Integração
como projeto: reflexões sobre a cúpula sul-americana no Brasil
A recente reunião de líderes sul-americanos que
ocorreu em Brasília no último dia 30 demonstrou claramente a prioridade do
vetor regional da política externa brasileira sob o governo Lula.
A iniciativa de trazer ao Brasil as lideranças de 11
países sul-americanos visa também ampliar os processos de cooperação econômica
e os laços políticos com os países da região, segundo o entendimento de que o
Brasil pode desempenhar um papel de protagonista nesse processo.
Não obstante, o encontro de líderes promovido pelo
Brasil reforça a visão do governo brasileiro de que a América do Sul deve atuar
em conjunto no cenário internacional, de forma a proteger seus interesses
comuns. Com efeito, já nos primeiros meses do governo Lula, o Brasil buscou
reatar seus laços políticos regionais, o que foi manifestado pelo retorno do
país ao quadro da CELAC (Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos),
que havia sido deixado de lado durante a administração Bolsonaro.
Tratou-se, em suma, de (re)assumir uma das
principais diretrizes da política externa brasileira, presente em sua
Constituição de 1988, que é a de fomentar a integração e a "formação de
uma comunidade latino-americana de nações". Não por acaso, no discurso
político do governo Lula outras formações políticas regionais, como o Mercosul
e a Unasul, também voltaram a ganhar maior importância, por representarem
instrumentos para a consolidação de uma América Latina mais unida e
independente.
Diante desse contexto, a realização da cúpula de
líderes sul-americanos em Brasília representou uma importante contribuição do
Brasil no aprofundamento desse processo de integração econômica, social e
política na região. Também é, sem dúvidas, um ato de reivindicação simbólica da
identidade geográfica do Brasil, que comporta uma forte dose de idealismo
político.
Vale dizer que essa reivindicação geográfica já era
ensaiada no começo dos anos 1990, quando do estabelecimento do Mercosul
(fundado por Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai) e que tinha como objetivo
promover a livre circulação de bens e serviços, a diminuição de entraves no
comércio intrarregional e a implantação de uma política tarifária comum em
relação a terceiros países.
Desde então, já se pretendia coordenar posições
comuns em fóruns econômicos regionais e internacionais, reafirmando o papel da
América do Sul como um bloco político, social e cultural coeso e disposto a
promover a multipolaridade nas relações internacionais.
Durante a sua história, o Brasil invariavelmente
precisou lidar em sua política externa com o tema referente à aproximação com
seus vizinhos sul-americanos. Por vezes, essa aproximação com os países da
região esteve condicionada à decepção brasileira quanto ao tratamento que lhe
era dispensado pelos Estados Unidos, com quem o país nunca conseguiu
estabelecer uma relação especial e igualitária. Verdade é que: ao longo dos
séculos XIX e XX, a América do Sul não se encontrava exatamente entre as
prioridades de Washington, que enxergava-a apenas como sua zona de influência
natural.
Hoje, porém, a pressão hegemônica dos Estados Unidos
sobre a região é menor, tendo em vista que a China se tornou o mais importante
parceiro comercial para muitos países da América do Sul (Brasil incluso). Muito
embora o subcontinente permaneça sendo um fornecedor de matérias-primas e
commodities, fato é que as relações mais estreitas com a China poderão
propiciar uma retomada nos projetos de desenvolvimento econômico nacionais,
baseados na transferência de tecnologias e em investimentos em sua
infraestrutura propiciados por Pequim.
Voltando à reunião da cúpula, Lula enfatizou a
necessidade de se olhar para a região de forma coletiva, no intuito de
redefinição de "uma visão comum" para a América do Sul, a fim de que seus
países sejam capazes de enfrentar – em conjunto – as ameaças atualmente
presentes no sistema internacional. Trata-se, ademais, de uma alusão velada à
confrontação em curso entre o Ocidente (liderado pelos Estados Unidos) e o
Oriente (representados sobretudo por Rússia e China), que tem provocado uma
nova divisão política no mundo.
Para o Brasil, assim como para os países da América
do Sul, não interessa participar desse mais novo embate entre Leste e Oeste,
mas sim chamar a atenção para as diferenças que dividem os assim chamados Norte
e Sul Global.
Segundo essa visão, o tema mais importante para a
América do Sul deve ser o da superação de seu subdesenvolvimento, e, ao mesmo
tempo, defender seus interesses nacionais e regionais comuns, baseados no crescimento
econômico e na diminuição das desigualdades sociais.
