Paulo
Henrique Arantes: Desde o A.I. 5, emparedar o Judiciário é arma da
extrema-direita brasileira
Ao direcionar ao Judiciário seu bombardeio
retórico, Jair Bolsonaro e seus débeis seguidores, os filhos entre eles,
repetem uma tática comum a ditaduras e entre potenciais ditadores. Quando
decidiu responsabilizar previamente as urnas eletrônicas pela derrota
eleitoral, foi no Tribunal Superior Eleitoral que Bolsonaro bateu. Para seu
azar, deu de cara com uma corte tecnicamente qualificada e a cara feia de
Alexandre de Moraes. Depois, denunciada a conspiração que pretendeu derrubar o
governo eleito, inclusive mediante três assassinatos, as armas bolsonaristas
continuam a apontar para a Justiça, agora o Supremo Tribunal Federal, mais
especificamente para a figura de Moraes, relator do caso e alvo de intensa
campanha destruidora de reputação.
O discurso patético de perseguição e
cerceamento de liberdades que bolsonaristas levam às ruas não gerará nada de
concreto em termos judiciais – só barulho e cortina de fumaça. A fuga de Eduardo
Bolsonaro para os Estados Unidos visa a encontrar, em outras terras, apoios de
gente que compartilha dos mesmos princípios, ou da mesma falta de princípios.
Lembre-se de que o filho zero-três, nos primeiros minutos do governo do pai,
disse que para fechar o STF bastavam um soldado e um cabo. Sempre foi essa a
vontade deles.
Nos Estados Unidos, bolsonaristas fujões
encontram sobretudo um presidente que compartilha de igual volúpia
anti-Justiça. O caráter imperial do governo americano não poderia ser mais claro.
Não existe imperialismo que se sujeite à lei. Trump ignorou ordens de juízes
federais que bloqueavam suas políticas, como a deportação de cidadãos
venezuelanos. Solicitou o impeachment de juízes federais, como no caso do
magistrado que bloqueou suas ordens de deportação. O presidente americano
atacou publicamente magistrados que emitiram decisões contrárias aos seus
interesses, como o juiz Arthur Engoron, responsável por um processo de fraude
fiscal contra ele, qualificando-o como "agente democrata" e afirmando
que o caso era uma "vergonha". As vias legais de contestação de
decisões judiciais não estão no repertório de Trump.
Se nos regimes democráticos em inflexão
autoritária o Poder Judiciário é o primeiro inimigo a ser abatido, ainda que
por meios aparentemente legais, nas ditaduras escancaradas é a primeira
instituição alvejada pela pena repressora. O Brasil do golpe de 1964 constitui
exemplo acabado. O Ato Institucional número 5 cuidou disso com denodo. Editado
em 13 de dezembro de 1968, o A.I.5 concedeu ao presidente da República poder de
cassar mandatos e aposentar compulsoriamente juízes, sem necessidade de
justificativa ou julgamento. Além disso, tornou as decisões do governo
inalcançáveis por qualquer revisão judicial, ou seja, qualquer ato baseado no
AI-5 não poderia ser contestado nos tribunais.
Donald Trump tem no A.I. 5 brasileiro uma
fonte de inspiração, se quiser. Já os Bolsonaros nunca disfarçaram seu apreço
àquela medida que tornou a vida dos brasileiros um inferno.
• "A
extrema direita quer o Senado para controlar o STF", alerta João Cezar de
Castro Rocha
No programa Boa Noite 247, o professor e
pesquisador João Cezar de Castro Rocha analisou o ato promovido por Jair
Bolsonaro em Copacabana, no dia 16 de março, e destacou os sinais de esgotamento
da mobilização bolsonarista. Além da baixa adesão ao evento, ele chamou a
atenção para a radicalização do discurso e a tática da extrema direita de
tentar pressionar o Supremo Tribunal Federal (STF). Para o pesquisador, há um
plano claro de poder: "A extrema direita quer o Senado para controlar o
Supremo. Esse é o verdadeiro projeto para 2026".
O evento, que havia sido anunciado como uma
grande demonstração de força, reuniu um público muito abaixo do esperado.
