STF
deve restabelecer direitos indígenas
Ainda pendente de análise pelo Senado, o projeto que
define um marco temporal para a demarcação de terras indígenas no país poderá
ter que ser adaptado a uma eventual decisão do Supremo Tribunal Federal sobre o
tema, segundo ministros da Corte ouvidos pelo GLOBO. Uma ação que discute a
validade da tese tem julgamento previsto para o próximo dia 7.
Segundo o texto aprovado nesta quarta-feira pela
Câmara, apenas áreas ocupadas por indígenas no dia 5 de outubro de 1988, data
da promulgação da Constituição, podem ser considerados na hora de definir as
demarcações. A proposta, em discussão há mais de 15 anos no Congresso, teve sua
votação pautada como forma de se antecipar a uma decisão do Supremo.
No Supremo, contudo, o entendimento de magistrados é
o de que o tribunal, caso decida pela inconstitucionalidade do marco temporal,
poderá orientar a discussão no Legislativo. Afirmam, contudo, que uma eventual
“derrubada” do projeto pela Corte só poderia ser feita após ele ser aprovado e
tornado lei, uma vez que não cabe “controle antecipado” de constitucionalidade.
Além disso, precisaria que algum partido acionasse o STF por meio de uma ação
direta de inconstitucionalidade.
Integrantes do tribunal ouvidos pela reportagem
afirmam que o ministro Alexandre de Moraes, autor do pedido de vista que
suspendeu o julgamento, quer apresentar o seu voto no próximo dia 7 e não vê impedimento
nas discussões realizadas pelo Congresso para que o Supremo realize a análise
do assunto. Até o momento, apenas dois ministros já votaram no caso do marco
temporal: Edson Fachin, relator, que é contrário à tese, e Nunes Marques, que é
a favor. Na Corte, não se descarta a possibilidade de algum outro ministro
pedir vista e fazer com que o Supremo se pronuncie já quando a lei for
questionada.
A celeridade dada à tramitação do projeto na Câmara
foi uma reação direta ao julgamento do caso. Ao aprovar o texto, Câmara tenta
se antecipar para evitar que a Corte regulamente o assunto. A previsão é que o
ritmo seja mais lento no Senado. Segundo o presidente da Casa, Rodrigo Pacheco
(PSD-MG), o texto deve passar por comissões antes de ir ao plenário.
A tese do marco temporal se baseia em uma
interpretação sobre o artigo 231 da Carta, que diz: “São reconhecidos aos
índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os
direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à
União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens”.
Na visão dos defensores da proposta, ao utilizar o
verbo no presente — “ocupam” —, a Constituição prevê se tratar dos territórios
ocupados naquela data. Deputados favoráveis argumentam, ainda, que estabelecer
o marco temporal para demarcações é uma forma de garantir segurança jurídica a
proprietários de terras no país, que poderiam ser desapropriados caso,
futuramente, suas terras fossem reivindicadas como território indígena.
Ambientalistas e defensores da causa indígena, por
outro lado, citam o parágrafo 1º do mesmo artigo da Constituição como argumento
contrário ao marco temporal.
“São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios
as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades
produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais
necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e
cultural, segundo seus usos, costumes e tradições”, diz o trecho.
O processo no STF trata especificamente do
território ocupado pelo povo indígena xokleng, em Santa Catarina. A Fundação
Nacional dos Povos Indígenas (Funai) questiona uma decisão da Justiça Federal
do estado que aplicou a tese do marco temporal ao conceder a reintegração de posse
de uma área que integra a reserva ocupada pelos indígenas. A decisão neste
processo terá repercussão geral e há várias ações travadas esperando a
definição.
No caso do texto aprovado na Câmara, fica
estabelecido que povos indígenas têm direito apenas às terras que já ocupavam
ou já disputavam em 5 de outubro de 1988, data da Constituição. O projeto
também abre margem para contato com povos isolados caso haja “utilidade
pública”, sem definir os critérios que definiram essa necessidade de uso. O
texto afirma que o “usufruto dos índios não se sobrepõe ao interesse da
política de defesa e soberania nacional” e permite que sejam desenvolvidas
atividades nas reservas sem que as comunidades sejam consultadas.
Senado
só votará marco temporal após STF julgar
Um dia após a votação do projeto de lei do Marco
Temporal na Câmara dos Deputados, a deputada federal Célia Xakriabá (Psol-MG)
confirmou que o presidente do Senado Federal, Rodrigo Pacheco (PSD-MG),
garantiu que a pauta vai “seguir os ritos normais” na Casa, ou seja, não será
votado em regime de urgência, como na Câmara. Com isso, a votação deve ficar
para depois do julgamento do tema no Supremo Tribunal Federal (STF), marcado
para o dia 7 de junho.
Uma reunião foi realizada na terça-feira (30/5) com
o presidente da Casa para impedir o avanço da pauta. Segundo a deputada, ele
garantiu que terá “prudência” e “seguirá os ritos normais”.
Ao Correio, a deputada elogiou a postura de Pacheco,
por entender que a votação do Marco Temporal interfere na imagem do Brasil
externamente. “Por isso que é bom ter presidente que vai até a COP [Conferência
da ONU sobre Mudanças Climáticas]. Eu ouvi dele ontem (30) que não quer mais
ser cobrado por essa imagem do Brasil de um país que mais desmata, de um país
que não tenha compromisso com os povos indígenas”, disse.
