segunda-feira, 5 de junho de 2023

2 milhões de jovens estão fora das escolas no Brasil, diz Unicef

A evasão escolar pode ser classificada como o abandono estudantil motivado por diferentes causas. Esse tema é frequente nos debates educacionais brasileiros há tempos e entender os motivos para ele ser uma constante pode ser um 1º passo para buscar soluções. Segundo uma pesquisa realizada recentemente pelo Unicef, cerca de 2 milhões de crianças e adolescentes de 11 a 19 anos não estão frequentando a escola no Brasil.

Nota-se que o número apresentado teve um crescimento exponencial depois da pandemia de covid-19, que contribuiu para o aumento da desigualdade social e econômica em diferentes aspectos, sendo um deles a educação básica nacional.

A pandemia, no entanto, não foi a única razão para o crescimento desse número. Em 2018, em uma pesquisa também realizada pelo Unicef, foi revelado que a evasão escolar continuava a apresentar uma projeção de crescimento – apenas de 2017 a 2018 cerca de 220 mil jovens desistiram de frequentar a escola, a maioria desses pertencia às escolas públicas.

A professora Helena Singer, doutora em Sociologia pela Universidade de São Paulo e coordenadora do Movimento de Inovação na Educação, explica que para a compreensão do tema é importante entendermos antes o papel da escolarização obrigatória.

Essa foi determinada em 1996, a partir da Lei de Diretrizes e Bases da Educação e estendida por meio da Lei nº 12.796, de 4 de abril de 2013, que torna obrigatório o ensino básico a partir dos 4 anos e a sua manutenção até os 17 anos.

“A educação é um direito do cidadão e é dever do Estado oferecer a escola e garantir as condições para a permanência do estudante”, afirma a professora.

•        Processo histórico

A partir dos anos 90 a infraestrutura das escolas públicas passa a apresentar melhores condições. Essa contribuição foi importante para melhorar a situação do período, já que a ausência de vagas era uma das maiores contribuições para a evasão escolar.

Assim, a especialista comenta que o abandono estudantil está ligado a questões estruturais hoje. “Embora tenhamos escolas bem espalhadas pelo território, muitas vezes as condições não são muito favoráveis. É preciso garantir, por exemplo, o transporte escolar e a merenda, ou seja, garantir que os estudantes estejam nesse ambiente com qualidade.”

Além disso, em alguns casos, é comum que os alunos abandonem a escola por terem outras obrigações, como a necessidade de trabalhar para auxiliar na sustentação familiar. Para solucionar essa questão, Helena explica que foi criado o Bolsa Família (inicialmente chamado de Bolsa Escola), programa que fornece apoio financeiro para famílias, sendo uma, entre as diferentes condições, a permanência estudantil.

O projeto estudantil também deve considerar que cada contexto apresenta uma especificidade. Assim, a escola não é a mesma quando está inserida em ambientes diversos, como a cidade, o campo e a floresta.

Segundo Helena, cada um desses ambientes apresenta uma especificidade que precisa ser considerada para evitar o aumento do número de abandono da escola.

Além disso, a especialista explica que, em algumas situações, mesmo com toda a infraestrutura e condições estruturais sendo garantidas ao estudante, é possível que o processo de evasão ainda ocorra.

Nesses casos, é comum que as causas para o abandono estejam na própria escola, com motivos que variam desde o bullying até o desinteresse por parte do estudante.

O fato de a obrigatoriedade da educação básica ser uma conquista relativamente nova também colabora para que, ainda hoje, o número de jovens fora do ambiente escolar seja representado por um número tão elevado.

•        Pandemia e políticas públicas

É notório que o cenário pandêmico contribuiu para o aumento da evasão escolar, isso aconteceu, segundo a professora, “pois houve uma perda de vínculo da escola com os estudantes e suas famílias”.

A falta de acesso à internet afetou a continuidade do estudo desses indivíduos, já que as instituições de ensino não estavam preparadas para fornecer a educação com uma base remota — cenário que nunca foi presente ou necessário no País até então.