Daí a relevância do regionalismo ativo do Brasil nas
relações internacionais, que procura conferir à América do Sul uma voz única
nos processos negociadores globais, de modo a lidar eficientemente com outros
atores importantes como Estados Unidos, Rússia, China, União Europeia, Índia,
entre outros.
No passado, vale lembrar, a tentativa de se criar
uma "voz única" no continente fora levada a cabo durante a Guerra
Fria pelos Estados Unidos através da Organização dos Estados Americanos (OEA).
No entanto, essa organização rapidamente acabou se tornando num mero
instrumento de dominação regional por parte dos americanos, vide o tratamento
discriminatório dispensado pela OEA a Cuba a partir da década de 1960 e sua
inaptidão na resolução da crise econômica venezuelana nas décadas seguintes.
A atuação do Brasil, diferentemente da americana,
procura estabelecer um diálogo mais horizontalizado, a fim de atrair os países
da América do Sul para a discussão de posições comuns e de políticas de
enfrentamento aos desafios e problemas regionais que persistem em assolar o
continente, como a pobreza e o subdesenvolvimento.
Pelo tamanho de sua população, território, PIB e
recursos naturais, o Brasil se credencia naturalmente a um papel de destaque
nesse processo de aglutinação das forças políticas regionais. Dito isto, se o
Brasil ainda pretende atender ao seu desejo histórico por reconhecimento
internacional, será fundamental empreender esforços para fazer da integração
sul-americana um de seus principais projetos nacionais.
Ø Cúpula do Brics defende ‘prioridade à erradicação da pobreza no mundo’
A cúpula de chanceleres dos países integrantes do
Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), realizada nesta sexta-feira
(02/06) na sul-africana Cidade do Cabo, teve como um dos temas principais os
esforços internacionais para a erradicação da pobreza.
No discurso inaugural, a anfitriã do evento, a
ministra sul-africana para as Relações Internacionais e Cooperação, Naledi
Pandor, lamentou que “as agendas das organizações internacionais se desviaram
dos temas relacionados às desigualdades sociais e já não respondem às
necessidades e exigências do Sul Global”.
“Não podemos permitir que o conflito bélico uma
parte do mundo [Ucrânia e Rússia] substitua todas as demais agendas. Devemos
recuperar o objetivo de erradicar a pobreza global como o maior desafio da
humanidade, trazendo a atenção e os recursos do mundo de volta para esta
questão preocupante”, declarou Pandor.
A chanceler da África do Sul enfatizou que “a
erradicação da pobreza, em todas as suas formas e dimensões, incluindo a
pobreza extrema, é o maior desafio mundial e condição essencial para o
desenvolvimento sustentável”.
A declaração de Pandor acontece durante uma cúpula
encabeçada pelos chanceleres dos cinco países membros do Brics: além da
anfitriã, também participaram o brasileiro Mauro Vieira, o russo Sergei Lavrov,
o indiano Subrahmanyam Jaishankar e o chinês Ma Zhaoxu – a China foi o único
país que não enviou seu ministro titular, Qin Gang, que alegou problemas de
saúde, e sim o seu vice.
Além dos representantes dos países membros, também
foram parte do evento diplomatas de 13 outros países.
Entre as delegações convidadas, oito participaram do
evento presencialmente: Arábia Saudita, Cazaquistão, Ilhas Comores, República
Democrática do Congo, Cuba, Emirados Árabes, Gabão e Irã. Os demais
chanceleres, que participaram virtualmente, foram os representantes de
Argentina, Bangladesh, Egito, Guiné-Bissau e Indonésia.
A cúpula dos chanceleres é considerado um evento de
preparação para o encontro dos presidentes, que também acontecerá na África do
Sul, entre os dias 22 e 24 de agosto, na cidade de Johanesburgo.
Ø EUA estão preocupados com a queda de competitividade na América Latina
frente à China, diz mídia
A perda de influência dos Estados Unidos na região
latino-americana está se tornando cada vez mais evidente e já está despertando
preocupações na Casa Branca. No entanto, até agora os EUA carecem das
ferramentas necessárias para enfrentar o problema e competir com a China, que
está aumentando sua presença na região.
O diretor principal do Conselho de Segurança
Nacional para o Hemisfério Ocidental, Juan González, afirmou que Washington
busca medidas para fortalecer sua posição nos países latino-americanos e
pretende reformar ou promover mudanças em vários organismos existentes, como a
Corporação Financeira de Desenvolvimento Internacional, o Banco Interamericano de
Desenvolvimento, a Organização dos Estados Americanos e outros.
