As apostas do governo Lula para tentar conter
a inflação dos alimentos
Alimentos como carnes, açúcar, café e azeite
estão com imposto de importação zerado a partir desta sexta-feira (14/3), por
medida do governo federal. No dia 6, foi anunciada uma série de medidas que
tenta conter a inflação na comida.
O vice-presidente Geraldo Alckmin afirmou que
o governo vai priorizar o direcionamento do Plano Safra à produção de itens da
cesta básica e quer fortalecer os estoques públicos de alimentos.
As medidas devem entrar em vigor em
"questão de dias", acrescentou.
A economia, e mais especificamente o preço
dos alimentos, tornou-se uma espécie de "calcanhar de Aquiles" do
governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), cujos indicadores de popularidade
vêm caindo.
A inflação de alimentos fechou 2024 com alta
de 7,69%, bem acima dos 4,83% de avanço na inflação geral, medida pelo Índice
Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).
Alimentos comuns do dia a dia puxaram a
inflação, como café (39,6%), óleo de soja (29,2%), carne (20,8%) e leite longa
vida (18,8%).
O anúncio feito por Alckmin ocorreu após
reunião entre ele, Lula e os ministros Carlos Fávaro (Agricultura), Paulo
Teixeira (Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar), Rui Costa (Casa
Civil) e Sidônio Palmeira (Secretaria de Comunicação Social).
"São medidas para reduzir preços, para
favorecer o cidadão e a cidadã, para que ele possa manter o seu poder de
compra, possa ter a sua cesta básica com preço melhor", argumentou
Alckmin, que também é ministro de Desenvolvimento, Indústria, Comércio e
Serviços, em coletiva.
Em entrevista à BBC News Brasil anterior ao
anuncio feito por Alckmin, o economista André Braz apontou que medidas efetivas
para conter a inflação dos alimentos são de médio a longo prazo — por isso, o
governo Lula não deve colher os resultados dessas medidas até o fim de seu
mandato, que acaba no ano que vem.
"Não existe uma fórmula mágica para
baratear o preço dos alimentos, isso vai depender de políticas em diferentes
segmentos, e mais de médio e longo prazo", afirmou Braz, coordenador de
Índices de Preços na Fundação Getulio Vargas (FGV).
Braz comentou também que o controle de
tarifas de importação, um dos pilares do pacote governista antes ventilado e
anunciado nesta quinta, é o que poderia ter mais efeito mais imediato, ao lado
de políticas de crédito para os agricultores.
Confira as três apostas do governo para frear
o preço dos alimentos anunciadas nesta quinta.
• Aposta
1: Redução e eliminação de impostos
O governo federal anunciou que vai zerar os
impostos de importação para os seguintes produtos: azeite (hoje com alíquota de
9%); milho (7,2%); óleo de girassol: (até 9%); sardinha (32%); biscoitos
(16,2%); macarrão (14,4%); café (9%); carnes (até 10,8%); e açúcar (até 14%).
"O governo está abrindo mão de imposto,
está deixando de arrecadar, para favorecer a redução de preço", afirmou
Alckmin a jornalistas.
Presente na entrevista coletiva, o secretário
de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Guilherme Mello, afirmou que os
alimentos que terão imposto de importação zerado têm um volume de importação
pequeno justamente por terem "tributação elevada".
"Do ponto de vista da arrecadação,
talvez não tenha um impacto significativo, mas do ponto de vista do consumidor,
certamente veremos um impacto", disse Mello, acrescentando que ainda serão
desenvolvidas notas técnicas para estimar os impactos.
Alckmin disse não acreditar que a eliminação
do imposto de importação de alguns alimentos vá impactar significativamente
produtos nacionais, que poderiam ser afetados pela competição com importados.
Ele argumentou que haveria uma complementação
na oferta de alimentos, e não uma substituição, e que o Brasil depende de
produtos externos que pouco ou nada são produzidos aqui, como o óleo de palma.
O vice-presidente afirmou que os impostos
federais sobre itens da cesta básica já são zerados, mas anunciou que vai
pleitear com o Estados a extensão dessa isenção, já que alguns cobram o Imposto
sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre esses alimentos.
