Educação Ambiental:
Livro detalha o papel crucial dos biocombustíveis na transição energética
Dotado
de abundantes recursos naturais, o Brasil é o país que apresenta a matriz
energética mais diversificada. E pode desempenhar um papel decisivo na transição
energética em curso no planeta: das fontes fósseis para as fontes renováveis e
ambientalmente sustentáveis. Nessa equação, os biocombustíveis são uma variável
de máxima importância. Seja pela adição de 27,5% de etanol à gasolina, seja
pelo uso direto de etanol hidratado em veículos flex, o álcool de
cana-de-açúcar constitui mais de 40% do combustível consumido em motores de
ciclo Otto no país (o tipo mais comum em automóveis e que funciona nos chamados
quatro tempos: admissão, compressão, combustão e exaustão). Além disso, o
percentual de biodiesel no combustível utilizado em motores de ciclo Diesel
(combustão causada pela compressão da mistura de ar e combustível) aumentou de
10% para 12% em abril deste ano. E deverá continuar subindo gradativamente,
para chegar a 15% em 2026.
Tudo
isso tem uma história, com desafios, erros e acertos. E um acúmulo de
conhecimento que pode beneficiar outros países. Um exemplo é a Índia, segundo
maior produtor mundial de cana-de-açúcar, depois do Brasil, que, no rastro do
processo brasileiro, já pôs em marcha neste ano um programa de adição de 20% de
etanol à gasolina e começa também a fabricar veículos flex.
Neste
contexto, um livro escrito por dois especialistas tarimbados e publicado
com apoio da
FAPESP vem trazer importante contribuição, tanto para profissionais da área
quanto para leitores preocupados com o futuro do planeta, em um cenário de
crise climática. Trata-se de The future role of biofuels in the new
energy transition (Blucher, 2023), de Luís Augusto Barbosa Cortez e Frank Rosillo-Calle.
Ex-professor
da Faculdade de Engenharia Agrícola da Universidade Estadual de Campinas
(Unicamp) e atual pesquisador sênior do Núcleo Interdisciplinar de Planejamento
Energético (Nipe-Unicamp), Cortez é um nome referencial no campo dos
biocombustíveis. Seu livro Sustainability and Productivity,
publicado em 2010, foi contemplado com o prêmio Jabuti. Rosillo-Calle, por sua
vez, é pesquisador honorário sênior do Imperial College London, no Reino Unido,
com participação em diversos projetos internacionais de pesquisa e atividades
acadêmicas em universidades do Brasil, Espanha, Reino Unido e Tailândia.
“A
situação do Brasil no setor energético é muito favorável. Nossos veículos flex
já emitem menos do que os elétricos europeus. E, nesta conjuntura de crise,
também existe uma oportunidade: a de transformar o limão, constituído pelo
desmatamento, em uma limonada, a agricultura sustentável”, diz Cortez à Agência FAPESP.
O
pesquisador argumenta que, ao contrário de outros países, pobres em recursos
naturais, o obstáculo no caso brasileiro não é falta de espaço ou recursos
hídricos ou áreas ensolaradas, mas mentalidades e interesses econômicos e
políticos ainda presos a um passado insustentável. E lembra que o bioetanol se
expandiu no Brasil praticamente sem desmatar nem substituir a produção de
alimentos; apenas reutilizando áreas de pastagem degradadas. “Menos de 5% da
área destinada à agricultura no Brasil é ocupada pela plantação de
cana-de-açúcar para biocombustível. Isso representa menos de 0,5% da área do
país. No entanto, existem, atualmente, 150 usinas produtoras de bioetanol no
Estado de São Paulo. A proporção é de uma para cada duas cidades”, conta.
E
enfatiza que “é preciso repensar o uso do espaço, a partir do pasto degradado”,
informando que a superfície ocupada por pastagens no país é superior a 200
milhões de hectares – quase metade da área total da Amazônia brasileira (cerca
de 420 milhões de hectares, que ocupam mais da metade do território do país).
Comparativamente, a agricultura estende-se por 70 milhões de hectares.
“A
densidade animal nessa imensa área de pastagens é muito variável. Há regiões
com baixíssima densidade. O Brasil poderia manter sua posição de primeiro
produtor mundial de carne bovina, transitando da pecuária extensiva para a
pecuária confinada e liberando grandes extensões de terra para a agricultura
sustentável, sem desmatar a Amazônia nem o Cerrado. É preciso convencer o
pecuarista de que o confinamento é melhor. E de que é muito mais vantajoso
plantar cana ou milho para produzir biocombustíveis do que manter o boi no
pasto”, sublinha Cortez.
Esses
dados ainda são pouco conhecidos no Brasil. E menos ainda na Europa. Até mesmo
em um país altamente comprometido com a pauta ambiental, como a Alemanha,
existe um preconceito em relação aos biocombustíveis brasileiros, baseado na
ideia de que a cana-de-açúcar rouba espaço da Floresta Amazônica. “A
desinformação é enorme. E uma das expectativas que temos com o nosso livro é
esclarecer as pessoas sobre os benefícios proporcionados pelos
biocombustíveis”, pontua Cortez.
Para
o pesquisador, um dos obstáculos ao aumento ainda maior do uso de
biocombustíveis no país é a política que vincula o preço do etanol ao preço da
gasolina, quando não existe nenhuma razão objetiva para isso. Convencer o
consumidor pouco informado das virtudes ambientais do etanol pode ser uma
tarefa difícil. Mas o preço do produto na bomba é um argumento que qualquer um
entende.
O
pesquisador acredita que o carro elétrico vai ter, sim, uma entrada no país.
Mas que, por um tempo relativamente longo, essa solução ficará confinada às
grandes cidades. “Há 70 milhões de automóveis na frota brasileira. E muitos
veículos relativamente antigos continuam circulando. Isso não é algo que possa
ser mudado de uma hora para outra. Além do que, seria preciso mexer em toda a
logística de abastecimento”, pondera Cortez.
O
livro em pauta contempla um vasto espectro de subtemas, investigando em
especial as diferentes opções energéticas para reduzir rapidamente as emissões
de gases de efeito estufa e alcançar uma taxa líquida (emissões menos
absorções) igual a zero em meados deste século – meta imperativa para evitar a
catástrofe climática.
Com
prefácio do professor José
Goldemberg,
que entre numerosas atuações foi presidente da FAPESP de 2015 a 2018, o
livro The future role of biofuels in the new energy transition pode
ser adquirido no site da editora Blucher por R$ 70,00. Também está disponível
no formato e-book por R$ 39,00.
Fonte:
Por José Tadeu Arantes em Agência FAPESP
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