sexta-feira, 21 de março de 2025

O Genocídio impune contra os palestinos continua

O massacre perpetrado terça-feira por Benjamin Netanyahu em Gaza é apenas a primeira gota de um programa, reiterado diversas vezes, de aniquilação do povo palestino. Também se enquadra no plano global de deportação idealizado por Donald Trump para limpar etnicamente Gaza e tomar seu território e litoral, facilitando assim o imperialismo agressivo dos EUA. Esse objetivo predatório inevitavelmente se estenderá à colonização total da Cisjordânia. Desde o início do conflito, novos colonos aparecem todos os dias em busca das terras dos palestinos sitiados: o jogo da especulação sobre o sangue palestino derramado impunemente é servido a quem der mais, e não espera. Projetos imobiliários de “reconstrução” israelenses já estão à espreita na Gaza destruída. Enquanto isso, os olhos do mundo estão voltados para a Ucrânia, que em breve será dividida para atender aos interesses da nova aliança Trump-Vladimir Putin.

A violação do desconfortável cessar-fogo que Netanyahu assinou sob os auspícios do então presidente dos EUA, Joe Biden, foi incentivada por Trump para finalmente acabar com a devastação de Gaza. E não há ninguém, pelo menos na Europa e no Oriente Médio, capaz de se opor aos desígnios imperialistas do líder americano. As três grandes potências — França, Reino Unido e Alemanha — continuam letárgicas, empregando uma retórica de indignação comedida que mal esconde seu histórico antiarabismo e islamofobia.

A culpa eterna dos europeus pelo Holocausto contra os judeus no século XX está sendo paga hoje com os corpos dilacerados dos palestinos, que choram em seus túmulos como os judeus exterminados pelos nazistas. A Europa demonstra, mais uma vez, sua covardia e cumplicidade no genocídio do povo palestino. Agora que a única voz honrada e digna que falou em nome da União Europeia, Josep Borrell, já não está presente, os líderes das instituições comunitárias preferem sussurrar paráfrases de condenação para não apontar o dedo aos culpados: “A violência deve parar… Todos os reféns devem ser libertados… A ajuda humanitária deve ser reposta…”. Diante do massacre de mais de 400 pessoas inocentes nos bombardeios israelenses, a Europa continua a demonstrar seus padrões duplos.

Por outro lado, não é nenhum mistério histórico entender como uma sociedade supostamente democrática como Israel, que carrega em seus genes desde o nascimento o culto à memória da opressão e do genocídio, colocaria nas mãos de seus líderes legitimamente eleitos o planejamento e a prática, em larga escala, do massacre de seus vizinhos. Lembre-se da lenda de Kurtz, o herói filantrópico de O Coração das Trevas, de Joseph Conrad, que, gritando "horror, horror!", condenou os africanos mártires ao horror da mais absoluta e cruel dominação. Até 1967, Israel vivia em um estado permanente de medo e ameaça. Desde sua vitória naquele conflito, tornou-se uma potência dominante no Oriente Médio, equipada com armas nucleares e armas de destruição em massa, e hoje personifica a arrogância da força pura e do ódio contra seu meio ambiente. Ilustrativo disso é o convite estendido por Isaac Herzog, chefe do Estado israelense, a Jordan Bardella, líder do partido francês de extrema direita de Marine Le Pen, para visitar Israel neste mês. Bardella despertou entusiasmo quando começou a gritar slogans de ódio contra árabes e muçulmanos.

No entanto, esta não é uma evolução natural, mas, como muitos historiadores e sociólogos israelenses apontaram, o resultado de uma construção mental desenvolvida por partidos de extrema direita aliados a fundamentalistas religiosos fanáticos ao longo dos últimos 25 anos de governo. Por isso, ele encontrou um ponto de fusão ideológico ideal com Trump, que quer fazer da força a única regra das relações internacionais.

