segunda-feira, 5 de junho de 2023

Marco temporal das terras indígenas: um imenso debate

O novo marco temporal das terras indígenas é um assunto de grande relevância e debate no cenário jurídico e político do Brasil. Esta proposta consiste em uma interpretação a ser dada sobre a demarcação de terrenos usados pelos povos originários.

Para os ruralistas, somente as áreas ocupadas até a data da promulgação da Constituição Federal de 1988 podem ser consideradas como terras tradicionalmente indígenas. Esta interpretação tem gerado controvérsias e implicações significativas para os direitos dos povos indígenas, influenciando, inclusive, o Supremo Tribunal Federal (STF).

Historicamente, as terras indígenas eram demarcadas com base no critério da ocupação ancestral, ou seja, levando em consideração a presença histórica destes povos nas áreas reivindicadas.

A nova interpretação, se for estabelecida de fato pelo STF, pode trazer uma restrição aos direitos dos povos originários, pois muitas comunidades que buscam a demarcação de suas terras ficarão prejudicadas se não puderem comprovar a ocupação até 1988.

Segundo os ruralistas, a justificativa é a de conferir segurança jurídica, buscando evitar a revisão de demarcações já consolidadas, bem como a criação de conflitos fundiários e a insegurança para os proprietários.

•        Povos originários

No entanto, os movimentos sociais e as organizações indigenistas argumentam que essa interpretação é contrária aos direitos dos povos originários, uma vez que muitas comunidades foram expulsas de suas áreas antes mesmo da promulgação da atual Constituição.

Essa interpretação também ignora a história de violência, exploração e expropriação de terras vivenciada por estes povos ao longo dos séculos, desconsiderando a luta e os direitos dessas comunidades.

Além disso, se assim for aprovado, o novo marco temporal pode dificultar o processo de demarcação, uma vez que exige uma série de provas documentais que muitas vezes são inexistentes ou de difícil acesso para os povos indígenas.

A decisão a ser tomada pelo STF e, consequentemente pela Câmara Federal, já que o Projeto de Lei (PL) 490/07 que quer transformar em lei a tese do marco temporal foi aprovado em regime de urgência para ser votado, gerou preocupação e variados protestos dos representantes dos povos originários, que veem a possibilidade dessa interpretação uma ameaça aos seus direitos territoriais e à preservação de suas culturas.

Organizações sociais e defensores dos direitos humanos têm buscado formas de contestar e reverter essa urgência, através de mobilizações e pressão política, ainda mais que está marcada a votação do tema no STF para o dia 7 de junho, sendo assim, qual o sentido de se votar um PL na casa legislativa antes do Supremo?

O debate precisa ser feito com calma, trazendo à tona diversos elementos importantes, como a importância de políticas públicas voltadas para a garantia dos direitos dos povos indígenas, como a demarcação e proteção de suas terras, a promoção da saúde e educação indígena, entre outras.

•        Preservação ambiental

A discussão do tema evidencia ainda a necessidade de um diálogo amplo e inclusivo, que leve em consideração os diferentes interesses e perspectivas envolvidos, buscando soluções que respeitem os povos originários e promovam a justiça social e a preservação ambiental.

Em conclusão, o novo marco temporal das terras indígenas tem gerado intensos debates e implicações para os direitos dos povos indígenas no Brasil. A interpretação do STF, que pode estabelecer como critério a ocupação até a promulgação da Constituição Federal de 1988 (como querem os ruralistas), restringe os direitos territoriais destas comunidades e desconsidera a história de violência e expropriação de terras que elas enfrentaram ao longo dos séculos. Essa interpretação coloca em risco a preservação de suas culturas e a garantia de seus direitos, demandando ações concretas para a sua proteção e o fortalecimento das políticas públicas voltadas para estes sujeitos.

Diante disso, é fundamental que o STF (e a Câmara federal se for o caso) compreenda o marco temporal sob uma outra ótica, garantindo uma ampla participação que envolva todos os atores relevantes, incluindo as comunidades indígenas, especialistas, organizações da sociedade civil e o poder público, garantindo assim a preservação de suas identidades e a construção de uma sociedade mais justa e inclusiva.