• Aposta
2: Estímulo ao abastecimento nacional
Outra aposta do governo é aumentar a
disponibilidade de comida no país, que é um dos maiores produtores de alimentos
do mundo.
Para isso, o Plano Safra, um amplo programa
de financiamento para agricultores, vai priorizar a produção de itens da cesta
básica, anunciou Alckmin.
De acordo com o ministro do Desenvolvimento
Agrário e Agricultura Familiar, Paulo Teixeira, uma das formas de estimular
esse tipo de produção seria a diminuição de juros para esses itens no Programa
Nacional de Apoio ao Médio Produtor Rural (Pronamp), algo que ainda está sendo
estudado.
Teixeira acrescentou que insumos para a
agricultura também podem ser beneficiados de alguma forma.
Além disso, o governo pretende ampliar as
capacidades da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).
O Planalto havia divulgado também que
percentuais de misturas de biodiesel e etanol nos combustíveis seriam mantidos,
de forma a não encarecer o transporte.
Entretanto, depois essa informação foi
retirada do comunicado enviado pelo governo sobre as novas medidas.
• Aposta
3: Mais certificação
O governo quer criar ainda o selo
"Empresa Amiga do Consumidor", que pretende identificar supermercados
e empresas do ramo que ofereçam preços "equilibrados" da cesta
básica.
Em outra frente, o governo vai ampliar por um
ano, para todo o país, a venda de produtos que já passaram por certificação
sanitária em algum município.
Segundo o ministro Carlos Fávaro, da
Agricultura, isso pode favorecer produtos como leite, mel e ovos.
O governo também quer aumentar a adesão de
municípios ao Sistema Brasileiro de Inspeção de Produtos de Origem Animal
(Sisbi).
• Alta
espalhada de preços impede estratégia dos consumidores de substituir produtos
Na hora de fazer as compras, um dos desafios
da inflação atual é que a alta de preços dos alimentos está espalhada. Muitas
vezes, isso impede a estratégia dos consumidores de substituir produtos.
Não se pode fazer uma omelete ou um bom
restaurante sem quebrar os ovos.
Repórter: Quantos ovos por dia?
Daniel de Souza Cunha, cozinheiro: 112 ovos
por dia em média mais ou menos.
Repórter: Então essa inflação pegou em cheio?
Daniel de Souza Cunha: Pega em cheio. A gente
acaba tendo que se adaptar bastante ao mercado.
Repórter: Teve que passar um pouquinho paro
cliente?
Daniel de Souza Cunha: Acabou tendo que
passar um pouquinho, mas não coisa significativa.
Para o orçamento apertado das famílias, o ovo
de galinha era só o que faltava: subiu 15% em fevereiro. E antes o problema
fosse só esse.
“A gente está vendo que a gente tem uma
pressão generalizada. Ou seja, na média, tudo está subindo um tanto quanto e
mais do que a gente esperava. Então, a gente atribuir a um fator climático, ao
estresse de um animal ou à chuva específica em uma região não consegue explicar
o porquê de uma cesta com 400 produtos está subindo de uma forma consistente
mês a mês. E quando a gente olha no período de 12 meses, a gente vê essa subida
quase que constante”, afirma Pierre Oberson de Souza, professor de finanças da
FGV.
Do economês ao bom português: não tem para
onde correr.
“Aqui tem um sacolão, ali tem um mercado e
aqui tem outro. Eu já entrei naquele, já vim aqui, daqui eu vou passar para
aquele”, conta a encarregada de limpeza Maria Gertrudes do Nascimento Santos.
Quase nenhum produto escapa.
“Maracujá está um absurdo, maracujá está caro.
Abacate está caro. Na verdade assim, está tudo caro”, diz a acompanhante
terapêutica Rebeca da Silva Souza.
O abacate, o alho, a laranja-lima e a
tangerina. Inflação sem pausa nem para o café: 75% dos alimentos subiram de
preço nos últimos 12 meses. Mais que há um ano, quando a alta afetava 62% da
cesta do IBGE. É o mesmo que dizer que três em cada quatro itens pesquisados
ficaram mais caros.