Segundo um levantamento realizado pela organização Todos Pela Educação, a evasão obteve um aumento de cerca de 171% durante esse período, quando comparado ao ano de 2019.

Apesar dos dados, Helena explica que o quadro pode ser revertido, apesar das dificuldades que podem aparecer durante esse processo. Para ela, as políticas públicas devem atacar todas as frentes possíveis, assim, a infraestrutura adequada para o número de alunos deve ser garantida juntamente com a proximidade das escolas das residências.

A merenda escolar também deve apresentar qualidade, uma vez que grande parte dos estudantes consome a sua principal refeição nesse ambiente e a qualificação dos profissionais da área deve ser realizada.

Além disso, a professora diz que a escola deve passar a “se conectar com os projetos de vida dos estudantes”, para que os alunos e as famílias reconheçam a escola como um equipamento de produção de conhecimento. Ou seja, é necessário que a comunidade entenda que a escola apresenta um compromisso com o desenvolvimento local.

A escola também deve ser entendida como ambiente de desenvolvimento físico, social e cultural do indivíduo. Helena diz que, para isso ser possível, é essencial que ela se articule com diferentes equipamentos.

Assim, as políticas públicas que trabalham com essas noções são as mais funcionais no combate à evasão escolar. “Aquelas que fazem articulações da educação com a saúde, as ciências sociais, a cultura, a comunicação e que territorializam a escola, fazendo um projeto pedagógico dela, são as melhores”, afirma a especialista.

 

       Suprema Corte dos EUA pode proibir uso de raça como critério de entrada em universidades

 

A Suprema Corte dos Estados Unidos julga neste mês duas ações que podem tornar ilegal que universidades considerem a raça dos candidatos em processos de admissão —decisões que analistas apontam que vão alterar de forma substancial o panorama das instituições de ensino americanas.

As ações foram movidas contra as universidades Harvard e da Carolina do Norte. Embora cotas raciais sejam proibidas nos EUA, universidades podem, na maioria dos estados, criar métodos para estimular o ingresso de estudantes negros e hispânicos.

Dada a composição de maioria conservadora da atual Suprema Corte, no entanto, a expectativa de analistas é de uma decisão que proíba essas ações afirmativas. Seria a segunda vez em um ano que uma decisão do colegiado altera políticas consideradas históricas —a primeira foi a mudança do entendimento de quase 50 anos que descaracterizou o acesso ao aborto como um direito constitucional.

Os casos em discussão foram impetrados pela SFFA (estudantes pela admissão justa, da sigla em inglês), que diz representar 20 mil estudantes e pais que discordam das ações afirmativas. A entidade foi criada pelo estrategista conservador Edward Blum, que questiona esse tipo de medida desde os anos 1990.

As universidades são acusadas agora de discriminarem alunos brancos e de ascendência asiática em favor de negros, hispânicos e indígenas —o que as instituições negam.

"A Suprema Corte deve considerar as ações afirmativas inconstitucionais, e as universidades vão ter que encontrar outras maneiras para aumentar a diversidade dos alunos", diz Donald P. Harris, professor da Universidade Temple, na Pensilvânia, e reitor associado para assuntos de equidade, diversidade e inclusão na faculdade de direito da instituição. "Vão considerar fatores como contexto geográfico, status socioeconômico e outros indicadores para substituir critérios de raça, mas não vai ser fácil."

Hoje, nove estados americanos já impedem o uso de ações afirmativas. Michigan é um deles. Em 2006, um referendo aprovado por 58% da população proibiu o uso de raça, gênero e religião em processos seletivos de universidades e vagas de empregos. A mudança teve impacto imediato no perfil demográfico dos alunos universitários no estado. A proporção de estudantes negros na Universidade de Michigan caiu de cerca de 8% na época para 2,5% hoje —o número de alunos hispânicos, no entanto, permaneceu similar.