 

       STF se adianta ao Congresso e retoma análise do ‘marco temporal’

 

O Supremo Tribunal Federal (STF) retoma, na próxima quarta-feira, o julgamento da ação conhecida como ‘marco temporal’ sobre as terras indígenas. A Corte interrompeu a votação em 2021, após um pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes, mas o processo ganhou um vulto ainda maior após a deliberação do Congresso sobre o tema, favorável aos grileiros.

Até agora dois ministros votaram: o relator Edson Fachin, contra o marco temporal, e o ministro Nunes Marques, a favor. A paralisação da análise por dois anos abriu brechas para que a bancada ruralista emplacasse a votação da medida na Câmara dos Deputados.

Impulsionado pelo presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), o ‘marco temporal’ foi aprovado em regime de urgência pela Câmara na última semana. Parlamentares ruralistas tinham pressa para se antecipar ao STF. No Senado, o projeto deve tramitar de forma regular, sem caráter de urgência, em sintonia com a Corte Suprema, que poderá encerrar a questão nas próximas semanas.

•        Entendimento

Indígenas de todo o Brasil começam a mobilização em Brasília (DF) a partir de segunda-feira (5). O acampamento convocado pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) busca sensibilizar os ministros da Corte contra a aprovação do marco temporal.

A assessoria jurídica da Apib já avaliou que a decisão da Suprema Corte poderá influenciar eventuais leis do Congresso que contenham o ‘marco temporal’.

"O que tem que prevalecer é o entendimento do STF porque ele é o guardião da Constituição. Logo, os preceitos do PL 490 (do marco temporal), e futuramente a lei que pretende se criar, serão inconstitucionais", analisou no processo, em 2021, a advogada Samanta Pataxó.

•        Por séculos

O chamado ‘marco temporal’ é uma tese jurídica defendida pelo agronegócio, repudiada pelas organizações indígenas e considerada inconstitucional por juristas e advogados - indígenas e não indígenas.

A proposta muda radicalmente o critério para demarcações ao estabelecer que apenas as terras já ocupadas por povos indígenas em 5 de outubro de 1988 - data da promulgação da Constituição - podem ser reivindicadas por eles.

Um grupo indígena que tenha ocupado um território por séculos, mas que não estivesse no local na data exata estabelecida pelo marco temporal, pode ficar sem direito à demarcação.  Líderes e advogados indígenas, juristas e ambientalistas consideram que o critério poderá paralisar novas demarcações e também permitir o questionamento na Justiça de processos demarcatórios já concluídos, a exemplo do território indígena Raposa Serra do Sol, um dos maiores do país.

 

       Um ano após morte de Bruno Pereira, abandono se mantém no Vale do Javari

 

Após um ano do assassinato brutal de Bruno e Dom a terra indígena do Vale do Javari ainda vive sob medo e abandono pelo Estado. Fontes ouvidas pelo Correio lamentam a inação do poder público para combater a violência e o tráfico na região. Integrantes da Funai que atuam na região afirmam, em caráter reservado, que as terras indígenas continuam sendo invadidas com a presença de garimpeiros, pescadores, caçadores e o crime organizado.

 “Não tem Ibama, não tem Polícia Federal em Atalaia, as agências de segurança pública não estão presentes. O Exército está aí, mas é aquela coisa: é a maior burocracia para fazer uma parceria. A Força Nacional baseada na nossa região tampouco contempla nossas necessidades. Os policiais militares que são arregimentados pela Força Nacional trabalharam por anos em área urbana. O Estado não dá condições para nós fazermos nosso trabalho. Acho que por isso que o Bruno tinha pouca perspectiva, falava que nosso chefe é os índios. A gente está aqui porque eles precisam da gente, estamos tentando fazer com que os direitos deles se concretizem”, critica Iltercley Chagas.

