Lula propõe ao Congresso dar isenção de
Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT)
enviou ao Congresso nesta terça-feira (18) o projeto de lei que dá isenção do
Imposto de Renda das Pessoas Físicas (IRPF) para quem ganha até R$ 5 mil por
mês e prevê desconto parcial para quem ganha entre R$ 5 mil e R$ 7 mil mensais,
o que reduzirá o valor a ser pago. As medidas, se aprovadas, valem a partir de
2026.
Ainda este ano, o governo quer aumentar para
R$ 3.036 (dois salários mínimos) a faixa de isenção do IR, que atualmente está
em R$ 2.824. A mudança também precisa passar pelo Congresso.
No caso da isenção, se aprovada, cerca de 10
milhões de contribuintes devem deixar de pagar IR a partir de 2026.
🔎Veja o que deve mudar:
• Renda
mensal de R$ 5 mil: desconto de 100%. O imposto a pagar, sem desconto, seria de
R$ 312. Com o desconto, o pagamento é zero.
• Renda
mensal de R$ 5,5 mil: desconto de 75%. O imposto a pagar, sem desconto, seria
de R$ 436,79. Com o desconto, R$ 203,13.
• Renda
mensal de R$ 6 mil: desconto de 50%. O imposto a pagar, sem desconto, seria de
R$ 574,29. Com o desconto, R$ 417,85.
• Renda
mensal de R$ 6,5 mil: desconto de 25%. O imposto a pagar, sem desconto, seria
de R$ 711,79. Com o desconto, R$ 633,57.
• Renda
mensal de R$ 7 mil: desconto de zero. O imposto a pagar, sem desconto, seria de
R$ 849,29. Nessa faixa de renda, esse valor terá de ser pago na íntegra.
🔎E quem ganha mais de R$ 7 mil?
Pela proposta do governo, quem está entre os
R$ 7 mil e os R$ 50 mil mensais continuará seguindo a tabela do Imposto de
Renda nos moldes atuais.
Ou seja, não terá direito aos novos
benefícios – mas também não será alvo da taxação adicional.
O texto do governo não altera os valores
atuais da tabela do IR. Apenas prevê que a faixa de isenção volte a ser de dois
salários mínimos ainda este ano.
🔎Mudança para os super-ricos
Para compensar a perda de arrecadação,
estimada em R$ 27 bilhões em 2026, a proposta prevê taxar quem ganha mais de R$
50 mil por mês, o equivalente a R$ 600 mil por ano. A alíquota será gradual até
10% para quem ganha R$ 1,2 milhão ou mais por ano.
O valor inclui salário, aluguéis, dividendos
de empresas pagos a acionistas e outros rendimentos.
E exclui do cálculo poupança, títulos
isentos, herança, aposentadoria, pensão de moléstia grave, venda de bens,
outros rendimentos mobiliários isentos, indenizações.
A proposta de aumentar impostos dos
super-ricos sofre resistência de parlamentares.
🪜A tributação será em "escadinha":
• Renda
anual entre R$ 600 mil e R$ 750 mil: alíquota de 2,5%, imposto mínimo a pagar
de R$ 18.750
• Renda
anual entre R$ 750 mil e R$ 900 mil: alíquota de 5%; imposto mínimo a pagar de
R$ 45 mil
• Renda
anual entre R$ 900 mil e R$ 1,05 milhão: alíquota de 7,5%, imposto mínimo a
pagar de R$ 78,75 mil
• Renda
anual entre R$ 1,05 milhão e R$ 1,2 milhão: alíquota de 10%, imposto mínimo a
pagar de R$ 120 mil
🔎De olho na classe média
O aumento da isenção do IR, que beneficia a
classe média, é uma aposta do governo para tentar melhorar a popularidade do
presidente Lula.
O presidente assinou o texto na solenidade e
entregou, simbolicamente, ao presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB)
– por onde o projeto deve começar a tramitar.
Ministros e líderes do governo também
participaram do evento. Esperado no ato, o presidente do Senado, Davi
Alcolumbre (União-AP), estava em uma solenidade em homenagem aos 40 anos da
redemocratização e não compareceu.
"Muita gente criticou a proposta,
considerou inexequível, mas estamos seguros de que estamos no caminho para
começar a reverter a péssima distribuição de renda do país", afirmou o
ministro da Fazenda, Fernando Haddad.
Em discurso, Lula disse que o projeto é como
"dar um presente para uma criança" e que "não vai machucar
ninguém, não vai deixar ninguém pobre".
"Não vai fazer com que os que contribuem
deixem de comer sua carne, sua salada, seu camarão, sua lagosta, seu filé
mignon. Mas vai permitir que o pobre possa comer um pouco de carne, seja
músculo, alcatra, contrafilé ou fígado", disse Lula.
Haddad afirmou que o projeto, se aprovado
como está, deve "afetar" negativamente 100 mil pessoas – são aquelas
com rendas mais altas, que passarão a pagar mais impostos. Em compensação, o
texto vai beneficiar 20 milhões de pessoas, que pagarão menos imposto.