Sem poder usar os critérios de raça para admissão, a universidade passou a adotar políticas focadas em classe social para aumentar a diversidade, conta Erica Sanders, vice-reitora assistente e diretora-executiva de admissão de graduandos.

"Realizamos campanhas de recrutamento em locais com populações historicamente sub-representadas, focando alunos de baixa renda e cujos pais não têm graduação, mesmo sabendo que isso não necessariamente se sobrepõe a critérios de raça. Organizamos visitas ao campus para apresentá-los à comunidade universitária e mostrar os serviços que oferecemos", explica Sanders.

A experiência em Michigan e em estados como a Califórnia —o primeiro a proibir ações afirmativas, em 1996—, onde universidades embranqueceram após a medida, mostram que "substituir a questão da raça pela classe econômica não resolve o problema chave dos sistemas de racismo estrutural históricos e ainda existentes nos EUA", diz Sara Kaplan, diretora do Centro de Pesquisa e Política Antirracista da American University.

Para ela, proibir ações afirmativas teria impactos dos mais variados, desde o aumento da disparidade de renda até a mudança nas prioridades da pesquisa acadêmica, tornando a produção científica do país menos diversa.

Já os argumentos contrários às políticas afirmativas incluem, além de suposta discriminação contra alunos brancos, a falta de perspectiva para o fim dessas ações, utilizadas nos EUA desde os anos 1960.

O mecanismo remonta à luta pelos direitos civis, primeiro como uma maneira de impedir que pessoas de minorias raciais fossem excluídas do mercado de trabalhos. Um decreto de John Kennedy em 1961 dizia que empresas com contratos com o governo federal deveriam adotar "ações afirmativas para garantir que os candidatos sejam tratados igualmente sem distinção de raça, cor, religião, sexo ou origem nacional".

Em 1978, no entanto, uma decisão da Suprema Corte considerou ilegal a reserva de cotas para minorias raciais ao analisar um caso da Universidade da Califórnia em Davis, que havia reservado 16 de 100 vagas de medicinas para grupos minoritários. A mesma decisão, porém, considerou legítimas ações afirmativas que considerassem raça como um dos critérios para admitir alunos. Decisões posteriores do tribunal confirmaram a legalidade da medida, ainda que com eventuais restrições.

Trinta e cinco anos depois, em 2003, um novo caso em Michigan levou a discussão novamente à mais alta instância da Justiça americana. O colegiado, à época, manteve o entendimento vigente. Agora, porém, a Suprema Corte em sua formação atual —seis dos nove magistrados são da ala mais conservadora— deve mudar o cenário.

A maioria dos americanos é favorável à manutenção das ações afirmativas, segundo pesquisa da Associated Press e da Universidade de Chicago divulgada na semana passada. Ao todo, 63% da população defende que a Suprema Corte não proíba o mecanismo nos sistemas de admissão.

Apesar disso, entre os pontos que devem ser considerados importantes para as universidades aceitarem novos alunos, os americanos citam como critérios mais relevantes do que a raça o histórico escolar, o desempenho no vestibular, a capacidade de pagar o curso e as habilidades esportivas.

No Brasil, lei de 2012 que reserva metade das vagas em instituições federais para cotas (divididas entre critérios raciais e sociais) já teve sua constitucionalidade confirmada pelo Supremo Tribunal Federal.

Nos EUA, o sistema de admissão é diferente. Enquanto a ampla maioria das universidades brasileiras utilizam apenas o vestibular como critério de admissão, as americanas podem usar, além de uma prova, critérios como histórico escolar do candidato e cartas de apresentação e recomendação. Assim, é comum que o processo seja menos objetivo, sobretudo porque muitas instituições não divulgam seus métodos.

"Mas raça é um critério relativamente até pouco utilizado na admissão nas universidades", diz Julie Park, professora da Universidade de Maryland. Pesquisa de 2019 da Associação Nacional de Aconselhamento para Admissão em Faculdades apontou que apenas 24,6% das instituições dizem que a raça tem influência considerável ou moderada nos processos de admissão.

 

Fonte: Poder 360/FolhaPress

 

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