Correio Braziliense

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