• Senado
vai prolongar debates sobre Marco Temporal
O projeto de lei do marco temporal (PL 490/07) não
tramitará em regime de urgência no Senado. Quem assegura é o presidente da
Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). A representantes indígenas, ele se comprometeu
a seguir os ritos normais antes de levar a matéria à apreciação do plenário. O
diálogo foi estabelecido logo após o fim da votação do texto na Câmara, em uma
reunião conduzida pela deputada federal Célia Xakriabá (PSol-MG), que preside a
Frente Parlamentar Mista de Defesa dos Direitos dos Povos Indígenas, e pela
ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara. O andamento menos célere dará
tempo para o julgamento do tema no Supremo Tribunal Federal (STF), que ocorrerá
em 7 de junho.
“Chegando lá, não vai ter urgência esse projeto. Ele
(Pacheco) vai distribuir para as comissões. E garantiu que vai ter um diálogo
com os povos indígenas, o que não aconteceu aqui”, frisou o
secretário-executivo do Ministério dos Povos Indígenas, Eloy Terena, numa
referência à votação, a toque de caixa, na Câmara, onde o projeto foi aprovado
na terça-feira.
Ao Correio, a deputada Célia Xakriabá elogiou a
postura de Pacheco. Ela enfatizou que a aprovação do marco temporal das
demarcações de terras indígenas interfere na imagem do Brasil no exterior. “Por
isso que é bom ter um presidente que vai até a COP (conferência da Organização
das Nações Unidas sobre mudanças climáticas). Eu ouvi dele que não quer mais
ser cobrado por essa imagem de um país que mais desmata, de um país que não tem
compromisso com os povos indígenas”, disse.
A dificuldade dos indígenas em abrir diálogo com a
Câmara decorre, principalmente, da pressão exercida pela bancada ruralista. Um
dia após a aprovação do marco temporal na Casa, a ministra Sônia Guajajara
compareceu à audiência na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) para
esclarecer as políticas de demarcação de territórios indígenas e de
desapropriações de terras. O requerimento foi feito pela deputada Caroline de
Toni (PL-SC), integrante da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA).
Na oitiva, houve desentendimento entre as duas
quando Guajajara deu uma bronca na parlamentar para que prestasse atenção às
suas explicações. A ministra respondia a questionamentos da deputada a respeito
da necessidade de tantas demarcações de terras e enfatizava que o fato não era
político-ideológico.
“Queria que ela prestasse atenção, por favor, para
depois não perguntar de novo”, repreendeu Guajajara. “Você já me perguntou duas
vezes coisas que eu já tinha dito inicialmente, então, se não prestar atenção,
eu vou passar a tarde toda aqui, com você me perguntando a mesma coisa.”
Caroline de Toni se defendeu explicando que tinha sido chamada à CPI do
Movimento dos Sem Terra (MST), porque era a próxima a falar. Guajajara
retrucou: “Se for para a senhora me ofender, eu também não vou ficar aqui”.
Câmara
aprova ministérios, mas tira poderes de Marina e Guajajara
A Câmara terminou de aprovar na madrugada desta
quinta-feira a medida provisória que reestrutura os ministérios. O texto que
passou pelos deputados manteve o mesmo número de pastas definidas pelo
presidente Luiz Inácio Lula da Silva originalmente, mas mudou a organização
interna delas. O Senado ainda precisa votar o texto, o que deve acontecer nesta
quinta-feira.
Veja as principais mudanças feitas pela Câmara.
Marina Silva (Meio Ambiente) perde Agência Nacional
de Águas (ANA) para Waldez Goes (Integração Nacional).
Marina Silva (Meio Ambiente) perde sistemas de
informações Saneamento Básico (Sinisa) e de Gestão dos Resíduos Sólidos (Sinir)
para Jader Filho (Ministério das Cidades).
Marina Silva (Meio Ambiente) perde CAR para Esther
Dweck (Ministério da Gestão).
Sonia Guajajara (Povos Indígenas) perde influência
sobre demarcação de terras para Flávio Dino (Ministério da Justiça).
Funasa é recriada e vai para o Ministério da Saúde.
Decisão representa perdas para o Ministério das Cidades, que absorveria as
principais funções com a extinção.
Casa Civil perde a coordenação das atividades de
inteligência federal para o GSI
• Ministério
do Meio Ambiente
O Ministério do Meio Ambiente, de Marina Silva, foi
o principal afetado. A pasta perdeu a Agência Nacional das Águas (ANA) para o
ministro da Integração Nacional, Waldez Goes, e o Cadastro Ambiental Rural
(CAR) para a ministra da Gestão, Esther Dweck.
Além disso, Marina também deixou de ter a
responsabilidade sobre os sistemas de informações Saneamento Básico (Sinisa) e
de Gestão dos Resíduos Sólidos (Sinir) para o ministro das Cidades, Jader
Filho. Waldez é aliado do senador Davi Alcolumbre (União-AP) e Jader é da cota
do MDB na Esplanada.
• Povos
Indígenas
Por sua vez, a ministra dos Povos Indígenas, Sonia
Guajajara, perdeu influência sobre a demarcação de terras indígenas para o
ministro da Justiça, Flávio Dino.
O enfraquecimento das duas pastas representa uma
derrota na agenda ambiental e de defesa dos povos indígenas, que são temas
caros à base do governo, que é de esquerda.
• Casa
Civil
Além disso, o ministro da Casa Civil, Rui Costa,
perdeu a coordenação das atividades de inteligência federal, que passou para o
Ministério do Gabinete de Segurança Institucional. A medida enfraquece a
Agência Brasileira de Inteligência, que continua na Casa Civil, mas com
limitações e dá poder ao GSI.
• Funasa
Outra ação que terá efeito a partir de sexta-feira é
a recriação da Funasa. A MP sobre o assunto não será votada. O relator da MP
dos Ministérios, Isnaldo Bulhões (MDB-AL), tentou incluir a extinção no texto,
mas a Câmara excluiu isso do texto.
Fonte: O Globo/Correio Braziliense
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