O servidor cobra mais velocidade para conter os crimes cometidos contra o meio ambiente e os povos indígenas. “Ainda está muito incipiente. A (ministra dos Povos Indígenas) Sônia Guajajara evocou, nas entrevistas dela, que o Vale do Javari e a Terra Ianomâmi ia ser foco das atuações. Até houve uma projeção bacana no início, mas não deu seguimento. Quase seis meses depois é que está se vendo um movimento mais institucionalizado, o Estado fazendo reuniões intersetoriais. Estávamos na perspectiva de que seria algo mais imediato”, reclama Chagas.

Eliesio Marubo, procurador jurídico da Univaja, afirma que o governo atual não tem dado a devida prioridade para a causa no Vale do Javari. “Nada mudou. As coisas estão do mesmo jeito, cada vez piores. Não estamos tendo as respostas que esperávamos. Isso tem agravado a situação no Vale do Javari. Dificilmente eles vão dar resposta que precisamos agora. Estamos totalmente vulneráveis. Eu tenho estado cansado com todo esse contexto e perdido um pouco as esperanças”, lamenta.

Ivan Soler lembrou do assassinato do indigenista Maxciel Pereira, morto em 2019. E faz um apleo por uma presença maior do Estado na região amazônica. “Maxciel foi assassinado em Tabatinga, onde a família dele morava. Foi outro que pagou caro por cumprir com seu dever de funcionário público com louvor. Ele era meu chefe. Só ele e eu trabalhávamos naquela salinha do 2º andar do prédio da Funai em Atalaia do Norte. O Estado tem que aumentar muito sua presença por lá”, clama.

“Meu maior desejo, e acredito que fosse o dele também, é que todo mundo se esforce para que a partida deles não tenha sido em vão. Porque para os indígenas, indigenista bom é indigenista vivo. Mortos não temos utilidade alguma para eles”, finaliza Soler.

 

       Podemos vai ao STF contra normas em terras Yanomami

 

O Podemos ajuizou uma ADI (Ação Direta de Constitucionalidade) no STF (Supremo Tribunal Federal) contra uma norma estabelecida pela Funai (Fundação Nacional do Indígena) contra atividade religiosa realizada por não indígenas em terras Yanomami. A ação está sob a relatoria do ministro Dias Toffoli.

A portaria diz que é “proibido o exercício de quaisquer atividades religiosas junto aos povos indígenas, bem como o uso de roupas com imagens ou expressões religiosas”. Na petição, o Podemos afirma que a norma desrespeita a liberdade religiosa.

“A Liberdade de manifestação e a religiosa, são consequências da evolução das instituições políticas, que caminham, como não poderia deixar de ser, em parelha com o aprimoramento das legislações dos países democráticos, sobretudo quanto aos temas que devem ter sede na Constituição Federal, baliza e norte de toda a organização de um Estado, e é confirmada pela Suprema Corte Brasileira”, diz trecho do pedido.

 “Este tipo de inconstitucionalidade expressa a incompatibilidade de conteúdo, substantiva, entre a lei ou ato normativo e a Constituição. Não existe a possibilidade da norma continuar a existir.

A norma foi adotada pela Funai em 1º de fevereiro, dias depois de o ministério da Saúde decretar Estado de Emergência na região Yanomami.

A chegada em massa de garimpeiros ilegais nos últimos anos instalou a fome e as doenças entre os indígenas.

Além dos assassinatos cometidos pelos invasores, a etnia se viu sem comida, pois as caças morriam ou fugiam com a chegada do garimpo, e exposta a doenças como malária e pneumonia, dentre outras.

Em janeiro, o governo federal montou hospitais de campanha em Roraima e começou a socorrer os yanomami. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) instituiu o Comitê de Coordenação Nacional para Enfrentamento à Desassistência Sanitária das Populações em Território Yanomami, para discutir as medidas a serem adotadas.

 

Fonte: Correio do Brasil/Correio Braziliense/Poder 360

 

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