Bolsonaro, no entanto, seguiu com sua estratégia de ataque ao STF, reforçando
sua narrativa de vitimização dos envolvidos nos atos golpistas de 8 de janeiro
de 2023. Durante o discurso, ele pediu aos seus apoiadores: "Me deem 50%
da Câmara e 50% do Senado que eu mudo os destinos do Brasil".
<><> A derrocada da mobilização
bolsonarista
Castro Rocha apontou que o fracasso da
manifestação revela um enfraquecimento da capacidade de mobilização do
ex-presidente. "Quem vê flop não vê reação", ironizou, referindo-se
ao esvaziamento do ato. Segundo ele, a energia vista em eventos passados, como
as manifestações de setembro de 2021, já não se repetiu. "A Avenida
Atlântica já foi tomada por 14 ou 16 quarteirões de manifestantes. Desta vez,
havia apenas dois. O número é significativo, mas o mais importante é a mudança
na atmosfera: não há mais aquele fervor de ‘tudo ou nada’ pelo
Bolsonaro".Para ilustrar o cenário, ele mencionou a foto capturada pelo
fotojornalista Alexandre Cassiano, do jornal O Globo, que mostra uma bandeira
dos Estados Unidos sobreposta à do Brasil. "Esse detalhe reforça o que eu
chamo de 'patriotismo da terra alheia'. Muitos desses grupos bolsonaristas
idolatram símbolos estrangeiros enquanto atacam as instituições
nacionais", criticou.
<><> O aprisionamento ideológico
dos bolsonaristas
Outro tema abordado foi a recusa dos presos
do 8 de janeiro em aceitar acordos da Procuradoria-Geral da República (PGR),
que poderiam amenizar ou extinguir suas penas. Para Castro Rocha, isso
demonstra o grau de radicalização dessas pessoas. "É impressionante
imaginar que alguém abra mão do convívio com os filhos por radicalidade
ideológica", afirmou. "Esses indivíduos foram moldados pelo discurso
de Bolsonaro de tal forma que não conseguem enxergar a realidade. Eles negam
qualquer responsabilidade do ex-presidente nos atos que cometeram e repetem um
discurso robotizado", acrescentou.
Ele comparou a alienação dos bolsonaristas ao
conto O Alienista, de Machado de Assis. "Bolsonaro é o Simão Bacamarte
dessa tragédia política, aprisionando seus seguidores dentro de uma narrativa
que os mantém mais presos do que qualquer cela física", argumentou. O
pesquisador sugeriu, inclusive, que os detentos do 8 de janeiro lessem a obra
para refletirem sobre sua própria condição. "Quem sabe alguns teriam a
epifania de que foram usados e manipulados?".
<><> A criação do
"alexandrismo" e o ataque ao STF
Durante o ato, Flávio Bolsonaro acusou o ministro
Alexandre de Moraes de ser responsável pela morte de um dos detentos do 8 de
janeiro, alegando que a decisão judicial teria sido "deliberada" para
impedir que ele recebesse tratamento médico. A multidão respondeu com gritos de
"assassino" contra Moraes. Castro Rocha alertou para o perigo desse
discurso: "A extrema direita precisa construir inimigos para manter sua
base mobilizada. Agora, eles tentam transformar Moraes em símbolo de uma
suposta 'ditadura da toga'".
Além disso, destacou a criação do termo
"alexandrismo" para reforçar a narrativa de que há perseguição
política contra Bolsonaro e seus aliados. "Essa retórica serve para
justificar ações antidemocráticas e criar uma falsa necessidade de um
‘contragolpe’", analisou.
<><> A estratégia para 2026:
domínio sobre o Legislativo
Castro Rocha apontou que Bolsonaro já
sinalizou seu verdadeiro objetivo para as eleições de 2026: garantir maioria no
Congresso para controlar o Judiciário. "O que eles querem é subjugar o
STF, como Victor Orbán fez na Hungria. Uma vez que a Suprema Corte esteja sob
controle, não há mais barreiras institucionais para um governo
autocrático".