Estamos colhendo o resultado do excesso e da
falta de chuva, do custo do dólar, da economia aquecida com crescimento de
emprego e renda. Mas os economistas dizem que um cenário onde quase tudo sobe
de preço é a tradução mais pura do fenômeno de inflação; não dá mais para dizer
onde começa nem quando termina.
Comer em casa: alta de 7,1%. Fora de casa:
6,72%. Mais que a média geral da inflação. Então, a solução não está na cozinha
da Gertrudes, nem do Daniel, mas no equilíbrio da receita da política
econômica, diz o professor da FGV.
“Quando o governo gasta muito e ele está
basicamente colocando dinheiro na economia de alguma forma, então as pessoas
com mais recurso, que veio muitas vezes do governo, esse gasto acima do que era
razoável, acabam consumindo mais e gerando uma pressão inflacionária mais uma
vez. Então, por isso que se fala tanto de ‘a contenção dos gastos públicos é
importante’, porque isso vai conseguir segurar um pouco a inflação”, afirma
Pierre Oberson de Souza.
Lula culpar um 'pilantra' pela alta no preço
do ovo é populismo, diz Octávio Guedes
O presidente Lula abriu nesta sexta-feira
(14) uma caçada ao responsável pela alta de 15% no preço do ovo em apenas um
mês. O culpado? Um pilantra. Isso é apenas mais um discurso populista de
ignorar as reais causas para um problema e preferir eleger um inimigo público
número 1.
"Nós estamos em uma tarefa muito grande,
o presidente da República, o ministro da Fazenda, porque nós queremos encontrar
quem é o pilantra que aumentou o ovo tanto. Não é possível", disse o
presidente, em Sorocaba (SP).
Eu sei quem é pilantra: é a galinha. A gente
ouviu o Paulo Teixeira, ministro de Desenvolvimento Agrário e Agricultura
Familiar, dizendo que tem muita galinha que morre de calor nos aviários,
granjas, que não estavam preparados para essa onda de calor.
Não tem pilantra nenhum! É uma estratégia
populista de oferecer para a população um inimigo. Por que essa estratégia é
populista? Porque você não leva em consideração as múltiplas causas do
problema.
Imagina dizer:
• que
é o aquecimento global, uma ideia difícil de se transmitir, culpado por matar
as galinhas de calor e, por isso, deixando-as menos produtivas.
• que
o preço do ovo aumentou no mundo inteiro e, com isso, o produtor exporta mais
-- para lucrar mais.
• e
que tem a questão do milho, com safra reduzida também pelo aquecimento global,
que afetou e fez a ração ficar menos nutritiva e, de novo, a galinha botar
menos ovo.
No lugar de se explicar todos os fatores
reais, é mais fácil para o político dizer: "Eu vou achar o pilantra que
está aumentando o ovo". E, aí, a solução é simples: prende o pilantra.
Existe este populismo para tudo. Jair
Bolsonaro (PL) propunha matar o pilantra do Paulo Freire quando falava de
educação. Não havia questão de currículo, de salários, de qualificar o
professor. Era o inimigo escolhido por Bolsonaro, e o eleitor acreditava que
era só tirar o Paulo Freire que a educação iria melhorar.
Quem foi o "pilantra", o eleito
inimigo público número 1, do governo Lula nos primeiros anos? Era o Roberto
Campos Neto, então presidente do Banco Central independente. Tudo era o Campos
Neto. Os juros eram uma maldade e, depois que ele saiu do BC, o problema dos
juros não se resolveu -- mesmo com um indicado do Lula.
Em vez de você oferecer para o público as
múltiplas razões de juros altos, inclusive colocando a culpa no próprio
governo, que não fez ajuste fiscal, é mais fácil você eleger os pilantras.
A fala do Lula sobre o ovo está dentro da
lógica de palanque e tática populista de achar um inimigo, um culpado. Isso não
tem ideologia, não tem campo político, não tem direita e esquerda. Todo mundo
faz.