A tragédia sofrida pelo povo palestino não decorre apenas da crueldade indizível do poder israelense. É também o resultado do fracasso histórico dos seus próprios movimentos, organizações e aparelhos de gestão administrativa. A Autoridade Palestina se tornou uma organização corrupta na qual poucos confiam, apesar de ser apoiada por regimes árabes, e o fundamentalismo armado do Hamas também não conseguiu oferecer uma alternativa realista. Para combater o plano global de extermínio idealizado por Trump e Netanyahu, os estados árabes apresentaram neste mês um plano de paz viável que propõe reconstruir Gaza com seu apoio e pede a eliminação do Hamas, o controle da Autoridade Palestina e, mais importante e inovador, a criação de uma força internacional de manutenção da paz da ONU entre Israel e Gaza. É a última chance para palestinos e israelenses que defendem a paz na região. Se falhar, o caos de uma guerra global será inevitável, pois o povo palestino não aceitará sua aniquilação sem lutar até a última gota de sangue. Porque entre Israel e Palestina, genocídio não é uma opção.

¨      Sob intensos bombardeios, tropas de Israel invadem Gaza e ordenam novos deslocamentos forçados

Após novos bombardeios na noite de terça para quarta-feira, o Exército israelense anunciou que iniciou operações terrestres no centro e sul da Faixa de Gaza, onde matou 436 pessoas em menos de 48 horas. Na tarde desta quarta-feira, 14 palestinos morreram em um bombardeio contra um velório no bairro de Al Sultan, em Beit Lahia, no norte do enclave, segundo informaram alguns jornalistas gazatianos. Mais de 70 palestinos morreram na segunda noite de bombardeios, de quarta para quinta-feira, de acordo com fontes de saúde em Gaza citadas pela Reuters.

Em um comunicado, as Forças de Defesa de Israel (FDI) afirmaram que buscam "expandir a zona de segurança" e "criar uma zona de contenção parcial entre o norte e o sul de Gaza". Dessa forma, as tropas voltam a estar presentes no interior da Faixa, de onde haviam se retirado para o perímetro durante a primeira fase do acordo de cessar-fogo com o Hamas, entre 19 de janeiro e 1º de março. Essa trégua colapsou depois que Israel lançou intensos bombardeios na noite de segunda para terça-feira, matando pelo menos 400 pessoas, das quais 183 eram menores, segundo o Ministério da Saúde de Gaza.

Além disso, as FDI afirmaram que continuaram atacando “dezenas de alvos terroristas e terroristas em toda a Faixa de Gaza”. Até o meio-dia desta quarta-feira, pelo menos 30 pessoas morreram, segundo o Ministério. Além disso, há mais de 670 feridos no total em dois dias de bombardeios.

Entre os mortos nesta quarta-feira está um funcionário do Escritório das Nações Unidas para Serviços de Projetos (UNOPS), conforme anunciou de Bruxelas seu diretor, Jorge Moreira da Silva. O trabalhador – cuja nacionalidade não foi revelada – morreu em uma explosão, e outros cinco ficaram feridos, alguns em estado grave, segundo Moreira da Silva, que não responsabilizou Israel pelo ocorrido. Fontes palestinas apontaram diretamente para um ataque israelense contra o edifício da UNOPS onde estavam as vítimas.

De acordo com Moreira da Silva, “uma munição explosiva foi lançada ou disparada contra a infraestrutura e detonou dentro do edifício” em Deir al Balah, que abriga não apenas as instalações da UNOPS, mas também uma residência para trabalhadores de todas as agências das Nações Unidas. Em declarações à imprensa, ele acrescentou que não se sabe que tipo de munição foi utilizada, se projéteis de lançamento aéreo, de artilharia ou foguetes.

"Na minha opinião, isso não pode ser classificado como um acidente, mas pelo menos como um incidente. O que está acontecendo em Gaza é inadmissível", afirmou. "Estou chocado e devastado por essa trágica notícia. Vi a dedicação absoluta de nossa equipe em Gaza no mês passado [durante uma visita à Faixa]. Eles e outros trabalhadores e edifícios da ONU nunca deveriam ser atacados."

