ANALISTAS APONTAM O
FUTURO DA EXTREMA-DIREITA SEM BOLSONARO
Na
última quinta-feira, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) iniciou
o julgamento da ação levantada pelo PDT contra o ex-presidente Jair Bolsonaro, acusado de
utilizar o aparato da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) e do
Palácio da Alvorada para conspirar contra o processo eleitoral, transmitindo em
rede pública seu pronunciamento a embaixadores, em 2022, em que utilizou-se de
informações falsas para tentar descredibilizar a segurança das urnas
eletrônicas.
Com
isso, ele corre o risco real de ficar inelegível, abrindo um vácuo no espaço
para uma candidatura de extrema-direita na disputa presidencial de 2026. Alguns
nomes já são cogitados entre analistas para preencher essa vaga, mas para os
especialistas consultados pelo Congresso em Foco, um candidato em
potencial se destaca: o governador de São Paulo, Tarcísio
de Freitas (Republicanos), eleito em sua primeira incursão
eleitoral em aliança com Bolsonaro.
O
risco de inelegibilidade de Bolsonaro não começou a ser cogitado recentemente.
No último mês de janeiro, o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, chegou a anunciar que, sem o
Jair, a sigla tende a optar pela ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro como candidata
em 2026. Ela hoje já ocupa espaço na direção do partido, além de ter forte
capilaridade no meio evangélico.
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Outro
sucessor de peso é Romeu Zema (Novo).
Reeleito governador de Minas Gerais, Zema conta com a simpatia do meio
empresarial e acumula um histórico de alianças eleitorais com o ex-presidente.
Seu partido, o Novo, é atualmente a principal linha auxiliar do PL no Congresso
Nacional, preenchendo o espaço que, na legislatura anterior, era ocupado pelo
PTB. A aproximação entre os dois chegou a resultar na criação de um bloco
parlamentar das duas siglas no Senado.
O
cientista político e consultor legislativo André Pereira César já enxerga
Tarcísio de Freitas como o principal sucessor eleitoral de Bolsonaro no pleito
de 2026. “Confirmado esse cenário, Tarcísio seria o nome mais forte para
assumir esse papel. Ele está circulando, está jogando pesado. Ele tem uma
capacidade de articulação e negociação muito melhor, muito mais eficaz do que a
do próprio Jair Bolsonaro”, afirmou.
O
historiador Daniel Pradera, cuja pesquisa é direcionada ao comportamento da
extrema-direita no Brasil, concorda com a tendência de ascensão de Tarcísio
como nome preferido em uma futura disputa presidencial. Além de considerar o
governador como um articulador mais habilidoso que Bolsonaro, Pradera explica
que Tarcísio consegue atrair votos tanto do eleitor extremista quanto de
setores moderados da direita.
“É
muito difícil dissociar a imagem dos dois, por mais que o Tarcísio tente de vez
em quando. O eleitorado do Tarcísio é o eleitorado de Bolsonaro, não há dúvida
quanto a isso. Por outro lado, Tarcísio não fala as atrocidades que Bolsonaro
falava”, apontou o historiador.
Mesmo
com a possibilidade de Bolsonaro ser eliminado da disputa presidencial, André
Cesar alerta que a presença do ex-presidente nos bastidores eleitorais ainda
será um fator de peso. Não apenas ele poderia atrair votos para um futuro
candidato substituto, como também utilizar a inelegibilidade como um
potencializador na campanha presidencial de outro candidato.
“Bolsonaro
é um puxador de votos natural. (…) O discurso, a narrativa que pode ser criada
em cima da inelegibilidade, pode ajudar muito a fortalecer certas práticas
dessa direita em termos de ação”, antecipou. Por outro lado, a capacidade de
atração de votos por parte do ex-presidente pode diminuir na medida em que, sem
a possibilidade de se eleger, sua influência política também sai enfraquecida.
Ø
Bolsonaro
espera que ministro Raul Araújo peça vista e adie seu julgamento no TSE
O
ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) disse, nesta sexta-feira, esperar que o
ministro Raul Araújo, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), peça vista (mais
tempo para análise) no julgamento que pode torná-lo inelegível por abuso de
poder político. O ex-chefe do Executivo elogiou o magistrado e acusou a Corte
de ser “tribunal político”.
“O
primeiro a votar depois do relator é o ministro Raul, conhecido por ser um
jurista que tem bastante apego à lei, apesar de estar num tribunal político. Há
possibilidade de pedir vista. É bom, porque ajuda a gente a clarear os fatos”,
comentou, em entrevista à Rádio Gaúcha.
No
TSE, Raul Araújo e Kassio Nunes Marques são os integrantes mais alinhados a
Bolsonaro. Caso seja pedido mais tempo para análise do processo, os autos devem
ser devolvidos em até 60 dias. Se esse prazo for excedido, a ação deve ser
julgada automaticamente, de acordo com as regras do tribunal.
