Zequinha Marinho,
senador que ajudou terrorista, é o bingo do bolsonarismo: pastor, amigo de
grileiro e faz rachadinha
Na
última quinta-feira, a CPI do 8 de janeiro convocou o terrorista George
Washington, o bolsonarista que planejou um atentado terrorista em Brasília. Ele
foi preso depois que a polícia descobriu que ele planejava explodir um caminhão de combustível perto do
aeroporto de Brasília. “O senhor (Jair Bolsonaro) despertou esse espírito”, escreveu
o terrorista em uma carta para o ex-presidente.
Há
menos de um mês de ser preso, o terrorista esteve presente em uma audiência
pública no Senado Federal convocada por senadores bolsonaristas. De caráter
golpista, a reunião foi palco de ataques ao processo eleitoral e ao STF,
pedidos de prisão do ministro Alexandre de Moraes e a defesa aberta de um golpe
militar. George Washington estava lá junto de outros dois acusados de
participar do planejamento do atentado a bombas. Os policiais legislativos
desconfiam que parte dos invasores de 8
de janeiro aproveitaram essa entrada no Senado para mapear alguns pontos do
prédio.
O
nome do senador que autorizou a entrada do terrorista George Washington estava
mantido sob sigilo, mas a Folha descobriu. Trata-se do paraense Zequinha
Marinho, do Podemos do Pará, um personagem pra lá de obscuro que reúne em si
todos os estereótipos de um político bolsonarista. É pastor evangélico, tem
ligações com madeireiras na Amazônia, atua em favor de grileiros, persegue os
povos indígenas, é negacionista climático e é acusado de se lambuzar com
rachadinha em seu gabinete. Perceba que o senador completa o bingo dos
predicados do bolsonarismo: tem um pouco de Ricardo Salles, um pouco de Silas
Malafaia, um pouco de Flávio Bolsonaro.
Antes
de estrear na política nos anos 90, Zequinha foi gerente do Banco da Amazônia e
pastor da Assembléia de Deus. Sua carreira política começou em 97, quando foi
deputado estadual no Pará. Depois, foi deputado federal do estado por 10 anos.
Em 2015, chegou a ser vice-governador durante o mandato de Simão Jatene, um
político marcado por escândalos de corrupção. A defesa da família, dos bons
costumes e dos interesses ruralistas sempre foram suas principais bandeiras.
Zequinha já era um legítimo bolsonarista antes do bolsonarismo existir.
Eleito
senador na onda bolsonarista de 2018, Zequinha passou a ser visto por
madeireiros, grileiros e garimpeiros da Amazônia como uma porta de acesso ao
governo federal. Uma reportagem da Agência Pública reuniu relatos e documentos
que mostram as movimentações de Zequinha junto ao governo federal para atender
esses criminosos que atuam na região amazônica. “Chama o Zequinha” era uma
frase repetida entre eles quando precisavam de uma ajudinha de cima.
O
senador atuou com especial apreço para retirar a proteção da terra indígena de
Ituna Itatá, no Xingú, onde povos indígenas vivem isolados. Do seu gabinete
saiu uma série de ofícios para órgãos públicos responsáveis pela fiscalização
da região. Por muito pouco Zequinha não conseguiu fazer com que a Funai retirasse
a proteção da área. O órgão cogitou a possibilidade, mas se viu obrigado a
voltar atrás depois da enorme repercussão internacional dos assassinatos de
Bruno Pereira e Dom Phillips, que ocorreram justamente em uma terra indígena
invadida por criminosos.
O
senador completa o bingo dos predicados do bolsonarismo: tem um pouco de
Ricardo Salles, um pouco de Silas Malafaia, um pouco de Flávio Bolsonaro.
De
qualquer forma, os posseiros ocuparam parte dessas terras ilegalmente. O maior
deles é Jassônio Costa Leite, considerado o maior grileiro de terras indígenas
da Amazônia. Adivinha quem é seu amigo particular? Sim, ele mesmo, o Zequinha.
Segundo o Ibama, Jassônio é o líder dos invasores de terras indígenas, o “chefe
do esquema criminoso”. É ele quem faz o loteamento e vende os terrenos
invadidos. Em 2021, após ser alvo de uma operação de combate ao desmatamento do
Ibama que o multou em R$ 105 milhões, o posseiro pediu ajuda para Zequinha –
ele gravou um vídeo ao seu lado chamando
os servidores do órgão de “bandidos e malandros”.
A
revolta do senador está no fato do Ibama ter como prática queimar os
equipamentos dos criminosos para que não sejam reutilizados em novos crimes.
Poucos dias após o encontro entre Zequinha e Jassônio, o então ministro Ricardo
Salles exonerou os diretores de fiscalização do órgão. Como disse um dos
servidores exonerados ouvido pela Agência Pública, “Na queda de braço entre ele
[o senador] e os fiscais, mesmo os mais antigos, Zequinha sempre sai ganhando”.