Moreira da Silva destacou que as instalações são "bem conhecidas" pelo Exército israelense e que "todo mundo sabia quem estava trabalhando nelas, que eram funcionários da UNOPS". Ele também detalhou que o complexo das Nações Unidas fica isolado de outras construções, em uma área conhecida de Deir al Balah, e que foi atacado nos últimos dois dias.

Anteriormente, o Ministério da Saúde de Gaza havia informado que cinco trabalhadores estrangeiros da ONU ficaram feridos e um morreu no bombardeio contra a sede onde estavam, no centro da Faixa. Segundo fontes do Ministério gazatiano, citadas pela Agência EFE, o prédio atacado é uma residência para funcionários estrangeiros da UNOPS localizada no centro de Gaza.

Por sua vez, as Forças de Defesa de Israel (FDI) negaram ter atacado um prédio da ONU. "Ao contrário das informações [da imprensa], as FDI não atacaram um complexo da ONU em Deir al Balah", afirmaram em um breve comunicado, pedindo aos meios de comunicação que "ajam com cautela".

No início da manhã desta quarta-feira, o Exército israelense emitiu novas ordens de evacuação para os moradores de várias áreas da Faixa, especialmente as fronteiriças com Israel, ao longo de todo o perímetro do enclave. O ministro da Defesa, Israel Katz, publicou um vídeo nas redes sociais alertando os gazatianos de que "as evacuações das zonas de combate recomeçarão em breve". Ele também advertiu que o que virá depois dos ataques aéreos será "muito pior" e que eles "pagarão o preço" pelo Hamas.

Os gazatianos são novamente obrigados a se deslocar diante da ofensiva israelense, embora não haja nenhum lugar dentro da Faixa sitiada onde estejam seguros. Com o retorno das tropas terrestres ao interior de Gaza, a liberdade de movimento de seus habitantes será limitada, assim como ocorreu nos meses anteriores à entrada em vigor do cessar-fogo, em 19 de janeiro. Até o início da trégua, mais de 48.500 palestinos haviam morrido.

¨      Israel bombardeia a trégua e o mundo se cala, alerta Tonio Dell’Olio

Gostaria de escrever sobre qualquer outra coisa esta manhã. Gostaria de abrir a janela da esperança para respirar a novidade da dádiva da paz plenamente acolhida. Mas, ao contrário, dessa mesma janela chegam os gritos desesperados de mães e pais que viram seus filhos serem mortos pelas bombas em Gaza.

Israel bombardeou a trégua. Não dá mais para aguentar. Eles não aguentam mais. E percebo que não consigo compreender plenamente o que significa estar constantemente entre a vida e a morte, sujeito ao cálculo ou ao humor de alguém que decide no lugar de Deus. Tampouco pode haver uma explicação para uma civilização como a nossa, que assiste impotente e inerme a esse suplício de dignidade pisoteada, de vidas ceifadas, de destruição e morte.

Deve haver uma saída! Não é possível se resignar à idolatria do simulacro de soberania nacional absolutamente inviolável mesmo quando adota a violência em ampla escala. Não podemos continuar a ser espectadores ou nos entregar como reféns a essa lógica. Que haja uma sacudida de dignidade do mundo inteiro. Os corpos daquelas crianças embrulhados em um lençol branco nos ordenam para ter esperança em um novo mundo, uma nova ordem mundial.

¨      A trégua acabou, assim como a dissuasão da propaganda. Por Davide Assael

fim da trégua entre Israel e o Hamas era anunciado desde o início, já que nenhum dos pontos que separavam os dois lados havia sido minimamente resolvido. Uma conclusão que também revela a capacidade de dissuasão do trumpismo. Falando francamente, não surpreende ninguém o fim da trégua entre Israel e o Hamas que, bem ou mal, estava em vigor desde 16 de janeiro. Os termos do acordo, que afinal nem acordo era, não abordavam nem uma metade dos pontos que dividiam os dois lados.

A trégua sempre pareceu mais uma manobra tática em vista da troca de presidência na Casa Branca, mas estava claro que, por um lado, o Hamas só poderia continuar com a entrega de reféns até certo ponto, já que eles são o único instrumento que resta em suas mãos para negociar alguma forma de sobrevivência política e, vamos ser sinceros, não apenas isso. Tendo a inteligência israelense já dado provas nos últimos meses que pode alcançar seus inimigos onde quer que eles estejam e a qualquer momento.