O
julgamento de Bolsonaro no TSE começou na quinta-feira. A ação, apresentada
pelo PDT, gira em torno da reunião organizada pelo então presidente com
embaixadores, em 18 de julho de 2022, no Palácio da Alvorada. No encontro, ele
colocou em xeque a segurança do sistema eleitoral e apontou risco de fraude no
pleito, sem apresentar provas. A reunião foi transmitida pela TV Brasil, uma
emissora pública.
Na
sessão no TSE, o Ministério Público Eleitoral (MPE) pediu a condenação de
Bolsonaro à perda dos direitos políticos por oito anos.
Também
nesta sexta-feira, Bolsonaro insinuou, mais uma vez, que o presidente Luiz
Inácio Lula da Silva (PT) tem ligação com a facção criminosa Primeiro Comando
da Capital (PCC). A declaração foi dada a apoiadores, em Porto Alegre, para se
defender do processo em curso na Justiça Eleitoral.
“Não
estou aqui atacando o TSE, longe disso, mas a fundamentação é uma coisa
inacreditável: reuniu-se com embaixadores. O outro cara, no ano passado, se
reuniu com a nata do PCC no Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro. E vai se
reunir, agora, com a nata do Foro de São Paulo também. Não há comparação entre
nós”, enfatizou, sem citar o nome de Lula.
O
Foro de São Paulo reúne partidos, governos e organizações da esquerda da
América Latina. O encontro ocorrerá entre 29 de junho e 2 de julho, no Setor
Hoteleiro Sul.
No
ano passado, circulou nas redes sociais um vídeo falso associando Lula a
criminosos da facção PCC. Os filhos de Bolsonaro também publicaram
desinformações para tentar relacionar o petista ao grupo criminoso. O ministro
da Justiça, Flávio Dino, rebateu as acusações de Bolsonaro. Ele afirmou que o
ex-presidente busca caluniar Lula como estratégia para escapar de punições
jurídicas.
“Achamos
que o ex-presidente deve manter a serenidade, deve manter a decência possível e
prestar contas à polícia e ao Poder Judiciário”, destacou, em entrevista
coletiva. “Mas não tente, mais uma vez, recorrer a esse ardil baixo e vil de
vincular o governo do presidente Lula ao PCC, ao Comando Vermelho e a qualquer
outra quadrilha.”
O
próprio Dino já foi acusado por bolsonaristas de ter ligações com criminosos.
Eles disseminaram fake news ao dizerem que o ministro teria feito um acordo com
traficantes para visitar o Complexo da Maré, no Rio de Janeiro, em março. Na
verdade, o chefe da pasta havia avisado às autoridades de segurança sobre o
encontro com lideranças da comunidade.
Ø
Governo
Lula e PT festejam, mas na verdade temem bolsonarismo mais forte sem Bolsonaro
Ministros
do governo Lula e integrantes do PT celebram em público a possibilidade de Jair
Bolsonaro (PL) se tornar inelegível por decisão do Tribunal Superior Eleitoral
(TSE). Em privado, no entanto, diversos deles avaliam que, com isso, o
ex-presidente pode se tornar um cabo eleitoral ainda mais forte do que já é
hoje, ainda no pleno gozo de seus direitos políticos.
Em
primeiro lugar, ele viraria uma espécie de mártir da causa da direita no
Brasil. Na condição de vítima, atrairia solidariedade e fidelidade ainda maior
de quem o admira.
Sem
o risco de Bolsonaro de novo comandar o país, o bolsonarismo poderia voltar a
atrair eleitores antipetistas que passaram a rejeitar o ex-presidente por
atitudes como o negacionismo na época da pandemia.
O
bolsonarismo sem Bolsonaro, portanto, poderia virar o polo mais importante de
oposição ao governo Lula, organizando-se em torno de um pré-candidato mais
palatável do que ele nas próximas eleições presidenciais.
O
nome mais citado como provável sucessor de Bolsonaro em um bolsonarismo de
tintas mais suaves é o do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas
(Republicanos-SP). A chave de tudo, no entanto, será o desempenho da economia,
analisam as mesmas lideranças. Se ela deslanchar, as dificuldades eleitorais da
oposição cresceriam.
Na
falta de uma liderança natural como Bolsonaro, e com certa desagregação de sua
base, seria preciso buscar um outro candidato em condições adversas diante de
um governo Lula fortalecido.
Na
semana passada, o instituto Quaest mostrou a força de Bolsonaro mesmo diante da
ação no TSE. Questionados, 43% dos entrevistados disseram que ele não deveria
ser condenado pelo tribunal. E 47% responderam que sim, ele precisa ser punido
–uma situação de empate técnico.
Questionados
se o ex-presidente deveria apoiar outro candidato à Presidência em caso de
ficar inelegível, 21% escolheram Tarcísio, 15% citaram Michelle Bolsonaro, 11%
apontaram o governador mineiro Romeu Zema e 4%, o senador Flávio Bolsonaro, um
dos filhos do ex-presidente.
