quarta-feira, 28 de junho de 2023

Lula sobe tom ao falar sobre UE-Mercosul: 'É preciso ser sério para exigir seriedade dos outros'

Presidente indagou quem dos europeus cumpriu as metas do Acordo de Paris "mais do que o Brasil" e questionou novamente as exigências europeias que apontam para uma cobrança unilateral.

Nesta terça-feira (27), durante evento de lançamento do Plano Safra, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva relembrou a ação votada pelo parlamento da França neste mês, na qual a Casa aprovou que "não vai querer fazer acordo" porque acha que o Brasil não pode cumprir as metas do Acordo de Paris.

Lula então questionou "quem deles cumpriu alguma meta mais do que nós [Brasil]?", segundo o jornal O Globo

"Vocês viram agora que o Congresso francês aprovou que não vai querer fazer acordo com o Mercosul porque eles acham que o Brasil pode não cumprir as metas [do Acordo] de Paris. E quem cumpre? Quem deles cumpriu alguma meta agora mais do que nós? Quem deles cumpriu? É importante que a gente seja sério para que a gente possa exigir seriedade dos outros para conosco", afirmou o mandatário.

No dia 13 de junho, a Assembleia Nacional da França estabeleceu condições para aprovar um eventual acordo UE-Mercosul, pedindo ao presidente, Emmanuel Macron, que faça oposição ao pacto comercial.

Os parlamentares também propuseram uma cláusula no pacto que diga que se o Acordo de Paris for violado, o pacto UE-Mercosul deve ser desfeito, conforme noticiado.

Durante sua viagem a Paris na semana passada, Lula disse que "está doido para fechar o acordo", mas que as últimas exigências dos parceiros europeus soavam como "ameaças".

No início do mês, durante encontro com a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, Lula também deixou claro sua insatisfação com um trecho do acordo que fala sobre compras governamentais, o qual permitiria o mesmo tratamento dado a empresas brasileiras e europeias em licitações públicas federais.

 

       EUA perdem espaço na Amazônia com parceria militar entre Brasil e Colômbia, diz analista

 

Escola Superior de Guerra da Colômbia visita o estado do Amazonas para estreitar laços com as Forças Armadas Brasileiras. Especialista ouvida pela Sputnik Brasil explica os objetivos da Colômbia na Amazônia e se a influência dos EUA sobre Bogotá representa um risco para o Brasil.

No dia 23 de junho, integrantes da Escola Superior de Guerra da Colômbia (ESG Col) visitaram o Comando de Fronteira Solimões, em Tabatinga (AM). Os militares visitantes avaliaram as atividades do Batalhão e do Exército brasileiros na região, próximo à fronteira brasileira com Colômbia e Peru, reportou o Defesa em Foco.

Governados por presidentes de esquerda, Brasil e Colômbia apostam na cooperação na área de Defesa para estimular os laços bilaterais. Logo após a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva no Brasil, em outubro de 2022, o presidente colombiano, Gustavo Petro, anunciou a intenção de construir “relações estreitas” com o Brasil, com foco na defesa da Amazônia.

Para a professora do curso de Defesa e Gestão Estratégica Internacional da UFRJ, Adriana Marques, o Brasil tem muito a ganhar em uma parceria com seu vizinho amazônico.

"O Brasil já tem processo de cooperação em defesa com a Colômbia em estágio mais avançado do que com os demais países amazônicos, a exemplo da Comissão Binacional Fronteiriça [COMBIFRON]", disse Marques à Sputnik Brasil.

Criada em 2012, a COMBIFRON tem focado seus esforços na manutenção da ordem e combate ao crime organizado. Em 2023, no entanto, Brasil e Colômbia querem inovar ao dar ênfase na defesa da biodiversidade e do meio ambiente.

"A Colômbia vive um novo momento político. Durante muito tempo, suas Forças Armadas estavam focadas na questão do narcotráfico e no combate às [Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia] FARC", notou Marques. "Nos últimos anos, Bogotá tem investido na proteção ambiental, montando estruturas militares e batalhões dedicados a essa questão."

O Brasil de Lula tem o intuito de seguir a mesma linha, ao "considerar os assuntos ambientais como tema transversal, incluído na agenda do Ministério da Defesa", disse a professora da UFRJ.

Segundo ela, a cooperação na área de defesa poderá, inclusive, contribuir para a retomada de projetos como o Conselho de Defesa Sul-Americano, que funcionava sob os auspícios da União de Nações Sul-Americanas (UNASUL) e da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA).

•        A sombra dos EUA

A cooperação militar entre Brasil e Colômbia na Amazônia soa alarmes para especialistas preocupados com a influência dos Estados Unidos no território da floresta. Historicamente, as Forças Armadas dos EUA têm na Colômbia um forte aliado no continente sul-americano.

"As relações [entre Bogotá e Washington] remontam à década de 1940 e são muito próximas", considerou Marques. "Os militares colombianos são ainda mais ligados aos norte-americanos do que os brasileiros."