<><> Luta contra todos

Por outro lado, o primeiro-ministro israelense Netanyahu, empenhado em manter unida a única coalizão que o sustenta em sua árdua luta contra todos, exatamente, todos os outros poderes do Estado. Um confronto que se agravou com os dois últimos episódios da eleição do novo presidente da Suprema Corte, Izhak Amit, nunca reconhecido pelo ministro da Justiça, bem como apoiador de Bibi da primeira hora, Yariv Levin (algo digno de guerra civil) e, notícia recentíssima, com a demissão do chefe do Shin Bet, Ronen Bar, que parecia prestes a tornar público um documento destacando as tentativas dos serviços internos na noite de 6 para 7 de outubro de 2023 de avisar, certo que tardiamente como admitiu pelo próprio Bar inúmeras vezes, o que estava sendo preparado naquele dia fatídico em que em Israel se celebrava o feriado de Simchàt Torah, que encerra o longo ciclo festivo no início do ano.

Se a defecção que se seguiu à aceitação da trégua pelo partido Otzmà Yehudìt (Poder Judaico), liderado por Itamar Ben Gvir, respondia mais à lógicas de distinção e posicionamento político do que o HaTzionut HaDatìt (Sionismo Religioso) do amigo-rival Bezalel Smotrich, a saída deste último, que jamais teria aceitado alguma forma de acordo que previsse algo diferente de uma Gaza ocupada, teria decretado a queda do governo e o fim de qualquer escudo político para o premiê, que, como sabemos, está cercado de processos, que não pararam nem mesmo neste ano e meio de guerra.

Depois de um breve período inicial, a trégua logo se transformou no habitual jogo de empurra-empurra, com o qual os dois lados queriam atribuir ao outro a responsabilidade pela mais que anunciada retomada das hostilidades. Ora, o roteiro de praxe alimentado pela era das redes sociais já foi ativado, de forma que cada lado das torcidas culpa o outro pelo que aconteceu.

<><> A contagem de mortos

Tudo sempre igual, com os tons habituais: de um lado, a contagem de mortos muito precisa do Hamas, que, dependendo das exigências políticas do momento, se apresenta como incapaz de atender às necessidades básicas de seus cidadãos ou como uma organização forte com Kalashnikovs à mostra; do outro lado, o costumeiro argumento dos civis usados como escudo, dos árabes dispostos a sacrificar seus filhos em oposição à cultura ocidental que, em vez disso, colocaria a sacralidade da vida no centro, e assim por diante.

Não se contam o número de entrevistas nos últimos meses em que Netanyahu, o homem que renegou a doutrina de guerra israelense que sempre foi orientada para o resgate dos reféns a qualquer custo, saiu-se com a frase feita: para nós, cada morte de civil é uma tragédia, para o Hamas é uma estratégia.

Falsificações, estereótipos, simplificações. Em uma palavra, propaganda de guerra.

<><> Nota sobre o trumpismo

Por trás da propaganda, o nada. Nenhum plano, como os próprios russos perceberam em outros cenários, nem mesmo qualquer capacidade de pressionar os aliados, já que essa fantasmagórica proposta árabe sobre o futuro da Faixa nunca chegou.

Tanto faz, amanhã Trump separará outra, depois outra ainda, acrescentando caos ao caos já existente. Com quem contar? Com o único lado que tem alguma margem de manobra, já que o outro é realmente abandonado e governado por um clã mafioso envolto em insígnias medievais.

Gostaria de encerrar com as palavras do federador da esquerda israelense, Yair Golan: “Não se deve permitir que a loucura vença. O protesto deve explodir com raiva para salvar os reféns, os soldados e o Estado de Israel das mãos desse homem corrupto e perigoso”.

E, eu acrescentaria, para salvar as vítimas palestinas das bombas israelenses e da loucura espelhada do Hamas.

 

Fonte: IHU

 

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