Em
discurso no Senado, Zequinha abusou das mentiras sobre os povos da região: “não
é uma terra indígena, é uma área de pretensão indígena. E o pior: não há índio
lá, nem isolado, nem reconhecido por ninguém”. Zequinha faz questão de ignorar
os mais de 30 anos de dados coletados por indigenistas ligados à Funai, que
atestam a existência de povos indígenas em isolamento na região. A falsa
narrativa é usada para justificar as ações predatórias na área indígena. A luta
do senador pelo domínio da região deu resultado: 84% do desmatamento de
Ituna-Itatá aconteceu justamente durante os 3 primeiros anos de mandato de
Zequinha.
No
ano passado, Zequinha organizou reuniões entre garimpeiros clandestinos do Pará
com ministros do governo Jair Bolsonaro. O objetivo era apresentar um
requerimento para impedir a atuação de servidores do Ibama e da Polícia Federal
nas regiões em que atuam ilegalmente. Os garimpeiros foram recebidos pelos
ministérios da Justiça, Meio Ambiente, Segurança Pública, Agricultura, Minas e
Energia, Direitos Humanos e a Advocacia-Geral da União. Durante uma das
reuniões no Ministério da Agricultura, Zequinha afirmou que a ação do Ibama no
oeste do Pará era “pior do que o Estado Islâmico na Síria”.
Entre
os presentes nessa caravana em Brasília, estavam representantes da cooperativa
Cooperouri, uma velha conhecida de policiais e fiscais quando o assunto é
garimpo ilegal. Segundo investigação da Polícia Federal, a Cooperouri integra
uma grande organização criminosa que atua na extração clandestina de ouro na
Terra Indígena Kayapó, no sul do Pará.
Em
2021, durante a Operação Handroanthus, a Polícia Federal apreendeu mais de 226
metros cúbicos de madeira ilegal, uma carga avaliada em R$ 129 milhões. O então
ministro Ricardo Salles atuou pessoalmente para conseguir liberar a carga criminosa.
Salles afirmou ter sido acionado por um grupo de parlamentares, entre eles
Zequinha.
Para
a surpresa de ninguém, o senador paraense é também um militante do negacionismo
climático. Segundo ele, o aquecimento global é apenas “folclore”, já que a “interferência
humana é muito pequena”. No primeiro ano do governo Bolsonaro, o Congresso
Nacional instalou uma comissão de deputados e senadores para discutir o tema
das mudanças climáticas e o aumento recente no número de queimadas da Amazônia.
Quem foi escolhido para ser o presidente dessa comissão? Sim, Zequinha, o negacionista climático e representante dos
garimpeiros. O episódio é uma síntese do que foi o bolsonarismo no poder.
As
malandragens de Zequinha não se limitam à Amazônia. Elas acontecem também dentro
do seu gabinete. O senador é réu pelo crime de concussão em um processo que se
arrasta por 10 anos. Marinho nega a “rachadinha” feita dentro do seu gabinete,
mas as provas contra eles são robustas.
• Zequinha já era um legítimo bolsonarista
antes do bolsonarismo existir.
O
caso começou em 2011, quando era deputado federal e presidente do PSC do Pará.
Ele obrigava os seus 23 funcionários a darem uma parte dos seus salários para o
partido. Em um e-mail enviado a uma servidora, Zequinha cobrava a grana de um
dos funcionários: “Peça ao Humberto para providenciar com a maior brevidade
possível o depósito correspondente a 5% do bruto que ele recebe. Ok?”. O
funcionário se recusou a pagar e Zequinha o demitiu por e-mail: “Diante da
impossibilidade de Vossa Senhoria autorizar o débito de 5% do Partido Social Cristão, ficou determinada
sua exoneração”. O Ministério Público Estadual pediu a cassação de Zequinha
Marinho.
Em
2021, ele foi alvo de um novo pedido de cassação por irregularidades na
captação e gastos de recursos de campanha em 2018 — o famoso caixa 2. O MP
também pediu a cassação de sua esposa, Júlia Marinho, acusada de desviar R$ 2,3
milhões da cota de gênero do fundo eleitoral para Zequinha.
Esses
são apenas alguns episódios escabrosos no currículo do senador bolsonarista. Há
muito mais, mas este texto precisa acabar. Zequinha é um homem baixinho, mas
sua trajetória em favor do que há de pior no Brasil é gigante. Graças a ele,
garimpeiros, grileiros e até o terrorista que planejou explodir um caminhão no
aeroporto de Brasília foram recebidos com tapete vermelho no Congresso Nacional
e nos ministérios do governo federal. Zequinha é a personificação do que é o
bolsonarismo. É o negacionista climático que preside comissão sobre o clima, o
pastor evangélico que atua contra os povos originários, o defensor dos bons
costumes que faz rachadinha no gabinete. É o combo completo.
Fonte:
Por João Filho, no Thr Intercept
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