No entanto, a cooperação com o Brasil diminui a influência dos EUA sob o governo de Bogotá, o que afasta o fantasma do intervencionismo norte-americano sobre a Amazônia.

"A influência dos EUA na região é inversamente proporcional à cooperação dos países amazônicos para protegerem sua soberania. A cooperação entre Colômbia e Brasil fortalece o poder sul-americano e diminui a influência dos EUA", concluiu a especialista.

Brasil e Colômbia compartilham extensa fronteira amazônica, de cerca de 1.642,5 km. A cooperação militar entre os países vizinhos é regulada pelo Acordo de Cooperação em Matéria de Defesa, assinado em 2008, e tem na Comissão Binacional Fronteiriça (COMBIFRON) um de seus projetos mais exitosos.

 

Ø  MEIO AMBIENTE: As incertezas da COP28. Por Carlos Bocuhy

 

Apesar do estado conflagrado da emergência climática global, consenso entre os principais analistas do setor, as mesas de discussão nas conferências do clima, como ocorreram nas últimas COPs, patinam na instabilidade geopolítica global, alimentada pelo retorno da guerra fria.  

Ativistas apontam que as conferências estão se tornando “palco de atitudes pouco cooperativas, com desfile de posições defensivas e diversionistas”. Os países ricos recuam em relação a qualquer sacrifício de recursos, do PIB ou de autossuficiência energética. De outro lado, observa-se aumento da corrida armamentista protagonizada pelas nações mais poderosas, preocupadas com sua hegemonia geopolítica. Coincidentemente, as nações mais ricas são as mesmas que figuram entre os maiores emissores de gases efeito estufa (GEE).  

A Conferência de Bonn, na Alemanha, ocorrida entre os últimos dia 5 e 15 de junho, sinalizou claramente o que deverá ser a COP28 que ocorrerá em dezembro nos Emirados Árabes Unidos. Bonn sedia anualmente reuniões preparatórias para as COPs, para alinhavar posições preparando terreno para as cúpulas climáticas anuais.  

Os documentos resultantes assemelham-se mais à memória de reunião, destinados à informalidade, relatando posições não consensuadas. Nada mais eficaz para postergar quaisquer compromissos. A proatividade cooperativa ocorre geralmente da parte dos países menores, enquanto os mais ricos mantêm-se na defensiva. 

Como consequência, Bonn está legando para discussão na COP28 a íntegra dos temas da agenda herdada das reuniões anteriores: mitigação, adaptação, perdas e danos e transição justa. 

Desenha-se uma COP28 assemelhada a um campo minado. Além do desalento global em função da instabilidade geopolítica, os trabalhos em Dubai serão conduzidos pelo líder petroleiro Sultão Ahmed al-Jaber, CEO da ADNOC, maior empresa de petróleo dos Emirados Árabes Unidos. O fato caracteriza insuperável conflito de interesses.  

Na contramão dos objetivos das conferências climáticas, al-Jaber declarou recentemente a intenção da ADNOC em aumentar substancialmente a exploração de petróleo até 2030. Após a sinalização ocorrida em Bonn, a COP28 promete ruas vazias e coreografia nas mesas. O país possui regime autoritário e repressivo com fortes pendências na área de direitos humanos.   

O momento é grave. O prognóstico climático futuro é considerado por especialistas como incerteza radical, que é diferente de risco, porque a série histórica não nos fornece parâmetro nenhum para saber o que ocorrerá, mas “é possível em cenário otimista esperar uma crise muito grave e em cenário pessimista que vamos para a extinção”, afirma Marcelo Medeiros, da Columbia University

A obra Incerteza radical, dos economistas Frank Knight e John Maynard Keynes, traz a distinção entre conceitos de risco e de incerteza. O risco estaria restrito a situações em que possíveis desfechos futuros e suas respectivas probabilidades fossem previamente conhecidos, enquanto a incerteza ficaria referida a situações em que não se conhecem as probabilidades nem mesmo os possíveis desfechos futuros relevantes. 

A busca de maior certeza dos efeitos climáticos sobre a humanidade tem sido objeto dos relatórios do Painel Intergovernamental das Mudanças Climáticas (IPCC), que agrega centenas de especialistas de mais de cem países. Os riscos que a humanidade corre em não conter a temperatura abaixo de 1,5 ºC tem sido objeto de tentativa de prognósticos visando mitigação e adaptação. Os relatórios, grosso modo, afirmam que a velocidade do aquecimento está acima do esperado e que as consequências estão se mostrando piores do que o previsto.  

As causas são conhecidas e a resposta ao desequíbrio climático é urgente. Em maio de 2022, o secretário-geral das Nações Unidas Antonio Guterrez dirigiu-se a jovens universitários norte-americanos da Seton Hall University de New Jersey convocando-os para “não trabalharem para os destruidores do clima”, em referência à indústria do petróleo. 