Ø
Casa
Civil guarda os últimos “segredos” da gestão Bolsonaro e os primeiros de Lula
Risco
de ações extremistas no dia da posse do presidente, ameaças de morte a
autoridades e financiadores de atos golpistas: documentos sigilosos podem ficar
guardados por até 15 anos
Documentos
classificados como sigilosos nos estertores do governo Jair Bolsonaro e também
os primeiros segredos da gestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva estão
sob a guarda da Casa Civil. A papelada reúne 549 relatórios, memorandos e
informes, um acervo que põe à prova a transparência no governo federal e dá
pistas do que a área de inteligência produziu antes e depois dos ataques
golpistas de 8 de janeiro.
Da
relação de documentos sob sigilo, 438 foram redigidos pela Agência Brasileira
de Inteligência (Abin). Desses, 255 ainda no governo Bolsonaro e 183 já na
gestão do petista. Sob o véu do sigilo está, por exemplo, um relatório
produzido no dia 27 de dezembro. Ele trata da “perspectiva de ação violenta por
atores extremistas no contexto da posse presidencial”.
Três
dias depois, um novo informe foi redigido falando de segurança institucional e
das caravanas com destino a Brasília também para a posse de Lula. Há ainda um
documento que fala de “indivíduos envolvidos em atos de violência” na capital
federal. Os três papéis ganharam status de “reservados” no governo Bolsonaro, o
que lhes garante uma proteção de cinco anos.
Sob
a guarda da Casa Civil está ainda documento de 10 de janeiro deste ano, dois
dias após os ataques golpistas aos prédios do Congresso, do Supremo Tribunal
Federal e do Palácio do Planalto. Trata da atuação do “movimento Brasil verde e
amarelo” e da “participação de lideranças do agronegócio em atos
antidemocráticos”.
No
dia 12, foi confeccionado um informe relatando o caso de um homem qualificado
como “extremista violento” que teria publicado uma “lista de alvos jurados de
morte”.
O
acesso a esses relatórios é restrito a poucos servidores. Mas seu conteúdo
também está ao alcance do ministro Rui Costa. Na montagem do governo Lula,
coube à Casa Civil, assumir a tutela da Abin, setor do governo tradicionalmente
comandado por um militar.
Nesta
semana, o presidente vetou alterações à MP dos ministérios que tinha sido
modificada por uma Câmara de Deputados em pé de guerra com a articulação
política da gestão petista, com ministro da Casa Civil entre os alvos. O gesto
de Lula assegurou a Rui Costa o controle das informações de inteligência da
Abin.
A
existência de tais documentos foi revelada pela própria Casa Civil de forma
discreta, mas também inédita. Como manda a Lei de Acesso à Informação (LAI),
todo dia 1º de junho os órgãos e ministérios do governo federal devem publicar
o rol de informações classificadas e desclassificadas. A Casa Civil publicou
sua lista às 19h30 daquele dia.
Ainda
que os documentos tenham recebido o carimbo de “secreto” ou “reservado”, pela
primeira vez se tem indicação do tema que consta nos papéis. O modelo adotado
pela Casa Civil não é padrão no governo. Cada ministério divulga sua lista no
formato que quer. Uns dão pistas do que tratam os registros classificados como
sigilosos, outros se limitam a um rol apenas de números, sem texto.
Essa
papelada ficará guardada se o governo não mudar de ideia. O segredo dura 15
anos, no caso dos “secretos”, e 5 anos, no caso dos “reservados”.
A
relação da Casa Civil, pela primeira vez, inclui o que foi produzido pela Abin,
agora sob o comando da Pasta. A lista de todos os documentos sigilosos do
ministério foi espremida para caber em apenas três páginas. A primeira vista
mal dá para ler o que tem nela.
É
preciso multiplicar por cinco o zoom para ver seu conteúdo e enxergar que no
dia 9 de janeiro, há um relatório da Abin sobre a missão da Marinha do Irã no
Brasil. Outro documento descreve uma suposta “rede de empresas de suspeito de
atuar como operador financeiro para o PCC”.
Os
documentos da Abin geralmente tratam da coleta de informações dispersas,
algumas sem comprovação, mas várias baseadas em apuração dos agentes de
inteligência que registram dados que podem servir de base a uma investigação ou
mesmo apontar ações de segurança a serem adotadas. Se isso foi feito a partir
dos documentos que estão em segredo é tema para a CPMI de 8 de janeiro que
ainda engatinha no Congresso.
Os
segredos hoje guardados e protegidos são um teste para o governo que prometeu
transparência. Diante da notória barbárie promovida nos prédios dos Três
Poderes no início do ano, cabe a pergunta se é preciso manter boa parte desses
documentos realmente trancados por tanto tempo.
Fonte:
Congresso em Foco/Folha/Correio Braziliense/Agencia Estado
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