• Lula
diz que quer descobrir quem 'passou a mão' no preço do ovo
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT)
afirmou nesta sexta-feira (14) que o preço do ovo está caro e que ele ainda não
encontrou uma explicação para a alta.
Em seguida, o presidente disse que quer
descobrir quem "passou a mão", isto é, quem está "roubando"
no preço do alimento. Lula ainda chamou de "pilantra" o suposto
responsável pela alta (leia mais abaixo).
Especialistas dizem que o aumento é
impulsionado pelo custo do milho, calor intenso e demanda aquecida na Quaresma,
os 40 dias que antecedem a Páscoa. Nesse período, os católicos costumam
diminuir o consumo de carne vermelha.
As exportações de ovos produzidos no Brasil
dispararam com a crise provocada pela gripe aviária nos Estados Unidos.
Entretanto, especialistas afirmam que ainda não é possível relacionar a alta de
preços no mercado interno com a situação nos Estados Unidos.
Segundo Lula, o governo está em "uma
briga tremenda" para baixar o preço e o vice-presidente tem feito muitas
reuniões sobre o assunto.
"Nós estamos com um problema de
alimento, que vocês já sabem que tem. O ovo está caro. Até hoje eu não
encontrei uma explicação do porquê que o ovo está caro", disse.
O presidente afirmou que fez um estudo
comparando os preços. Ele contou que analisou os seguintes valores:
• De
janeiro de 2003, quando a caixa de ovos com 30 dúzias custava R$ 144,15;
• De
janeiro de 2024, quando a mesma caixa de ovo custava R$ 143,09;
• De
janeiro de 2025, quando a caixa de ovo custava R$ 144,05; e
• De
fevereiro de 2025, quando a caixa de ovos com 30 dúzias subiu para R$ 210.
"Eu estou querendo descobrir onde é que
teve um ladrão que passou a mão no direito do povo brasileiro de comer ovo. O
povo brasileiro come, em média, 260 ovos por ano. É pouco, não dá nem um por
dia", mencionou.
"Mas sabe quantos ovos o Brasil vai
produzir este ano? 59 bilhões de ovos. Então não tem explicação esse ovo estar
caro, alguém está passando a mão. Esse é o dado concreto, e nós queremos saber
quem é", emendou Lula.
<><> 'Pilantra'
Em outro momento, o presidente questionou se
teria sido o calor o fator responsável pela diminuição dos ovos.
"Alguns dizem para mim: 'é porque
aumentou a exportação e o dólar tá caro'. Tudo bem que o cara que vai exportar
ele vai ganhar mais porque vai ganhar em dólar, mas o que ficou aqui não tem
que subir de preço. Nós só exportamos 0,9%, menos de 1% dos 59 bilhões de ovos.
Por que subiu o ovo?", indagou o presidente.
"Ah, porque fez muito calor, e a galinha
diminui os ovos tudo quando tem muito calor. Mentira. Porque calor fez no ano
passado, porque no final do ano agora choveu bem [...], então as galinhas não
reclamaram, então alguém está sacaneando as galinhas", frisou.
"Nós estamos em uma tarefa muito grande,
o presidente da República, o ministro da Fazenda, porque nós queremos encontrar
quem é o pilantra que aumentou o ovo tanto. Não é possível", arrematou
Lula.
As declarações foram dadas durante uma
cerimônia de entrega de ambulâncias em Sorocaba, em São Paulo.
<><> Tendência de alta
Lula tem criticado o preço do ovo e de outros
alimentos cujos valores nos supermercados subiram nos últimos meses.
A inflação dos alimentos é um dos motivos
apontados por especialistas e aliados do presidente para queda de aprovação do
governo.
Segundo a Associação Brasileira de Proteína
Animal (ABPA), o preço dos ovos deve subir até o fim da quaresma.
Produtores afirmam que a alta recente
representa uma "situação sazonal", comum ao período pré e durante a
quaresma, que acontece em abril.
A entidade informou que os custos de produção
acumularam alta nos últimos oito meses, com elevação de 30% no preço do milho,
que é usado como ração para as galinhas, e de mais de 100% nos custos de
insumos de embalagens.
Fonte: BBC News Brasil/g1

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