Ele ressaltou que essa tática já vem sendo
implementada pela extrema direita em várias instâncias do poder. "Eles
avançam ocupando conselhos tutelares, o Conselho Federal de Medicina e até a
OAB, que já tem sessões dominadas por bolsonaristas. Agora, o foco é o Senado,
pois é lá que se define a composição do STF".
Diante desse cenário, Castro Rocha defendeu
que o campo progressista não pode se concentrar apenas na disputa presidencial.
"Se Lula for reeleito, mas o Senado e a Câmara forem tomados pela extrema
direita, o governo ficará refém do Congresso. É fundamental eleger
parlamentares comprometidos com a democracia", alertou.
<><> O desafio: combater o caos
cognitivo
Para o pesquisador, a extrema direita
prospera no caos e, por isso, sua estratégia se baseia na produção constante de
desinformação. "Eles criam um ambiente onde fatos objetivos deixam de
importar. O bolsonarismo não sobrevive em um ambiente de normalidade, porque
precisa do caos para se sustentar".
Ele reforçou que a resposta ao bolsonarismo
não pode ser apenas reativa. "Temos que analisar o caos, mas sem permitir
que ele monopolize nosso imaginário. Precisamos retomar a normalidade e
reconstruir o compromisso com a verdade. Quando a mentira se torna a base da
política, a democracia entra em risco".
Castro Rocha concluiu sua análise com um
alerta: "A extrema direita perdeu força, mas segue sendo uma ameaça real.
Se não enfrentarmos esse projeto de poder com estratégia e seriedade, 2026 pode
ser um ponto de ruptura para a democracia brasileira".
• Ministros
do STF não descartam plano de fuga de Bolsonaro em andamento com Eduardo nos
EUA
Para ministros do Supremo Tribunal Federal
(STF) ouvidos, a ida de Eduardo Bolsonaro (PL-SP) para os Estados Unidos pode
trazer algo a mais nas entrelinhas do que a declarada narrativa de perseguição
política: a preparação para uma fuga do ex-presidente Jair Bolsonaro.
Esses ministros não descartam essa hipótese,
diante da inevitável condenação pela tentativa de golpe de Estado.
“É um cálculo político: possuem palco fora,
nos EUA, e podem preparar a fuga do pai, que vão chamar de exílio”, avalia um
ministro da corte.
Para integrantes do STF, o fracasso do
protesto em Copacabana, em que o apelo por anistia mostrou que não mobiliza as
massas, foi um divisor de águas na estratégia da família Bolsonaro.
De acordo com a investigação da Polícia
Federal (PF), Bolsonaro iria aguardar a tentativa de golpe morando nos EUA, no
final de 2022, como o blog revelou. Antes de viajar para lá, o ex-presidente
fez uma transferência de R$ 800 mil para os EUA, apontou a quebra de sigilo
bancário feita pela PF. Agora, se for condenado, ministros e investigadores não
descartam que ele possa investir nessa saída.
Aliados próximos do núcleo bolsonarista
afirmam que a decisão de Eduardo foi tomada por impulso e que até o pai foi
pego de surpresa, discordando da ideia.
Segundo fontes, a mudança de rota foi
improvisada por Eduardo após ele passar uma semana nos EUA. "Ele não tinha
nem roupa para esse período de mudança", relatou um aliado do núcleo.
Em conversa com o blog, aliados bolsonaristas
admitem que a ida do deputado -- agora licenciado -- também tem o objetivo de
tentar pressionar por medidas contra Alexandre de Moraes, que enfrenta questões
jurídicas nos Estados Unidos.
Eduardo Bolsonaro também temia perder o
passaporte, assim como o pai. Ele, assim como aliados, veem em Trump uma tábua
de salvação para a família. “Bolsonaro não tem saída jurídica. Só tem saída se
Trump se comover e decidir embarcar em alguma defesa política dele”, avalia um
dos mais próximos interlocutores político de Bolsonaro.
Em entrevista à revista Oeste na última
quarta-feira (19), Bolsonaro afirma que não irá sair do país. "A imprensa
especulando agora que vou fugir para a Embaixada dos Estados Unidos, não vou
fugir, não vou sair do Brasil", afirma o ex-presidente.
Fonte: Brasil 247/g1

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