González indicou que os EUA estão tentando competir
com as ferramentas "do passado", enquanto outros Estados, sobretudo a
China, já recorrem aos mecanismos "do futuro", informou a Bloomberg.
Ainda segundo a mídia, o avanço do país asiático nos processos de construção de
infraestruturas na América Latina é o que preocupa o diretor do conselho.
"Temos que desenvolver ferramentas para
competir neste espaço. No momento, as ferramentas que temos não são
suficientes", disse González.
A China trabalhou muito para se tornar um parceiro
importante de muitos países sul-americanos. No entanto, a autoridade destaca
que os EUA desfrutam das suas conquistas no domínio dos investimentos no setor
privado.
Em 2013, a China anunciou a vontade de iniciar o
projeto Nova Rota da Seda (também conhecido como Um Cinturão, Uma Rota) com a
intenção de construir rodovias, ferrovias e linhas marítimas que vão se
estender do centro da China até o porto de Roterdã, nos Países Baixos,
atravessando a Ásia Central e a Rússia. A construção desta rota propôs um novo
conceito nas relações internacionais, baseado no livre comércio entre as
nações, de forma a criar uma ordem baseada na prosperidade e estabilidade.
O projeto mais ambicioso da China é visto por muitos
como uma iniciativa puramente econômica e comercial que se concentra em grandes
projetos de infraestrutura, principalmente de transporte e energia — estradas,
pontes, gasodutos, portos, ferrovias e usinas elétricas. Em 2021, o presidente
chinês, Xi Jinping, declarou que os projetos Um Cinturão, Uma Rota ajudariam a
tirar 7,6 milhões de pessoas globalmente da pobreza extrema até 2030.
Em 2017, a iniciativa chegou à região da América
Latina, quando o Panamá foi o primeiro a assinar o memorando Faixa e Rota da
Seda. Mais tarde se juntaram Antígua e Barbuda, Barbados, Bolívia, Chile, Costa
Rica, Cuba, Equador, El Salvador, Granada, Guiana, Jamaica, Peru, República
Dominicana, Suriname, Trinidad e Tobago, Uruguai e Venezuela. Em 2022, a
Argentina se tornou o 21º membro do projeto chinês.
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Diretor da CIA visitou secretamente a China em maio,
segundo mídia britânica
O jornal Financial Times e a agência Reuters
afirmaram que William Burns, que dirige a Agência Central de Inteligência dos
EUA, foi à China para falar com funcionários de inteligência do país.
William Burns, diretor da Agência Central de
Inteligência (CIA, na sigla em inglês) dos EUA, visitou a China em maio para
conversar com seus homólogos chineses, relataram na sexta-feira (2) dois
veículos de imprensa britânicos.
Segundo uma das fontes do jornal britânico Financial
Times (FT), Burns não tinha responsabilidades diplomáticas, e só se encontrou
com funcionários de inteligência chineses.
"No mês passado, o diretor Burns viajou para
Pequim, onde se reuniu com homólogos chineses e sublinhou a importância de
manter linhas abertas de comunicação nos canais de inteligência", disse um
funcionário dos EUA ao FT e à agência britânica Reuters.
A CIA, que não costuma anunciar tais visitas, não
quis comentar a viagem.
A iniciativa chega em um momento em que o governo do
presidente norte-americano Joe Biden tem pressionado para manter linhas abertas
e agendar reuniões entre várias autoridades de Washington e Pequim em meio às
relações tensas.
Os laços entre as duas maiores economias do mundo
têm estado tensos nos últimos anos em meio a questões como Hong Kong, Taiwan,
Xinjiang, a suposta atividade militar de Pequim no mar do Sul da China, e
também passos dos EUA como a guerra comercial promovida pelo ex-presidente
norte-americano Donald Trump (2017-2021), as cada vez maiores restrições
comerciais e sanções de Washington a empresas chinesas e exportações à China, e
a promoção de grupos militares antichineses como o AUKUS e o Quad.
Burns, um diplomata veterano dos EUA antes de
liderar a CIA, fez dezenas de viagens sensíveis ao exterior como chefe da
agência, inclusive para conversas com altos responsáveis da Rússia, e também
com o Talibã (organização sob sanções da ONU por atividade terrorista) no
Afeganistão. As autoridades dos EUA garantem que suas missões relacionadas à
inteligência não estão diretamente ligadas à diplomacia dos EUA.
Fonte: Sputnik Brasil/Opera Mundi

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