"Coloca um enfrentamento decisivo para
nós brasileiros, queremos estar também entre as nações mais justas",
afirmou o ministro da Fazenda
🔎'Congresso fará alterações'
Em discurso após a fala de Haddad, Hugo Motta
afirmou que o Congresso terá "lealdade" com o governo – mas não
deixará de fazer mudanças no texto e de cobrar responsabilidade fiscal.
"O senhor terá de nós a lealdade na
tramitação da matéria, mas sempre buscando trazer a verdade nessa relação. O
Congresso, na sua diversidade, fará alterações nessa matéria. Alterações que
com certeza visarão melhorar a proposta", disse Motta.
O projeto foi anunciado no fim de novembro do
ano passado, junto com medidas de cortes de gastos, porém repercutiu mal no
mercado financeiro, auxiliando na disparada da cotação do dólar.
O governo optou por segurar o envio ao
Congresso. Esperou a troca do comando da Câmara e do Senado, refez cálculos e
decidiu enviar formalmente o projeto nesta terça.
🔎Aumento da faixa de isenção
Segundo a advogada trabalhista Paula Borges,
da Ferraz dos Passos Advocacia e Consultoria, o trabalhador beneficiado pela
lei deverá passar a receber um salário líquido maior quando a nova faixa de
isenção entrar em vigor, já que não sofrerá o desconto do Imposto de Renda.
Em geral, o Imposto de Renda é recolhido na
fonte – ou seja, descontado direto no salário. O trabalhador já recebe o valor
líquido, sem o imposto.
A cada ano, o contribuinte ajusta esse
cálculo ao declarar o imposto à Receita Federal. Nesse processo, pode receber
uma restituição (se tiver recolhido imposto a mais) ou ter que complementar o
imposto retido.
• Possíveis
impactos
O governo federal estimou a perda de
arrecadação com a isenção do IR para rendimentos em R$ 27 bilhões em 2026.
Na prática, o que as pessoas vão deixar de
pagar em imposto deve significar uma injeção adicional de recursos na economia,
com efeito sobre o consumo das famílias, o crescimento do Produto Interno Bruto
(PIB), a inflação e a taxa de juros, observaram os economistas da MCM
Consultores, em um estudo divulgado na semana passada.
Segundo a equipe da MCM, como a economia
brasileira já está atualmente superaquecida, o choque esperado no consumo das
famílias pode resultar em que o Banco Central não tenha espaço para reduzir a
taxa básica de juros em 2026 ou pode até ter que ajustar um pouco para cima a
taxa, para combater os efeitos da injeção de recursos na economia sobre a
inflação.
Isso porque, com mais dinheiro no bolso, as
famílias vão às compras, pressionando a demanda e os preços dos produtos.
Estudos realizados pelo Centro de Pesquisa em
Macroeconomia das Desigualdades da Universidade de São Paulo (Made-USP) antes
da proposta do governo ser encaminhada ao Congresso mostraram que a isenção do
IR até R$ 5 mil beneficia grupos já privilegiados da sociedade.
Segundo os pesquisadores, é preciso que a
medida de fato seja combinada com uma maior tributação do topo para que não
haja uma piora na desigualdade do país.
"Atualmente, temos mais ou menos 22% da
população pagando Imposto de Renda, e com a mudança da regra vai ter só
8%", destacou Luiza Nassif Pires, diretora do Made-USP e professora do
Instituto de Economia da Unicamp, em entrevista à BBC News Brasil em dezembro.
"Então, tem um problema que, apesar da
sensação de que aumentar a isenção até R$ 5 mil é algo que distribuiria renda
para a base, na verdade, isso é uma distribuição de renda para uma classe média
já mais no topo da pirâmide", completou a pesquisadora.
Também em entrevista à BBC, Samuel Pessôa,
pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas
(Ibre-FGV) e chefe de pesquisa econômica do Julius Baer Family Office, criticou
o fato de a mudança do IR ter sido anunciada junto ao pacote fiscal do governo.
"O ministro [Haddad] tem dito que tem
como objetivo fazer uma grande reformulação dos impostos de renda, com vistas a
reduzir o grau de regressividade e talvez tornar os impostos de renda
brasileiros mais progressivos. O ministro está absolutamente correto. Agora,
isso demandaria uma revisão mais ampla de todos os impostos de renda. Não é
isso que foi feito", observou Pessôa, em conversa com a BBC em novembro.
"O que foi feito é uma medida que, no
meu entender, é eleitoreira para que o presidente consiga que uma parte da
população, cuja maioria não votaria com ele, passe a votar com ele em
2026", acrescentou o economista.
Para Pessôa, será fundamental acompanhar a
tramitação do projeto no Congresso.
"O grande medo que fica é o Congresso
aprovar a isenção, o aumento da tabela do Imposto de Renda, e não aprovar o
imposto sobre os ricos. Aí cria um desequilíbrio fiscal, agrava o
problema", observou o economista.
Fonte: g1/BBC News Brasil

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