Guterrez também defendeu, em Davos, a responsabilização do setor petrolífero por mentir sobre seus impactos no clima planetário. Durante a COP27 do Egito, propôs forte taxação sobre os polpudos lucros recheados de carbono. O setor fatura ainda mais em função de subsídios superiores a US$ 1 trilhão anual, valor próximo ao pleiteado desde 2009 no acordo por perdas e danos, que deveria estar sendo aportado pelos países ricos para salvaguardar os países mais pobres. 

O transtorno de insegurança que assola países preocupados com a hegemonia política global faz sentido quando olhamos para as consequências assemelhadas do clima e da guerra, com fortes impactos de migração forçada. Patrícia Cohen, correspondente do Times em Londres, afirmou em artigo recente que as condições naturais e os campos produtivos arrasados da Ucrânia, a infraestrutura de abastecimento, saneamento e moradias, relembram ao mundo sobre a extensão dos impactos das guerras do século XX. A reconstrução do país arrasado volta às mesas de discussão, com estimativa inicial do Banco Mundial orçada em US$ 411 bilhões. 

Desenha-se novamente no cenário climático global uma reedição de Bretton Woods, ocorrida em 1944 em New Hampshire (USA), onde se discutiu a reconstrução econômica dos países destruídos pela Segunda Guerra Mundial. Durante os dias 23 e 24 de junho, líderes mundiais, banqueiros e ativistas climáticos debateram em Paris os perigos da desigualdade social no contexto das mudanças climáticas.  

O embaixador francês no Canadá, Michel Miraillet, afirma: “Devemos juntos impulsionar a mudança em nosso sistema financeiro global para torná-lo mais responsivo, justo e inclusivo, e para combater as desigualdades, financiar a transição climática e a proteção da biodiversidade e nos aproximar do alcance dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas”. 

Há também fortes apelos por medidas estruturais de contenção dos combustíveis fósseis. “O financiamento climático é ótimo, mas se não pararmos a indústria de combustíveis fósseis, então é apenas uma solução de Band-Aid”, afirma Mitzi Jonelle Tan, ativista de justiça climática das Filipinas, um país regularmente atingido por tufões. “Cresci com medo de me afogar no meu próprio quarto.” 

A perspectiva de que as negociações climáticas possam retirar subsídios avaliados em US$ 1 trilhão anuais e taxar lucros das Big Oil está gerando reações do setor. As mesas climáticas estão começando a ser invadidas por lobistas das empresas petrolíferas. A última conferência do clima, a COP27 (Egito), recebeu 25% mais representantes do setor petrolífero do que a anterior. 

Dentro do contexto de instabilidade global e do absurdo subsídio para as Big Oil, a ONU precisa imediatamente criar salvaguardas para o conflito de interesses que se configura com a presença de representantes da indústria do petróleo nos processos decisórios das COPs. Depois dos Emirados Árabes, que é o reino do petróleo, seguem os trabalhos para a COP29, que será realizada na Austrália, umbilicalmente ligada à produção de carvão, um dos piores contribuintes para o caos climático.   

Há muitas lacunas a sanear: o cômputo das emissões nacionais necessita urgentemente de melhorias em sua metodologia para identificar, de forma mais precisa, o volume total das emissões globais. A contabilidade apresenta falhas metodológicas que subestimam emissões causadas por meios naturais como incêndios, assim como outras inconsistências para cálculo mais preciso de emissões líquidas nacionais. 

Apesar da coreografia ensaiada dos poluidores, a reação da sociedade caminha a passos largos. O estado de Oregon, nos Estados Unidos, processou no dia 22 de junho as empresas Exxon Mobil, Shell e British Petroleum, entre outras, em função da “cúpula de calor” que se abateu sobre a região em 2021 e matou 91 pessoas. O processo visa indenização de US$ 1,5 bilhão, alegando que as alterações climáticas regionais não teriam ocorrido sem a queima de combustíveis fósseis. Casos semelhantes tramitam nos tribunais de Nova York, Massachussets e Rhode Island e podem ir a julgamento ainda em 2023. Em 2022, dezesseis municípios de Porto Rico, estado norte-americano, processaram empresas de combustíveis fósseis por danos causados por furacões em 2017.   

É preciso criticidade suficiente para fugir das armadilhas cosméticas e manter o foco em mudanças estruturais. Thomas Friedman, jornalista do New York Times, afirma que “se você conscientiza as pessoas, os cidadãos acabam trocando as lâmpadas e as lixeiras. Contudo, não são as lâmpadas ou as lixeiras que precisam ser substituídas, mas os líderes. Se os governos quiserem, a crise climática será mitigada”. 

A COP28 dos Emirados Árabes Unidos é motivo de preocupação e incerteza. A reunião preparatória de Bonn sequer conseguiu pautar a discussão sobre trocas de lâmpadas, lixeiras ou líderes. No entanto, os indicadores globais, a ciência, as mobilizações sociais e a sede por justiça apontam que, na medida que o mundo esquentar, a fritura estará à espera das empresas de combustíveis fósseis e de seus parceiros governamentais.  

 

Fonte: Sputnik Brasil/Le Monde

 

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